Paciente cardíaco revascularizado: processo de referência e contra referência dos serviços de saúde de Santa Catarina

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Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL Alacoque Lorenzini Erdmann 1 Betina Horner Schlindwein Meirelles 2 Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni 3 Maria Aparecida Baggio 4 Giovana Dorneles Callegaro Higashi 5 Cintia Koerich 6 Kamylla Santos da Cunha 7 Carolina Kahl 8 Paciente cardíaco revascularizado: processo de referência e contra referência dos serviços de saúde de Santa Catarina Cardiac revascularized patient: process of reference and counterreference of the health services of Santa Catarina 1 Enfermeira. Doutora em Filosofia da Enfermagem. Departamento de Enfermagem e Programa de Pós- Graduação em Enfermagem. Universidade Federal de 2 Enfermeira. Doutora em Filosofia da Enfermagem. Departamento de Enfermagem e Programa de Pós- Graduação em Enfermagem. Universidade Federal de 3 Departamento de Enfermagem. Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. 4 Curso de Graduação em Enfermagem e Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública em Região de Fronteira. Universidade Estadual do Oeste do Paraná. 5 Departamento de Enfermagem. Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. 6 7 8 RESUMO Objetivos: compreender o processo de referência e contrarreferência da pessoa acometida por coronariopatia e submetida à revascularização cardíaca nos serviços de saúde de Santa Catarina e a interface com a atuação do enfermeiro. Método: Trata-se de pesquisa quanti-qualitativa, organizada em dois momentos concomitante, entre março de 2013 a março de 2014. O primeiro foi quantitativo, do tipo epidemiológico observacional e transversal, em um hospital referência cardiovascular para Santa Catarina, envolvendo 99 indivíduos submetidos à revascularização miocárdica. Na etapa qualitativa, a Teoria Fundamentada nos Dados foi realizada com 62 participantes, vinculados ao sistema de saúde Estadual de Santa Catarina e municipal da região de Florianópolis e de Chapecó. Resultados: A média do tempo de internação ficou em 40,3 dias, enquanto a média do tempo de pré-operatório ficou em 22,8 dias, já a média do tempo de pós-operatório ficou em 10,9 dias. As principais características da internação e alterações apresentadas por indivíduos no pré e pós-operatório de CRM foram: ansiedade, dor torácica, angina, falta de ar, dispnéia, HAS, hemorragia, complicações pulmonares e arritmias. Instrumentos de Regulação representam importante meio para integração dos serviços de saúde, embora a contrarreferência não esteja estruturada. Profissionais de saúde, incluindo Enfermeiros, apresentam baixa resolutividade na prática clínica na Atenção Básica. Conclusão: Evidenciam-se fragilidades no processo de referência e contrarreferência, com desarticulação entre os diferentes pontos da rede de atenção à saúde e necessidade de fortalecimento das estratégias eficientes para garantir acesso e cuidado seguro, com vínculo entre os profissionais da Atenção Básica e usuário. 91

Erdmann AL et al. Palavras chave: Descritores: Enfermagem; Cirurgia Cardíaca; Integralidade em Saúde. INTRODUÇÃO No Brasil, é prevalente a causa de mortalidade por doenças cardiovasculares (31%), seguida por câncer (17%), em ambos os sexos. Embora a taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares tenha apresentado declínio gradativo no período de 2002 a 2011, em 2012 houve novo aumento, particularmente do sexo masculino com idade entre 30 e 70 anos 1. Considerando a pirâmide etária nacional e que as doenças cardiovasculares atingem principalmente a população economicamente ativa, somada à dificuldade de acesso aos serviços de média e alta densidade tecnológica e à falta de planejamento no processo regulatório em saúde presente nos países de baixa e média renda 2-3, importa aos profissionais e gestores em saúde discutir as possibilidades de melhoria no processo de referência e contrarreferência das pessoas acometidas por este agravo e que necessitam de tratamento cirurgico visando superar os entraves à efetivação da integralidade no Sistema Único de Saúde (SUS). Para além dos desafios relacionados à gestão de informações em saúde e estruturais em um país de dimensões continentais, que desde 2006 apóia-se na Programação Pactuada e Integrada da Assistência em Saúde para organização da rede de serviços através de fluxos de atendimento, a qual tem demonstrado necessidade de aprimoramentos 2, destaca-se a importância do capital humano no processo de planejar os processos com base no contexto e nas demandas identificadas junto aos usuários e famílias. Em diversos países, o Enfermeiro tem importante contribuição como profissional referência no controle e continuidade dos cuidados de saúde. Originada em Montreal (Canadá), nos anos 1960, a função do enfermeiro de ligação visava à redução do tempo de internação por meio da extensão das ações de enfermagem do serviço hospitalar para a comunidade 4, a qual ainda impacta positivamente na saúde dos pacientes, garantindo cuidados seguros e informações adequadas 5. Os sistemas e redes de serviços de saúde envolvem múltiplos aspectos, que requerem integração, tais como: regulação dos serviços; processos de gestão clínica; condições de acesso aos serviços; recursos humanos; sistemas de informação, comunicação e apoio logístico. Todavia, há problemas em todos esses aspectos no contexto nacional, especialmente na desarticulação entre oferta e demanda 6, que repercutem no aumento de pessoas com baixa adesão ao tratamento e com vínculo frágil com os serviços de saúde 7-8. Diante deste cenário, o objetivo deste estudo é compreender o processo de referência e contrarreferência da pessoa acometida por coronariopatia e submetida à revascularização cardíaca nos serviços de saúde de Santa Catarina. MÉTODO Trata-se de pesquisa quanti-qualitativa, organizada em dois momentos. O primeiro foi quantitativo, do tipo epidemiológico observacional e transversal. Entre março de 2013 a março de 2014, em um hospital referência cardiovascular para Santa Catarina, envolvendo 99 indivíduos submetidos à CRM. Foi realizado contato diário com os participantes da pesquisa durante o período de internação a fim de detectar alterações no quadro de saúde. Informações sobre o diagnóstico e quadro clínico de desconhecimento dos participantes foram coletadas em prontuário com a devida autorização dos participantes. Os dados foram coletados por meio de um questionário estruturado, o qual recebeu a contribuição de dois profissionais atuantes na instituição para sua elaboração, sendo estes um médico e um enfermeiro com experiência na área. No momento da aplicação, os dados coletados foram diretamente digitados em uma planilha eletrônica do programa Excel da Microsoft, e ao final, exportados para 92

o Software SPSS Statistics versão 22.0 para a realização da análise estatística. A segunda etapa foi qualitativa, com uso do método Teoria Fundamentada nos Dados, realizada com pessoas que realizaram CRM, com profissionais de uma instituição hospitalar referência estadual em alta complexidade cardiológica, com profissionais da atenção básica e especializada da região metropolitana de Florianópolis e do município de Chapecó e por profissionais gestores atuantes no sistema de regulação municipal e estadual. Destaca-se que Florianópolis e Chapecó representam dois pólos distintos no que tange a infraestrutura urbana e de densidade de serviços de saúde no Estado de Santa Catarina. A coleta de dados ocorreu no período de março de 2013 a junho de 2014, por meio de entrevistas semiestruturadas. A seleção dos participantes foi realizada por amostragem teórica, composta por três grupos amostrais. O primeiro grupo amostral foi composto por 20 pessoas revascularizadas. O segundo grupo amostral foi composto por 31 profissionais de saúde (enfermeiros, assistentes sociais, médicos, educadores físicos e agentes comunitários de saúde) com atuação direta ou indiretamente ao paciente, nos cenários de coleta de dados. O terceiro grupo amostral foi composto por 11 profissionais de saúde do grupo gestor do complexo regulatório Estadual e Municipal de Florianópolis e de Chapecó. A coleta de dados foi determinada ao se atingir o objetivo do estudo, totalizando 62 entrevistas. A coleta e análise dos dados ocorreram de forma simultânea, pautada pela análise comparativa, seguindo as etapas propostas: codificação aberta, axial e seletiva 9. O estudo seguiu as recomendações da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e recebeu parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, sob CAAE: 03616612.6.0000.0121. A obtenção da anuência dos participantes se deu por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. RESULTADOS A caracterização sociodemográfica mostra que 70% dos participantes são homens, 61% casados, 53% aposentados, e média de idade de 61,3 anos (DP 8,5). A média do tempo de internação ficou em 40,3 (DP 19,4) dias, enquanto a média do tempo de pré-operatório ficou em 22,8 (DP 16,1) dias, já a média do tempo de pós-operatório ficou em 10,9 (DP 10,2) dias. As principais características da internação e alterações apresentadas por indivíduos no pré e pós -operatório de CRM foram: ansiedade, dor torácica, angina, falta de ar, dispnéia, HAS, hemorragia, complicações pulmonares e arritmias. As variáveis do pré-operatório: dor no peito, dor torácica e angina e as variáveis do pós-operatório: insuficiência respiratória, hipertermia e arritmia foram associadas ao maior tempo de internação geral, como também se observou maior tempo de pós -operatório relacionado às variáveis do pós-operatório: insuficiência respiratória, HAS e arritmias. Em relação aos dados qualitativos, nas condições causais e contexto, destaca-se que as pessoas acessam o serviço de saúde, a partir da percepção de algum sintoma da doença coronária. Em Florianópolis, o atendimento clínico acontece em sua maioria através das Unidades de Pronto Atendimento. O médico aciona o sistema de regulação e o paciente é transferido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. A referência para alta complexidade é o hospital público estadual da região de Florianópolis. Este muitas vezes é acessado diretamente pelo paciente. Já em Chapecó, o Centro de Referência em Saúde Municipal (CRESM) responde pelo atendimento especializado, articulado com tratamento fora do domicílio (TFD). As estratégias para acesso do paciente aos diferentes níveis de atenção à saúde no estado de Santa Catarina utiliza tem ênfase no Sistema Nacional de Regulação (SISREG). Porém, os leitos da Unidade de Tratamento Intensivo são regulados pela própria instituição. Em Chapecó, o TFD e o CRESM são apontados como recursos na organização do fluxo de pessoas para a realização da cirurgia de revascularização do miocárdio. No entanto, a crítica dos profissionais é que a fila paralela proveniente do TFD dificulta o sistema de regulação. As condições intervenientes descrevem que na média complexidade, o atendimento e o referenciamento das pessoas com coronariopatia é prejudicado devido ao restrito número de consultas médicas e de enfermagem, à baixa resolutividade, à inabilidade dos profissionais do fluxo de referenciamento. Ainda, na alta complexidade, destaca 93

Erdmann AL et al. -se como motivo da morosidade para a CRM: falta de leitos hospitalares; profissionais que burlam o fluxo formal de atendimento; absenteísmo laboral e falta de recursos estruturais e materiais. O componente conseqüências sinaliza o inadequado acompanhamento em saúde das pessoas submetidas à CRM, em processo de reabilitação, na atenção básica e média complexidade nos diferentes campos do estudo. Tal fato condiciona à continuidade do vínculo das pessoas ao ambulatório e serviço hospitalar. CONCLUSÃO O estudo apresenta contribuições para a readequação da dinâmica de referência e contrarreferência da pessoa acometida por coronariopata e submetida à revascularização cardíaca nos diferentes pontos de atenção à saúde no SUS. Evidencia-se fragilidades no processo de referência e contrarreferência, com desarticulação entre os diferentes pontos da rede de atenção à saúde. Tal processo, mesmo que orientado pelo SISREG, apresenta ambiguidades e descontinuidades no atendimento em saúde, com necessidade de investimentos nos diversos níveis de complexidade da rede de atenção para garantir o acesso e acompanhamento desta população. O hospital é o serviço de saúde de referência a pessoa que requer tratamento cirúrgico de coronariopatia e o ambulatório e o serviço de reabilitação cardíaca deste é a contrarreferência para reabilitação das pessoas quando já revascularizada. Isso sinaliza o descompasso entre a teoria e a prática em saúde pública, considerando que a atenção básica além de atuar na promoção da saúde, na prevenção de doenças e de agravos, também é responsável por condições para reabilitação. REFERÊNCIAS 1. World Health Organization. Noncommunicable Diseases Country Profiles [Internet]. 2014 [citado 2017 out. 25]. Disponível em: http://apps.who.int/ iris/bitstream/10665/128038/1/9789241507509_ eng.pdf?ua=1 2. Almeida PF, Santos AM, Santos VP, Silveira Filho, RMS. Integração assistencial em região de saúde: paradoxo entre necessidades regionais e interesses locais. Saude soc. [Internet]. 2016 [citado 2017 out. 25];25(2):320-335. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/ S0104-12902016153295 3. Bloom G, Henson S, Peters DH. Innovation in regulation of rapidly changing health markets. Globalization and Health [Internet]. 2014 [citado 2017 out. 25];10(53):1-11. Doi: https://doi.org/10.1186/1744-8603-10-53 4. Bernardino E, Segui MLH, Lemos MB, Peres AM. Enfermeira de ligação: uma estratégia de integração em rede. Rev. bras. enferm. [Internet]. 2010 [citado 2017 out. 25]; 63(3):459-463. Doi: http://dx.doi. org/10.1590/s0034-71672010000300018 94

5. McNab J, Paterson J, Fernyhough J, Hughes R. Role of the GP liaison nurse in a community health program to improve integration and coordination of services for the chronically ill. Australian Journal of Primary Health [Internet]. 2016 [citado 2017 out. 25]; (22):123 127. Doi: http://dx.doi.org/10.1071/ PY14089 6. Pan American Health Organization (PAHO). World Health Organization. Health care coordinated by APS: building networks of attention in SUS: Contributions to the debate [Internet]. 2011 [citado 2017 out. 25]. Available from: http://iris.paho.org/xmlui/bitstream/handle/123456789/18457/9788579670657_ por.pdf?sequence=1&isallowed=y 7. Cunha KS, Higashi GDC, Erdmann AL, Kahl C, Koerich C, Meirelles BHS. Myocardial revascularization: factors intervening in the reference and counter-reference in Primary Health Care. Rev Esc Enferm USP. [Internet]. 2016 [citado 2017 out. 25];50(6):963-970. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/ S0080-623420160000700013 8. Cunha KS, Erdmann AL, Higashi GDC, Baggio MA, Kahl C, Koerich C, Meirelles BHS, Lanzoni GMM. Myocardial revascularization: unveiling strategies in reference and counter reference in primary health care. Revista Baiana de Enfermagem [Internet] 2016 [citado 2017 out. 25]; 30(1):295-304. Available from: http:/ / dx.doi.org/10.18471/ rbe.v1i1.16039 9. Strauss A, Corbin J. Pesquisa qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2008. 95