A PSICOLOGIA E O SINTOMA DA DEGRADAÇÃO AMBIENTAL NAS CIDADES Silva. M. C, (Dra. Professora do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia CEFET-PR/PPGTE e doutora pela FAU-USP) Magnabosco, M. (Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia CEFET-PR/PPGTE) Resumo O artigo propõe trazer para discussão o tema meio ambiente e justiça social por meio de contribuições provenientes da ciência urbanística e da psicologia. Esse estudo epistemológico acontece para refletir sobre o sintoma da degradação ambiental, como ele se apresenta no meio social e como avançar para aumentar a compreensão do significado de domínio do homem sobre a natureza. Como dar um passo para modificar as propostas discursivas de tratar o meio ambiente, que não se restrinjam ao público do sistema educativo? E como ficam os discursos para outros grupos sociais? O poder público pode marcar os significantes da natureza e possibilitar caminhos para a interiorização dos seus valores. Neste sentido, o urbanismo vai trabalhar com estas idéias de preservação da natureza ordenada. O homem urbano, que adota esta forma de pensar e de se comportar, insere, no seu cotidiano, tantas atividades que os ciclos da natureza acontecem sem que ele perceba. Podemos indagar se este sintoma expõe um quadro de degradação ambiental. O sintoma, termo apropriado pela medicina, significa aquilo que é passível de observação. Se pudermos representar a natureza como um paciente aflito que apresenta sintomas doentios manifestos por mudanças ou deformações na sua paisagem, bem como um mau funcionamento de seus ecossistemas, deduzimos que ela está precisando de um diagnóstico e de um tratamento. Isto vem sendo apresentado pela mídia de forma conflitante, em que duas ações diferenciadas interagem: um incentivo ao consumo de bens, promovido pelas empresas, e um consumo moderado por parte de instituições governamentais. milton.magnabosco@caixa.gov.br 1 Introdução A realidade social brasileira estudo o indivíduo nas relações sociais representações sociais e subjetividade Como o indivíduo, dentro do meio ambiente urbano se comporta diante da natureza e do consumo Como o grupo de indivíduos representam o meio ambiente urbano espaço de consumo de lazer de trabalho e constrói a visão de cidade A cidade é um ambiente que pede respeito Dominar a natureza é um problema enquanto representação simbólica domínio relacionada ao poder. Visão equivocada da relação homem natureza baseada na necessidade de domínio. A sobrevivência parece reger a questão do domínio. Precisa dominar se não ela pode destruir. Nós não a compreendamos e por isso
queremos dominá-la. Como dar um passo para modificar as propostas discursivas de tratar o meio ambiente que não se restrinjam ao público sistema educativo? E os discursos para outros grupos sociais? O poder público pode marcar os significantes da natureza e possibilitar caminhos para a interiorização dos seus valores. Neste sentido, o urbanismo vai trabalhar com estas idéias de preservação da natureza ordenada, disciplinada e iluminista. 2 Meio Ambiente e Justiça Social nas cidades As pesquisas relacionadas ao meio ambiente mobilizam atores de diversas áreas do conhecimento e operam com estratégias de justiça social. A inclusão e a exclusão do cidadão na sociedade concorrem para modificar a qualidade de sobrevivência dele e das pessoas com quem ele se relaciona. Todavia, estas condições têm sofrido mudanças com a entrada dos multifacetados tipos de ação social e econômica sobre o meio ambiente e das novas tecnologias de transporte e comunicação. A participação de atores públicos na promoção de benfeitorias está identificada com negociações de regras que incentivam uma reestruturação da competição econômica relacionada à prática de produção que favorece a elite de negócios. O uso social da natureza ainda instaura controvérsias e tem efeitos perversos quando a natureza é tratada como um capital natural inesgotável. Há uma inversão de valores que prioriza o capital. O espaço urbano insere-se no meio ambiente, e ali a política espacial está ajustada aos padrões de acumulação. Esta constatação é relevante para ampliar o conceito de meio ambiente urbano destacando a importância de se pensar uma ciência interdisciplinar. Talvez identificá-lo como noção (e não como conceito) seja mais prudente, pois é prematuro dizer que existem discussões aprofundadas nessas áreas afins das ciências. Por um lado, o meio ambiente urbano favorece a solidariedade entre agentes públicos e privados seduzidos pelo uso intensivo da terra e captura de riquezas. Por outro lado, as políticas públicas detêm o poder de criar um largo espectro de diferentes práticas para introduzir um controle de intervenção e de transformação da sociedade com perspectivas de resultados mais imediatos para o atual padrão de vida urbana. No entanto, o uso diferenciado de instrumentos de regulação e de intervenção do poder local para orientar e aperfeiçoar as múltiplas dimensões da questão urbana passa por discursos que deixam de contemplar as desigualdades sociais. As administrações públicas ora assumem e ora se abstêm de intervir ou regular os diversos âmbitos da vida social, dependendo das necessidades de acumulação. Isto fica evidente no manejo do espaço urbano. Mas este tipo de ação termina por acarretar prejuízos no meio ambiente urbano. As instituições públicas interferem diretamente na produção do espaço urbano por meio do planejamento da ordem territorial. Mas, também existem importantes períodos de omissão em que o Estado deixa sob a responsabilidade de outros agentes a condução da produção do espaço urbano. Estes momentos históricos de aparente omissão, entretanto, não significam necessariamente uma perda de controle por
parte do governo, mas pode vir a funcionar como uma estratégia para determinada conjuntura. 2 O meio ambiente urbano e a natureza Pelo fato do homem viver em centros urbanos cria-se uma aparente distância entre a realidade dos problemas ambientais e os ambientes construídos. A natureza parece se revelar na cidade pelos prognósticos dos céus: um temporal que venha a causar problemas de locomoção para os habitantes, desmoronamento de morros destruindo residências, e também quando a televisão noticia desastres ecológicos sensibilizadores a ponto do assunto se tornar motivo de comentários. A água, que escorre limpa pelas torneiras, passa por uma estação de tratamento, porém não se questiona a sua procedência. O mesmo acontece com os alimentos expostos em lojas, mercearias, supermercados que mesmo sendo produzidos em outros lugares do planeta, são consumidos sem estranheza. A noção das origem se perde na labuta diária, pois existe um pensamento seguro de que tanto a água como os alimentos podem ser comprados amanhã, em algum lugar. A história revela que o homem vive neste momento incertezas quanto a sua subsistência, e das gerações futuras, no planeta. Nos últimos tempos, a felicidade do homem se apresenta tão próxima com as conquistas científicas e tecnológicas, com a longevidade prolongada pelas pesquisas médicas, e com o prazer incessante e contínuo que a mídia e a indústria do entretenimento oferta. Todavia, os fatos deixam transparecer que ela está no limite. 3.2 As origens dos sintomas da degradação ambiental Este homem urbano que adota esta forma de pensar e de se comportar insere no seu cotidiano tantas atividades que os ciclos da natureza acontecem sem que ele perceba. Podemos indagar se este sintoma expõe um quadro de degradação ambiental? O sintoma, termo apropriado pela medicina, significa aquilo que é passível de observação. Ele permite que o médico delineie um perfil diagnosticável através do relato do paciente. Se pudermos representar a natureza como aquele paciente aflito que apresenta sintomas doentios manifestos por mudanças ou deformações na sua paisagem, bem como um mau funcionamento de seus ecossistemas, deduzimos que ela está precisando de um tratamento médico para estabelecer um diagnóstico e uma forma de tratamento. A psicanálise toma emprestado da medicina esta significação do sintoma, e aprofunda seu significado na medida que descobre que o próprio discurso do paciente é uma defesa construída pelo ego que esconde um desejo velado na fala, porém passível de ser detectado por um ouvido atento e por um método aplicável. Freud explicou que este é um desejo recalcado que tem origem no processo civilizatório, o qual provém de uma satisfação sexual recalcada. O reprimir constante de infinitas solicitações de satisfação levam à construção de um
sintoma. Agora parece plausível formular a seguinte proposição: quando uma tendência instintiva experimenta a repressão, seus elementos libidinais são transformados em sintomas e seus componentes agressivos em sentimento de culpa (FREUD, 1974b, p.163). Um homem só vale para o Estado pelo seu consumo. Rousseau Tanto o sintoma da medicina quanto o sintoma psíquico anunciam dores. A dor mental, regulada pela intensidade da repressão, é um indicativo de um mau funcionamento ou de uma má adaptação do sujeito a algo, o que faz com que ele sofra; Podemos muito bem denominar de inibição a uma restrição normal de uma função. Um sintoma, por outro lado, realmente denota a presença de algum processo patológico. Assim, uma inibição pode ser também um sintoma (FREUD, 1974a, p.107). O homem é um ser social e construiu regras para viver em sociedade, as quais funcionam como limitadoras de seu próprio desejo. E é neste processo de construção do social que a sua própria satisfação sofreu os cortes mais drásticos. Os processos de recalque, ao sublimar as pulsões, faz delas energia que se desvia para a construção de tudo o que nos cerca, aquilo que hoje chamamos de civilização e que nos identifica. É uma busca constante da verdade, e a psicanálise dirige todo seu trabalho para que o sujeito possa defrontar-se com as verdades da vida e que é deste enfrentamento que novos saberes podem surgir. O projeto cientifico da modernidade abre uma nova via à aventura do conhecimento a partir da constituição do sujeito e da ciência que, diante da certeza de seu pensamento, tenta construir um conhecimento objetivo, livre de todo traço de subjetividade e emotividade, para alcançar a verdade, a identidade do conhecimento com o real (LEEF, 2001, p. 188). 5 Relações conflituosas entre o homem e a natureza Da mesma forma que a criança, num impulso sádico de autodefesa, destrói na sua fantasia os bebês que estão por nascer no interior da mãe, o homem tem destruído a natureza. Pode-se atribuir aos seus atos algumas inferências que vão desde o seu desconhecimento, passando pela fantasia, pelo uso de uma ciência supostamente poderosa, pela sua capacidade de dominá-la, subjugá-la, despojála, alijá-la, até mesmo pela sua vontade de aniquilar o poder destruidor e ameaçador da natureza. O homem adentra nos seus segredos esquecendo que para preservar-se é preciso preservar o meio que o sustém.... o progresso da ciência, empurrado pelo impulso de saber e por sua vontade de controlar e dominar o real, provocou a destruição da natureza, exilando-a de sua terra natal, acelerando a morte entrópica do planeta, subjugando as culturas forjadoras de sentido e desconhecendo em sua passagem seus saberes. A objetividade da ciência deixou que lhe escorresse o real que hoje fala em nome da
natureza violada, denunciando o poder dominador do conhecimento científico (LEEF, 2001, p.189). A ciência conquista terrenos selvagens e domina os recursos da natureza, numa espoliação desmedida, com uma produção e consumo massivos de produtos poluentes e inutilidades em nome de uma satisfação egóica que procura dar conta de um desejo que o homem não tem sabido avaliar e mensurar suas conseqüências. Muitas vezes, os discursos midiáticos induzem ao consumo demasiado e à aquisição de bens independente da necessidade e do querer. As cidades estão cheias de lojas e vitrines que atraem consumidores desenfreados O saber psicanalítico da relação do sujeito com o seu sintoma e a forma como ele pode ser entendido e eclipsado no discurso de quem sofre, pode ser usado na construção de um saber ambiental. Os temas da degradação ambiental e da justiça social no meio ambiente urbano perpassam pela idéia de que o ambiente começa no ser humano, e o descuido, maltrato, a destruição fragilizam e provocam uma disfunção provinda do descaso com o sintoma da natureza e a natureza do sintoma. REFERÊNCIAS FREUD, Sigmund. Inibição, Sintoma e Angústia. Vol XX Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Editora Imago, Rio de Janeiro, RJ, 1974. (a) FREUD, Sigmund. O Mal Estar na Civilização. Vol XXI da Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Editora Imago, Rio de Janeiro, RJ, 1974. (b) LEEF, Henrique. Saber Ambiental: Sustentabilidade, Racionalidade, Complexidade, Poder. Editora Vozes. Petrópolis, RJ. 2001.