INFLUÊNCIA DO TREINAMENTO INTERVALADO DE ALTA INTENSIDADE SOBRE A PRESSÃO ARTERIAL DE PACIENTES COM DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA Filipe Arthur da Fonsêca BARROS Pós-graduado pelo IDE em Bases Teóricas para Avaliação e Prescrição do Exercício Físico RESUMO Objetivo: Verificar por meio de uma revisão sistemática os estudos que compararam a eficácia do treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) frente ao treinamento contínuo de moderada intensidade (MICE) sobre as repostas hemodinâmicas de pacientes com doença arterial coronariana (DAC). Metodologia : Trata-se de uma revisão sistemática que reuniu informações de um conjunto de artigos originais publicados nas bases de dados eletrônicas: Medline/Pubmed e Web of Science. Resultados : Sete estudos que analisaram um total de 200 pacientes com DAC foram analisados. O tamanho da amostra nos estudos variou de 15 a 60 pacientes. A duração dos programas de exercícios variou de 6 a com uma freqüência de treinamento de 2 a 3 vezes por semana. Discussão : As conclusões dessa revisão sistemática indicam que na literatura científica ainda não existe um consenso sobre qual o protocolo de treinamento é mais eficaz sobre as variáveis hemodinâmicas em pacientes com DAC, com uma leve tendência aos dois protocolos apresentarem respostas semelhantes. Conclusão: Ainda não existe um consenso sobre o protocolo mais eficaz sobre as variáveis hemodinâmicas em pacientes com DAC, entretanto, o HIIT pode ser uma ferramenta eficaz por demandar um menor tempo na sua execução, tornando mais fácil a adesão ao exercício físico. Abstract Objective : To verify through a systematic review of studies that compared the effectiveness of high-intensity interval training (HIIT) compared to the continuous training of moderate intensity (MICE) on the hemodynamic responses of patients with coronary artery disease (CAD). Methodology : This is a systematic review that gathered information from a number of original articles published in electronic databases: Medline / Pubmed and Web of Science. Results : Seven studies that 4
analyzed a total of 200 patients with CAD were analyzed. The sample size in the study ranged from 15 to 60 patients. The duration of the exercise program varied from 6 to weeks with a frequency of 2 training to 3 times per week. Discussion : The findings of this systematic review indicate that in the literature there is still no consensus on the training protocol is more effective on hemodynamic variables in patients with CAD, with a slight tendency to the two protocols presented similar responses. Conclusion : There is still no consensus on the most effective protocol on hemodynamics in patients with CAD, however, HIIT can be an effective tool for demanding a shorter time in its execution, making compliance easier to exercise. 5
1. INTRODUÇÃO A Doença Arterial Coronariana (DAC) é caracterizada pelo estreitamento das artérias coronárias em decorrência do espessamento endotelial causado pelo acúmulo de placas ateromatosas (PORTO; PORTO, 2005). Os pacientes com DAC apresentam redução significativa na expectativa de vida quando comparado aos indivíduos saudáveis (ROGER et al. 20). Neste sentido, uma maneira de minimizar os efeitos adversos da DAC é por meio do tratamento, o qual envolve um conjunto de intervenções visando a prevenção de doenças secundárias e conseqüente aumento nas taxas de sobrevivência (SMITH et al., 2006). O exercício físico tem se mostrado uma estratégia de intervenção eficaz para redução da mortalidade total e cardiovascular em pacientes com DAC (HERAN et al., 2011), pois induz diversas adaptações relacionadas à saúde (JOLLIFFE et al., 2001). Neste sentido, de acordo com o American College of Sports Medicine (ACSM) a prescrição de exercício para pacientes com DAC deve ser preconizada com exercícios contínuos (caminhada, corrida, ciclismo, natação e remo), com nível de intensidade moderada (40-85% VO2pico) durante 30-60 minutos (FLETCHER et al., 2013; ACSM, 2010). Por outro lado, os protocolos de exercícios intervalados em alta intensidade (HIIT) vêm ganhando considerável atenção pela literatura científica ( CORNISH; BROADBENT; CHEEMA, 2011) como uma prescrição benéfica para esse público (CURRIE et al., 2013). O HIIT consiste em breves explosões intermitentes de exercícios intercalados por períodos de recuperação passiva ou ativa (FOX et al., 1973; WISLOFF et al., 2007; ROGNMO et al., 2004). O baixo volume e a alta intensidade envolvem menos tempo de trabalho do que exercícios contínuos, (HOOD et al 2011; LITTLE et al., 2010), o que pode ser um modelo mais prático para populações clínicas com DAC (CURRIE et al., 2013). Estudos clínicos apontam que quando comparado o treinamento contínuo de moderada intensidade (MICE) com o HIIT em sujeitos com DAC, ambos protocolos de treinamento proporcionaram benefícios sobre as variáveis analisadas (GREMEAUX et al., 2011; CURRIE et al., 2013). Apesar de estudos apontarem 6
diminuição dos valores hemodinâmicos de maneira aguda tardia (>30 minutos) com os protocolos de HIIT (IELLAMO ET AL., 2013; GREMEAUX et al., 2011 ), até o presente momento não há consenso sobre os mecanismos relacionados nesta diminuição. Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo verificar por meio de uma revisão sistemática os estudos que compararam a eficácia do treinamento HIIT frente ao MICE sobre as respostas hemodinâmicas de pacientes com DAC. 2. MÉTODOS Trata-se de uma revisão sistemática que reuniu informações de um conjunto de artigos originais publicados no período de janeiro de 2000 a outubro de 2015 nas bases de dados eletrônicas: Medline/Pubmed e Web of Science que compararam o efeito do treinamento HIIT e contínuo sobre as respostas hemodinâmicas de pacientes com DAC. A seleção dos descritores utilizados na revisão foi efetuada mediante consulta ao MeSH (Medical Subject Headings) e ao DeCS (Descritores em Ciências da Saúde). Utilizando os seguintes termos e descritores, em língua inglesa : High intensity Interval training, HIIT, HIT, Coronary artery disease, Cardiac rehabilitation e Blood pressure, além dos operadores lógicos (booleanos) and e or para as combinações dos termos. Todos os processos de busca, seleção e avaliação dos artigos foram realizados por pares (FA e RP), onde as publicações que preencherem os critérios de inclusão foram analisadas integralmente e independentemente pelos dois pesquisadores e, em seguida, comparadas a fim de verificar a concordância entre os pares. A revisão se deu em dois estágios. No primeiro estágio, os artigos foram incluídos ou excluídos baseados em seus títulos e resumos. No segundo, o texto completo foi acessado e avaliado por relevância. Apenas artigos publicados (ou impressos) em periódicos foram considerados para a revisão. Trabalhos apresentados em conferências e/ou apenas resumos não foram analisados. 7
2.1 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO/ EXCLUSÃO Para a inclusão dos artigos foram abordados os seguintes aspectos: artigos que compararam o HIIT com o exercício contínuo; amostra com faixa etária acima dos 50 anos; estudos longitudinais, randomizados e que analisaram as respostas crônicas; artigos originais e com ano de publicação entre 2000 e 2015. Serão excluídos os estudos de revisão, teses e os artigos duplicados. 3. RESULTADOS Na pesquisa inicial foram identificados 1308 artigos. Após a leitura dos títulos e resumos, restaram 23 para leitura do resumo e texto na íntegra. Destes, 16 não atenderam aos critérios de seleção e foram excluídos do estudo, de tal forma que sete estudos fizeram parte da revisão final. (Fig. 1). Figura 1 - Diagrama da pesquisa e processo de inclusão As características dos estudos incluídos estão listadas na Tabela 1. Os incluídos são originários de diversas regiões do mundo, sendo dois estudos da mesma instituição no Canadá (CURRIE et al., 2013; CURRIE et al., 2015), com dois estudos da Noruega (WISLØFF et al., 2007; ROGNMOA et al., 2004) e Estados 8
Unidos (ANGADI et al., 2014), Itália (IELLAMO et al., 2013) e Áustria (TSCHENTSCHER et al., 2014) completam a lista com um estudo cada. Um total de 200 pacientes com DAC foram analisados. O tamanho da amostra nos estudos variou de 15 a 60 pacientes. A duração dos programas de exercícios variou de 6 a com uma freqüência de treinamento de 2 a 3 vezes por semana. 9
Tabela 1. Características dos estudos incluídos Estudo Amostra Protocolos Duração Principais resultados HIIT MICE HIIT MICE Iellamo et al. (2013) 16H/2M (67.2 ± 6) 15H/3M (68.4 ± 8) 3x/sem. - 4x(4'/3') 75 80%/45-50% 30'-45'- 45-60% da PA durante o dia, sem diferenças entre HIIT e MICE Currie et al. (2013) 11 (62±11) 11 (68±8) 2x/sem - 10'(1'/1') - 80-104%/ 10% 2x/sem - 30'-40'-50 ' - 51-65% HIIT e MICE apresentaram respostas semelhantes sobre a FMD Currie et al. (2015) 10 (63±8) 09 (66±8) 2x/sem - 10'(1'/1') -75-93%/ 10% 2x/sem - 30'-40'-50 '- 51-65% Melhorias semelhantes sobre a aptidão cardiorrespiratóri a Angadi (2014) 8H/1M (69 ±6.1) 4H/2M (71.5 ± _ 11.7) 3x/sem -16'(2'/2') - 80-85%/50% 15-30 -60%-70 % HIIT: PAD; VO2; E; TD Wisløff et al. (2007) 7H/2M (76.5±9) 7H/2M (74.4±) 4x(4'/3') - 90-95%/50-70 % 47' - 70-75% HIIT foi superior ao MICE sobre à reversão da remodelação do VE, capacidade aeróbia, função endotelial, e qualidade de vida. Tschentsc her et al. (2014) 15H/5M (62.1±9. 5) 15H/5M (63.1±10. 9) 4x4'/3x3'- 85-95%/60-70 % 33' - 65-85% 06 HIIT e MICE apresentaram respostas semelhantes Rognmoa et al. (2004) 06H/02 M (62.9 ± 11.2) 08H/01M (61.2 ± 7.3) 4x(4'/3') - 80-90%/50-60 % 41' - 50-60% 10 HIIT superior ao MICE no aumento do VO2pico PA pressão arterial; FMD Dilatação mediada por fluxo; PAD pressão arterial diastólica; E fluxo mitral precoce; TD tempo de desaceleração; VE ventrículo esquerdo. 10
4. DISCUSSÃO As conclusões dessa revisão sistemática indicam não haver consenso na literatura científica sobre qual o protocolo de treinamento é mais eficaz sobre as variáveis hemodinâmicas em pacientes com DAC, com uma leve tendência aos dois protocolos apresentarem respostas semelhantes. Dos sete estudos incluídos nesta revisão, quatro apresentaram respostas semelhantes sobre as variáveis estudadas entre os grupos e em três o HIIT foi superior ao MICE. Esses achados vão de acordo com os estudos de Meyer et al. (2013), no qual houve respostas semelhantes entre os grupos HIIT e MICE e com os achados de Currie et al. (2013), onde houve uma melhora significativa na capacidade cardiorrespiratória em ambos os grupos, também sem diferenças significativas. Já nos estudos de Nechwatal et al. (2002) e Haykowsky et al. (2013), o grupo HIIT apresentou melhores resultados, aparecendo diferenças significativas quando comparado ao grupo MICE. O que vai de acordo com a meta-análise realizada por Elliott et al. (2014), na qual o HIIT foi mais eficaz para a melhoria do VO2 pico e limiar anaeróbio em pacientes com DAC. O objetivo do exercício físico na reabilitação cardíaca é melhorar a aptidão cardiorrespiratória, uma vez que níveis de aptidão física mais baixa estão associados a um risco aumentado de mortalidade em pacientes cardíacos (KAVANAGH et al., 2002). Neste sentido, por envolver menos tempo de trabalho em relação ao MICE (CURRIE et al., 2015), ser uma ferramenta que apresenta baixo risco para pacientes com CAD (WARBURTON et al., 2005) e apresentarem melhoras semelhantes, o HIIT pode ser utilizado como uma ferramenta mais prática para adesão ao exercício do que o MICE (CURRIE, 2015) 5. CONCLUSÃO Ainda não existe consenso sobre o protocolo mais eficaz sobre as variáveis hemodinâmicas em pacientes com DAC, entretanto, o HIIT pode ser uma ferramenta eficaz por demandar um menor tempo na sua execução, tornando mais fácil a adesão ao exercício físico. 11
REFERÊNCIAS American College of Sports Medicine. Resource manual for guidelines for exercise testing and prescription. Wolters Kluwer: Lippincott Williams and Wilkins, Baltimore MD, p. 559 571, 2010. Angadi, S.S. et al. High-intensity interval training vs. moderate-intensity continuous exercise training in heart failure with preserved ejection fraction: a pilot study. J Appl Physiol.,.2014. Cornish, A.K., Broadbent S, Cheema BS. Interval training for patients with coronary artery disease: a systematic review. Eur J Appl Physiol, v. 4, n. 111, p. 579-89, Apr, 2011. Currie, K. D. et al. Low-volume, high-intensity interval training in patients with CAD. Med Sci Sports Exerc, v. 8, n. 45, p. 1436 1442, 2013. Currie, K.D. et al. Effects of resistance training combined with moderate-intensity endurance or low-volume high-intensity interval exercise on cardiovascular risk factors in patients with coronary artery disease. Journal of Science and Medicine in Sport, n.18, p. 637 642, 2015. Currie, K. D. et al. Heart rate recovery and heart rate variability are unchanged in patients with coronary artery disease following weeks of high-intensity interval and moderate-intensity endurance. Appl. Physiol. Nutr. Metab, n. 38, p. 644 650, 2013. Elliott, A.D. et al. Interval Training Versus Continuous Exercise in Patients with Coronary Artery Disease: A Meta-Analysis. Heart, Lung and Circulation, 2014. Fletcher, G.F. et al. Exercise standards for testing and training: A scientific statement from the American Heart Association. Circulation ; n.8, v. 8 p. 873 934, Aug, 2013. Fox, E.L. et al. Intensity and distance of interval training programs and changes in aerobic power. Med Sci Sports, Spring; v. 5, n 1, p. 18-22, 1973 Gremeaux, M. et al. Usefulness of the 6-minute walk test and the 200-metre fast walk test to individualize high intensity interval and continuous exercise training in coronary artery disease patients after acute coronary syndrome: a pilot controlled clinical study. Clinical Rehabilitation, n. 25, v. 9, 2011.
Haykowsky, M. J. et al. Meta-analysis of aerobic interval training on exercise capacity and systolic function in patients with heart failure and reduced ejection fractions. Am J Cardiol, ; n.111, v. 10, p.1466 9, May, 2013. Heran B.S. et al. Exercise-based cardiac rehabilitation for coronary heart disease. Cochrane Database Syst Rev, 2011. Hood, M.S. et al. Low volume interval training improves muscle oxidative capacity in sedentary adults. Med Sci Sports Exerc, n. 43, v. 10, p. 1849 1856, 2011. Iellamo, F. et al. Effect of High-Intensity interval training versus moderate continuous training on 24-h blood pressure profile and insulin resistance in patients with chronic heart failure. Intern Emerg Med, 2013 Jolliffe, J. A. et al. Exercise-based rehabilitation for coronary heart disease. Cochrane Database of Systematic Reviews, 2001. Kavanagh, T. et al. Prediction of long term prognosis in 169 men referred for cardiac rehabilitation. Circulation, n. 106, p. 666-671, 2002. Little, J.P. et al. A practical model of low-volume high-intensity interval training induces mitochondrial biogenesis in human skeletal muscle: potential mechanisms. J. Physiol, n. 588, v. 6, p. 1011 1022, 2010. Meyer, P. et al. High-Intensity Aerobic Interval Exercise in Chronic Heart Failure. Curr Heart Fail Rep, n. 10, p. 130 138, 2013. Nechwatal RM, Duck C, Gruber G. Physical training as interval or continuous training in chronic heart failure for improving functional capacity, hemodynamics and quality of life a controlled study [article in German]. Z Kardiol, n. 91, p. 328-337, 2002. Porto CC; Porto AL. Doença do coração: prevenção e tratamento. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. Roger, V.L., Go, A.S., Lloyd-Jones, D.M., Benjamin, E.J., Berry, J.D., Borden, W.B., et al. 20. Heart disease and stroke statistics 20 update: a report from the American Heart Association. Circulation, 5 (1): e2 e220. doi: 10.1161/CIR.0b013e31823ac046. PMID: 22179539. Rognmo, Ø. et al. High intensity aerobic interval exercise is superior to moderate intensity exercise for increasing aerobic capacity in patients with coronary artery disease. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil, n. 11, v. 3, p. 216-222, 2004. Smith, S.C. et al. AHA/ACC guidelines for secondary prevention for patients with coronary and other atherosclerotic vascular disease, 2006. 13
Tschentscher, M. High-intensity interval training is not superior to other forms of endurance training during cardiac rehabilitation. European Journal of Preventive Cardiology, 2014. Warburton, D. E. et al. Effectiveness of high-intensity interval training for the rehabilitation of patients with coronary artery disease. Am J Cardiol, n. 95, p. 1080 1084, 2005. Wisloff, U. et al. Superior cardiovascular effect of aerobic interval training versus moderate continuous training in heart failure patients: a randomized study. Circulation, n. 115, v. 24, p. 3086-3094, 2007. 14