IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO TRIBUNAL DO JURI NA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL



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Transcrição:

IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO TRIBUNAL DO JURI NA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL Jonas Guedes 1 Resumo: O tema abordado no presente artigo versará sobre a impossibilidade jurídica do Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual, sob a égide do Direito Constitucional e do Direito Penal Militar. Palavras-chave: Constituição Federal. Direito Penal Militar. Tribunal do Júri. Justiça Militar Estadual. Impossibilidade Jurídica. Abstract: The topic of this article will focus on the legal impossibility of the jury in State Military Justice, under the aegis of Constitutional Law and the Military Penal Law. Key-words: Federal Constitution. Military Penal Law. Jury. State Military Justice. Legal impossibility. Sumário: Introdução. 1. Tribunal do Júri. 2. Previsão Constitucional do Tribunal do Júri. 3. Alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996. 4. Alterações da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de Dezembro de 2004. 5. Impossibilidade Jurídica do Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. 6. Conclusão. Referências Bibliográficas. Introdução Este ensaio pretende estudar a impossibilidade jurídica do Tribunal do Júri na Justiça militar Estadual, sob a égide do Direito Constitucional de modo que o estudo da impossibilidade jurídica do Tribunal do Júri na Justiça Militar é assunto

indispensável aos profissionais atuantes na esfera do Direito Penal Militar, para que não haja afronta aos ditames elencados na Constituição Federal e no ordenamento jurídico brasileiro. Para tanto, é profícuo analisar o Tribunal do Júri, seu conceito, sua previsão legal e sua competência, para então analisar as alterações advindas da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996 e da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de Dezembro de 2004, para enfim tratar da impossibilidade jurídica do Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. Problematização: O que é o tribunal do Júri? Qual a previsão legal para sua instituição no ordenamento jurídico brasileiro? Qual a competência do Tribunal do Júri? Qual a competência da Justiça Militar Estadual? Existe previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro para instituir o Tribunal do Júri na Justiça Militar? 1. Tribunal do Júri O Tribunal do Júri, nos dizeres de Julio Fabrini Mirabete, é o mesmo que Tribunal Popular, onde sete juízes leigos, escolhidos dentre os cidadãos com características que lei os assegurar, julgarão determinado crime contra a vida, onde é profícuo ressaltar que esta competência está minimamente garantida pela Constituição Federal, onde Lei Ordinária poderá ampliá-la, entretanto, sendo vedada sua extinção, por o Tribunal do Júri tratar-se de clausula pétrea. O Júri no Brasil, conforme ensina James Tubenchlak, foi introduzido no ordenamento jurídico para limitar a competência do julgamento aos crimes de imprensa, sendo a iniciativa de sua criação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro e a lei promulgada em 18 de junho de 1822, com competência restrita dos delitos de imprensa. Inicialmente, a nomeação desses juízes, vinte e quatro homens bons, honrados, inteligentes e patriotas formariam o conselho de sentença. Ao longo dos anos, o instituto do Tribunal do Júri sofreu diversas modificações, o que não será objeto de estudo no presente trabalho, entretanto, importante destacar que atualmente o instituto do Tribunal do Júri é regulado pelo Decreto- Lei nº 3.689 de 03 de outubro de 1941, que veio instituir o Código de Processo Penal, atualmente vigente. Outro ponto a ser destacado foram as significativas alterações trazidas pela Lei

11.689 de 11 de junho de 2008 que alterou integralmente o procedimento do Tribunal do Júri, com a finalidade de modernizá-lo e torná-lo mais célere e efetivo no julgamento dos crimes dolosos contra a vida, e posteriormente, as alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996 e da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de Dezembro de 2004, ampliando a competência do tribunal do júri quanto aos crimes dolosos contra a vida, praticado contra civil, por militares. 2. Previsão Constitucional do Tribunal do Júri. Outro ponto fundamental no presente trabalho está na análise da previsão constitucional do Tribunal do Júri, onde é profícuo destacar a previsão legal para a instituição do Tribunal do Júri na Justiça Federal e como ele processa com o escopo de analisar de modo comparado a inexistência de previsão legal para a instituição do Tribunal do júri na Justiça Militar do Estado. O Tribunal do Júri está sacramentado no artigo 5º, inciso XXXVIII da Constituição Federal de 1988, que conforme aduzido, trata-se de cláusula pétrea, portanto, sendo vedada sua extinção, onde Lei Ordinária poderá tão somente ampliar sua competência. Cabe ainda ressaltar que, conforme tratado anteriormente, as alterações trazidas pelas Leis 11.689 de 11 de junho de 2008, 9.299 de 07 de Agosto de 1996 e da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de Dezembro de 2004, ampliaram a competência do Tribunal do Júri, entretanto, sem afastar ou alterar a competência da Justiça Comum ao processar e julgar os crimes dolosos contra a vida. A Justiça Federal, diferentemente da Justiça Militar, como será tratado neste estudo, encontra previsão legal no artigo 109, inciso IV da Constituição Federal e no artigo 4º do Decreto-Lei nº 253, de 28 de Fevereiro de 1967, para que seja instalado, onde o Tribunal do Júri Federal atuará em crimes dolosos contra a vida que cause dano a serviço da União. A título de exemplo, caso um funcionário público federal, seja vítima de um crime doloso contra a vida no desempenho de suas funções, o interesse da Administração Pública Federal é evidenciado pelo exercício da atividade estatal no momento do crime. Em suma, o Tribunal do Júri Federal atuará da mesma forma que o Tribunal do Júri Estadual, só que nas hipóteses em que houver interesse da União na resolução do crime doloso contra a vida.

Em decisão de Habeas Corpus nº63.622/pe, o Ministro Oscar Correa esclarece com sabedoria que o Júri Federal atende precisamente à conciliação dos dois textos constitucionais: o julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelo Tribunal do Júri (artigo 153, parágrafo 18, da CF) e a competência da Justiça Federal para processar e julgar os crimes praticados em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas... (art. 125, IV, da CF). 3. Alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996 Destacado o conceito de Tribunal do Júri e sua previsão constitucional, outro ponto fundamental para o estudo do tema proposto no presente artigo é destacar as alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996. Dentre as inúmeras alterações destaca-se a alteração do Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de Outubro de 1969), onde foi acrescido o paragrafo único ao seu artigo 9º, o qual in verbis, dispõe que os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da competência da Justiça Comum, ampliando desta forma a competência do Tribunal do Júri. Tal alteração apresentou-se em inconformidade aos preceitos elencados no texto constitucional, ao suprimir a competência da Justiça Militar, expressa no art. 124 (Justiça Militar Federal) e no 4º do art. 125 (Justiças Militares Estaduais), da Constituição Federal, portanto apresentou flagrante inconstitucionalidade, a qual foi discutida amplamente através de ação direta de inconstitucionalidade, entretanto, tal discussão seria dirimida após a promulgação da Emenda Constitucional nº 45 em 30 de Dezembro de 2004. 4. Alterações da Emenda Constitucional nº 45 em 30 de Dezembro de 2004 Analisado o conceito de Tribunal do Júri e sua previsão constitucional, as alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996, outro ponto fundamental é analisar as alterações da Emenda Constitucional nº 45 em 30 de Dezembro de 2004, para que se possa então delinear a impossibilidade jurídica do tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. Dentre as principais alterações, destaca-se a reforma do Judiciário, onde efetivamente ocorreu uma série de inovações, dentre elas a identificação do Juiz

Auditor da Justiça Militar ao Juiz de Direito da Justiça Comum, selando a isonomia entre os dois cargos, e a alteração do artigo 125, 4º da Constituição Federal. A primeira alteração mencionada, promovendo a isonomia entre os cargos de Juiz Auditor e Juiz de Direito, aliado ao fato de que os crimes militares dolosos contra a vida de civil, perpetrados por militares dos Estados, ainda capitulados como crimes militares, são utilizados como argumento para a instalação do Tribunal do Júri como será tratado adiante. Quanto à alteração do artigo 125, 4º da Constituição Federal, solucionou a discussão quanto à inconstitucionalidade da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996, visto alterar a competência das Justiças Militares do Estado, o qual in verbis dispõe que compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças (grifei). Por tal alteração, em uma situação excepcional trazida pela própria Constituição, o Tribunal do Júri passará a julgar crimes militares dolosos contra a vida de civis, ou seja, ao contrário do que se praticou até o advento da Emenda Constitucional em apreço. Destaca-se ainda, nos dizeres de Cícero Robson Coimbra Neves, que a existência de um Direito Penal especial não clama necessariamente pela instalação de uma Justiça Militar competente para julgar todos os crimes militares perpetrados. Onde, embora os crimes dolosos contra a vida de civil, perpetrados por militares dos Estados, ainda sejam definidos como crimes militares, há que ser observada a competência do Tribunal do Júri elencada na Constituição Federal. 5. Impossibilidade Jurídica do Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual Estabelecido o conceito de Tribunal do Júri e sua previsão constitucional, analisadas as alterações da Lei nº 9.299 de 07 de Agosto de 1996 e da Emenda Constitucional nº 45 em 30 de Dezembro de 2004, é possível através de uma análise conceitual, interpretativa e teleológica estudar a impossibilidade jurídica

do Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. Primeiramente, é profícuo destacar o entendimento do Supremo tribunal Federal: A Justiça Militar não comporta a inclusão, na sua estrutura, de um júri, para o fim de julgar os crimes dolosos contra a vida. CF/67, art. 127; art. 153, 18. CF/88, art. 5º, XXXVIII; art. 124, parágrafo único." (RE 122.706, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 21-11-90, DJ de 3-4-92). Tal entendimento demonstra que, embora após a promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, mesmo promovendo a isonomia entre os cargos de Juiz Auditor e Juiz de Direito, e em conformidade aos dizeres de Paulo Tadeu Rodrigues Rosa, em nenhum momento, o legislador constituinte derivado pretendeu que os crimes dolosos contra a vida praticados pelos militares estaduais fossem processados e julgados perante a Justiça Militar. Conforme aduzido, embora haja a isonomia entre os cargos de Juiz Auditor e Juiz de Direito e embora os crimes dolosos contra a vida de civil, perpetrados por militares dos Estados, ainda sejam definidos como crimes militares, inexiste respaldo legal como se observa no âmbito da Justiça Federal para instalação do tribunal do Júri na justiça Militar Estadual, como se observa em entendimento do Supremo Tribunal Federal: "TRIBUNAL DO JÚRI FEDERAL. DECRETO-LEI N. 253/67. ARTIGOS 215, IV, E 153, PARAGRAFO 18, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O Júri Federal atende precisamente à conciliação dos dois textos constitucionais: o julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelo Tribunal do Júri (artigo 153, parágrafo 18, da CF) e a competência da Justiça Federal para processar e julgar os crimes praticados em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas (art. 125, IV, da CF)." (1ª Turma - HC 63.662/PE - Unânime - publicado no DJ de 14/08/1986). Conforme aduzido, nos casos de deslocamento de processos que digam respeito a crimes dolosos contra a vida, instalar-se-á o procedimento do Júri Federal, previsto no art. 4º do Decreto-Lei nº 253, de 28 de Fevereiro de 1967, que diz: "Art. 4º Nos crimes de competência da Justiça Federal, que devem ser julgados pelo Tribunal do Júri, observar-se-á o disposto na legislação processual, cabendo a sua presidência ao juiz a que competir o processamento da respectiva ação penal.

Vale ainda destacar que o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é que na Justiça Federal Ordinária entende-se constitucional a organização do júri, sob a presidência do juiz federal competente, para o julgamento de crimes dolosos contra a vida, que ratione personae, caem na competência do Judiciário da União. Sendo que tal entendimento não é aplicável as Justiças militares dos Estados tendo em vista a disposição do Artigo 9º, inciso III, alínea d, do Código Penal Militar, casos em que os crimes dolosos contra a vida de militares dos Estados por militares dos Estados como se verifica: "A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de ser constitucional o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de militar em serviço pela justiça castrense, sem a submissão destes crimes ao Tribunal do Júri, nos termos do o art. 9º, inc. III, d, do Código Penal Militar." (HC 91.003, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 22-5-07, DJ de 3-8-07). E nos casos de crimes dolosos contra a vida de militares dos Estados praticados por civis, conforme dispõe o artigo 125, 4º da Constituição Federal, in verbis como se verifica: Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. E conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal: "A Constituição Federal (art. 125, 4º) só outorga competência à Justiça Militar estadual para processar e julgar policiais militares quando se tratar de crime militar definido em lei ( )." (HC 71.926, Rel. Min. Moreira Alves, julgamento em 30-5-95, DJ de 1º-12-95). "A Justiça Militar estadual não dispõe de competência penal para processar e julgar civil que tenha sido denunciado pela prática de crime contra a Polícia Militar do Estado. Qualquer tentativa de submeter os réus civis a procedimentos penais persecutórios instaurados perante órgãos da Justiça Militar estadual representa, no contexto de nosso sistema jurídico, clara violação ao principio constitucional do juiz natural (CF, art. 5º, LIII). A Constituição Federal, ao definir a competência penal da Justiça Militar dos Estados-Membros, delimitou o âmbito de incidência

do seu exercício, impondo, para efeito de sua configuração, o concurso necessário de dois requisitos: um, de ordem objetiva (a prática de crime militar definido em lei) e outro, de índole subjetiva (a qualificação do agente como policial militar ou como bombeiro militar). A competência constitucional da Justiça Militar estadual, portanto, sendo de direito estrito, estende-se, tão-somente, aos integrantes da Policia Militar ou dos Corpos de Bombeiros Militares que hajam cometido delito de natureza militar." (HC 70.604, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 10-5-94, DJ de 1º-7-94). 6. Conclusão Por conta dessa efetiva problemática quanto às esferas de competência da Justiça Militar e do Tribunal do Júri, as recentes alterações da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de dezembro de 2004, promovendo a isonomia dos cargos de Juiz Auditor e Juiz de Direito, assim como a alteração do artigo 125, 4º da Constituição Federal, florescem expectativas quanto à possibilidade de instalação do tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual, entretanto, conforme exposto não há a possibilidade jurídica pela inexistência de previsão no ordenamento jurídico brasileiro para sua instalação como se verifica na Justiça Comum e na Justiça Federal. 7. Referências bibliográficas ASSIS, Jorge César de. Justiça Militar Estadual. Curitiba: Juruá, 1992. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. GOMES, Luiz Flávio. Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual. Artigo disponível no site da internet www.lfg.com.br. Acesso em 29 de setembro de 2012. LOBÃO, Célio. Direito Penal Militar. Editora Método, 2009. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. 18. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2006. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo, Atlas, 1999. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Tribunal do Júri na Justiça Militar Impossibilidade Jurídica. Artigo disponível no site da internet

http://www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/3573213. Acesso em 29 de setembro de 2012. RONALDO, João Roth. Direito Militar: Doutrina e Aplicações. 1. ed. Editora Campus, São Paulo, 2011. RONALDO, João Roth. Temas de Direito Militar. Suprema Cultura, São Paulo, 2004. TUBENCHLAK, James. Tribunal do Júri: Contradições e soluções, Rio de Janeiro, Forense, 1990. 1Funcionário Público Federal, Bacharel em Direito, Pós Graduando em Direito Militar e Pós Graduando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.