SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL MEC SETEC INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MATO GROSSO DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO SHEILA SIQUEIRA DA SILVA A LEITURA COMO FERRAMENTA PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA DA LEITURA PARA AFERIÇÃO ÀS PRÁTICAS EMANCIPATÓRIAS E CRIATIVAS Cuiabá MT Outubro 2009
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MATO GROSSO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO LATU SENSU A DISTÂNCIA: EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA INCLUSIVA SHEILA SIQUEIRA DA SILVA A LEITURA COMO FERRAMENTA PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA DA LEITURA PARA AFERIÇÃO ÀS PRÁTICAS EMANCIPATÓRIAS E CRIATIVAS Cuiabá MT Outubro 2009
Ficha Catalográfica Silva, Sheila Siqueira da A Leitura como Ferramenta para o Exercício Da Cidadania Da Leitura para Aferição às Práticas Emancipatórias e Criativas Cuiabá -MT, 2009 Total de folhas do TCC: 55 Campos, Carlos Roberto Pires Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso Trabalho de Conclusão Curso Pós-Graduação Latu Sensu a distância em Educação Profissional e Tecnológica Inclusiva
SHEILA SIQUEIRA DA SILVA A LEITURA COMO FERRAMENTA PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA DA LEITURA PARA AFERIÇÃO ÀS PRÁTICAS EMANCIPATÓRIAS E CRIATIVAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Pesquisa e Pós-Graduação do Curso de Especialização em Educação profissional e Tecnológica Inclusiva, do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso, como exigência para a obtenção do título de Especialista. Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Pires Campos Cuiabá - MT Outubro 2009
SHEILA SIQUEIRA DA SILVA A LEITURA COMO FERRAMENTA PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA DA LEITURA PARA AFERIÇÃO ÀS PRÁTICAS EMANCIPATÓRIAS E CRIATIVAS Trabalho de Conclusão de Curso Especialização em Educação Profissional e Tecnológica Inclusiva, submetido à Banca Examinadora composta pelos Professores do Programa de Pós-Graduação Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Especialista. Aprovado em: outubro de 2009 Prof. Dr. Carlos Roberto Pires Campos Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo Orientador Prof. MSc. Mário Jorge de Moura Zuany Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo Membro da Banca Prof. Prof.ª Esp. Maria Aparecida Silva de Souza Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo Membro da Banca Cuiabá - MT Outubro de 2009
DEDICATÓRIA Dedico aos alunos do primeiro módulo do Curso Técnico Subsequente em Mineração, turma 2009/2.
AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, pela paciência e persistência, em todo o percurso da pesquisa, além das dicas preciosas e as sábias intervenções. Aos gestores e coordenadores da Pós-Graduação, pelo brilhante e inovador trabalho na área de educação inclusiva. E aos colegas de trabalho, pela compreensão e apoio durante o percurso da pesquisa.
"Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem livros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever - inclusive a sua própria história. Bill Gates
RESUMO Atualmente a grande maioria das pessoas acredita que a leitura só faz bem. Mas, o brasileiro sabe ler e escrever? O que os déficits educacionais da população representam em termos de exclusão social? A escola está conseguindo cumprir a função de garantir a todos o desenvolvimento de competências básicas necessárias ao exercício da cidadania? A história da educação permite constatar que, em todas as épocas, a escola foi seletiva, um privilégio de poucos. As sociedades sempre excluíram aqueles considerados inferiores. Pobres, mulheres, escravos, imigrantes, deficientes e outros tiveram seu acesso negado à educação por serem considerados inaptos ou destinados a comporem, na divisão social do trabalho, a massa encarregada somente da ação, sendo considerados incapazes de refletir. Serve para o desenvolvimento social do indivíduo a prática da leitura, requisito fundamental para o desenvolvimento de habilidades sociais, proporcionando-lhe melhor entendimento de seu meio e de seus pares, na construção de sua identidade e no convívio com o diferente. A pesquisa descritiva investigou os hábitos de leitura e a forma como se processam as atividades de leituras para alunos de um curso técnico na modalidade concomitante de uma escola pública federal do sul do Estado do Espírito Santo. Com este trabalho, pretendemos contribuir para uma reflexão acerca da importância do desenvolvimento das habilidades de leitura, por meio de uma proposta de educação que vise à participação social, com vistas a favorecer aos alunos o exercício de seus direitos, atuando efetivamente da sociedade, melhorando seu nível educativo, fortalecendo seus valores democráticos e tendo respeitada sua diversidade cultural. Palavras-chave: práticas de leitura; letramento múltiplo; cidadania
ABSTRACT Nowadays, it is thought by most people that reading is something really favorable. However, the question is: do the Brazilians know how to read and write? Concerning to social exclusion, what do the educational deficits of the population represent? Has the school been achieving its role of assuring everyone the development of basic competences necessary to citizenship? The history of Education allows us to conclude that in all times the school was selective, a privilege for a few ones. Society has always excluded those considered inferior people. The poor ones, women, slaves, immigrants, handicapped and others had their excess to education denied by being considered unable or people who did not deserve to become part of society. The reading practice is a fundamental practice for people s development of social abilities, providing them a better understanding about their environment and about their similar during their identity formation and their living with what is different. The descriptive research has investigated the reading habits and the way reading activities are performed by students of a technical course in the concomitant modality in a federal public school in the State of Espírito Santo. By this work, we intend, through an educational proposal which focuses the social participation, to contribute to a reflection about the importance of the students reading and interpretation abilities development in order to favor them concerning their rights exercise. In this way, the students can effectively act in society, improving their educational level, strengthening their democratic values and making them respected in despite of their cultural differences. Key words: reading practices; multiple literacy, citizenship.
LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 Gênero dos Alunos Pesquisados 36 Gráfico 2 Faixa Etária dos Alunos Pesquisados 37 Gráfico 3 Ocupação dos Alunos Pesquisados 37 Gráfico 4 Finalidade da Leitura para os Alunos Pesquisados 38 Gráfico 5 Tipo de Material Lido pelos Alunos Pesquisados 39 Gráfico 6 Frequência de Leitura de Revistas pelos Alunos Pesquisados 40 Gráfico 7 Tipo de Revistas Lidas pelos Alunos Pesquisados 40 Gráfico 8 Frequência de Leitura de Jornal pelos Alunos Pesquisados 41 Gráfico 9 Partes do Jornal Lidos pelos Alunos Pesquisados 41 Gráfico 10 Frequência de Leitura de Livros pelos Alunos Pesquisados 42 Gráfico 11 Tipo de Livros Lidos pelos Alunos Pesquisados 42 Gráfico 12 Tipo de Atividade mais Atrativa para os Alunos Pesquisados 43
SUMÁRIO INTRODUÇÃO 12 CAPÍTULO I 16 1.1 Fragilidades de leitura e escrita 16 1.2 Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (Inaf) 2001 23 CAPÍTULO II METODOLOGIA 33 CAPÍTULO III RESULTADOS E DISCUSSÃO 36 CONCLUSÃO 47 REFERÊNCIAS 48 APÊNDICES 50
12 INTRODUÇÃO Nem sempre as práticas de leitura gozaram de significativa relevância, para Zilberman (2001 p.35), por muito tempo, o exercício da leitura foi considerado atividade condenada, no começo da era moderna, quando a prática da leitura começou a se expandir, foi considerada uma corporificação do demônio. Dom Quixote perdeu o juízo por muito ler livros de cavalaria e bem antes de Cervantes, com os trágicos gregos, já se falava dos males da leitura. Hoje, a grande maioria acredita que a leitura só faz bem. Mas, o brasileiro sabe ler e escrever? O que os déficits educacionais da população representam em termos de exclusão social? A escola está conseguindo cumprir a função de garantir a todos o desenvolvimento de competências básicas necessária ao exercício da cidadania? Ao percorrer a história da educação, podemos constatar que, em todas as épocas, a escola foi seletiva, configurando-se como um privilégio de poucos. As sociedades sempre excluíram aqueles considerados inferiores. Pobres, mulheres, escravos, imigrantes, deficientes e outros tiveram seu acesso negado à educação por serem considerados inaptos ou não merecedores de fazer parte da sociedade. Foram excluídos, também, aqueles que abandonaram cedo a escola, por apresentarem dificuldades em acompanhar o modelo de escola implantado, por serem indisciplinados ou por necessidade de trabalhar para ajudar no sustento da família. O que se verifica, pois, é a primazia de uma escola antidemocrática e excludente. Só muito recentemente tem havido maior empenho em universalizar a educação, inicialmente pela defesa da integração dos diferentes e, mais recentemente, pela sua inclusão. E favorecer a inclusão não significa simplesmente discutir a igualdade de direitos, mas destacar o respeito à diversidade. Há um grande caminho a ser percorrido e a formação de leitores pode ser uma fonte de inteligência, de criatividade, de poder de intervenção na
13 sociedade, pois livros comidos com prazer são livros a ser ruminados pelo resto da vida (RUBEM ALVES, 2006, p.60). Os problemas relacionados à leitura e à escrita se relacionam a outras questões sociais, como a má distribuição de renda, déficits de escolarização, falta de recursos materiais e humanos nas escolas, bibliotecas mal equipadas, dificuldade no acesso à internet, entre outros. Promover o letramento significa associar leitura e escrita a práticas sociais que tenham sentidos para aqueles que as utilizam, desvendando sua diversidade, suas dimensões políticas e implicações ideológicas, além de pressupor níveis de domínio das práticas que exigem essas habilidades. Saber ler e escrever não significa, pois, uma questão de tudo ou nada, mas uma competência que pode ser desenvolvida em diversos níveis. A convivência com a música, a pintura a fotografia, o cinema, com outras formas de utilização do som e com as imagens, assim como a convivência com as linguagens artificiais poderiam nos apontar para uma inserção no universo simbólico que não é a que temos estabelecido na escola. Essas linguagens não são todas alternativas, elas se articulam. E é essa articulação que deveria ser explorada no ensino da leitura, quando temos como objetivo desenvolver a capacidade de compreensão do aluno. A leitura e a escrita devem ser incentivadas em todo o ambiente educacional na busca de uma educação para todos, uma educação preocupada com a formação integral do indivíduo respeitando sua cultura, ensejando o desenvolvimento de letramentos múltiplos, de leituras que possibilitem maior atuação no social. A pesquisa parte do pressuposto de que a prática da leitura é fator fundamental para o desenvolvimento de habilidades sociais do indivíduo, proporcionando-lhe um melhor entendimento de seu meio e de seus pares, na construção de sua identidade e no convívio com o diferente. Assim, o trabalho possui por objetivo geral a intenção de contribuir para uma reflexão acerca da importância do desenvolvimento das habilidades de leitura e interpretação dos alunos por meio de uma proposta de educação que vise à
14 participação social, com vistas a favorecer-lhes o exercício de seus direitos, capacitando-os a participar efetivamente da sociedade, melhorando seu nível educativo, fortalecendo seus valores democráticos e fazendo ter suas diversidade cultural respeitada. Seguidas deste objetivo geral, ações cognitivas foram fixadas, com vistas a permitirem que o objetivo geral fosse alcançado. Assim, especificamente, a pesquisa busca, ainda, demonstrar a relevância das atividades de leitura no espaço escolar, principalmente as que favorecem o desenvolvimento de habilidades sociais. Além desta ação, temos, ainda, como propósito, revelar as práticas de leitura que mais emergem em uma determinada clientela escolar, com vistas a sugerir alternativas possíveis. A pesquisa se justifica porque a leitura e a escrita constituem-se instrumentos indispensáveis na época contemporânea para que o ser humano possa desenvolver suas capacidades, seja no nível individual, seja no âmbito coletivo. Seu incentivo é fator fundamental na formação dos jovens, para o desenvolvimento de sua consciência crítica, para compreensão e intervenção no mundo em que vivem e para aguçar sua curiosidade, criatividade e participação. Uma instituição pública federal do sul do estado do Espírito Santo oferece Cursos Técnicos Pós-Médio e tem recebido alunos que apresentam elevado grau de dificuldade de escrever, de se expressar e de interpretar textos. Nas Reuniões Pedagógicas a principal constatação dos professores é que grande parte dos alunos não têm uma base escolar que lhes permita acompanhar o andamento das disciplinas e, consequentemente, acabam por não adquirirem as competências exigidas para avançarem no curso. O elevado número de reprovações no primeiro módulo do curso de Mineração, eleito para ser analisado nesta pesquisa por seu caráter de inovação, leva muitos alunos à evasão, e os que persistem, ou desistem no próximo módulo ou levam o dobro do tempo mínimo para concluir o curso. A desistência, pelo que foi observado, leva as turmas a se formarem com menos de cinquenta por cento
15 dos ingressantes. São vagas que ficam ociosas ao tempo que poderiam atender à comunidade. Assim, a pesquisa pretende, ainda, investigar nessa população em que sentido um Projeto no âmbito da leitura e cidadania contribuirá para o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita dos alunos, e consequentemente para o desenvolvimento de sua criatividade e criticidade, aumentando-lhes o poder de intervenção na sociedade, tornando-os verdadeiros atores sociais.
16 CAPÍTULO I 1.1 Fragilidades de leitura e escrita É lugar comum a afirmação de que no quadro educacional brasileiro as fragilidades de leitura e escrita ultrapassam os limites do possível. No rol de atores desse problema muitas vezes não estão somente os discentes, vez que entre os educadores, nem sempre, a prática de leitura e escrita é atividade usual. A falta de hábito de leitura não decorre só de uma cultura de tradição oral, nesse intrincado poço escuro jazem outras questões que se pretendem abordar neste estudo. Vários autores focalizam, em suas pesquisas, a situação da leitura e da escrita nas escolas brasileiras, buscando desenhar um painel das diferentes ordens de problemas manifestados nessa área. Um interessante estudo propõe Silva (2007) em que apresenta parte de sua pesquisa defendida como dissertação de mestrado sob o título A escolarização do leitor: a didática da destruição da leitura, feita com alunos da 8ª série da rede pública. A autora calcula que se a partir da 2ª série se iniciasse uma prática de leitura bimestral com os alunos, no final da 8ª série, somar-se-ia um mínimo de 24 leituras realizadas. Porém, dos 302 depoimentos tomados para sua pesquisa, menos de 50 % leram mais do que 10 livros, o restante ficou na faixa de 1 a 10 livros. Esses números acusam tanto a inexistência ou a precariedade de livros de leitura na escola quanto o constante adiamento da leitura de livros para as últimas séries do ensino fundamental. A partir de sua pesquisa, a autora constatou, ainda, que a grande maioria das obras lidas foram escritas no final do século XIX e início do XX, leituras que se repetem ano após ano, nas escolas, num período em que houve uma verdadeira explosão da ficção destinada ao público infanto-juvenil no Brasil. (p.84) A pesquisa aponta dois motivos para a escolha dos clássicos. O primeiro por serem livros que a maioria dos professores pesquisados já leu, já conhece e, portanto, não significam risco algum para eles, e o segundo por ser o livro adequado pois acreditam poder seriar e graduar os problemas, as realidades, as fantasias e a leitura dos alunos. (p.86) Conclui a autora que estes motivos são
17 preocupantes, pois além de confirmarem a habitual deficiência nos hábitos de leitura, servem como exemplo de certo autoritarismo e da burocracia que permeiam as relações sócio-educativas. A análise de Silva (2007) também é indicadora de um conformismo didático de estratégias aparentemente bem sucedidas e supostamente criativas. Em outro estudo empreendido, há a defesa de que o ensino de Língua Portuguesa deveria centrar-se em leitura e produção de textos e análise linguística, objetivando tentar ultrapassar a artificialidade quanto ao uso da linguagem e possibilitar o domínio efetivo da língua. Geraldi (2007) destaca a diferença entre saber a língua, que significa dominar as habilidades de uso da língua em situações concretas de interação, e saber analisar uma língua, que significa o domínio de conceitos e meta-linguagens. Para o linguista da UNICAMP, na prática escolar, vigora uma atividade linguística artificial a qual torna a relação intersubjetiva ineficaz, porque a simula (p.89), e completa: na prática escolar, porém, o eu é sempre o mesmo; o tu é sempre o mesmo. O sujeito se anula em benefício da função que exerce. Quando o tu-aluno produz linguisticamente, tem sua fala tão marcada pelo euprofessor-escola que sua voz não é voz que fala, mas voz que devolve, reproduz a fala do eu-professor-escola. (GERALDI, 2007 p.89) A aprendizagem de uma língua é dificultada e comprometida por esta artificialidade que, segundo o autor, é comprovada pois na escola não se escrevem textos, produzem-se redação (...); na escola não se leem textos, fazem-se exercícios de interpretação (...); na escola não se faz análise linguística, aplicam-se dados preexistentes. (idem, 2007 p.92) Sendo a leitura um processo de interlocução entre leitor / autor mediado pelo texto. Geraldi (2007) aponta quatro possíveis posturas ante o texto: a leitura como busca de informação, em que o principal motivo da leitura é responder às questões formuladas, ou seja, simulação de leitura; a leitura como estudo do texto, que é mais praticada em outras disciplinas do que nas aulas de língua portuguesa, e que deveriam desenvolver as mais variadas formas de interlocução leitor / texto /
18 autor; a leitura como pretexto, segundo o autor, quase ausente nas aulas de língua portuguesa, pretexto para produção de outros textos, para teatros, ilustrações; e leitura como fruição do texto, como prazer, ler por ler sem o compromisso de uma avaliação, de uma ficha de leitura. Em outra pesquisa, também é constatada a precariedade com que os textos são trabalhados em sala de aula. Lajolo (2007) indica que as atividades com textos literários são superficiais e estão mais associadas à prestação de contas, deveres, tarefas e obrigações do que à real concepção de literatura. Segundo a pesquisadora, o professor explora estes textos como se fossem guardiões de algo sagrado, com o dever de incuti-los em seus alunos. Desta forma, os textos literários tornam-se objetos de desinteresse de um público que não pediu para estar ali, o qual, muito menos, consegue entender a necessidade, ou utilidade, de tal atividade, a não ser a de que o tema ali discutido será cobrado avaliativamente. Apesar de bem intencionado, o professor se transforma num propagandista persuasivo de um produto (p.14) e a atividade literária, desse ponto de vista, corre o risco de perder sua especificidade. Esta situação revela alguns pontos do contexto escolar brasileiro, onde se buscam respostas imediatas para problemas concretos, que reduzem o atrito e aumentam a digestibilidade da aula; mas lidam superficialmente com a questão, resolvendo o problema pelo seu contorno (LAJOLO, 2007 p.14). O fato é que na escola de hoje, se considerado o contexto sócio-político do mercado editorial para produção de livros e manuais didáticos, talvez, o professor seja peça secundária. Assim, o que fazer com o texto literário já que, há alguns anos, deixou de ser de sua competência e passou a ser de editoras que, com seus livros didáticos e paradidáticos, tomaram para si a tarefa de preparar aulas. E num sentido distorcido da palavra motivação, a obra literária pode ser completamente desfigurada na prática escola. Para isso, recorremos às palavra da própria pesquisadora da linguagem:
19 Propor palavras cruzadas, sugerir identificação com uma ou outra personagem, dramatizar textos e similares atividades que manuais escolares propõem, é periférico ao ato de leitura, ao contato solidário e profundo que o texto literário pede. (p.15) Para Marisa Lajolo (2007), alguns encaminhamentos tradicionais no ensino de literatura não devem ser desconsiderados, como: a inscrição do texto na época de sua produção; a inscrição, no texto, do conjunto dos principais juízos críticos que sobre ele se acumulam; a inscrição do e no texto, no e do cotidiano do aluno. O fato é que o desencontro percebido nos dias atuais entre literatura e jovens é mero sintoma de um desencontro maior: entre professores e literatura. Isso, porque não leem e escrevem mal, e isso deve ser superado pois somente superando tais problemas é que na aulas de português poderemos abrir espaço para formas de liberdade e de subversão as quais, em certas condições, instauram-se pelo e no texto literário. (p. 16). Lajolo (2007) propõe uma reflexão sobre o papel da leitura numa sociedade democrática. A modernização crescente do modo de produção do livro possibilitou uma massificação da leitura, deixando de ser uma atividade individual e reflexiva e tornando-se, hoje, em consumo rápido do texto. É a transformação do livro em produto de consumo, que envelhece depressa, que gera constantemente a necessidade de novos textos, e consequentemente de lucro. Hoje, os profissionais da leitura (professores, bibliotecários e animadores culturais) devem tomar consciência de seu papel para que mudanças qualitativas possam ocorrer nos projetos e práticas de leitura. A estes cabe muito mais do que a intermediação e o patrocínio do consumo de textos impressos. Apesar de a literatura ser uma modalidade privilegiada de leitura, ela não é única,. Outras modalidades de leitura desfrutam de maior trânsito social, além de serem responsáveis pelo grau de cidadania de que desfruta o cidadão. Numa sociedade em que a divisão de renda é tão desigual, também é desigual a distribuição de bens culturais, sendo que a participação nestes últimos é mediada pela leitura, que não está ao alcance de todos.
20 Lajolo (2007) constata que ler é essencial, e não só para aqueles que pretendem participar de uma produção cultural mais sofisticada, pois a própria sociedade do consumo utiliza a linguagem escrita para muitos de seus apelos. Ler jornal, procurar emprego, assinar contratos de trabalho e outra infinidade de atividades sociais do dia-a-dia requerem habilidades de leitura que precisam ser considerados num projeto de educação democrática. E afirma também ser fundamental a leitura de textos literários, pois É à literatura, como linguagem e como instituição, que se confiam os diferentes imaginários, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos através dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos, suas utopias. Por isso a literatura é importante no currículo escolar: o cidadão, para exercer plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literária, alfabetizar-se nela, tornar-se usuário competente, mesmo que nunca vá escrever um livro: mas porque precisa ler muitos livros. (p. 106) Os significados das leituras que o sujeito vai acumulando ao longo da vida o tornam capaz de interpretar suas nova leituras, aceitando-as ou recusando-as, por meio de seu diálogo com o texto. Mas alerta marisa Lajolo (2007) que, principalmente sobre os textos literários, pesam a autoridade das inúmeras outras leituras de que o texto foi objeto ao longo da história, cabendo ao professor de leitura e literatura o equilíbrio entre a interpretação livre e a interpretação sancionada pela comunidade intelectual. Para a formação de leitores, cumpre a nós, primeiro, extirpar a representação social de que o brasileiro, e o jovem, não gostam de ler e segundo que os profissionais diretamente ligados à iniciação na leitura sejam bons leitores (perfil não muito comum entre os professores de hoje). A formação de um leitor exige familiaridade com grande número de textos e precisa ocorrer num espaço de maior liberdade possível. Isso significa uma mudança radical nos rumos que norteiam as políticas de leitura atualmente em prática. Sobre a importância das atividades de leitura e escrita nas aulas de história Seffner (2004) lembra que, para alguns, a história só começa após a invenção da escrita e da leitura, o que leva a divisão entre história e pré-história. Antes da
21 invenção da escrita, o saber estava armazenado na mente dos indivíduos vivos, e após a morte destes, o conhecimento se perdia, na maioria dos casos. Surgindo a escrita, o saber passou a ser guardado em textos cujo intérprete teria o domínio do conhecimento. A reflexão traduz o desejo do autor e, por que não, nosso, qual seja, formar um aluno capaz de realizar uma leitura histórica densa do mundo, percebendo a realidade social como construção histórica da humanidade, obra na qual todos têm participação, de forma consciente ou não (p. 109), configurando-se o domínio do código escrito como apenas o início da jornada. É necessário integrar esta habilidade à maneira de o aluno ser e estar no mundo. A atualidade é marcada, principalmente entre os jovens, pela leitura fragmentada, descontinuada. Na maioria dos casos, eles leem para trabalhar, para informar-se e encontram dificuldades na leitura contínua, intensa, na leitura de um livro do início ao fim. Seffner (2004) alerta que a leitura da história deve partir da análise de pressupostos dos quais parte o autor e todo texto é revelador de uma determinada leitura do mundo. A partir desse ponto deve o texto ser posto em discussão. A pesquisa chama a atenção, ainda, para a importância de se discutir com os alunos o papel da capacidade leitora na formação da autonomia e na construção da cidadania. Isto significa dizer que o aluno, ao empreender sua leitura do mundo, deve ter consciência do que está fazendo e das consequências de tal ato. Para o autor, ler é compreender o mundo, e escrever é buscar intervir na sua modificação (p. 115) e deve-se propor atividades para que cada aluno desenvolva sua própria capacidade argumentativa num ambiente de troca de vivências e opiniões. É preciso propiciar a tomada de uma postura frente ao texto, a formação de opiniões fundamentadas deixando de lado a obrigatoriedade de decorar ou de ver o texto como uma verdade absoluta. Devemos formar alunoscidadãos capazes de elaborarem seu projeto de vida, posicionando-se frente às questões polêmicas da vida social, construindo alternativas políticas viáveis e manifestando com clareza a argumentação coerente de suas opiniões (p.116).
22 Compreendendo a leitura desse ponto de vista, vamos autenticar a reflexão de que o sentido de um determinado texto não está nele próprio, mas vai se construindo, na medida em que, com ele, o aluno-leitor interage. Nesse sentido, se a aquisição da linguagem e o desenvolvimento de habilidades de leituras significam também o desenvolvimento do homem como sujeito social que tornará a língua ferramenta dócil para seu uso e da qual ele será sujeito, tanto de sua linguagem quanto de seu texto, apontamos riscos sérios na maneira como o ensino pode estar se comportando, qual seja, a partir de mecanismos sociais suspeitos de perverterem a construção do próprio sujeito. Devemos conceber que a linguagem não existe só para veicular informações, ela existe para demonstrar o lugar que o falante ocupa no social e qual o papel ele ocupa em relação à própria linguagem. Como ponto fundamental deste aporte teórico, elaborado de modo a fornecer subsídios para a discussão dos resultados colhidos na pesquisa de campo, cabe a questão: o que a escola tem feito para proporcionar práticas de letramentos múltiplos, de modo a tornar o aluno sujeito de seu texto, cidadão de suas situações de comunicação? Esta inquietação comandará nossa pesquisa e orientará nossas abordagens.
23 1.2 - Indicador nacional de alfabetismo funcional (Inaf) 2001 O INAF é uma iniciativa do Instituto Paulo Montenegro que objetiva oferecer à sociedade brasileira um conjunto de informações sobre habilidades e práticas relacionadas à leitura, escrita e matemática da população, de modo a fomentar o debate público e subsidiar a formulação de políticas de educação e cultura. As coletas de dados são anuais junto a duas mil pessoas com idade entre quinze e sessenta e quatro anos, residentes em zonas rurais e urbanas em todas as regiões do país. Em 2001, foi realizado o primeiro levantamento de dados do INAF, que abordou habilidades e práticas de leitura e escrita, e em 2002 focalizou as habilidades matemáticas. Assim, a pesquisa continua sendo realizada anualmente alternando entre os dois focos citados com a perspectiva de, a longo prazo, construir um indicador que possibilite a compreensão sobre o analfabetismo e possibilite o monitoramento de sua evolução ou redução. Em análise aos resultados do INAF 2001, vários autores propuseram reflexões acerca do tema letramento por meio de artigos que contribuem para um melhor entendimento das relações da população brasileira com as práticas de leitura e escrita. Alguns destes estudos serão abordados neste trabalho, afim de subsidiar a criação de uma programa de incentivo e disseminação da leitura que contribua para o desenvolvimento do cidadão como ator social. Serra (2004 p. 66) propõe uma análise aos resultados do INAF 2001 a partir da seguinte constatação: não podemos mais permitir que a alfabetização de qualquer brasileiro esteja separada das condições necessárias para sua manutenção: a garantia de acesso aos materiais escritos, por meio de bibliotecas preparadas para exercer a função social de alimentar leitores e escritores da língua que expressa sua história, sua memória, sua cultura. Isso, porque as políticas públicas não contêm, em sua concepção, justificativas e diretrizes claras para a maioria da população, e apesar de teoricamente representarem o resultado de muitas participações, na prática, expressam as ideias dos grupos que detêm a hegemonia política e econômica. E