Inovar a prática valorizando o Professor UMA EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES COM FOCO NO USO DE TABLETS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA Teresinha Aparecida Faccio Padilha teresinhafaccio@gmail.com Adriana Belmonte Bergmann aberg@univates.br Marli Teresinha Quartieri mtquartieri@univates.br Maria Madalena Dullius madalena@univates.br Lucy Aparecida Gutiérrez de Alcântara lucy.alcantara@jna.ifmt.edu.br Neiva Althaus neivaalthaus@universo.univates.br Resumo: Este trabalho relata uma investigação efetivada com professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental objetivando investigar potencialidades de um curso de formação continuada, com foco no uso de tablets, nos processos de ensino e de aprendizagem da Matemática. Assim, o grupo da pesquisa intitulada Tecnologias no Ensino, desenvolvida no, propôs um curso de formação continuada, durante o qual foram explorados aplicativos, realizadas e elaboradas atividades que, posteriormente, os participantes poderiam desenvolver com seus alunos. Filmagens e gravações dos encontros foram as formas de coleta de dados. A pesquisa teve como fundamento os princípios da pesquisa-ação, pois o intuito foi de que os professores participassem como atores ativos, sendo as atividades discutidas e desenvolvidas a partir das suas experiências. Os resultados apontaram que ainda há necessidade de investimento em relação ao uso pedagógico deste recurso. As trocas de experiências e os momentos de reflexões em conjunto foram expressos como fatores necessários para integração dos tablets na prática pedagógica. Palavras-chave: Anos Iniciais do Ensino Fundamental; formação continuada; matemática; tablets. 1. Introdução A velocidade com que surgem novas tecnologias e o quanto elas modificam o modo como as pessoas se relacionam, veiculam informações e influenciam nos diferentes
segmentos sociais é impressionante. A facilidade de acesso e a portabilidade permitida pelos dispositivos móveis contribuem para que essas inovações estejam presentes no cotidiano de pessoas de diferentes faixas etárias e setores da sociedade. Neste contexto, a escola não pode manter-se alheia a existência dos recursos tecnológicos. Contudo, integrar as tecnologias no fazer pedagógico, usando-as na construção do conhecimento e de habilidades na formação de cidadãos atuantes no cenário social é tarefa árdua e desafiadora aos docentes. É preciso usar os recursos tecnológicos com as vantagens que estes oferecem frente a outros costumeiramente presentes nas práticas pedagógicas de modo a qualificar as aprendizagens. Assim, é importante a atualização e formação constante do docente para desempenhar com êxito este propósito. Em relação à utilização das tecnologias, os professores precisam estar preparados, tanto tecnicamente, quanto pedagogicamente para integrá-las em suas práticas, e, assim, desenvolver um ensino que seja eficaz para a aprendizagem e útil ao cotidiano dos estudantes. À vista disso, apresentamos o modelo TPACK Conhecimento Tecnológico e Pedagógico do Conteúdo (Figura 1) - proposto por Mishra e Koehler (2006, 2008), considerado pelos autores essencial para um ensino eficiente com tecnologias. O modelo baseia-se no Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK) descrito por Lee Shulman, em que a interação entre este conhecimento e a tecnologia educacional pode produzir um ensino eficaz com as tecnologias. Neste modelo é necessário conhecer os conceitos separados que o formam. Assim, pode-se destacar três conhecimentos principais: Conhecimento do Conteúdo (CK), Conhecimento Pedagógico (PK) e Conhecimento Tecnológico (TK). Das interações entre esses conhecimentos, resultam outros quatro conhecimentos: Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK), Conhecimento Tecnológico do Conteúdo (TCK), Conhecimento Pedagógico Tecnológico (TPK) e o Conhecimento Tecnológico Pedagógico do Conteúdo (TPACK). Figura 1 - O modelo TPACK e seus componentes de conhecimento
Fonte: Mishra e Koehler (200\08). De acordo com Mishra e Koehler (2006), o Conhecimento do Conteúdo (CK) é o domínio dos professores sobre o assunto a ser ensinado. Ele é importante para que os professores não ensinem conceitos errados aos alunos. O conhecimento dos professores deve ser aprofundado para ensinar a disciplina. O Conhecimento Pedagógico (PK), de acordo com os autores, é o domínio dos professores sobre suas práticas de ensino, a metodologia utilizada para que os alunos participem de forma ativa do processo de aprendizagem.. Este conhecimento inclui competências para gerenciar a sala de aula, o planejamento das aulas, juntamente com o método de avaliação dos alunos, compreendendo valores e objetivos, como descrevem Mishra e Koehler (2006). O Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK) estabelece relações entre o conhecimento dos livros didáticos, das diretrizes curriculares e dos materiais de apoio. Em efeito: Esse conhecimento é diferente do conhecimento de um especialista de disciplina e também é diferente do conhecimento pedagógico geral partilhado pelos professores de todas disciplinas. PCK (Pedagogical Content Knowledge) está preocupado com a representação e formulação de conceitos, técnicas pedagógicas, conhecimento do que faz os conceitos difíceis ou fáceis de aprender, conhecimento prévio dos estudantes, e teorias da epistemologia. Ele também envolve conhecimento de estratégias de ensino que incorporam representações conceituais apropriadas em ordem de localizar as dificuldades e equívocos do aluno e manter uma compreensão significativa. (MISHRA e KOEHLER, 2006, p. 1027, tradução nossa). Já o Conhecimento Tecnológico (TK) é o conhecimento relacionado às tecnologias. (...) é o conhecimento sobre as tecnologias padrões, tais como livros, giz e quadro negro, e tecnologias mais avançadas, tais como a internet e vídeo digital. Isso envolve as habilidades requeridas para operar tecnologias em particular. TK
incluí conhecimento de como instalar e remover dispositivos periféricos, instalar e remover programas de software, e criar e arquivar documentos. (MISHRA & KOEHLER, 2006, p. 1027, tradução nossa). Mishra e Koehler (2006) definem como Conhecimento Tecnológico do Conteúdo (TCK) aquele que se relaciona ao conhecimento do professor sobre as tecnologias, para integrá-las no ensino de um conteúdo específico, fazendo com que o aluno adquira conhecimento sobre esse conteúdo. O Conhecimento Tecnológico Pedagógico (TPK) é aquele em que a compreensão da influência de uma determinada tecnologia e/ou dos recursos tecnológicos pode ser aproveitada de formas diferentes sobre o ensino e a aprendizagem, bem como de acordo com o contexto e propósitos, reconfigurando as tecnologias de uso comum para os fins pedagógicos. Acreditamos que a formação continuada de professores é uma das maneiras de unir os recursos tecnológicos com a prática pedagógica e os conhecimentos de conteúdos. Considerando o exposto, esse trabalho divulga alguns resultados de uma pesquisa 1 desenvolvida por um grupo de investigadores que tem o objetivo de integrar as tecnologias, mais especificamente os tablets, nos processos de ensino e de aprendizagem da Matemática. Uma das ações do grupo foi o oferecimento de um curso de formação continuada intitulado Uso de tablets para o ensino de Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Neste trabalho, socializaremos os resultados coletados por meio de filmagens e gravações dos encontros com os professores. 2. O curso de formação continuada O curso de formação continuada foi ofertado para professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e teve por objetivo auxiliá-los no uso de tablets como uma ferramenta pedagógica para o ensino, em particular, explorando aplicativos para o ensino da Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Os encontros do referido curso ocorreram uma vez por mês, totalizando quarenta horas de formação, com dez encontros, sendo oito presenciais e dois à distância. Durante os encontros presenciais foram sugeridas atividades, utilizando aplicativos online disponíveis para tablets, relacionadas aos 1 Pesquisa tem apoio da FAPERGS (Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul) e CNPq ( Conselho Nacional de desenvolvimento Científico e Tecnológico).
seguintes conteúdos matemáticos: sequência numérica, operações matemáticas, frações, números decimais e geometria. Nos encontros presenciais, buscou-se constantemente envolver os docentes, por meio de atividades e tarefas que permitissem reflexão, debate e planejamento. Assim, todas as atividades propostas foram desenvolvidas pelos professores participantes e estes foram constantemente incentivados a explorá-las com seus alunos. A cada encontro foram realizadas discussões, que foram gravadas e posteriormente, transcritas, para analisar a viabilidade das atividades propostas e os avanços que os professores estavam obtendo em relação ao trabalho com os tablets e a utilização dos aplicativos na sua prática pedagógica. Para validação dos dois encontros à distância os participantes foram instigados a explorar algumas atividades propostas no curso, com o uso de tablets, em sua prática pedagógica, escrever um relatório dos resultados e socializar os avanços e as dificuldades com o grupo. 3. A coleta de dados e considerações emergentes O desenvolvimento metodológico do estudo foi baseado na pesquisa-ação que, segundo Moreira (2011) tem por objetivo fundamental melhorar a prática, considerando ao mesmo tempo os resultados e os processos. O autor define a pesquisa-ação como uma forma de pesquisa coletiva, autorreflexiva, realizada por participantes de situações sociais, que busca ampliar a produtividade e o entendimento das suas próprias práticas sociais ou educativas, e compreenderem a relação entre tais práticas e as situações em que acontecem. A coleta de dados ocorreu por meio das respostas dos professores aos questionamentos realizados durante os encontros, bem como de suas percepções em relação ao que estava sendo proposto, e a associação que faziam entre sua prática e os conhecimentos construídos nessa prática. Inicialmente foi realizada uma introdução da parte operacional e do funcionamento do tablet. Mesmo o curso tendo foco nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, no grupo, também havia professores de Matemática dos Anos Finais. Esta diversidade enriqueceu as trocas de experiências e relatos efetivados no decorrer dos encontros. Neste primeiro encontro foi questionado porque da procura pelo curso. Uma professora expressou que seu interesse ocorreu por uma necessidade de compreensão relacionada a conteúdos, conforme comentário a seguir.
[...] porque eu tinha muita dificuldade de entender qual era a construção dos números, da adição da subtração nas séries iniciais, então toda a vez que eu faço um curso com as meninas das séries iniciais me ajuda a entender lá no sétimo, oitavo ano, quando não entende uma multiplicação, uma divisão, a explicar de novo pra aquele aluno, pra tentar solucionar, porque as vezes o meu jeito de explicar era muito avançado pra ele, precisava voltar pra uma construção mais simples, que ele ficou pra trás da aula das séries iniciais, então isso já foi um ganho imenso, sem contar a parte dos tablets (P.3). Interessante ressaltar que a inquietação da professora ao constatar a necessidade de conhecimentos do conteúdo que ensina veio acompanhada de uma postura de busca ao participar do curso com enfoque ao que almejava. Duarte (2011, p. 40), a respeito desta questão comenta que: Trabalhar em torno de grandes ideias e conceitos matemáticos, recorrer a várias formas de os representar, interpretar os erros dos alunos e desenvolver explicações alternativas, são algumas das competências reconhecidas para aprender a ensinar. As limitações no conhecimento da Matemática podem traduzir-se em dificuldades em desenvolver boas e diversificadas explicações e estratégias flexíveis para a sala de aula e empobrecer a aprendizagem dos alunos. Durante os encontros desenvolvíamos sequências didáticas que contemplassem os conteúdos propostos, explorando-os por meio de aplicativos escolhidos de forma a contribuírem na aprendizagem dos alunos. Esta sistemática de trabalho possibilitou abordarmos conteúdos pedagógicos trazidos nas discussões. Além disso, procuramos proporcionar um espaço de planejamento e acompanhamento da prática desenvolvida nas salas de aulas dos professores junto com os alunos. Este aspecto foi elogiável e encorajador da integração da ferramenta tecnológica nas aulas. Sobre este aspecto Bovo (2004, p. 36) comenta: [...] obstáculos ao trabalho do professor são muitos e os cursos não dão conta de auxiliá-lo nestas dificuldades. É necessário um apoio constante, um suporte. Um suporte que pode ser estabelecido através de parcerias entre a escola e a universidade, como é o caso de algumas atividades que procuram fazer uma formação contextualizada na prática do professor, nas suas dificuldades, nos seus anseios e na realidade da sua escola. Relatos nos permitem inferir que o apoio de integrantes do grupo responsável pelo curso de formação realizado encorajou muitos professores experimentarem o uso da ferramenta tecnológica em suas aulas. Isto nos indica que obtivemos reflexos na prática pedagógica desses professores que possivelmente encorajar-se-ão a novas tentativas após o término da formação. Lobo da Costa (2010, p. 93) comenta que as tecnologias, como toda inovação, só será integrada à prática profissional após um processo longo de apropriação e de utilização frequente em situações diversificadas.
Os professores demonstraram compreender a proposta do curso de formação, é o que podemos exemplificar na fala de uma professora: a ferramenta não é o que vai ser diferencial, o auge da minha aula não é o tablet, mas são as práticas que eu vou estar desenvolvendo a partir dele, ou encerrando, fazendo um fechamento com atividade no tablet (P1). Esta fala sintetiza a ideia que a ferramenta por si só não produzirá aprendizado se não for mediada por uma proposta pedagógica consistente. Neste sentido Souza (2010, p. 65), afirma que a mudança pedagógica e a melhora na qualidade da aprendizagem dos alunos, com uso desses novos recursos, não acontece se as TIC forem utilizadas para continuar transmitindo a informação para o aluno, reforçando o processo da instrução, ao invés de serem utilizadas para criar ambientes de aprendizagem que propiciem aos alunos a construção de conhecimento. Corroboramos com Richt (2010, p. 144) quando afirma que a formação continuada é um dos caminhos mais importantes ao desenvolvimento profissional do professor. Assim, acreditamos na importância da realização de formações que contemplem a integração das tecnologias como mais uma ferramenta em prol da aprendizagem. 4. Considerações finais Ao propor esta formação continuada, que permitiu ao professor um modo de vivenciar o uso das tecnologias, no caso os tablets, como uma ferramenta auxiliar na sua prática pedagógica, acreditamos ter possibilitado um trabalho de crescimento conjunto, em que os resultados passaram a fazer de fato, parte dos conhecimentos do professor e contribuíram com a realização de sua tarefa pedagógica (BITTAR, 2006). Por conseguinte, podemos inferir que uma proposta de formação continuada que utiliza uma variedade de atividades que possibilitam a experimentação, a inovação e a reflexão crítica sobre a utilização das tecnologias, é importante para a integração de tais recursos na prática pedagógica. Durante as sessões do curso de formação foi possível perceber a motivação dos participantes no decorrer da exploração das atividades propostas. Os professores, aos poucos, se sentiram mais seguros em relação à utilização do tablet, à exploração dos conteúdos matemáticos e à elaboração de atividades que podem facilitar a integração dessa
tecnologia no processo de ensino e contribuir com o progresso da aprendizagem dos alunos. 5. Referências BITTAR, M. Possibilidades e dificuldades da incorporação do uso de softwares na aprendizagem da Matemática. Um estudo de um caso: O software Aplusix. In: III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA (III SIPEM), 2006, Águas de Lindóia, SP, Brasil. Anais...Á guas de Lindóia, SP: 2006. BOVO, A. A. Formação Continuada de professores de matemática para o uso da informática na escola: tensões entre proposta e implementação. 2004. 146 f. Dissertação (Mestre em Educação Matemática) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas. Rio Claro. 2004. LOBO DA COSTA, N. M. Reflexões sobre tecnologia e mediação pedagógica na formação do professor de matemática. In: BELINE, W.; COSTA, N. M. L. da (Orgs.). Educação Matemática, Tecnologia e Formação de Professores: algumas reflexões. Campo Mourão: Ed. da FECILCAM, 2010. Cap. 1, p. 85-116. MISHRA, P.; KOELER, M. J. Technological Pedagogical Contente Knowledge (TPACK): Confronting the Wicked Problems of Teaching With Technology. In: CRAUFORD, C. et al. (Eds) Procedings of Society for Information Technology and Teacher Education International Conference 2007. Chesapeak, VA: Association for the Advancement of Computing in Education, 2008. MISHRA, P; KOEHLER, M. J. Tecnological Pedagogical Content Knowledge: A Framework for Teacher Knowledge. Teachers College Record, v. 6, n. 6, p. 1017 1054, jun. 2006. MOREIRA, M. A. Metodologia de pesquisa em ensino. São Paulo: Editora Livraria de Física, 2011. RICHT, A. (2010). Apropriação do Conhecimento Pedagógico-Tecnológico em Matemática e a Formação Continuada de Professores. Tese de doutorado, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro, SP, Brasil.