Atenção Primária à Saúde em Comunidades Rurais: Impacto sobre o Estado Nutricional

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Anais do 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária Belo Horizonte 12 a 15 de setembro de 2004 Atenção Primária à Saúde em Comunidades Rurais: Impacto sobre o Estado Nutricional Área Temática de Saúde Resumo O estado nutricional na infância é influenciado pelas condições socioeconômicas, características familiares, condições de habitação e cuidados à saúde. Objetivo: Avaliar o estado nutricional, condições socioeconômicas, prevalência de anemia e parasitoses intestinais bem como o hábito alimentar de crianças residentes em uma comunidade rural do município de Viçosa-MG e verificar o impacto de intervenções no contexto da atenção primária à saúde sobre o estado nutricional. Foram estudadas 36 crianças com idade entre 1 a 12 anos, submetidas à avaliação antropométrica, exame bioquímico e parasitológico. Aplicaram-se inquéritos de freqüência alimentar e socioeconômico. Foram feitas orientações nutricionais e para a saúde, tratamento medicamentoso e avaliação do impacto destas ações sobre o estado nutricional.resultados: 54,3% apresentaram déficit nutricional para o índice P/I, 37,1% para E/I e 31,4% para P/E; 75,7% das crianças encontravam-se parasitadas e 16,7% anêmicas. Das crianças estudadas, 74,3% possuíam renda familiar < 1 salário e apenas 2,9% tinham mães com 1º grau completo. Após intervenção, as médias em escore-z para E/I, P/I e P/E evoluíram significativamente (p=0,002; p < 0,001; p=0,018 respectivamente).conclusões: Ressalta-se a importância de atenção contínua a esta população e implementação de políticas municipais voltadas para comunidades de zona rural. Autores Mirelle Lomar Viana - estudante de Nutrição. Rosana das Graças Carvalho dos Santos - estudante de Nutrição. Raquel Maria Amaral Araújo Professora do Departamento de Nutrição e Saúde Úrsula Máffia - Nutricionista da Secretaria de Ação Social/Prefeitura Municipal de Viçosa Sylvia do Carmo Castro Franceschini Professora do Departamento de Nutrição e Saúde. Instituição Universidade Federal de Viçosa - UFV Palavras-chave: estado nutricional; condições de saúde; intervenção Introdução e objetivo O diagnóstico e o acompanhamento das condições nutricionais de crianças constituem formas práticas e sensíveis de avaliar, simultaneamente, condições e tendências da saúde infantil e o grau com que vêm sendo atendidos os direitos humanos elementares da população (Buvinich,1998). A avaliação nutricional possibilita determinar a magnitude, o comportamento e os determinantes dos agravos nutricionais, permitindo a identificação de grupos de risco e subsidiando medidas de intervenção. A antropometria é um recurso amplamente aplicado para avaliar o estado nutricional, principalmente em crianças, por ser um dos recursos mais sensíveis, rápido, barato e não invasivo, estabelecendo ainda uma estimativa da prevalência e intensidade das alterações nutricionais (Accioly et al, 2003; World Health Organization, 1986). Segundo Tanner, crianças residentes em áreas rurais são freqüentemente menores e possuem ritmo de crescimento mais lento, devido a fatores como a maior precariedade de

acesso aos serviços de saúde e educação; consumo irregular de alimentos, assim como maior gasto energético nas atividades diárias quando comparadas às residentes no setor urbano. A desnutrição pode ter como fatores predisponentes o baixo nível socioeconômico, fatores ligados às características familiares, baixa escolaridade dos pais, saneamento básico inadequado ou ausente e más condições ambientais, que se associam a repetidos processos mórbidos, dentre os quais se destacam a anemia e parasitoses intestinais devido a natureza crônica destes, que podem atuar ocasionando ou agravando a desnutrição preexistente (Fernandes et al, 1998). Em áreas rurais, principalmente as mais afastadas dos centros urbanos e de baixa renda, a presença de cobertura de saneamento e o acesso a serviços básicos de saúde são aspectos importantes no que diz respeito à determinação das condições de saúde da população. Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi avaliar o estado nutricional, condições socioeconômicas, prevalência de anemia e parasitoses intestinais, bem como o hábito alimentar de crianças residentes em uma comunidade rural do município de Viçosa-MG e proceder à reavaliação do estado nutricional, após intervenções com o intuito de controle e prevenção de carências nutricionais no contexto da atenção primária à saúde. Metodologia Trata-se de um estudo longitudinal realizado com um grupo de 36 crianças, com idade entre 1 a 12 anos, recém cadastradas no Programa Leite de Soja da Prefeitura Municipal de Viçosa MG (o qual tem como objetivo a distribuição do produto a crianças carentes do município) e residentes em Pau-de-Cedro, uma comunidade rural do município. Do total da amostra, três crianças não participaram de todas as avaliações por terem se recusado ou por não se encontrarem em suas residências nos dias em que foram realizados os exames. Pau-de-Cedro localiza-se a dezoito quilômetros do município de Viçosa. A atividade econômica predominante é a agricultura de subsistência e observa-se um grande número de aposentados e pensionistas na população. A comunidade não conta com serviço de saúde local e quanto ao saneamento ambiental, não possui rede de esgoto, água encanada, sistema de coleta de lixo e ruas pavimentadas, o que dificulta o acesso ao local principalmente em épocas de chuva. Ressaltam-se ainda as inadequadas condições de moradia as quais a população está submetida, sendo a maioria das casas da comunidade de pau-a-pique e chão batido. Para coleta de dados foram feitas visitas domiciliares que contaram com o acompanhamento de um agente comunitário que realizava trabalho voluntário no local, o que facilitou a comunicação e o contato entre os pesquisadores e os pais ou responsáveis pelas crianças. Mediante ao consentimento dos responsáveis pelas crianças, foi realizada avaliação antropométrica, exame bioquímico e parasitológico (com coleta de sangue e fezes) e aplicados inquérito de freqüência alimentar e questionário socioeconômico. As medidas antropométricas foram coletadas nos domicílios e foram aferidos peso e altura de cada criança, segundo técnica recomendada por Jelliffe. O peso foi obtido em balança digital, eletrônica, com capacidade máxima de 150 quilos e precisão de 100 gramas. Na medida estatural das crianças de diferentes faixas etárias foram utilizados: - Infantômetro para medida de crianças menores de 24 meses; - Estadiômetro de 2 metros de comprimento para medida de crianças com 24 meses ou mais. Os dados antropométricos foram avaliados e classificados considerando o escore-z abaixo de -1 desvio padrão de afastamento da mediana da população de referência do NCHS (National Center For Health Statistics, 1977) para déficit de peso para idade, estatura para idade e de peso para estatura (World Health Organization, 1986).

Os questionários socioeconômicos e inquéritos de freqüência alimentar realizados com os responsáveis pela criança. através de visita domiciliar, foram aplicados com objetivo de caracterizar a população estudada quanto às condições de vida e ingestão alimentar, respectivamente. Pretendeu-se no questionário socioeconômico e de condições de saúde e saneamento, a obtenção de informações referentes à identificação, data de nascimento, renda familiar, escolaridade dos pais, tratamento da água e procedência, assim como a dos alimentos, e a presença ou não de energia elétrica e equipamentos domésticos como fogão à gás, geladeira, televisão e rádio. No inquérito de freqüência alimentar, obtiveram-se informações quanto à freqüência de ingestão de frutas, legumes e verduras, cereais e derivados, leguminosas, doces, carnes, ovos e leite. Após a avaliação dos dados obtidos na avaliação antropométrica, questionário socioeconômico e inquérito de freqüência alimentar, os pais foram informados a respeito do estado nutricional das crianças e foram trabalhadas estratégias (quando pertinente) para propiciar melhorias no hábito alimentar de acordo com as condições locais. Como foi observado que todas as famílias utilizavam o quintal para plantação, enfatizou-se a importância de consumir os alimentos plantados e elaborá-los de formas diferenciadas visando uma maior aceitação pelas crianças e menor perda de nutrientes. O sangue foi coletado por punção venosa para realização do eritrograma e a dosagem de hemoglobina analisada segundo método da cianometahemoglobina. Para diagnóstico de anemia, foram utilizados como pontos de corte valores preconizados pela Who, sendo considerada anemia, hemoglobina abaixo de 11 g/dl para crianças menores de 6 anos de idade e abaixo de 12 g/dl para crianças com idade entre 6 e 12 anos de idade (World Health Organization, 1986). Para realização do exame parasitológico, foram entregues ao responsável pela criança frascos plásticos identificados com os respectivos nomes e contendo substância conservante (MIF: mercúrio + iodo + formol). Os frascos foram recolhidos 1 a 2 dias após a sua distribuição e analisados em seguida pelos métodos de Hoffman, Faust e Ritchie. Os eritrogramas e os exames parasitológicos foram analisados no laboratório do Posto de Saúde do município de Viçosa. Em caso de exame parasitológico positivo e/ou diagnóstico de anemia, as crianças foram tratadas com vermífugo e/ou sulfato ferroso. Durante a distribuição dos medicamentos, foram dadas orientações orais ou escritas (em casos de mães alfabetizadas) quanto à sua administração e foi realizado um trabalho educativo domiciliar, envolvendo as crianças e os responsáveis, focado nos principais hábitos nocivos observados na comunidade, como higiene pessoal e ambiental precárias e hábitos alimentares incorretos, quando encontrados. Estas informações foram reforçadas oportunamente, no decorrer do período em que estava sendo realizada a pesquisa. Passados quatro meses da intervenção, as crianças foram novamente avaliadas antropometricamente, utilizando os mesmos métodos e parâmetros da avaliação anterior a fim de determinar se a intervenção refletiu de forma positiva no estado nutricional destas. Os dados obtidos foram armazenados em banco de dados no programa Epi-Info versão 6.04, onde foram posteriormente analisados. Para comparação dos índices antropométricos antes e após intervenção, foi realizado teste-t pareado no programa Sigmastat versão 2.03. Resultados e discussão A amostra foi composta por 36 crianças, sendo 47,2% do sexo feminino e 52,8% do sexo masculino. Com relação à renda, observou-se que 74,3% das crianças possuíam renda familiar igual ou inferior a 1 salário mínimo, 20% entre 1 e 2 salários e 5,7% maior ou igual a 2 salários mínimos. Destaca-se que a pesquisa foi realizada no ano de 2003 sendo neste período, 1 salário mínimo correspondente ao valor de R$ 240,00. No que diz respeito à

presença de equipamentos domésticos, verificou-se que 40% da população possuíam fogão a gás, 14,3% geladeira, 48,6% televisão e 62,9% tinha rádio em sua residência. Os dados de renda e equipamentos domésticos revelam o baixo poder aquisitivo da população. Quanto à escolaridade materna, 82,9% das crianças tinham mães que cursaram até a 4ª série do ensino fundamental, 11,4% não tiveram nenhum estudo e apenas 2,9% cursaram o primeiro grau completo. Visto que um maior nível educacional se relaciona diretamente com uma maior compreensão da etiologia das doenças infantis, eficiência nos cuidados higiênicos com a criança e melhor utilização dos serviços públicos de saúde (LEI, 1994), destaca-se a importância de atenção à comunidade a partir da veiculação de informações, o que inclui de maneira essencial, a implementação de programas educacionais. A maior parte da população (54,3%) residia em domicílios compostos por seis ou mais moradores. Nenhuma das residências possuía água encanada, sendo o recurso hídrico proveniente de poços ou minas e 45,3% das crianças residiam em casas nas quais a água não era submetida a nenhum tratamento prévio ao consumo, ou seja, a água não passava por processos de filtração ou fervura. Em todas as casas visitadas, observou-se que a maior parte dos alimentos consumidos era proveniente da agricultura de subsistência. Os dados referentes à distribuição socioeconômica da população encontram-se na Tabela 1. Tabela 1- Aspectos socioeconômicos das crianças estudadas na comunidade rural de Pau-de-Cedro; município de Viçosa-MG Variáveis N % Renda 1 salário mínimo 26 74,3 1>salário mínimo 2 7 20 2 salários mínimos 2 5,7 Escolaridade Materna Sem estudo 4 11,4 Até a 4ª série 29 82,9 5ª a 8ª série 1 2,9 1º grau completo 1 2,9 Nº de moradores/residência 1-5 moradores 16 45,8 6-14 19 54,3 Luz elétrica Sim 26 74,3 Não 9 25,7 Equipamentos domésticos Fogão à gás 14 40 Geladeira 5 14,3 Televisão 17 48,6 Rádio 22 62,9 Proveniência da água Mina 24 68,6 Poço 11 31,4 Tratamento da água Nenhum 16 45,7 Filtrada 18 51,4 Fervida 1 2,9

Amostra- n=35 Salário mínimo em 2003= R$ 240,00 O exame parasitológico demonstrou que 75,7% das crianças apresentaram algum tipo de verminose, sendo que a maioria (60%) estava infectada por um parasita, 24% por dois, 8% por três e 4% estavam infectadas por quatro ou cinco parasitas. Os parasitas encontrados e suas freqüências na população estão apresentados na Tabela 2. Tabela 2- Tipo e freqüência de parasitoses intestinais nas crianças estudadas na comunidade rural de Pau-de-Cedro; município de Viçosa-MG Parasita Nº % Ascaris lumbricoides 13 39,4 Entamoeba coli 9 27,3 Giardia lamblia 5 15,2 Entamoeba histolytica 5 15,2 Ancylostoma duodenale 4 12,1 Trichuris trichiura 4 12,1 Strongyloides stercoralis 2 6,1 As enteroparasitoses constituem-se em importantes indicadores das condições de saneamento de uma população. Pode-se classificar as parasitoses encontradas em dois grupos: transmitidas pela água ou alimento ou por penetração de larvas. No primeiro grupo encontram-se o Ascaris lumbricoides, Entamoeba histolytica, Trichuris trichiura e Giardia lamblia. No segundo grupo estão o Ancylostoma duodenale e Strongyloides stercoralis. O alto índice de enteroparasitoses encontrado reflete as precárias condições de higiene ambiental e pessoal observados na população estudada. Embora tenha sido encontrada alta freqüência de parasitas transmitidos pela água, não houve associação estatisticamente significante entre a presença de tratamento da água consumida e parasitoses intestinais na população em estudo, o que pode ter ocorrido pela inexistência de rede pública de canalização da água, ou seja, independentemente do tratamento domiciliar dado à água (filtração ou fervura) todos consomem água de fonte não confiável, que neste caso é proveniente de poços ou mina. Foi detectada prevalência de anemia abaixo da esperada (16,7%), uma vez que foi observada alta presença de parasitas que causam espoliação sanguínea (Ancylostoma duodenale e Strongyloides stercoralis). É conhecido que a ocorrência de anemia é bem mais acentuada em crianças com idade entre 6-24 meses, portanto o resultado encontrado pode ser devido ao fato de que apenas 11,4% das crianças estudadas se encontravam nesta faixa etária considerada de maior risco. Não foi encontrada associação estatisticamente significante entre anemia e parasitoses intestinais. Quanto ao hábito alimentar, observou-se na comunidade um alto consumo de frutas e vegetais sendo que dentre as frutas, as mais consumidas foram a banana, laranja, goiaba e mexerica e dentre os vegetais batata, almeirão, lobrobô, chuchu, tomate, alface e mandioca. Embora o arroz e o feijão sejam alimentos presentes e comuns no hábito alimentar da população brasileira, parte da população estudada não apresentou consumo diário destes alimentos, sendo o arroz consumido diariamente por 72,2% das crianças e o feijão por 97,2% destas. O leite foi consumido com freqüência diária ou de 4 a 6 vezes na semana por 69,4% das crianças. O maior consumo de carne encontrado, apresentou uma freqüência de 2 vezes

por semana sendo este observado em 44,4% da população e 33,3% desta tinha consumo de uma vez por mês ou ausência de consumo deste alimento. O consumo de ovos foi encontrado em igual freqüência em 47,7% da população. O angu foi um alimento bastante freqüente nos hábitos da população sendo consumido diariamente por 91,7% das crianças. Foi observada uma baixa freqüência de consumo de doces, com grande parte das crianças (86,1%) com ingestão correspondente a uma vez por mês ou raramente. Em uma população com boas condições de saúde e nutrição, espera-se encontrar aproximadamente 15,9% das crianças em risco nutricional (valores de escore-z menores do que -1) (World Health Organization, 1986). Na avaliação do estado nutricional da população em estudo, 54,3% das crianças apresentaram déficit nutricional para o índice peso/ idade, 37,1% para o índice estatura/ idade e 31,4% para o índice peso/ estatura no momento da primeira avaliação. O valor encontrado para o índice peso/ idade indica uma alta freqüência de crianças com déficit ponderal, mostrando comprometimento do peso no passado e/ou atual. A inadequação do índice peso/ estatura revela uma perda de peso aguda. Períodos prolongados de ganho insuficiente de peso na infância podem levar a atrasos no crescimento, detectados por inadequação no índice de estatura/ idade. Segundo Victora, o déficit de estatura está associado de forma predominante às condições socioeconômicas, como trabalho e escolaridade dos pais e, possivelmente, à deficiência crônica de micronutrientes; de outro modo, o déficit ponderal reflete em maior grau as condições vividas no momento, como a ocorrência de doenças. Na população em estudo, encontrou-se associação estatisticamente significante (p=0,025) entre déficit nutricional para o índice peso/ idade e baixa renda (renda familiar menor ou igual a 1 salário mínimo). Tal associação era esperada visto que a renda é o determinante mais importante da condição nutricional da criança. Observou-se também, associação significante (p=0,03) entre déficit de peso/ estatura e baixa escolaridade materna (mães que estudaram até a 4ª série do ensino fundamental). As variáveis número de moradores por residência, parasitose e anemia não se relacionaram significativamente com nenhum dos índices antropométricos. Após intervenção, por meio de orientações dadas às mães ou responsáveis pela criança e tratamento medicamentoso em caso de anemia e/ou parasitose, pôde-se observar uma melhora significativa no estado nutricional das crianças, como mostrado na tabela 3. O resultado encontrado reforça a importância da atenção primária e secundária como forma de promover a saúde em populações que vivem em condições de pobreza. Tabela 3 Evolução do estado nutricional considerando os índices peso/ idade, peso/ estatura e estatura/ idade Indicador 1ª avaliação (X ± DP) 2ª avaliação (X ± DP) p Peso/ Idade (P/I) 1,09 ± 0,90 0,73 ± 0,90 < 0,001 Peso/ Estatura (P/E) 0,68 ± 0,85 0,40 ± 0,82 0,018 Estatura/ Idade (E/I) 0,82 ± 0,96 0,67 ± 0,95 0,002 DP= desvio-padrão; x= média Conclusões A partir do reconhecimento da importante influência que as condições de vida exercem sobre o crescimento é que os organismos internacionais de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), e nacionais, como o Ministério da Saúde (MS) e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), preconizam o acompanhamento do crescimento como atividade de rotina na atenção à criança (World Health Organization, 1986). Diante dos resultados obtidos neste estudo, verifica-se a importância de programas contínuos de suplementação alimentar voltados à população de baixa renda, com o intuito de

melhorar o estado nutricional de crianças. No entanto, após o cadastramento das famílias, o Programa Leite de Soja funcionou por aproximadamente quatro meses, e assim mesmo de forma irregular sendo após este período, suspenso por tempo indeterminado. Este perfil reflete os problemas inerentes aos programas de suplementação alimentar no Brasil. Outro aspecto a ser observado diz respeito à erradicação das parasitoses intestinais, que foram encontradas em alta prevalência nesta população. Esta ação envolve medidas a longo prazo, como programas de orientação educacional e otimização das condições de saneamento básico. Destaca-se a importância de atenção contínua a esta população e a necessidade de redefinição e implementação de políticas municipais na área de nutrição voltadas para comunidades rurais, além de políticas públicas com o objetivo de promover melhoria das condições sanitárias do local. Referências bibliográficas ACCIOLY, E., SAUNDERS, C., LACERDA, E. M. A., Nutrição em Obstetrícia e Pediatria. Editora Cultura Médica Ltda Rio de Janeiro/RJ, 12:257-273; 2:43-70, 2003. BUVINICH, M. R.. A infância brasileira nos anos 90. In: MONTEIRO, C. A (org.). Panorama Nutricional. Brasília: Fundo das Nações Unidas para a Infância, 1998, p. 83-96. FERNANDES, C. M. et al. Atenção Primária e Secundária aos Desnutridos. R. Un. Alfenas, Alfenas, 4:149-153, 1998. JELLIFFE, D. B. Evaluación del Estado de Nutrición de la Comunidad. Genebra: OMS, 1968. LEI, D. L. M. Retardo do crescimento na idade pré-escolar: fatores socioeconômicos, associação com o estado nutricional na idade escolar e prognóstico do aproveitamento discente no Município de Osasco. São Paulo, 1994. Dissertação (Doutorado), Faculdade de Saúde Pública da USP, 1994. NATIONAL CENTER FOR HEALTH STATISTICS. NCHS growth curves for children, birth-18 years. Vital Health Statistics, 11:1-74, 1977. OMS (Organización Mundial de la Salud). Lucha Contra la Anemia Nutricional Especialmente Contra la Carencia de Hierro. Genebra: OMS (Serie de Informes Técnicos, 580), 1975 TANNER, J. M. Foetus into man: physical growth from conception to maturity. Massachusetts: Havard University Press, 1978, 250p. VICTORA, C. G. The association between wasting and stunting: An international perspective. Journal of Nutrition, 122:1105-1110, 1992. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Use and interpretation of anthropometric indicators of nutritional status. Bulletin of World Health Organization. Geneva, n.64, p.929-941, 1986.