VII-005 DETECÇÃO E AVALIAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DE Legionella pneumophila EM ÁGUA DE USO HOSPITALAR



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Transcrição:

VII-005 DETECÇÃO E AVALIAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DE Legionella pneumophila EM ÁGUA DE USO HOSPITALAR Aldo Pacheco Ferreira (1) Biólogo, Mestre em Engenharia Biomédica (COPPE/UFRJ), Doutor em Engenharia Biomédica (COPPE/UFRJ). Endereço (1) : Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública, Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental, Laboratório de Biotecnologia Ambiental, Rua Leopoldo Bulhões, 1480 - Manguinhos Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21041-210 - Brasil - Tel: (21) 2598-2746 - e-mail: aldo@ensp.fiocruz.br RESUMO Espécies de Legionella (bacilos aeróbicos gram-negativos) são largamente distribuídas em ambientes aquáticos. A água potável é uma fonte nosocomial de legionelosis. Diversos Órgãos Internacionais (Centers for Disease Control and Prevention - CDC, Occupational Safety and Health Administration - OSHA), orientam para ter-se um monitoramento de Legionella pneumophila em hospitais. A família Legionellaceae engloba um grupo de bactérias fastidiosas que requerem técnicas especiais de isolamento, das quais L. pneumophila é o membro mais comumente encontrado como causa de doença humana. Este organismo é um patógeno oportunista, infectivo, sobretudo pela exposição a partir de aerossóis gerados por águas saídas de nebulizadores, torneiras e chuveiros, bem como sistema de ventilação central. As pneumonias causadas ocorrem quando são inalados aerossóis infectados. Outro ponto importante de contaminação são as incisões cirúrgicas, geralmente após a higienização corpórea dos pacientes no período pós-operatório. Hospitais da esfera Municipal, Estadual e Federal do Estado do Rio de Janeiro foram inspecionados quanto a presença de L. pneumophila. Avaliou-se, em paralelo, os caracteres físico-químicos e colimétricos (coliformes totais e termotolerantes) visando checar a qualidade da água consumida nestes hospitais. PALAVRAS-CHAVE: Legionella pneumophila, Pneumonia, Água de uso hospitalar, Engenharia clínica. INTRODUÇÃO É fundamental que a saúde esteja sempre, direta ou indiretamente, envolvida em variadas pesquisas para o entendimento das causas dos acometimentos e para o desenvolvimento de procedimentos que visem a proteção da população em relação a estas, propiciando resultados para que se tenha, na medida do possível, a solução de problemas e sobretudo a segurança dos pacientes hospitalizados. Problemas sérios de saúde ambiental são compartilhados tanto por países desenvolvidos quanto por países em desenvolvimento, afetando milhões de pessoas que sofrem de doenças, as quais tiveram como causa principal a exposição a agentes biológicos. A saúde evidencia a harmonia das diversas partes que integram o corpo humano. O meio interno ou fisiológico regula a complexidade dos fenômenos físico-químicos gerados como resposta aos estímulos do meio externo, ou seja, é o resultado de um ajuste dinâmico adequado do organismo com os agentes que tendem a alterá-lo. Não é uma inter-relação passiva entre as substâncias que integram o organismo e os fatores que pretendem romper a harmonia, mas uma resposta ativa das forças corporais que funcionam estabelecendo o ajuste. Dessa forma, a saúde pode ser interpretada como produto de inter-relação harmônica entre o organismo e o ambiente que a rodeia, fator este de caráter dinâmico. De acordo com recentes dados da Organização Mundial de Saúde [1], há um quadro de deterioração das condições de saúde da população mundial, e descreve-se enfaticamente a repetição de doenças comunicáveis e emergentes, as quais disseminam um quadro mórbido que afeta o mundo inteiro. A situação se complica drasticamente pela colonização de microrganismos no ambiente hospitalar, em especial, nas incidências de infecção hospitalar, como é expressada por L. pneumophila que acomete disseminadamente pacientes por veiculação hídrica, tornando-se mais um problema de Saúde Pública. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

No Brasil, apesar de alguns disponíveis demonstrarem a incidência de L. pneumophila no ambiente hospitalar, existem poucas abordagens na literatura sobre esta questão. VERONESI e colaboradores [2] são os precursores da investigação de legionelosis no país, em inquérito sorológico em doadores de sangue e trabalhadores de Unidades Tratamento Intensivo de três hospitais de São Paulo, quando evidenciaram anticorpos em 19% das amostras. Trabalho semelhante foi feito em Petrópolis (RJ) e Curitiba (PR) com resultados mais alarmantes. LEVIN e colaboradores [3] discorreram sobre um surto epidêmico causado por L. pneumophila em uma unidade de transplante renal em São Paulo, demonstrando a necessidade de ter-se um monitoramento regular no ambiente hospitalar. Conforme mostrado na Tabela 1, há correntemente 14 sorogrupos de L. pneumophila e pelo menos 29 outras espécies de legionella. Segundo BUTLER et al. [4] L. pneumophila sorogrupo 1 é a responsável por mais de 80% de todas as infecções e, em escala bastante reduzida, aparecem os sorogrupos 4 e 6 como responsáveis pelo restante dos acometimentos. A freqüência de legionelosis como causa de pneumonia varia entre 4% e 23%, com mortes ocorrendo em cerca de 32% dos casos [5]. Além disso, é responsável por infecções extrapulmonares fatais pela limpeza de incisões cirúrgicas de cirurgias pós-cardíacas e, principalmente, em transplantes de órgãos [6-10]. Tabela 1: Espécies de Legionella spp. ( isoladas de acometimentos de pneumonia em pacientes) Legionella pneumophila sorogrupos 1-14 L. londiniensis L. anisa L. longbeachii L. birminghamensis L. maceachernii L. bozemanii L. micdadei L. cherrii L. nautarum L. cincinattiensis L. oakridgensis L. dumoffii L. parisiensis L. erythra L. quateriensis L. feeleii L. rubrilucens L. geestiae L. sainthelensi L. gormanii L. santicrucis L. hackeliae L. spiritensis L. israelensis L. steigwaltii L. jamestownniensis L. wadsworthii L. jordanis L. worsliensis A ecologia e sobrevivência das legionellas no ambiente, principalmente em reservatórios d água, é intimamente favorecida por protozoários (Hartmanella vermiformis, Tetrahymena pyriformes) e amebas (Acanthamoeba castellani, Naegleria spp.) que podem suportar a multiplicação de L. pneumophila. O mecanismo infectivo dá-se pela invasão de L. pneumophila nestes hospedeiros, a qual apropria-se de macromoléculas intracelulares destes para realizar multiplicação intracelular. Segue, então, a fase de replicação intracelular até o ponto em que lisam a célula hospedeira e reinvadem novos hospedeiros [11-15]. MATERIAIS E MÉTODOS Um total de cinco hospitais da esfera Municipal, Estadual e Federal de municípios do Estado do Rio de Janeiro permitiram ser inspecionados, sendo que todos positivaram quanto à presença de L. pneumophila. Destes, dois hospitais com o pior quadro acordaram para a realização da pesquisa. A qualidade da água varia de acordo com o sistema de água envolvido. Fica então subentendido que a maioria dos métodos eficientes para isolar L. pneumophila depende exclusivamente da qualidade da água. Tendo-se como base o trabalho de VICKERS et al. [16], coletas semanais foram levadas a cabo nestes dois recintos por 10 semanas. Realizou-se um total de 200 análises, com 140 análises físico-químicas, 40 análises colimétricas e 20 análises para legionella. Os pontos de amostragem foram: setor de pediatria do hospital A e ambulatório geral do hospital B. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2

Coleta de Amostras para Provas Físico-Químicas As amostras para provas físico-químicas foram coletadas em volume de 500 ml em frascos esterilizados. Foram submetidas a exames laboratoriais sendo expresso o Valor Máximo Permitido (VMP). Testes: sólidos dissolvidos totais (VMP 1000 mg/l), ferro (VMP 0,3 mg/l), cloro residual (0,5 2,0 mg/l), sulfato (VMP 250 mg/l), cloretos (VMP 250 mg/l), dureza (VMP 500 mg/l) e ph (6,0 9,5). Os valores da faixa de aceitabilidade das provas realizadas estão preconizadas pela Portaria 1469/2000 [17] e a metodologia empregada pela APHA [18]. Coleta de Amostras para Provas Microbiológicas Análise de Coliformes Totais e Termotolerantes (Escherichia coli) Para as análises de coliformes totais e termotolerantes utilizaram-se frascos estéreis contendo 50 µl de uma solução de tiosulfato de sódio (Na 2 S 2 O 3 ) a 1%, de forma a neutralizar qualquer cloro residual. Coletou-se 100 ml para as análises que foram feitas pelo método de filtração por membrana [18]. Todas as amostras foram, em prazo máximo de seis horas, encaminhadas para exames laboratoriais acondicionadas em banho de gelo e ao abrigo da luz. Isolamento de Coliformes - Filtração por membrana Conforme mostrado na Figura 1, o volume da amostra foi filtrado a vácuo utilizando uma membrana de 0,45 µm (Millipore HAWG 04700). A membrana foi colocada em placa de Petri de 47 mm (Millipore PD 100 4700) sobre uma almofada absorvente (Millipore HAWP 04700) saturada com meio líquido (Figura 2). Nas análises de coliformes totais a almofada absorvente foi saturada com 20 ml do meio de cultura Endo Broth (BBL Microbiolgy Systems, USA). Incubou-se o material a 37 C por 22-24 horas. Nas análises de coliformes termotolerrantes a almofada absorvente foi saturada com 20 ml do meio de cultura FC Broth (BBL Microbiolgy Systems, USA). Incubou-se o material a 44,5 C por 22-24 horas. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3

Figura 1: Esquema ilustrativo de material utilizado para filtração por membrana Figura 2: Isolamento bacteriano por membrana filtrante à vácuo ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4

Análises de Legionella pneumophila Para as análises de L. pneumophila utilizaram-se frascos estéreis contendo 750 µl de uma solução de tiosulfato de sódio (Na 2 S 2 O 3 ) a 1%, de forma a neutralizar qualquer cloro residual. Foram coletados em cada hospital 1500 ml e para o isolamento e concentração de L. pneumophila utilizou-se o método de filtração por membrana [18]. Todas as amostras foram, em prazo máximo de seis horas, encaminhadas para exames laboratoriais acondicionadas em banho de gelo e ao abrigo da luz. Isolamento de legionella - Filtração por membrana As legionellas são incapazes de crescer em meio de cultura como o ágar-sangue ou qualquer outro comumente usado em laboratórios clínicos. Para isolamento de L. pneumophila montou-se o protocolo: Após filtração, a membrana de 0,45 µm (Millipore HAWG 04700) foi colocada assepticamente em um erlenmayer estéril de 30 ml com tampa de rosca contendo 5 ml de água destilada estéril com 8 pérolas de vidro. A solução foi vigorosamente homogeneizada. Procedeu-se, então, o tratamento ácido (eliminação da microflora competitiva). Retirou-se 1 ml da solução anterior, colocou-se 9 ml de tampão HCl-KCl, homogeneizou-se e deixou-se a solução em repouso por 3 minutos. Após o período de reação, foi inoculado 0,1 ml em uma placa de Petri com BCYE Selective Agar GVPC (Oxoid). Incubou-se a 35 C em estufa com atmosfera umidificada, por 24-72 horas. As colônias foram então especificadas bioquimicamente (Legionella Latex Test Legionella species test reagent DR0803M, Legionella pneumophila serogroup 1 DR0801M, Legionella pneumophila serogroup 2-14 DR0802M, OXOID). RESULTADOS A Tabela 2 e a Tabela 3 mostram resultados das análises físico-químicas da água do hospital A e do hospital B. Tabela 2: Resultados das análises físico-químicas da água do hospital A hospital A Coleta n Análises 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Sólidos dissolvidos 865 943 1105 1145 997 980 880 910 940 935 totais Ferro 0,22 0,14 0,21 0,23 0,26 0,26 0,27 0,24 0,20 0,13 Cloro residual 0,8 1,2 0,3 0,5 1,3 1,5 1,4 1,9 1,1 1,6 Sulfato 188 170 125 222 234 190 201 216 178 165 Cloretos 134 122 156 141 198 151 157 149 155 173 Dureza 334 412 417 219 253 214 278 226 197 184 ph 6,7 6,1 5,3 5,5 6,4 5,6 6,3 6,0 5,7 6,1 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5

Tabela 3. Resultados das análises físico-químicas da água do hospital B hospital B Coleta n Análises 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Sólidos 680 550 605 588 493 555 603 662 545 679 dissolvidos totais Ferro 0,22 0,31 0,17 0,12 0,16 0,2 0,17 0,28 0,23 0,24 Cloro residual 0,5 0,8 0,4 0,2 1,1 0,6 0,0 0,9 1,1 0,4 Sulfato 188 133 145 178 222 210 98 94 123 165 Cloretos 110 93 99 82 78 110 102 134 156 169 Dureza 293 228 415 419 398 325 311 229 199 426 ph 6,0 6,2 5,1 6,7 6,3 5,9 5,2 5,6 6,0 5,3 Os resultados das análises colimétricas do hospital A e do hospital B são expressas na Tabela 4. Tabela 4: Resultados das análises colimétricas do hospital A e do hospital B hospital A hospital B Coleta n Coliformes totais/100 ml Coliformes termotolerantes/100 ml Coliformes totais/100 ml Coliformes termotolerantes/100 ml 1 2 1 0 0 2 0 0 1 0 3 0 0 4 2 4 0 0 2 1 5 0 0 7 3 6 0 0 13 7 7 1 0 0 0 8 0 0 3 1 9 2 1 5 4 10 0 0 1 0 Isolamento de Legionella pneumophila Outras espécies de legionella isoladas nos hospitais pesquisados Demonstrando uma quadro bastante alarmante foram isoladas nos dois hospitais outras espécies de Legionellas spp. Além de L. pneumophila sorogrupo 1. No hospital A isolou-se Legionella micdadei. No hospital B isolou-se: Legionella bozemanii, Legionella anisa, Legionella micdadei e Legionella pneumophila sorogrupos 3 e 4. Legionella pneumophila sorogrupo 1 foi isolada em 60% das amostras coletas no hospital A e 100% das amostras coletadas no hospital B. A Tabela 5 exprime os resultados das análises de pesquisa de isolamento de L. pneumophila sorogrupo 1, no hospital A e no hospital B. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6

Tabela 5: Resultados das análises de Legionella pneumophila sorogrupo 1 nos hospitais A e B hospital A hospital B Coleta n CFU/ litro de L. pneumophila sorogrupo 1 1 0 2,3 x 10 5 2 0 4,0 x 10 2 3 1,2 x 10 3 5,1 x 10 4 4 0,4 x 10 2 3,2 x 10 5 5 0 3,9 x 10 3 6 1,1 x 10 3 5,3 x 10 4 7 2,5 x 10 4 4,2 x 10 3 8 0 1,8 x 10 4 9 0,3 x 10 2 2,4 x 10 5 10 2,2 x 10 4 6,6 x 10 6 CONCLUSÕES A interpretação dos dados obtidos pelas culturas de água frente a diferentes resultados entre as amostras dos hospitais e as flutuações nas concentrações de legionella encontradas nos pontos de coleta refletem variadas fontes de influência para o crescimento de L. pneumophila. Em adição, o risco para o acometimento após exposição a uma dada fonte deve ser influenciado por outros fatores que não só a presença ou a concentração de organismos. Estes fatores incluem o grau de contaminação da água (coliformes, parasitos), a variações nas concentrações físico-químicas, a susceptibilidade do hospedeiro e as propriedades virulentas da cepa contaminante. Estes dados são suficientes para atribuir um nível de risco para a doença com base no número de legionellas detectadas nas amostras do hospital A e do hospital B. O ambiente físico é um outro fator que influencia a disseminação de legionellas a partir de águas potáveis a pacientes. Em sistemas de água do âmbito hospitalar, elevadas concentrações de cálcio e magnésio são fatores associados com a colonização de L. pneumophila. Outros estudos demonstraram haver uma correlação nas concentrações de ferro com o isolamento de L. pneumophila. Ficou demonstrado que, enquanto altos níveis destes são tóxicos a diferentes espécies de legionellas, baixos níveis aumentam a ocorrência de L. pneumophila. Tais afirmações tiveram um peso marcante nos resultados experimentais, uma vez que obteve-se níveis inaceitáveis de reprovação das amostras. Os achados físico-químicos e colimétricos estão diretamente interligados a qualidade da água dos hospitais pesquisados pelo fato de ter-se 60% de L. pneumophila nas amostras do hospital A e 100% L. pneumophila nas amostras do hospital B.: Níveis de reprovação quanto ao hospital A: o teor de cloro residual - 10% o ph 40% Níveis de reprovação quanto ao hospital B: o teor de cloro residual - 40% o ph 50% A qualidade da água nos hospitais pesquisados refletiu também a presença de contaminações por coliformes, obtendo-se os seguintes níveis de reprovação das amostras: Níveis de reprovação quanto ao hospital A: o coliformes totais 30% o coliformes termotolerantes 20% Níveis de reprovação quanto ao hospital B: ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7

o coliformes totais 80% o coliformes termotolerantes 60% O risco pessoal de adquirir legionelosis pela exposição a água contaminada depende de vários fatores, incluindo o tipo e a intensidade da exposição e a saúde da pessoa exposta. Pessoas com severa imunosupressão ou doenças de característica crônica têm, marcadamente, um incremento no risco de contrair a doença. A taxa de mortalidade é de 40% em pacientes hospitalizados que contraíram legionella contra os 20% para os que contraíram a doença, porém estavam saudáveis [19]. Estes dados demonstram a importância continuada de água como um reservatório de patógenos nosocomiais. Nossas práticas de controle de infecção deveriam ser dirigidas para interromper a transmissão destes patógenos para o paciente. Há dados que sugerem que quando um caso é reconhecido, a presença de dados adicionais devem ser suspeitados. A ausência de coliformes e a presença de agentes físico-químicos (nos níveis preconizados) são de fundamental importância não só para a potabilidade da água como também no impedimento de condições à ocorrência de contaminantes patogênicos, em especial, aqueles de veiculação hídrica. É imprescindível a manutenção da qualidade da água consumida nos hospitais assim como testes biológicos de controle para a detecção de L. pneumophila para que se tenha a segurança necessária do ambiente hospitalar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. WORD HEALTH STATISTICS ANNUAL. World Health Organization, Genève, 1998. 2. VERONESI, R. BARBOSA, S.F.C., COSCINA, A.L. e LIMA, A.C. (1984). Legionelose no Brasil: Inquérito sorológico entre doadores de sangue e trabalhadores em unidades de terapia intensiva de três hospitais em São Paulo. Revista Clínica da Faculdade de Medicina de São Paulo v. 39, n. 6, pp. 257-259. 3. LEVIN, A.S.S., FILHO, H.H.C., and SINTO, S.I. (1991). An outbreak of nosocomial legionnaires disease in a renal transplant unit in Sao Paulo, Brazil. Journal of Hospital Infection v. 18, pp. 243-248. 4. BUTLER, J.C., FIELDS, B.S. and BREIMAN, R.F. (1997). Prevention and control of legionellosis. Infectious Diseases in Clinical Practice v. 6, pp. 458-464. 5. YU, V.L. (1981). Legionnaires' disease: an epidemiologic overview. JAMA v. 245, pp. 24-29. 6. SINGH, N., MUDER, R.R., YU, V.L. and GAYOWSKI, T. (1993). Legionella infection in liver transplant recipients: implications for management. Transplantation v. 56, pp. 1549-1551. 7. BANGSBORG, J.M., ULDUM, S., JENSEN, J.S. and BRUUN, B.G. (1995). Nosocomial legionellosis in three heart-lung transplant patients: case reports and environmental observations. European Journal of Clinical Microbiology and Infectious Diseases v. 14, pp. 99-104. 8. PATTERSON, W.J., HAY, J., SEALl, D.V. and McLUCKIE, J.C. (1997). Colonization of transplant unit water supplies with Legionella and protozoa: precautions required to reduce the risk of legionellosis. Journal of Hospital Infection v. 37, pp. 7-17. 9. CHOW, J. and YY, V.L. (1998). Legionella: a major opportunistic pathogen in transplant recipients. Seminars in Respiratory Infections v. 13, pp. 132-139. 10. KOOLL, J.L., FIORE, A.E., KIOSKI, C.M., BROWN, E.W., BENSON, R.F. and PRUCKLER, J.M.(1998). More than 10 years of unrecognized nosocomial transmission of legionnaires disease among transplant patients. Infection Control and Hospital Epidemiology v. 19, pp. 898-904. 11. ROWBOTHAM, T.J. (1980). Preliminary report on the pathogenicity of Legionella pneumophila for fresh water and soil amoebae. Journal of Clinical Pathology v. 33, pp. 1179-1183. 12. ROWBOTHAM, T.J. (1983). Isolation of Legionella pneumophila from clinical specimens via amoebae, and the interaction of those and other isolates with amoebae. Journal of Clinical Pathology v. 36, pp. 978-986. 13. ROWBOTHAM, T.J. (1986). Current views on the relationship between amoebae, legionellae and man. Israel Journal of Medical Sciences v. 22, pp. 678-689. 14. FIELDS, B.S., SANDEN, G.N., BARBAREE, J.M., MORILL, W.E., WADOSWSKI, R.M., WHITE, E.H. and FEELEY, J.C. (1989). Intracellular multiplication of L. pneumophila in amoebae isolated from hospital hot water tanks. Current Microbiology v. 18, pp. 131-137. 15. CIRILLO, J.D., FALKOW, S. and TOMPKINS, L.S. (1994). Growth of Legionella pneumophila in Acanthamoeba castellani enhances invasion. Infection and Immunity v. 62, pp. 3254-3261. 16. VICKERS, R.M., YU, V.L., HANNA, S.S., MURACA, P., DIVEN, W. and CARMEN, N. (1987). Determinants of Legionella pneumophila contamination of water distribution systems: 15-hospital prospective study. Infect Control v. 8, pp. 357-363. 17. Portaria 1469/2000. Brasil. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 8

18. AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION, Standard methods for the examination of the water and wastewater, 20 ed., New York, 2001. 19. LIN, Y.E, VIDIC, R.D., STOUT, J.E. and YU, V.L. (1998). Legionella in water distribution sistems. JAWWA v. 90, 112-121. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 9