UNESCO: RECOMENDAÇÕES SOBRE A PAISAGEM HISTÓRICA URBANA PREÂMBULO



Documentos relacionados
Documento em construção. Declaração de Aichi-Nagoya

Educação para a Cidadania linhas orientadoras

Carta para a Preservação do Patrimônio Arquivístico Digital Preservar para garantir o acesso

49 o CONSELHO DIRETOR 61 a SESSÃO DO COMITÊ REGIONAL

POLÍTICAS DE GESTÃO PROCESSO DE SUSTENTABILIDADE

DECLARAÇÃO DE QUÉBEC

Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS ADOTADAS PARA O RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO. Introdução

A CARTA DE BANGKOK PARA A PROMOÇÃO DA SAÚDE EM UM MUNDO GLOBALIZADO

Política de Sustentabilidade das Empresas Eletrobras

Promover um ambiente de trabalho inclusivo que ofereça igualdade de oportunidades;

Número 7/junho 2013 O PROGRAMA URBACT II

1. Objectivos do Observatório da Inclusão Financeira

MMX - Controladas e Coligadas

DECLARAÇÃO FINAL Quebec, 21 de setembro de 1997

PROJETO de Documento síntese

Política de Sustentabilidade das empresas Eletrobras

ASSOCIAÇÃO PARA A ECONOMIA CÍVICA PORTUGAL

Addis Ababa, ETHIOPIA P. O. Box 3243 Telephone 517 Fax:

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: CAPÍTULO I DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Declaração sobre meio ambiente e desenvolvimento (Rio de Janeiro, 1992)

Programa de Desenvolvimento Rural do Continente para

POLÍTICA DE COESÃO

Proposta de Programa- Quadro de Ciência, Tecnologia e Inovação L RECyT,

SÍNTESE PROJETO PEDAGÓGICO. Missão

Cooperação científica e técnica e o mecanismo de intermediação de informações

Puerta Joven. Juventud, Cultura y Desarrollo A.C.

ACORDO-QUADRO SOBRE MEIO AMBIENTE DO MERCOSUL

Conjunto de pessoas que formam a força de trabalho das empresas.

OCPLP Organização Cooperativista dos Povos de Língua Portuguesa. Proposta de Plano de Atividades e Orçamento

A Declaração recomenda prudência na gestão de todas as espécies e recursos naturais e apela a uma nova ética de conservação e salvaguarda.

ENCONTRO DE MINISTROS DA AGRICULTURA DAS AMÉRICAS 2011 Semeando inovação para colher prosperidade

MINISTÉRIO DO AMBIENTE

CONTEÚDOS DE GEOGRAFIA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL COM BASE NOS PARÂMETROS CURRICULARES DO ESTADO DE PERNAMBUCO

154 a SESSÃO DO COMITÊ EXECUTIVO

ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA COMISSÃO DE ASSUNTOS EUROPEUS

GUIA PARA A COOPERAÇÃO SUL-SUL E TRIANGULAR E O TRABALHO DECENTE

Criar Valor com o Território

Plano de Atividades 2015

Indicadores Gerais para a Avaliação Inclusiva

Bacharelado em Serviço Social

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 4ª CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO SUB-GRUPO DE TRABALHO DE TRATADOS INTERNACIONAIS

EFIÊNCIA DOS RECURSOS E ESTRATÉGIA ENERGIA E CLIMA

Programa de Desenvolvimento Social

PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Curso Agenda 21. Resumo da Agenda 21. Seção I - DIMENSÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS

Análise jurídica para a ratificação da Convenção 102 da OIT

Padrão de Príncipes, Critérios e Indicadores para Florestas Modelo. Rede Ibero-Americana de Florestas Modelo 2012

Contextos da Educação Ambiental frente aos desafios impostos. Núcleo de Educação Ambiental Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro

WP WGFA 2/06 Add. 1 Rev. 1

CARTA INTERNACIONAL DO TURISMO CULTURAL

::ENQUADRAMENTO ::ENQUADRAMENTO::

Sumário executivo. From: Aplicação da avaliação ambiental estratégica Guia de boas práticas na cooperação para o desenvolvimento

Termo de Referência nº Antecedentes

(Publicada no D.O.U em 30/07/2009)

EUNEDS INTRODUÇÃO FINALIDADE E OBJECTIVOS

FrontWave Engenharia e Consultadoria, S.A.

Fórum Crédito e Educação Financeira 25 de Janeiro de António de Sousa

I Oficina de Restauração de. Paisagens Florestais. Rio Branco Acre - Brasil. Articulação entre atores na ação e aprendizagem

Declaração de Odense. O ABC para a Equidade Educação e Saúde. 4.ª Conferência Europeia das Escolas Promotoras de Saúde:

Rede de Produção de Plantas Medicinais, Aromáticas e Fitoterápicos

POLÍTICA DE COESÃO

implementação do Programa de Ação para a Segunda Década de Combate ao Racismo e à Discriminação Racial,

CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO CAPÍTULO 30 FORTALECIMENTO DO PAPEL DO COMÉRCIO E DA INDÚSTRIA INTRODUÇÃO

REPÚBLICA DE ANGOLA MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA

ROJECTO PEDAGÓGICO E DE ANIMAÇÃO

Mesa Redonda Novas agendas de atuação e os perfis profissionais em bibliotecas universitárias

PROJETO EDUCATIVO DE ESCOLA

CURSO: GESTÃO AMBIENTAL

Política de investimento na Comunidade

CONFERÊNCIA: O futuro dos territórios rurais. - Desenvolvimento Local de Base Comunitária. Painel 1: Coesão e Sustentabilidade Territorial

NÚCLEOS DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

PROGRAMA DE PROMOÇÃO DA

Resumo do Acordo de Parceria para Portugal,

Declaração de Santa Cruz de la Sierra

Iniciativas Futuro Verde" do Japão

DESAFIO PORTUGAL 2020

Carta do Conselho da Europa sobre a Educação para a Cidadania Democrática e a Educação para os Direitos Humanos

Plano de Atividades 2015

Tema: Educação do Campo

AGENDA 21 escolar. Pensar Global, agir Local. Centro de Educação Ambiental. Parque Verde da Várzea Torres Vedras 39º05'08.89" N 9º15'50.

Compromisso para IPSS Amigas do Envelhecimento Ativo CONFEDERAÇÃO NACIONAL INSTITUIÇÕES DE SOLIDARIEDADE

Dúvidas e Esclarecimentos sobre a Proposta de Criação da RDS do Mato Verdinho/MT

Uma iniciativa que pretende RECONHECER AS BOAS PRÁTICAS em projetos que promovam o desenvolvimento sustentável.

Por que Projetos Sociais?

Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento. ( ) ENED Plano de Acção

Trabalho, Mudanças Climáticas e as Conferências do Clima: subsídios para as negociações da UGT na COP-21 Resumo Executivo

Reflexões sobre o Quinto relatório de avaliação do IPCC constatações e complexidades Natal outubro CAROLINA DUBEUX carolina@ppe.ufrj.

Política Ambiental das Empresas Eletrobras

ROCK IN RIO LISBOA Princípios de desenvolvimento sustentável Declaração de propósitos e valores Política de Sustentabilidade do evento

PLANO DE AÇÃO E MELHORIA DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE ALPENDORADA 1. INTRODUÇÃO

Plan International e IIDAC com recursos do Fundo União Europeia

Programa Operacional Regional Alentejo 2014/2020

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1373/XII/4ª

Programa Operacional Regional do Algarve

A Declaração Política de Recife sobre Recursos Humanos para a Saúde: compromissos renovados para a cobertura universal de saúde

DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA JUVENTUDE SOCIALISTA AÇORES

IX Colóquio Os Direitos Humanos na Ordem do Dia: Jovens e Desenvolvimento - Desafio Global. Grupo Parlamentar Português sobre População e

Presente à reunião proposta do Vereador José Maria Magalhães do seguinte teor:

Transcrição:

UNESCO: RECOMENDAÇÕES SOBRE A PAISAGEM HISTÓRICA URBANA PREÂMBULO Tendo em conta que as áreas históricas urbanas estão entre as mais abundantes e diversas manifestações do nosso património cultural comum, moldadas por gerações e constituindo um testemunho-chave dos esforços e aspirações da humanidade através do espaço e do tempo, Considerando igualmente que o património urbano é, para a humanidade, um bem social, cultural e económico, definido por uma estratificação histórica de valores que foram produzidos por culturas sucessivas existentes e um acumular de tradições e experiências, reconhecidas como tal na sua diversidade, Tendo também em conta que a urbanização está a evoluir a uma escala nunca vista na história da humanidade e que, em todo o mundo, este facto está na base da mudança e do crescimento socioeconómico, que deveria ser aproveitado a nível local, nacional, regional e internacional, Reconhecendo a natureza dinâmica das cidades, Notando, no entanto, que o desenvolvimento rápido e muitas vezes descontrolado está a transformar as áreas urbanas e a sua paisagem, o que poderá provocar a fragmentação e deterioração do património urbano com profundo impacto nos valores da comunidade, em todo o mundo, Considerando, assim, que para apoiar a proteção do património natural e cultural, deverá ser colocada a tónica na integração das estratégias de conservação, gestão e planeamento da área histórica urbana nos processos de desenvolvimentos locais e planeamento urbano, tais como a arquitetura contemporânea e desenvolvimento de infraestruturas, para os quais a aplicação de uma abordagem paisagística iria ajudar a manter a identidade urbana, Considerando que o princípio do desenvolvimento sustentável prevê a preservação dos recursos existentes, a proteção ativa do património humano e a sua gestão sustentável se revestem como uma condição sine qua non do desenvolvimento, Lembrando que existe um corpus de documentação normativa, incluindo convenções, recomendações e cartas, versando o tema da conservação das áreas históricas 1, e que todo este corpus permanece válido, 1 Em particular, a Convenção da UNESCO de 1972 sobre a Proteção do Património Mundial Cultural e Natural, a Convenção da UNESCO de 2005 sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, a Recomendação da UNESCO de 1962 sobre a Salvaguarda da Beleza e do Carácter das Paisagens e Locais, a Recomendação da UNESCO de 1968 sobre a Preservação de Bens Culturais Ameaçados por Obras Públicas ou Privadas, a Recomendação da UNESCO de 1972 sobre a Proteção, a nível nacional, do Património Cultural e Natural, a Recomendação da UNESCO de 1976 sobre a Salvaguarda e Papel Contemporâneo das Áreas Históricas; a Carta Internacional ICOMOS para a Conservação e Restauração de Monumentos e Sítios (Carta de Veneza) de 1964, Carta Internacional ICOMOS para Jardins Históricos (Carta de Florença) de 1982, e a Carta do ICOMOS para a Conservação das Cidades Históricas e Áreas Urbanas (Carta de Washington) de 1987, a Declaração ICOMOS Xi'an de 2005, bem como o Memorando de Viena de 2005.

Lembrando que, no âmbito dos processos relativos às alterações demográficas, à liberalização do mercado global e à descentralização, bem como do turismo de massas, da exploração comercial do património e das alterações climáticas, as condições mudaram e as cidades estão sujeitas a pressões de desenvolvimento e desafios que não enfrentavam aquando da adoção da última recomendação da UNESCO acerca das áreas históricas em 1976 (i.e. a Recomendação acerca da Salvaguarda e Papel Contemporâneo das Áreas Históricas), Considerando ainda a evolução dos conceitos de cultura e património e das abordagens à sua gestão, através da ação concertada de iniciativas locais e reuniões internacionais 2, que têm sido úteis na orientação de políticas e práticas em todo o mundo, Na tentativa de complementar e expandir a aplicação das normas e princípios elaborados nos instrumentos internacionais existentes, Considerando as propostas no âmbito da paisagem urbana histórica como uma abordagem à preservação do património urbano, que surge na agenda da sessão sob o item 8.1, Tendo decidido na sua trigésima quinta sessão que esta questão deveria ser abordada através de uma Recomendação dos Estados-Membros, Adota-se a presente Recomendação. A Conferência Geral recomenda aos Estados-Membros que adotem as medidas e o enquadramento legislativo e institucionais adequados, com vista a aplicar os princípios e normas estabelecidos na presente Recomendação nos territórios sob sua jurisdição. A Conferência Geral recomenda aos Estados-Membros que partilhem esta Recomendação com as autoridades locais, nacionais e regionais e as instituições, serviços ou organismos e associações relacionados com a salvaguarda, conservação e gestão de áreas urbanas históricas e espaços geográficos mais abrangentes. INTRODUÇÃO 1. Assistimos, nos dias de hoje, à maior migração humana da história. Hoje, mais de metade da população mundial reside em áreas urbanas. As áreas urbanas são cada vez mais importantes como motores de crescimento e como centros de inovação e criatividade; proporcionam oportunidades de emprego e educação e vão ao encontro das crescentes necessidades e aspirações da população. 2. No entanto, uma urbanização rápida e descontrolada pode frequentemente resultar em fragmentação social e espacial e numa drástica deterioração da qualidade do ambiente urbano e das áreas rurais circundantes. De facto, isto pode dever-se a uma excessiva densidade de construção, edifícios padronizados e monótonos, perda do espaço público e outras comodidades, infraestruturas inadequadas, pobreza debilitante, isolamento social, e um risco crescente de desastres relacionados com o clima. 3. O património urbano, incluindo seus componentes tangíveis e intangíveis, constitui um recurso fundamental na melhoria da habitabilidade das áreas urbanas e promove o desenvolvimento económico e a coesão social num ambiente global em constante mudança. Como o futuro da humanidade depende do planeamento e gestão eficazes de recursos, a conservação tornou-se uma estratégia para alcançar o equilíbrio entre crescimento urbano e qualidade de vida numa base sustentável. 2 Particularmente, a Conferência Mundial de 1982 sobre Políticas Culturais na Cidade do México, a Reunião Nara sobre a Autenticidade de 1994, a cimeira de 1995 da Comissão Mundial sobre Cultura e Desenvolvimento, a Conferência HABITAT II em Istambul de 1996, com a ratificação da Agenda 21, a Conferência Intergovernamental da UNESCO sobre Políticas Culturais para o Desenvolvimento de 1998, em Estocolmo, a Conferência Mundial conjunta Banco Mundial-UNESCO de 1998 sobre a Cultura no Desenvolvimento Sustentável - Investir em Dotes Culturais e Naturais, a Conferência Internacional de 2005 sobre o Património Mundial e Arquitetura Contemporânea em Viena, a Assembleia Geral ICOMOS sobre o espaço de Monumentos e Locais, em Xi'an, em 2005 e a Assembleia-Geral ICOMOS sobre o Espírito do Local, no Québec, em 2008.

4. Nos últimos cinquenta anos, a conservação do património urbano tem surgido como um importante sector da política pública em todo o mundo. É uma resposta à necessidade de preservar os valores partilhados e beneficiar do legado da história. No entanto, a mudança de ênfase dos monumentos arquitetónicos em direção, sobretudo, a um reconhecimento mais amplo da importância dos processos sociais, culturais e económicos na conservação dos valores urbanos deve ser acompanhada de uma propensão para a adaptação das políticas existentes e criação de novas ferramentas no intuito de concretizar esta visão. 5. Esta Recomendação está orientada para a necessidade de uma melhor integração e enquadramento das estratégias de conservação do património urbano no âmbito dos objetivos mais abrangentes do desenvolvimento sustentável global, a fim de apoiar ações públicas e privadas que visam preservar e melhorar a qualidade do ambiente humano. Sugere uma abordagem paisagística para a identificação, conservação e gestão de áreas históricas dentro dos seus contextos urbanos mais amplos, considerando as inter-relações das suas formas físicas, a sua organização e conexão espacial, as suas características e espaços naturais, e os seus valores sociais, culturais e económicos. 6. Esta abordagem tenta dar resposta às questões políticas, de governação e gestão, envolvendo uma variedade de intervenientes, incluindo agentes públicos e privados a nível local, nacional, regional, internacional, no processo de desenvolvimento urbano. 7. Esta Recomendação baseia-se nas quatro Recomendações anteriores da UNESCO relacionadas com a preservação do património, reconhecendo a importância e a validade de seus conceitos e princípios na história e prática da conservação. Além disso, as convenções e cartas de conservação modernas abordam as várias dimensões do património cultural e natural e constituem os fundamentos da presente Recomendação. I. DEFINIÇÃO 8. A paisagem urbana histórica é a área urbana compreendida como o resultado de uma estratificação histórica dos valores e atributos culturais e naturais, que se estende além da noção de "centro histórico" ou "ensemble" para incluir o contexto urbano mais amplo e a sua localização geográfica. 9. Este contexto mais amplo inclui nomeadamente a topografia do local, a geomorfologia, hidrologia e recursos naturais; o seu ambiente construído, tanto histórico como contemporâneo; as suas infraestruturas acima e abaixo do nível do solo; os seus espaços abertos e jardins, os seus padrões de uso da terra e organização espacial; perceções e relações visuais; bem como todos os outros elementos da estrutura urbana. Também inclui práticas e valores sociais e culturais, processos económicos e as dimensões intangíveis do património relacionado com a diversidade e identidade. 10. Esta definição cria a base para uma abordagem abrangente e integrada para a identificação, avaliação, conservação e gestão de paisagens urbanas históricas dentro de um quadro global de desenvolvimento sustentável. 11. A abordagem da paisagem urbana histórica visa preservar a qualidade do ambiente humano, melhorando o uso produtivo e sustentável dos espaços urbanos, reconhecendo seu carácter dinâmico e promovendo a diversidade social e funcional. Integra os objetivos de conservação do património urbano e os de desenvolvimento social e económico. Está enraizada num relacionamento equilibrado e sustentável entre o ambiente urbano e natural, entre as necessidades das gerações presentes e futuras e o legado do passado. 12. A abordagem da paisagem urbana histórica considera a diversidade cultural e a criatividade como ativos fundamentais para o desenvolvimento humano, social e económico e oferece ferramentas para gerir as transformações físicas e sociais e garantir que as

intervenções contemporâneas estão harmoniosamente integradas com o património num cenário histórico e levam em consideração os contextos regionais. 13. A abordagem da paisagem urbana histórica inscreve-se na esteira das tradições e das perceções das comunidades locais, respeitando os valores das comunidades nacionais e internacionais. II. DESAFIOS E OPORTUNIDADES DA PAISAGEM URBANA HISTÓRICA 14. As recomendações da UNESCO reconhecem o papel importante das áreas históricas nas sociedades modernas. Também identificam uma série de ameaças específicas para a conservação de áreas históricas e oferecem princípios gerais, políticas e diretrizes para fazer face a tais desafios. 15. A abordagem da paisagem urbana histórica reflete a evolução significativa da disciplina e da prática da conservação do património urbano nas últimas décadas, permitindo que os decisores políticos e gestores encarem os novos desafios e oportunidades de uma forma mais eficaz. A abordagem da paisagem urbana histórica apoia as comunidades na sua busca de desenvolvimento e adaptação, mantendo as características e os valores ligados à sua história, memória coletiva e meio ambiente. 16. Nas últimas décadas, devido ao aumento acentuado da população urbana no mundo, a escala e a velocidade do desenvolvimento e a economia em mudança, as povoações urbanas e as suas áreas históricas tornaram-se centros e motores de crescimento económico em muitas regiões do mundo, e têm assumido um novo papel na vida cultural e social. Como resultado, também estão sob um vasto conjunto de novas pressões, incluindo: Urbanização e Globalização 17. O crescimento urbano está a transformar a essência de muitas áreas urbanas históricas. Os processos globais têm um profundo impacto sobre os valores atribuídos pelas comunidades às áreas urbanas e o seu espaço, e sobre as perceções e realidades dos habitantes e utilizadores. Por outro lado, a urbanização oferece oportunidades económicas, sociais e culturais que podem valorizar a qualidade de vida e traço tradicional das áreas urbanas; por outro lado, as alterações não-geridas na densidade urbana e no crescimento podem determinar o sentido de espaço, integridade do tecido urbano, e a identidade das comunidades. Algumas áreas urbanas históricas estão a perder as suas funcionalidades, papel tradicional e população. Uma abordagem sob a perspetiva da paisagem urbana histórica pode ajudar a gerir e atenuar esses impactos. Desenvolvimento 18. Muitos processos económicos oferecem formas e meios para atenuar a pobreza urbana e promover o desenvolvimento social e humano. A maior disponibilidade de inovações, tais como as tecnologias da informação e práticas sustentáveis de planeamento, conceção e construção, pode melhorar as áreas urbanas, otimizando, assim, a qualidade de vida. Quando gerida de forma eficiente através da abordagem de paisagem urbana histórica, novas funções, como serviços e turismo, são importantes iniciativas económicas que podem contribuir para o bem-estar das comunidades e para a conservação de áreas urbanas históricas e sua herança cultural, assegurando em simultâneo a diversidade económica e social e a função residencial. O insucesso na otimização destas oportunidades irá originar cidades insustentáveis e inviáveis, tal como a sua implementação de forma inadequada e imprópria irá resultar na destruição de bens patrimoniais e em perdas insubstituíveis para as gerações futuras.

Ambiente 19. As povoações têm-se constantemente adaptado às mudanças climáticas e ambientais, incluindo aquelas resultantes de desastres. No entanto, a intensidade e a velocidade das mudanças atuais constituem um desafio para os nossos complexos ambientes urbanos. A preocupação crescente com o ambiente, particularmente com o consumo de água e energia, exige abordagens e novos modelos para a vida urbana, com base em políticas ecologicamente sensíveis e práticas destinadas ao reforço da sustentabilidade e da qualidade de vida urbana. Muitas dessas iniciativas, no entanto, devem integrar o património natural e cultural como recursos para o desenvolvimento sustentável. 20. As alterações às áreas urbanas históricas podem igualmente resultar de desastres repentinos e conflitos armados. Estes podem ser de curta duração, mas ter efeitos duradouros. Uma abordagem sob a perspetiva da paisagem urbana histórica pode ajudar a gerir e atenuar esses impactos. III. POLÍTICAS 21. As políticas modernas de conservação urbana, que se refletem nas recomendações e cartas internacionais, criaram condições para a preservação das áreas urbanas históricas. No entanto, os desafios presentes e futuros exigem a definição e a implementação de uma nova geração de políticas públicas que identifiquem e protejam os estratos históricos e o equilíbrio de valores culturais e naturais em ambientes urbanos. 22. A conservação do património urbano deve ser integrada no planeamento geral de políticas e práticas e todas aquelas relacionadas com o contexto urbano mais abrangente. As políticas devem oferecer mecanismos para encontrar o equilíbrio entre conservação e sustentabilidade a curto e longo prazo. Deve colocar-se particular ênfase na integração harmoniosa entre o tecido histórico urbano e as intervenções contemporâneas. Em particular, as responsabilidades dos diferentes intervenientes são as seguintes: a) Os Estados-Membros devem integrar estratégias de conservação do património urbano nas políticas e agendas de desenvolvimento nacional de acordo com a abordagem da paisagem urbana histórica. Neste enquadramento, as autoridades locais devem preparar planos de desenvolvimento urbano, tendo em conta os valores da área, incluindo a paisagem e outros valores patrimoniais, e os recursos associados. b) Os stakeholders públicos e privados devem cooperar, inter alia, por meio de parcerias para garantir a aplicação bem-sucedida da abordagem da paisagem urbana histórica. c) As organizações internacionais a braços com processos de desenvolvimento sustentável devem integrar a abordagem da paisagem urbana histórica nas suas estratégias, planos e operações. d) As organizações não-governamentais nacionais e internacionais devem participar no desenvolvimento e divulgação de ferramentas e melhores práticas para a implementação da abordagem da paisagem urbana histórica. 23. Todos os níveis de gestão - local, nacional / federal, regional -, cientes da sua responsabilidade, devem contribuir para a definição, elaboração, implementação e avaliação das políticas de conservação do património urbano. Estas políticas devem basear-se numa abordagem participativa de todos os intervenientes e deve ser coordenada numa perspectiva tanto institucional como sectorial. IV. FERRAMENTAS

24. A abordagem baseada na paisagem urbana histórica implica a aplicação de um conjunto de ferramentas tradicionais e inovadoras devidamente adaptadas aos contextos locais. Algumas destas ferramentas, que necessitam de ser desenvolvidas como parte do processo envolvendo os diversos intervenientes, poderão incluir: a) As ferramentas de compromisso cívico devem incluir uma combinação diversificada de intervenientes e capacitá-los para identificar valores fundamentais nas suas áreas urbanas, desenvolver contextos que reflitam a sua diversidade, estabelecer metas e estabelecer ações para salvaguardar o seu património e promover o desenvolvimento sustentável. Estas ferramentas, que são parte integrante da dinâmica de gestão urbana, devem facilitar o diálogo intercultural através da aprendizagem das comunidades acerca das suas histórias, tradições, valores, necessidades e aspirações e através da mediação e negociação entre conflitos de interesses e grupos. b) As ferramentas de conhecimento e planeamento deverão ajudar a proteger a integridade e autenticidade dos atributos do património urbano. Deverão igualmente permitir o reconhecimento da importância cultural e diversidade e efetuar a monitorização e gestão da mudança para melhorar a qualidade de vida e do espaço urbano. Estas ferramentas incluiriam a documentação e mapeamento das características culturais e naturais. Deveriam ser utilizadas avaliações de impacto ambiental, patrimonial e social para suportar e facilitar os processos de tomada de decisão num enquadramento de desenvolvimento sustentável. c) Os sistemas de regulação deverão refletir as condições locais e podem incluir medidas legislativas e regulamentares visando a conservação e gestão dos atributos tangíveis e intangíveis do património urbano, incluindo os seus valores sociais, ambientais e culturais. Os sistemas tradicionais e regulares devem ser reconhecidos e reforçados, na medida do necessário. d) As ferramentas financeiras deveriam criar capacidades e apoiar o desenvolvimento inovador e gerador de receitas, enraizado na tradição. Para além dos fundos governamentais e globais de agências internacionais, as ferramentas financeiras devem ser implementadas de um modo eficaz para fomentar investimentos privados a nível local. O microcrédito e outras formas de financiamento flexível para apoiar as empresas locais, bem como uma variedade de modelos de parcerias, também são fundamentais para tornar a abordagem da paisagem urbana histórica financeiramente sustentável. V. CAPACITAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO 25. A capacitação deve envolver os principais intervenientes: comunidades, decisores, e profissionais e gestores, a fim de promover a compreensão da abordagem da paisagem urbana histórica e a sua implementação. A capacitação eficaz depende de uma colaboração ativa destes principais intervenientes, com o objetivo de adaptar a aplicação da presente Recomendação aos contextos regionais para definir e aperfeiçoar as estratégias e objetivos locais, quadros de ação e esquemas de mobilização de recursos. 26. A investigação deve orientar-se para a complexa estratificação das povoações urbanas, de modo a identificar os valores, compreender o seu significado para as comunidades e apresentá-los aos visitantes de uma forma abrangente. As instituições académicas e universitárias e outros centros de investigação devem ser encorajados a desenvolver pesquisas científicas sobre aspetos da abordagem da paisagem urbana histórica e cooperar aos níveis local, nacional, regional e internacional. É essencial para documentar o estado das áreas urbanas e a sua evolução, para facilitar a avaliação das propostas de mudança e para melhorar as competências e procedimentos de proteção e de gestão. 27. Incentivar o uso das tecnologias da informação e comunicação para documentar, compreender e apresentar a estratificação complexa das áreas urbanas e dos seus

constituintes. A recolha e análise destes dados são uma parte essencial do conhecimento acerca das áreas urbanas. Para comunicar com todos os sectores da sociedade, é particularmente importante chegar aos jovens e a todos os grupos sub-representados, a fim de incentivar a sua participação. IV. COOPERAÇÃO INTERNACIONAL 28. Os Estados-Membros e organizações internacionais, governamentais e nãogovernamentais, devem facilitar a compreensão do público e o envolvimento na implementação da abordagem da paisagem urbana histórica, pela difusão de boas práticas e lições aprendidas a partir de diferentes locais do mundo, a fim de fortalecer a rede de partilha de conhecimentos e capacitação. 29. Os Estados-Membros deveriam promover uma cooperação multinacional entre as autoridades locais. 30. Agências internacionais de desenvolvimento e de cooperação dos Estados-Membros, bem como organizações não-governamentais e fundações, devem ser encorajados a desenvolver metodologias que levem em conta a abordagem de paisagem urbana histórica e a harmonizá-las com os seus programas de assistência e projetos relativos às áreas urbanas.