A COMPETÊNCIA LEGISLATIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL



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A COMPETÊNCIA LEGISLATIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL Kelvin Raul Klein 1 Caroline Vieira Ruschel 2 SUMÁRIO Introdução; 1 Breves Noções sobre Competência; 2 Competência Material; 3. Competência Legislativa; 4 Competência Legislativa em Matéria Ambiental; Considerações finais; Referência dasfontes citadas. RESUMO O presente artigo científico tem por objetivo a realização de uma pesquisa a respeito da competência em sentido geral e a competência legislativa em matéria ambiental, disciplinada no texto da Constituição Federal de 1988. Isto porque, embora a constituição dê o norte para a proteção e preservação do meio ambiente, ela não especifica quais os mecanismos jurídicos para esta proteção, deixando a cargo da legislação infraconstitucional esta tarefa. Daí a necessidade de se discorrer a respeito do tema, uma vez que a Carta Política abre espaço para que tanto a União, o Distrito Federal, os Estados-membros e os municípios venham a legislar em matéria ambiental. Palavras-chave: Competência; Competência legislativa ambiental; Meio Ambiente. INTRODUÇÃO Um dos temas mais conflituosos em matéria ambiental é a repartição de competências. Tanto sob o aspecto administrativo ou material quando sob o aspecto legislativo, o impasse existe, posto que com a diferenciação entre a competência legislativa e a competência administrativa, estabelecida pela Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história constitucional brasileira, este tipo de competência deixou de ser uma conseqüência. No que diz respeito especificamente à competência administrativa ambiental, a questão deverá ser regulamentada por lei complementar, conforme determina o 1 Acadêmico do 10º período do Curso de Direito da Univali, campus de Itajaí. 2 Professora Mestre do Curso de Direito da Univali. 342

parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal. Enquanto isso, prevalece a competência comum entre os entes federativos, o que certamente contribui para aumentar o número de conflitos. Já a repartição da competência legislativa ambiental está devidamente disciplinada pela Carta Magna, prescindindo a princípio de uma regulamentação normativa. No entanto, os conflitos permanecem por diversos motivos: primeiro porque são vários os tipos de competência legislativa em matéria ambiental, como a exclusiva (art. 25 1º e 2º), privativa (art. 22), concorrente (art. 24) e suplementar (art. 24, 2º) [01]. E, depois, porque sob muitos enfoques a competência legislativa incide sobre a competência administrativa, reforçando os atritos entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. 1 BREVES NOÇÕES SOBRE COMPETÊNCIA Etimologicamente 3, a palavra competência deriva da terminologia latina competentia de competere que significa estar em gozo ou no uso de, ser capaz, perterncer ou ser próprio 4. A competência em seu sentido mais amplo, remete ao entendimento acerca da capacidade (aptidão ou do poder) que um determinado sujeito, público ou privado, possui para desempenhar uma tarefa específica. Esta capacidade, na esfera jurídica, se apresenta de duas formas: uma no sentido de aptidão, através da qual o sujeito pode exercitar ou fruir um determinado direito que lhe assiste, é pois, uma faculdade assegurada e garantida por lei; a outra, no sentido de poder (através do qual uma determinada autoridade possui legalmente a atribuição para conhecer certos atos jurídicos e deliberar a seu respeito) é na verdade, a outorga à pessoa ou instituição, para deliberar sobre determinado assunto, resolvendo-o segundo as regras ou os limites que a investem nesse mesmo poder. 3 Segundo BUENO. ETIMOLOGIA, s. f. Parte da lingüística que estuda a origem e o significado das palavras. BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: FTD, 2000, p. 334. 4 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 24. ed. Rio de janeiro: Forense, 2004, p. 319. 343

A competência, conforme leciona José Afonso da Silva 5, faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções. O modelo do Estado brasileiro, baseado no Federalismo legitimado pela Constituição Federal, que abrange a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos com suas autonomias definidas pelo texto constitucional, se fundamenta em dois elementos básicos, ou seja, a existência de órgãos governamentais próprios e posse de competências exclusivas 6. O sistema federalista brasileiro, alicerçado na autonomia das esferas governamentais, permite a divisão de competência entre a União, os Estadosmembros, o Distrito Federal e os Municípios. José Afonso da Silva 7, discorrendo sobre a temática, leciona que: A teoria do federalismo costuma dizer que a reparticção de poderes autônomos constitui o núcleo do Estado Federal. Poderes, aí, significa a porção de matéria que a Constituição distribui entre as entidades autônomas e que passa a compor seu campo de atuação governamental, sua área de competência. Ainda, com relação ao sistema de repartição de competências, José Afonso da Silva 8 assevera que: O sistema de repartição de competências entre as entidades da Federação Brasileira é bastante complexo. A Constituição de 1988 busca realizar o equilíbrio federativo por meio de uma repartição de competências que se fundamenta na técnica da enumeração dos poderes da União (arts. 21 e 22), com poderes remanescentes para os Estados (art. 25, 1º) e poderes definidos indicativamente para os Municípios (arts. 29 e 30), mas combina, com essa reserva de campos específicos, áreas comuns em que se prevêem atuações paralelas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23) e setores concorrentes entre União e Estados, em que a competência para estabelecer políticas gerais, diretrizes gerais e normas gerais cabe à União, enquanto se defere aos Estados e até aso Municípios a competência suplementar (arts. 24 e 30). Esta repartição de competência se fundamenta, ainda, na predominância de 5 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 413. 6 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 68. 7 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 68-69. 8 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 69. 344

interesses, ou seja, onde prevalecer o interesse geral de caráter nacional, a competência será atribuída à União; onde predominarem s interesses regionais, a competência será da alçada dos Estados e por fim, predominando os interesses locais, a competência será estendida ao Município. Sob outro prisma, a doutrina divide a competência em material e legislativa. A competência material, por sua vez, se subdivide em exclusiva e comum, cumulativa ou paralela. A competência legislativa, se subdivide em exclusiva ou privativa; concorrente e suplementar. Tais divisões serão melhor trabalhadas no decorrer deste trabalho. 2 COMPETÊNCIA MATERIAL A competência material compreende as ações e as decisões que determinado ente federativo deve tomar. Implica também, na delimitação da implementação de certas providências de caráter político-executivo, através das quais se tem a prática dos atos de gestão dos sujeitos estatais. A competência material pode ser exclusiva, em virtude do seu objeto só pode ser exercida pela entidade estatal à qual é definida 9, e por sua vez se caracteriza pela nota da indelegabilidade 10, conforme disposto no artigo 21 da Constituição Federal de 1988, que trata da competência material exclusiva da União. Por outro lado, a competência material pode ser comum e isto corresponde à cooperação administrativa, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar, em âmbito nacional, entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios 11 na execução das funções coincidentes e ininterruptas, que recaem sobre as matérias dispostas no artigo 23 do texto constitucional de 1988. 3 COMPETÊNCIA LEGISLATIVA A competência legislativa consiste no poder conferido a uma determinada 9 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo Revista dos Tribunais, 1996, p. 294. 10 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 528. 11 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988.. Rio de Janeiro: Forense, 1992, v. 4. p. 1740. 345

instituição estatal, para que esta elabore e aplique regras, normas e leis acerca de assuntos específicos. É através da competência legislativa que se define e se limita as matérias, dentro das quais podem ser produzidas as leis e regulados os assuntos dos quais as mesmas versam. Rodrigo César Rebello Pinho 12, ao discorrer sobre o assunto, aponta que a competência legislativa é a: Faculdade para a elaboração de leis sobre determinados assuntos. À União foi atribuída uma ampla competência legislativa (CF, arts. 22 e 24). O Municípios ficaram com competência para legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual no que couber. Aos Estados foi reservada competência legislativa remanescente (CF, art. 25, 1º). A competência privativa ou exclusiva é aquela que até poderia ser exercida por qualquer uma das entidades estatais, mas que em razão ou por interesse da organização federativa, é atribuída somente a uma delas, ou a uma de suas espécies 13, de modo que apenas aquele poder enunciado, constitucionalmente, pode exercê-la 14. O texto constitucional de 1988, ao dizer que compete privativamente à União legislar sobre certas e determinadas matérias, procurou fixar e determinar o modelo jurídico que delega somente a esse ente jurídico público a exclusividade de elaborar e editar normas ordinárias intraconsticional acerca de direito civil, penal, processual, eleitoral, ambiental e agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho 15. Entretanto, esta exclusividade não é absoluta, uma vez que existe a possibilidade, desde que haja uma lei complementar federal, dos Estados-mebros poderem legislar a respeito de determinadas matérias, entre elas: propaganda 12 PINHO, Rodrigo César Rebello. Da organização do Estado, dos poderes e histórico das constituições, v. 18. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 09. 13 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional, 1996, p. 294. 14 MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988, v. 3, tomo I: arts. 18 a 23. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 266. 15 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 1991 v. 3. p. 1440. 346

comercial, trânsito, transporte, sistemas de consórcios e sorteios, entre outras 16. A competência legislativa é, ainda, concorrente, e isto implica dizer que pode ser exercida por qualquer das espécies de entidades estatais, à exceção dos Municípios 17. A doutrina subdivide a competência legislativa concorrente em duas vertentes, a saber: cumulativa e não cumulativa. Identifica-se a primeira quando houver algum tipo de obstáculo ao exercício de uma porção do poder por parte da União, dos Estados e do Distrito Federal e, em existindo algum conflito de funções, haverá o império da vontade da União que se exterioriza por meio das normas jurídicas federais. A competência legislativa concorrente não cumulativa, ocorre quando há a divisão vertical das atribuições entre as entidades políticas (União, Estados e Distrito Federal), verticalização esta na qual a União figurará no ápice, lhe sendo garantido a atribuição de determinar os princípios e normas gerais; cabendo, por sua vez aos Estados e ao Distrito Federal, a complementação normativa 18. A competência legislativa suplementar encontra seu lugar no mundo jurídico quando da possibilidade da ausência de legislação federal na esfera das competências concorrentes e, nestes casos, importará na competência plena dos Estados para editar normas gerais. Entretanto, a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia das leis estaduais no que lhe for contrário 19. No que diz respeito à competência suplementar dos Municípios, esta encontra-se disposta no artigo 30, II da Constituição Federal de 1988, e isto implica no fato de que o Município poderá regular normas federais e estaduais, adequandoas às suas peculiaridades 20. 16 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988, v. 3, p. 1441. 17 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional, 1996, p. 295. 18 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada, 2003, p. 556. 19 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional, 1996, p. 295. 20 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada, 2003, p. 594. 347

4 COMPETÊNCIA LEGISLATIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL Com o advento da Constituição Federal de 1988, a organização política relacionada ao meio ambiente brasileiro passou alicerçar-se pelo artigo 1º da Lei nº 6.938/81 que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, cuja redação se determina pela Lei nº 8.028/90; e pelos artigos 23, VI e VII, e 225 ambos do texto constitucional. Esta tutela ambiental, encontra-se inserida no texto constitucional em sua concepção unitária sendo conceituada como um bem de uso comum do povo, o que garante, assim, o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado 21. Como bem se pode perceber, a Constituição Federal de 1988, procurou regular e determinar a competência para legislar acerca de matéria ambiental à União, aos Estados e ao Distrito Federal (art. 24, V, VI e VII), de modo que tem-se assim a competência concorrente, na qual a União se encarrega de regulamentar as normas gerais atinentes ao meio ambiente e, aos Estados e ao Distrito Federal, a suplementação dessas normas gerais. Isto não quer dizer que os Municípios estão dispensados de legislarem a respeito de matéria ambiental, pelo contrário, a Constituição Federal também prevê a suplementação por parte dos Municípios (art. 30, II). Não se pode deixar de ressalvar que é o princípio da predominância dos interesses que se aplica na repartição das competências legislativas, ou seja, à União caberá as matérias com interesse nacional, ao passo que aos Estados caberão as de interesse regional, enquanto que aos municípios tocarão as competências legislativas de interesse local 22. Sendo que as normas gerais não podem ser revogadas pela legislação estadual ou municipal, já que são consideradas princípios e fundamentos de uma determinada matéria legislada. Para Paulo Afonso Leme Machado 23, a concorrência enseja a possibilidade 21 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 77. 22 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Manual de direito ambiental e legislação aplicável. São Paulo: Max Limonad,1999, p. 186. 23 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 2000, p. 77. 348

de iniciativa na área da legislação ambiental para os Estados e para o Distrito Federal, se a União se mantiver inerte. Tem-se ainda que toda norma geral de origem Federal, quer seja em matéria ambiental, quer seja em outra matéria cuja competência seja concorrente, não necessita abarcar todo o território nacional. Desta maneira a norma geral pode abranger somente um ecossistema, uma bacia hidrográfica ou somente uma espécie de animal ou vegetal 24. Outro aspecto que merece destaque é que a União, ao elaborar as normas gerais, deve atentar para obrigatoriedade de inserir em seus textos os conteúdos dos acordos, convenções e tratados ratificados, depositados e promulgados no Brasil, bem como não atingir normas constitucionais. Neste contexto da competência em matéria ambiental, cabe privativamente à União a tarefa de elaborar as legislações que versem sobre: águas, energia, jazidas, minas e outros recursos minerais, populações indígenas e atividades nucleares de qualquer natureza 25. Tal competência abrange quase que totalmente as matérias ligadas ao meio ambiente, formando um conjunto considerável da legislação ambiental. Esta competência privativa coloca a União em uma situação de supremacia quanto ao dever de proteção ambiental, uma vez que cabe a União a implantação da Política geral do Meio Ambiente, como já solidificado com o advento da Lei n. 6.938/81 que trata, em conjunto com a Constituição Federal de 1988, das questões ambientais no Brasil 26. Embora a União ocupe posição de destaque, no que diz respeito à competência em matéria ambiental, a Constituição Federal de 1988 estendeu a todos os entes públicos federados a responsabilidade e a competência comum com vista à proteção do meio ambiente, ao combate de todas as formas de poluição, a preservação da flores e seus respectivos ecossistemas e isto implica na fauna e na flora, o acompanhamento e fiscalização da permissão de direitos de pesquisa e 24 MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 2000, p. 78. 25 ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999, p. 59. 26 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 73. 349

exploração dos recursos hídricos e minerais em todo o território nacional 27. Não obstante, deve-se levar em conta que a competência comum em matéria ambiental é uma imposição constitucional para que os diversos integrantes da Federação atuem em cooperação administrativa recíproca visando resguardar os bens ambientais 28. Como se pode perfeitamente observar, cabe à União o direcionamento da legislação em matéria ambiental, o que não exclui os Estados Federados de legislarem neste universo, mas esta competência somente poderá ser comum ou suplementar. José Afonso da Silva 29 leciona que: os Estados não têm competência exclusiva em matéria de meio ambiente. Têm competência comum com a União e os Municípios, nos termos do art. 23, III, IV, VI e VII, da Constituição Federal de 1988. Quanto à competência legislativa em matéria ambiental dos Estados Federados, os mesmos possuem competência complementar, uma vez que poderão pormenorizar as normas gerais e estabelecer as condições para a sua aplicação 30, ou supletiva, quando na ausência de normas gerais da União suprirão a falta, legislando para atender a suas peculiaridades 31. Com o exposto até o momento, pode-se perceber que o legislador constitucional procurou propiciar todas as condições, em matéria de competência ambiental, para que a União, os Estados e o Distrito Federaltenham instrumentos legais para uma efetiva proteção ao meio ambiente. Ainda que se tenha discorrido a respeito das competências da União e dos Estados-membros, deve-se ainda trazer à luz à esfera de competência, em matéria ambiental, dos Municípios e quais são as suas responsabilidades quanto à proteção ao meio ambiente. 27 ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, 1999, p. 59. 28 ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, 1999, p. 60. 29 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 75. 30 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competência na Constituição de 1988, 2. ed. São Paulo: Atlas, 2000, 163. 31 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competência na Constituição de 1988, 2000, 163. 350

Os Municípios, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, ganharam, no Brasil, um status quo de ente federado, adquirindo uma autonomia até então inexistente, além de passarem a possuir competência exclusiva em algumas matérias legislativas e organização política própria 32. Esta nova condição dada aos Municípios proporcionou a aplicação de uma tutela mais efetiva nas condições de vida dos munícipes, uma vez que é nos Municípios que as pessoas nascem, trabalham, têm suas relações sociais, estudam etc. Deste modo, o Município agrega os requisitos adequados de atendimento aos anseios daqueles que nele habitam, principalmente em se tratando de um país das dimensões, diferenças culturais e econômicas do Brasil 33. A este respeito, Paulo de Bessa Antunes 34 discorre que: O artigo 30 da Constituição Federal atribui aos Municípios competência para legislar sobre: assuntos de interesse lical; suplementar a legislação federal e estadual no que couber; promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. Este poder legislativo de interesse local está expresso no artigo 30, inciso II da Constituição Federal de 1988, estendendo ao Município a competência suplementar frente à legislação Federal e Estadual no que couber 35. Em sendo assim, compete ao Município legislar em matérias de interesses locais que não estejam abrangidas por legislação Federal e Estadual, entre elas, questões voltadas à regulamentação e proteção ao meio ambiente. 32 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 63. 33 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro, 2003, p. 63. 34 ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, 1999, p. 62. 35 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional, 2007, p. 77. 351

CONSIDERAÇÕES FINAIS A competência legislativa se subdivide em remanescente, exclusiva, privativa, concorrente, suplementar e reservada. Na competência concorrente cabe a União editar normas gerais e aos Estados e ao Distrito Federal suplementá-las, devendo ser compreendidas como as que dizem respeito a interesses gerais independentemente da especificidade a que cheguem. Quanto à competência legislativa dos Municípios inexiste consenso sobre o conceito de interesse loca. Deve-se ter em mente que, no âmbito municipal, a proposta de uma política municipal de meio ambiente deve basear-se em ampla análise das potencialidades dos recursos locais e considerar a situação da administração pública, os problemas vividos pelo município, as aspirações da população, e principalmente, trazer uma visão abrangente de como tratar o desenvolvimento local a partir de caminhos socialmente mais justos e mais humanos. Trata-se de colocar o meio ambiente não como tema das ações setorizadas, mas referenciá-lo como condição básica para o desenvolvimento do município. Ainda no que tange à competência em matéria ambiental, deve-se ressaltar que além da competência legislativa, tem-se ainda a competência administrativa. Esta competência administrativa liga-se diretamente à competência comum fixada pela Constituição Federal de 1988 (art. 23) que traz um rol de atribuições a serem observadas pelo Poder Público em todas as suas esferas, destacando-se entre estas atribuições à proteção ao meio ambiente, a preservação da fauna e o combate à poluição em quaisquer de suas formas. Deve-se ressaltar que o modo que cada entidade vai atuar efetivamente em cada matéria dependerá da organização administrativa de cada órgão público federal, estadual e municipal é que trará a verdadeira tutela ao meio ambiente. Pode-se observar que, no Brasil, a busca por uma efetiva e eficaz proteção ao meio ambiente possui, pelo menos em termos legais, todas as condições de ser levada a cabo com sucesso, embora muitos sejam as barreiras de ordem política e de interesses muitas vezes obscuros. 352

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competência na Constituição de 1988, 2. ed. São Paulo: Atlas, 2000. ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999. BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: FTD, 2000. BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988.. Rio de Janeiro: Forense, 1992, v. 4. CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Saraiva, 1991 v. 3. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Manual de direito ambiental e legislação aplicável. São Paulo: Max Limonad,1999. MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988: arts. 18 a 23. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001 v. 3, t. I. p. 266. PINHO, Rodrigo César Rebello. Da organização do Estado, dos poderes e histórico das constituições,. São Paulo: Saraiva, 2000.v. 18. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 24. ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo Revista dos Tribunais, 1996. 353