Artigo Traduzido. Arild Stenvik, DDS, MSD, PhD* Björn U. Zachrisson, DDS, MSD, PhD** Palavras-chave: Autotransplante. Agenesia.

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Transcrição:

Artigo Traduzido Um Caso de Difícil Solução, Facilitado pelo Autotransplante: Agenesia de um Incisivo e de Dois Pré-molares Inferiores, com Trespasse Vertical Acentuado A Difficult Agenesis Case Made Easier by Autotransplantation: Deep Overbite With One Incisor And Two Second Premolars Missing In The Mandibile Arild Stenvik, DDS, MSD, PhD* Björn U. Zachrisson, DDS, MSD, PhD** Resumo Relatou-se o tratamento ortodôntico de um adolescente do gênero feminino, com uma má oclusão de Classe I, trespasse vertical extremamente acentuado (sobremordida profunda) e ausência congênita de três dentes inferiores. Como parte importante do plano de tratamento, realizou-se o autotransplante de dois pré-molares superiores em desenvolvimento, para a região posterior da mandíbula. Utilizando-se uma abordagem segmentada, e um período de tratamento de 1 ano e 10 meses, obteve-se um resultado satisfatório, tanto no plano sagital quanto no vertical. Visto que foi possível manter uma inclinação ideal dos incisivos inferiores, o perfil facial pós-tratamento foi excelente. O autotransplante de dois pré-molares em desenvolvimento, fundamental para o sucesso nesse tratamento ortodôntico (tratamento biológico), trata-se de uma técnica fascinante. Palavras-chave: Autotransplante. Agenesia. INTRODUÇÃO Há uma concordância quanto à dificuldade de se obter um resultado ortodôntico satisfatório em pacientes com ausência congênita de um incisivo inferior. Isto é particularmente real nos casos de pacientes que também apresentam um trespasse vertical acentuado antes do tratamento. A experiência clínica demonstrou que uma sobremordida profunda, associada à presença de apenas três incisivos inferiores, pode se agravar com o tratamento ortodôntico. De fato, se um incisivo inferior for extraído como parte do plano de tratamento, o colapso vertical e lingual esperado na região ântero-inferior pode ser utilizado como uma vantagem ortodôntica para melhorar a oclusão nesta região, nos casos * Professor e Chefe do Departamento de Ortodontia, Faculdade de Odontologia, Universidade de Oslo, Oslo, Noruega. ** Professor II, Departamento de Ortodontia, Faculdade de Odontologia, Universidade de Oslo, Oslo, Noruega. Tradução: Maria Dolores Dalpasquale Revisão: Prof. Danilo Furquim Siqueira e Prof. Adriano Lia Mondelli Artigo traduzido com permissão do autor e autorizado pela World Journal of Orthodontics, volume 2, número 1, p. 45-50, 2001 R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002 61

Um Caso de Difícil Solução, Facilitado pelo Autotransplante: Agenesia de um Incisivo e de Dois Pré-molares Inferiores, com Trespasse Vertical Acentuado FIGURA 1 - Radiografia panorâmica pré-tratamento quando o paciente tinha 12 anos e 7 meses de idade. Observa-se a ausência do incisivo lateral inferior direito e de ambos os segundos pré-molares inferiores. Os terceiros molares também estão ausentes. A B C D E F FIGURA 2 - Condição intrabucal pré-tratamento aos 12 anos e 8 meses de idade. O segundo pré-molar superior esquerdo já havia sido transplantado para a região do segundo pré-molar inferior, enquanto o autotransplante no lado direito ainda não havia sido realizado. Observe a sobremordida profunda, particularmente dos incisivos centrais superiores, e a agenesia do incisivo lateral inferior direito. de Classe III combinada e nos casos com uma tendência de mordida aberta anterior 5. Se um caso específico apresentar agenesia de ambos os segundos pré-molares inferiores, simultaneamente à ausência de um incisivo inferior e trespasse vertical acentuado, a situação, do ponto de vista ortodôntico, torna-se complicada. O objetivo desse artigo é descrever o resultado do tratamento ortodôntico para tal caso, que foi tratado por um residente em Ortodontia (Dr. L. Fernandes) sob a supervisão do autor, no Departamento de Ortodontia, da Universidade de Oslo. Será demonstrado que o autotransplante de dois pré-molares superiores em desenvolvimento para a região póstero-inferior constituiu-se de uma parte importante no plano de tratamento. MATERIAL E MÉTODOS Transplante Pode-se observar nas figuras 1 a 3, a radiografia panorâmica, as fotografias intra e extrabucais e a telerradiografia em norma lateral de um paciente do gênero feminino, com 12 anos e 7 meses de idade ao início do tratamento. O paciente apresentava uma má 62 R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002

Arild Stenvik, Björn U. Zachrisson oclusão de Classe I, com um trespasse vertical extremamente acentuado e agenesia do incisivo lateral inferior direito e de ambos os segundos pré-molares inferiores. Nenhum dos terceiros molares estavam presentes. Não ocorreram desvios evidentes de um padrão esquelético normal (Fig. 3). O lábio superior apresentava-se notavelmente fino e a espessura do lábio superior, de acordo com Holdaway 8 (1983), media 12mm (Fig. 3). Após diversas consultas, onde o plano de tratamento foi discutido, decidiu-se, aproximadamente um ano antes do início do tratamento, que os dois segundos pré-molares superiores seriam transplantados para o arco inferior, na época adequada para a intervenção cirúrgica (Fig. 4A-4B). O segundo pré-molar superior esquerdo foi transplantado para a região do segundo pré-molar inferior, após a extração do segundo molar decíduo, em maio de 1995. O segundo pré-molar superior direito foi transplantado em outubro do mesmo ano. Em ambos os casos, os dentes apresentavam aproximadamente dois terços de desenvolvimento radicular na época da cirurgia (Fig. 4C - 4D). Os transplantes foram realizados por um cirurgião-dentista experiente (Dr. A. Heyden), no Departamento de Cirurgia Oral e Medicina Oral, da Universidade de Oslo, em um procedimento de rotina, como descrito a seguir. 3,9 O Tratamento Ortodôntico Iniciou-se o tratamento ortodôntico em novembro de 1995, quando o paciente tinha 13 anos e 3 meses de idade. Cimentaram-se bandas com tubos linguais nos primeiros molares superiores, para a utilização da barra transpalatina pré-fabricada, com a finalidade de rotação do molar e controle da ancoragem (Fig. 5D). Instalou-se o aparelho fixo superior (colagem dos braquetes) em janeiro de 1996, utilizando-se fios australianos superelásticos de 0,016 polegadas para o nivelamento. Realizouse o fechamento dos locais de extração superiores (retração dos caninos) com arcos de aço inoxidável segmentados, de primeiro molar ao canino, e a retração, a intrusão e a incorporação dos torques dos dentes ântero-superiores, com um arco utilitário de aço inoxidável de 0,016 FIGURA 3 - A teleradiografia em norma lateral quando o paciente tinha 12 anos e 7 meses de idade não demonstrava nenhum desvio esquelético significante. Os incisivos inferiores estão 1 mm da linha A-Pog e os lábios inferior e superior estão 0,5 mm e 1 mm atrás da linha E, respectivamente. x 0,022 polegadas (Fig. 5A-5C). Instalou-se o aparelho fixo inferior em outubro de 1996 e a curva Spee (profunda) foi nivelada utilizandose inicialmente os fios TMA, com reversão de curva (Fig. 5A-5C) e em seguida um arco de aço inoxidável de 0.016 x 0,022 polegadas. Os espaços superiores foram fechados utilizandose um arco de aço inoxidável de 0,016 x 0,016 polegadas com alças verticais e a finalização com um arco de aço inoxidável de 0,016 x 0,022 polegadas. Removeu-se o aparelho em setembro de 1997, após 1 ano e 10 meses de tratamento. A radiografia panorâmica dessa época pode ser observada na figura 6. Como contenção inferior, utilizou-se um fio trançado, extremamente flexível, de 0,0215 polegadas (Masel Orthodontics, Bristol, PA, EUA), colado de canino a canino (Fig. 7E). No arco superior, a contenção consistiu em uma placa removível. As fotografias de acompanhamento do resultado final demonstram as condições intrabucais após 3 anos e 3 meses de tratamento (Fig. 7). Os resultados da análise R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002 63

Um Caso de Difícil Solução, Facilitado pelo Autotransplante: Agenesia de um Incisivo e de Dois Pré-molares Inferiores, com Trespasse Vertical Acentuado A B C D E F FIGURA 4 - Radiografias intrabucais mostrando os segundos pré-molares superiores (A, B), os mesmos dentes após seu transplante para o arco inferior (C, D) e a condição radiográfica aproximadamente 6 meses após (E, F). Observa-se a completa neoformação óssea do processo alveolar ao redor dos pré-molares transplantados e seu desenvolvimento radicular continuado. A obliteração pulpar é mais evidente no pré-molar esquerdo. O desenvolvimento radicular dos dentes transplantados torna-se evidente comparando-se as figuras e e f com a condição radiográfica 18 meses mais tarde na figura 6. cefalométrica nessa época revelaram que os incisivos inferiores foram localizados 0,5mm à frente da linha A-Pog e que os lábios superior e inferior foram localizados 5 e 5,5mm respectivamente, atrás da linha E. RESULTADO CLÍNICO E DISCUSSÃO Apesar dos problemas citados inicialmente, foi possível tratar esse caso com um resultado satisfatório, tanto no plano sagital quanto no vertical. Como esperado, a linha média superior localizou-se no meio dos três incisivos inferiores 5,17 (Fig. 7B). Ambos caninos superiores permaneceram em um relação de Classe I com os dentes inferiores (Fig. 7A e 7C). A intercuspidação satisfatória do canino foi parcialmente possível devido ao pequeno tamanho dos incisivos superiores. A correção do trespasse vertical permaneceu estável e com um resultado excelente por mais de três anos após o final do tratamento ortodôntico (Fig. 7B). As formas do arco superior e inferior foram amplamente mantidas da condição pré-tratamento (compare as Fig. 2D, 2E, 5D, 7D-7E). As angulações observadas na radiografia panorâmica pós-tratamento também foram aceitáveis (Fig. 6). Reconhecidamente, o incisivo lateral superior direito deveria ter apresentado mais torque vestibular de raiz e o incisivo lateral superior esquerdo deveria 64 R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002

Arild Stenvik, Björn U. Zachrisson A B C D E F FIGURA 5 - Fotografias da evolução do caso após 9 meses da colagem do aparelho fixo superior. Observa-se a correção satisfatória da sobremordida profunda (a até c). Os arcos segmentados utilizados na maxila resultaram em uma inclinação excessiva de ambos os caninos (A, C). Realizou-se o alinhamento inferior com um arco contínuo, incluindo dobras nos caninos para corrigir sua angulação. (A, C). FIGURA 6 - A radiografia panorâmica na época da remoção do aparelho demonstra um desenvolvimento radicular quase que completo de ambos os pré-molares superiores transplantados, que agora ocupam a posição dos segundos pré-molares inferiores ausentes. Todos os espaços foram fechados e as angulações de todos os dentes estão satisfatórias. Os terceiros molares não estão presentes. ter sido rotacionado para lingual (face distal), características que já estavam presentes ao início do tratamento (Fig. 2D). Estas deveriam ter sido corrigidas como parte do tratamento, preferencialmente com desgastes 17, reduzindo o tamanho (massa dentária) dos incisivos superiores. Além disso, os segundos molares superiores não foram englobados no aparelho e, portanto, permaneceram de certa forma girados (Fig. 7D). Mesmo consciente deste fato, o resultado foi considerado excelente para um aluno. Com o conhecimento atual da quantidade ideal de visualização dos elementos dentários (sentido vertical) em posição de repouso 19, parece que, embora o paciente apresente aproximadamente 3 mm de exposição dos incisivos superiores (Fig. 7F), um melhor resultado do tratamento teria sido possível, caso a maior parte da correção do trespasse vertical tivesse sido realizada no arco inferior. Weiland et al. 18, (1996) demonstraram que a intrusão dos incisivos inferiores pode ser mais eficaz com o uso de arcos segmentados do que com o arco contínuo, o qual foi utilizado na mandíbula para nivelar a curva de Spee profunda para esse paciente. Sem sombra de dúvida, os detalhes mais R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002 65

Um Caso de Difícil Solução, Facilitado pelo Autotransplante: Agenesia de um Incisivo e de Dois Pré-molares Inferiores, com Trespasse Vertical Acentuado A B C D E F FIGURA 7 - A condição intrabucal após 3 anos e 3 meses da remoção do aparelho demonstra uma correção adequada da sobremordida profunda (B), e uma oclusão de Classe I satisfatória de ambos os caninos superiores (A, C). A linha média superior está no meio dos três incisivos inferiores (B). Os primeiros molares superiores estão, é claro, em uma relação Classe II (A, C). Os segundos molares superiores, os quais nunca foram colados, permanecem de certa forma girados (D). Como contenção inferior, utilizou-se um fio trançado flexível com 0,0215 polegadas, fixado de canino a canino (E) na visão extrabucal em posição de repouso (F), o paciente apresenta aproximadamente 3 mm de exposição dos incisivos centrais superiores. interessantes desse caso não estão relacionados à correção da oclusão ou do trespasse vertical, apesar da ausência de um incisivo inferior. O mais fascinante foi o desenvolvimento radicular continuado e o resultado final dos pré-molares superiores autotransplantados em seus novos locais na mandíbula. Ambos os pré-molares continuaram seu desenvolvimento radicular após a operação e desenvolveram quase que o comprimento radicular total. Isso está em conformidade com as observações prévias 12,13. O grau de obliteração da polpa radicular e coronária foi mais rápido e mais pronunciado no primeiro pré-molar esquerdo do que no direito (Fig. 4E, 4F - 6). De fato, o segundo pré-molar direito demonstrou obliteração apenas da polpa coronária, enquanto o canal radicular ficou quase normal, após 5 anos e 7 meses da cirurgia. Como discutido anteriormente 3, o prognóstico e a função em longo prazo para os dentes com obliteração pulpar parcial são considerados favoráveis. Provavelmente, a escolha de um cirurgiãodentista com uma considerável experiência clínica em transplante dentário, para a realização das cirurgias, foi decisiva para o resultado final. Schwartz et al. 12,(1985) afirmaram que a escolha do cirurgião-dentista apresenta-se como um dos fatores mais importantes para a obtenção do sucesso. Se o autotransplante não tivesse sido realizado, a melhor alternativa de tratamento seria a manutenção dos segundos molares decíduos até a sua esfoliação, para posterior substituição por implantes. Essa alternativa teria implicado em reposições artificiais com coroas protéticas, como também em um novo tratamento ortodôntico para a obtenção de um espaço ideal. Na opinião dos autores, isso teria representado uma qualidade inferior no tratamento do paciente. Por outro lado, se o objetivo fosse apenas o fechamento do espaço ortodôntico, com o movimento mesial dos primeiros e segundos molares inferiores, teria sido extremamente difícil evitar a retração dos incisivos inferiores, particularmente visto que o apinhamento era moderado. Qualquer retração seria indesejável, uma vez que, ao início do tratamento, o trespasse vertical apresentava-se acentuado e os lábios finos. Com a solução do transplante, foi possível manter a inclinação e a posição pré-tratamento dos incisivos inferiores. A distância aumentada entre os lábios e a linha E desde o período pré até o pós-tratamento deveu-se ao crescimento, visto que os incre- 66 R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002

Arild Stenvik, Björn U. Zachrisson mentos do nariz e do mento geralmente são maiores do que aqueles dos lábios 6. CONCLUSÃO Diversas condições favoráveis contribuíram para o sucesso nesse caso de difícil solução. O autotransplante de dois pré-molares em desenvolvimento, fundamental para se alcançar essa solução de tratamento biológico, trata-se de uma técnica fascinante. ABSTRACT Aim: The orthodontic treatment of an adolescent female patient with Class I malocclusion, extremely deep anterior overbite, and congenital absence of three mandibular teeth is described. Methods: Autotransplantation of two developing premolars from the maxilla to the mandibular posterior region was an important part of the treatment plan. Using a segmented approach, and a treatment period of 1 year and 10 months, a satisfactory result was obtained, both sagittally and vertically. Since it was possible to keep an optimal mandibular incisor inclination and position, the posttreatment facial profile is excellent. Conclusion: The autotransplantation of two developing premolars, which was fundamental for the achievement of this biologic treatment solution, is an exciting technique. Key words: Autotransplantation. Agenesis. REFERÊNCIAS 1. ANDREASEN, J. O.; PAULSEN, H. U.; YU, Z.; BAYER, T. A long-term study of 370 autotransplanted premolars. Part 4. Root development subsequent to transplantation. Eur J Orthod, v. Oxford, v. 12, p. 38-50, 1990. 2. ; AHLQUIST; R.; BAYER, T.; SCHWARTZ, O. A long-term study of 370 autotransplanted premolars. Part 1. Surgical procedures and standardized techniques for monitoring healing. Eur J Orthod, Oxford, v. 12, p. 3-13, 1990. 3. CZOCHROWSKA, E. M.; STENVIK, A.; ALBUM, B.; ZACHRISSON, B. U. Auto- transplantation of premolars to replace maxillary incisors. A comparison with natural incisors. Am J Orthod Dentofacial Orthop, St. Louis, v. 118. p. 592-600, 2000. 4. DAHL, E. H.; ZACHRISSON, B. U. Long-term experience with direct-bonded lingual retainers, J Clin Orthod, Boulder, v. 25, p. 619-630, 1991. 5. FAEROVIG, E.; ZACHRISSON, B. U. Effects of mandibular extraction on anterior occlusion in adults with Class III malocclusion and reduced overbite. Am J Orthod Dentofacial Orthop, St. Louis, v. 115, p. 115, p. 113-124, 1999. 6. FORSBERG, C. M.; ODENRICK, L. Changes in the relationship between the lips and the aesthetic line from eight years of age to adulthood. Eur J Orthod, Oxford, v. 1, p. 265-270, 1979. 7. HJORTDAL, O.; BRAGELIEN, J. Induction of jaw bone formation by tooth autotransplantation. Norske Tannlaegeforenings Tidende, [S.l.], v. 88, p. 319-322, 1978. 8. HOLDAWAY, R. A. A soft-tissue cephalometric analysis and its use in orthodontic treatment planning. Part I. Am J Orthod, St. Louis, v. 84, p.1-28, 1983. 9. KRISTERSON, L. Autotransplantation of human premolars: a clinical and radiographic study of 100 teeth. Int J Oral Surg, Copenhagen, v. 14, p. 200-213, 1985. 10. LAGERSTRÖM, L.; KRISTERSON, L. Influence of orthodontic treatment on root development of autotransplanted premolars. Am J Orthod, St. Louis, v. 89 p. 146-150, 1986. 11. LUNDBERG, T.; ISAKSSON, S. A clinical follow-up study of 278 auto- transplanted teeth. Br J Oral Maxillofac Surg, London, v. 34, p.181-185, 1996. 12. SCHWARTZ, O. et al. Autotransplantation of human teeth. A life-table analysis of prognostic factors. Int J Oral Surg, Copenhagen, v. 14, p. 245-258, 1985. 13. SLAGSVOLD, O.; BJERCKE, B. Applicability of autotransplantation in cases of missing upper anterior teeth. Am J Orthod, St. Louis, v. 74, p. 410-421, 1978. 14.. Autotransplantasjon av premolarer [in Norwegian]. Göteborgs Tandläkare-Sällskaps Artikelserie, [S. l.], v. 351, p. 45-85, 1967. 15..Indications for autotransplantation in cases of missing premolars. Am J Orthod, St. Louis, v. 74, p. 241-257, 1978. 16..Autotransplantation of premolars with partly formed roots. A radiographic study of root growth. Am J Orthod, St. Louis, v. 66, p. 355-366, 1974. 17. TUVERSON, D. L. Anterior intraoclusal relations. Am J Orthod, St. Louis, v. 78, p. 361-370, 371,393, Oct. 1980. 18. WEILAND, F. J. et al. Evaluation of continuous arch and segmented arch and segmented arch leveling techniques in adult patients: a clinical study. Am J Orthod Dentofacial Orthop, St. Louis, 110, p. 647-652, 1996. 19. ZACHRISSON, B. U. Esthetic factors involved in anterior tooth display and the smile: vertical dimension. J Clin Orthod, Boulder, v. 32, p. 432-445, 1998. 20.. Bonding in Orthodontics. In: GRABER, T. M.; VANARSDALL Jr., R. L. (Ed.). Orthodontics: current principles and techniques. 3rd ed. St Louis: Mosby, 2000. p. 557-645. Endereço para correspondência: Prof. Arild Stenvik, Department of Orthodontics, University of Oslo, P. O. Box 1109, Blindern, 0315 Oslo, Norway. e-mail: stenvik@odont.uio.no R Clín Ortodon Dental Press, Maringá, v. 1, n. 2, p. 61-67 - abr./maio 2002 67