ELIANA BRAVIM TEIXEIRA NEVES Direito Educacional ESCOLAS DE TEMPO INTEGRAL E O DIREITO À EDUCAÇÃO GARANTIDO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

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Transcrição:

ELIANA BRAVIM TEIXEIRA NEVES Direito Educacional ESCOLAS DE TEMPO INTEGRAL E O DIREITO À EDUCAÇÃO GARANTIDO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS VILA VELHA, 2018

ESCOLAS DE TEMPO INTEGRAL E O DIREITO À EDUCAÇÃO GARANTIDO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS Eliana Bravim elianabravim2011@hotmail.com (27) 99925-4000 Resumo O presente artigo trata da discussão acerca da oferta de Educação em Tempo Integral garantido em legislação nacional. A História da Educação demonstra experiências de oferta de educação nesta modalidade. A atual legislação brasileira, desde a Constituição Federal de 1988, passando pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e o Plano Nacional de Educação, determina a oferta da educação básica em tempo integral, orientando assim, que os Sistemas de Ensino elaborem Políticas Públicas de ampliação de vagas para alunos em tempo integral em suas redes de ensino. Concluise que, ao poder público e à comunidade civil compete observar o cumprimento das normas e planejamentos previstos para implantação das escolas de tempo integral e aos profissionais do Direito Educacional reserva-se a função de contribuir na interpretação e aplicação da Lei neste processo jus-pedagógico de oferta da educação em tempo integral. Escolas de Tempo Integral. Direito à Educação. Políticas Públicas INTRODUÇÃO O problema de investigação que se propõe apresentar este artigo científico encontra-se imbricado na legislação educacional nacional e nas políticas educacionais nacionais. A Educação em Tempo Integral tem se colocado como meta obrigatória a ser implantadas nas redes educacionais, quer seja municipal, quer seja estadual, de acordo com o atual Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005, de 25/06/2014, meta 6). Diante disso, será exposta neste artigo científico uma análise das Politicas Públicas Nacionais que se referem à oferta de escolas de tempo integral. Este artigo científico traz como objetivos a análise da legislação educacional nacional no que se refere à Educação em Tempo Integral, assim como uma avaliação do conceito de Educação em Tempo Integral. Como suporte teórico deste trabalho de análise das políticas públicas, vamos avaliar documentos legais tais como, a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o Plano Nacional de Educação, e Educação Integral: texto referência para o debate nacional/2009. Além dos documentos legais, alguns autores

também serão utilizados como referencial teórico, são eles: Brasil (1988); Brasil (1996); Brasil (2014); Moura (2014); Moll, (2012). Sendo assim, neste artigo, trataremos do aporte teórico-legal para que esta oferta de escolas de tempo integral aconteça, ressaltando assim o direito à educação, contido nestes documentos legais. A importância deste trabalho encontra-se na persistência do Governo Federal em ampliar a oferta de Escolas de Tempo Integral. A Educação em Tempo Integral tem sido uma orientação nos documentos legais há alguns anos. Diante disso, percebe-se uma movimentação dos sistemas de ensino em ampliar a oferta educacional em Tempo Integral. A Educação em Tempo Integral tem sido uma orientação nos documentos legais há alguns anos. Diante disso, percebe-se uma movimentação dos Sistemas de Ensino em ampliar a oferta educacional em Tempo Integral. Este artigo científico se justifica pela necessidade de expor um aporte teórico capaz de fazer entender o motivo pela ampliação da oferta de escolas em tempo integral, o que impacta diretamente na quantidade de vagas ofertadas na rede regular de ensino pública, visto que o quantitativo de matrícula por escola passa ser metade da quantidade ofertada em dois turnos diante da permanência do mesmo aluno em tempo integral no ambiente escolar. 1. EDUCAÇÃO INTEGRAL: RETROSPECTIVA HISTÓRICA Situar a educação integral, em sua versão que promove a integralidade do ser, como aspecto central do processo educacional é, em grande parte, derivada das concepções de um povo acerca do ideal de Homem, de sociedade, de cultura. Na tentativa de se destacar o papel da educação integral enquanto centro do processo educacional, alguns autores se debruçam neste entendimento trazendo para a reflexão de hoje os caminhos já percorridos na História da Educação. Ao abordar o tema de educação integral, faz-se necessário retornar à fase mais antiga da História da Educação, a Grécia Antiga. Segundo Mura (2014, 15) O surgimento das polis impôs demandas que os gregos buscaram suprir, tentando alcançar o protótipo de homem ideal: o homem da polis. Também especularam a concepção de educação que o abrangesse em sua totalidade. Moura chama atenção para a recorrente menção de que Grécia é o início dos processos educativos nos quais sofistas são peças fundamentais nas discussões e no entendimento da formação integral do ser. Seguindo os períodos históricos da História da Educação, Moura (2014) aponta a educação integral como aspecto importante também no período do Império Romano, uma vez que, em Roma, as práticas educacionais foram em grande parte derivadas dos gregos.

Segundo Cambi (1999, p. 121 apud MOURA, 2014, p. 39), a educação no período da Idade Média também sofreu mudanças. Este período foi marcado, exclusivamente, por um viés religioso no qual a Igreja Católica conduzia os pensamentos permeados na sociedade, assim como nos contextos educacionais o advento do cristianismo operou uma profunda revolução cultural no mundo antigo, talvez a mais profunda que o mundo ocidental tenha conhecido na sua história. Uma revolução da mentalidade, antes mesmo da cultura e das Instituições sociais e, depois, políticas também. Dentre os diversos fatores que contribuíram para a constituição e êxito do cristianismo cabe elencar sua natureza pedagógica. Podemos inferir que a sua atividade educativa é inerente ao seu surgimento. Neste período histórico, no qual a Igreja Católica instituía e conduzia os processos educacionais, a educação integral foi marcada por um ideal de Homem no qual a religiosidade era o centro. Sendo assim, a formação integral do ser humano acontecia uma vez que a educação escolar não se vinculava a apenas aspectos pragmáticos, mas sim teóricos e para além das vivências cotidianas. No entanto, era realizada com um conjunto restrito de informações, sendo somente aquelas que a Igreja Católica considerava de valor a ser ensinado ao povo da Idade Média. A reflexão sobre as abordagens da Educação Integral avança junto com os períodos históricos. Para situar as reflexões sobre esta temática na História da Educação no Brasil, além do texto de Moura (2014), têm-se ainda os estudos da coletânea organizada por Moll (2012). Assim, segundo Moll (2012, p. 17), [...] A partir da Constituição de 1988, a sociedade brasileira tem mais consciência sobre o direito da educação pública de qualidade para todos, e juntos com o aprofundamento e a consolidação democrática, estamos instituindo, em nível nacional, uma escola pública republicana, laica, obrigatória, gratuita e integral. Sendo assim, o entendimento sobre a educação integral passa necessariamente pelos pelas reflexões provocadas pelos autores MOURA (2014) e MOLL (2012) acerca dos movimentos históricos e políticos nos quais o contexto nacional presenciou. A educação no Brasil foi e é marcada pelas grandes interferências religiosas, políticas, econômicas e culturais. Por um tempo longo, a pedagogia ministrada no Brasil foi de poder dos Padres Jesuítas e como tal, detinham em seu modelo pedagógico, o Ratio Studiorum, uma vertente religiosa e intencional de catequização. Este foco no trabalho pedagógico jesuíta fez adormecer a concepção de formação integral do ser humano uma

vez que a centralidade do trabalho era de cunho prático e determinado para o contexto da época. Segundo Moura (2014) a educação integral só destaca no cenário brasileiro com a Reforma de Leôncio de Carvalho durante o período imperial brasileiro, na qual se propunha que as crianças permanecessem na escola por um período de mais de seis horas nas quais atividades de visitação de museus e bibliotecas estivessem no rol de ações a serem realizadas pelos educadores junto com seus alunos. Esta reforma propunha assim um trabalho para além dos espaços/tempos/atividades escolares, possibilitando aos alunos uma ampliação dos conhecimentos demonstrando uma preocupação com a formação do sujeito para além dos conteúdos escolares. No início do período Republicano, observa-se outra tentativa significante para o trabalho com a educação integral. A reforma proposta por Anísio Teixeira, conhecida como Escolas Parque nas quais os conteúdos escolares deveriam privilegiar uma formação intelectual, artística, física, moral. Ou seja, uma busca pela integralidade do ser. Após a proposta de reforma educacional de Anísio Teixeira, o debate sobre educação integral só ganhou destaque novamente no cenário brasileiro em 1980, quando, segundo Moura (2014) foram criados por Darcy Ribeiro, os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), no Rio de Janeiro. A proposta destes modelos de escolas foi reconhecida nacionalmente e tentou-se ampliar para todo o território em 1990, alterando o nome para Centros Integrados de Atendimento à Criança (CIACs). Nesta mesma abordagem, em 1992 o então presidente, o senhor Itamar Franco, criou os CAICs (Centros de Atenção à Criança), no entanto, as críticas situaram esta ação mais como um trabalho assistencialista que educacional de fato, o que fez com que o Projeto não despontasse enquanto uma ação de educação integral reconhecidamente como formação integral do ser humano. Outra experiência relevante de educação integral, segundo Moura (2014) foi a criação dos Centros Educacionais Unificados, os CEUs. Nestes centros, o modelo pedagógico se propunha a trabalhar a instrução (conteúdos escolares) articuladoa com atividades recreativas e desportivas. Mais recentemente ainda, na História da Educação no Brasil, outra ação com foco na formação integral do ser humano merece destaque, a chamada política pública Mais

Tempo na Escola. Em documento próprio denominado Série Mais Educação: Educação Integral texto referência para o debate nacional, publicado em 2009, o Ministério da Educação (MEC) traz a tona a questão da ampliação da jornada diária de trabalho escolar com a formação integral enquanto pano de fundo do trabalho pedagógico. Certos de que somente ampliar a carga horária do aluno na escola não é fator determinante para melhoria da qualidade educacional, o texto do MEC traz considerações acerca da Educação Integral enquanto concepção de condução do trabalho pedagógico. Nesta mesma vertente, o MEC lança o Programa Ensino Médio Inovador- ProEMI, em outubro de 2009, com o objetivo de: [...] apoiar e fortalecer o desenvolvimento de propostas curriculares inovadoras nas escolas de ensino médio, ampliando o tempo dos estudantes na escola e buscando garantir a formação integral com a inserção de atividades que tornem o currículo mais dinâmico, atendendo também as expectativas dos estudantes do Ensino Médio e às demandas da sociedade contemporânea. (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2009). Diante desta retomada histórica, observa-se que, em diversos momentos a educação integral foi tema central das discussões teóricas, políticas, pedagógicas em contextos estaduais e, principalmente, nacional enquanto política pública. Vale ressaltar que o debate não se encerrou com o lançamento nacional do Pro- EMI, mas sim abriu o leque para que em 2014 o Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005/2014 apresentasse, em sua Meta 6 as projeções que se pretende para a permanência e ajustes da oferta de escolas de tempo integral no território nacional. 2. MARCO LEGAL DA OFERTA DE ESCOLAS EM TEMPO INTEGRAL A legislação brasileira traz um arcabouço de normatizações que amparam a oferta das escolas em tempo integral. Inicialmente, pode-se destacar a Constituição Federal de 1988 que, em seu artigo 205 diz que: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Ao apresentar como direito de todo cidadão, o Estado garante sua oferta de forma que sua omissão acarrete prejuízo ao poder público. Vale ressaltar a expressão dever do Estado, instituindo assim, sobre o poder público a obrigatoriedade e a busca contínua de melhoria na qualidade e no número de oferta de vagas adequado à demanda.

Neste mesmo sentido, de normatizações acerca da ampliação da oferta de vagas em escolas de tempo integral, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, traz alguns artigos que podem ser objeto de estudo, são eles: Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. [...] 2º O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino. Neste mesmo sentido, o artigo 87 apresenta o Plano Nacional de Educação como documento estratégico na formalização de metas a serem instituídas e perseguidas de forma a melhorar a qualidade da educação brasileira: Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano a partir da publicação desta Lei. 1º A União, no prazo de um ano a partir da publicação desta Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos. 5º Serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo integral. (grifo meu). Nestes artigos pode-se contemplar a preocupação do legislador em deixar exposto o regime integral de funcionamento das escolas. A carga horária dos alunos nas unidades escolares tem sido foco de debate em âmbito internacional. Diversos países já organizam seus sistemas de ensino com carga horária integral ou mesmo ampliada. A carga horária mínima nas unidades escolares brasileiras é de quarto horas diárias. Diferentes políticas públicas têm sido testadas na tentativa de ampliar a jornada diária de estudos. Outra fonte legal de normatização acerca da oferta de carga horária ampliada é o Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005/2014. O PNE traz uma meta específica acerca desta temática. Trata-se da Meta 6, que diz [...] oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) dos (as) alunos (as) da educação básica (BRASIL, 2014). As estratégias para se alcançar esta meta estão listadas em nove tópicos diferentes, cada qual abordando de uma forma a maneira planejada para que se amplie, de forma equitativa e com qualidade, a educação em tempo integral em todo o território nacional, em regime de colaboração entre as esferas públicas.

Vale ressaltar ainda que os sistemas de ensino estaduais e municipais, juntamente com seus Conselhos de Educação, normatizam a oferta de educação de tempo integral sob sua jurisdição. Considerações finais O artigo científico aqui apresentado teve como objetivo central apresentar o marco legal que justifica e normatiza a oferta da educação básica em tempo integral. A oferta vem sendo exigida desde a Constituição Federal de 1988 e na revisão do Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005/2014) a educação em tempo integral apareceu como uma meta a ser cumprida pelos sistemas de ensino estadual e municipal em colaboração com a União. A educação em tempo integral tem suas especificidades e como tal exige do poder público um planejamento estratégico e financeiro que possibilite esta oferta uma vez que impacta diretamente na quantidade de vagas ofertadas em cada unidade escolar, na contratação de pessoal docente e administrativo para atuação nas escolas, sendo de temo integral ou não, de forma a garantir, além da meta que diz respeito à educação em tempo integral como as de tempo regular. Sendo assim, conclui-se que cabe ao poder público e à comunidade civil observar o cumprimento das normas e planejamentos previstos para implantação das escolas de tempo integral. Aos profissionais do Direito Educacional, vale ressaltar a função de contribuir para que fique esclarecido a ação de cada ente neste processo jus-pedagógico no qual compete ao poder público a obrigatoriedade da oferta e a sociedade civil o direito a educação em tempo integral.

Referências Bibliográficas BRASIL. Constituição Federal de 1988. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. BRASIL. Plano Nacional de Educação. Lei n? 13.005, de 25 de junho de 2014. BRASIL. Educação integral: texto referência para o debate nacional. - Brasília: Mec, Secad, 2009. (Série Mais Educação). MOLL, Jaqueline (Org.). Caminhos da Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. Porto Alegre: Penso, 2012. MOURA, Romilso Mizael de. Uma leitura histórico-contextual da escola de tempo integral. Piracicaba, SP, 2014. Tese de Doutorado. Universidade Metodistade Piracicaba. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Ensino Médio Inovador. Disponível em http://portal.mec.gov.br/ensino-medio-inovador. Acesso em: 30 de maio de 2016. Ficha técnica da autora: Eliana Bravim é Pedagoga, Especialista em Direito Educacional e Mestre em Educação. Faculdade de Direito em curso. Atua como Coordenadora Pedagógica em escola de Tempo Integral na Rede Estadual do Espírito Santo e compõe a Equipe de Formadores da Secretaria Estadual de Educação das novas equipes escolares Consultora Educacional da Rede Privada.