2 ASPECTOS RELEVANTES SOBRE O DIREITO DE FAMÍLIA BRASILEIRO



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Transcrição:

1 INTRODUÇÃO O estudo sobre a filiação tornou-se necessária no meio jurídico em face das modificações ocorridas na sociedade nas últimas décadas. A Constituição Federal de 1988 previu o tratamento igualitário entre os filhos de qualquer origem e protegeu a família ainda que não constituída pelo casamento (por união estável, entre heterossexuais e homossexuais, com apenas um pai ou uma mãe, etc.). Por essa razão, o sistema precisou se adequar a nova realidade jurídica e social. O reconhecimento da filiação tornou-se, assim, um direito fundamental do indivíduo humano, ainda mais da criança recém nascida, e um direito de personalidade (indisponível e irrenunciável). Tanto o texto constitucional como infraconstitucional coadunam no sentido de que qualquer origem de filiação deve ser considerada para fins de reconhecimento extrajudicial do parentesco socioafetivo. Diante disso, a fim de desenvolver o tema proposto será abordado o direito de família e sua adequação à nova realidade social, o reconhecimento da filiação como direito fundamental e personalíssimo e a filiação socioafetiva, com ênfase na possibilidade do reconhecimento administrativo dessa filiação, além de outros aspectos importantes deste tema novo, que vem sendo discutido em nossos Tribunais. 2 ASPECTOS RELEVANTES SOBRE O DIREITO DE FAMÍLIA BRASILEIRO 2.1 A MODIFICAÇÃO DA SOCIEDADE E DO DIREITO O principal objetivo do Direito é a busca pela pacificação social através de regras de conduta, que devem ser contemporâneas sob pena de serem inócuas. Desde o ano de 1916 as relações familiares eram regradas pelo Código Civil (Lei nº 3.071/1916) por meio de normas de ordem pública, o que implica dizer que os regramentos ali existentes não poderiam ser alterados pelas vontades das partes. Única exceção era a possibilidade de escolha do regime de bens que regeria o casamento.

Ante as inovações sociais o Estado viu-se obrigado a editar leis que satisfizessem as necessidades sociais, tendo em vista que o Código Civil vigente não atendia os anseios da população. Diante disso, nos casos de desquite judicial não havia previsões legais a respeito da guarda dos filhos menores, motivo pelo qual foi editado o Decreto 9.701/46. Contudo, não havia legislação sobre como regulamentar os alimentos a esses filhos menores. Para regularizar a situação foi promulgada a Lei 5.478/68. Com o passar dos anos as previsões existentes a respeito da dissolução da sociedade conjugal e do matrimônio já não eram satisfatórias, e, então, surgiu a necessidade da Lei 6.5154/77 (Lei do divórcio). Contudo, a maior inovação legislativa foi a Constituição Federal de 1988, que tratou do Direito de Família de forma ímpar ao criar novas entidades familiares, protegê-las juridicamente e coibir qualquer tipo de discriminação. Óbvio que a Constituição Federal não esgotou todos os assuntos relativos ao Direito de Família, até mesmo porque esta não era sua função. Portanto, continuaram sendo editadas leis que protegiam a entidade familiar e seus membros. Podemos citar, ainda, a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Lei 8.560/92 (dispõe sobre a averiguação oficiosa de paternidade), a Lei 8.971/94 (regula o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão) e a Lei 9.278/96 (regula as situações daqueles que vivem em União Estável). Por fim, podemos citar como a segunda maior inovação legislativa no que diz respeito ao Direito de Família a Lei 10.406/02, responsável pela implantação do novo Código Civil Brasileiro. Essa lei atualizou todo o Direito Civil Brasileiro, inclusive o Direito de Família. Os dois marcos no Direito de Família Brasileiro (Constituição Federal de 1988 e o Código Civil atual) trouxeram inovações de extrema importância sobre as relações familiares. Entretanto, para fins do presente trabalho, será considerado especialmente o princípio da isonomia em relação aos filhos, uma novidade da Constituição Federal de 1988 e referendada pelo Código Civil. 2.2. CONCEITOS LEGAIS DE FAMÍLIA O ordenamento jurídico brasileiro apresenta vários conceitos de família, conforme a conveniência do Estado ou do particular. Dessa forma, a abrangência da família é alterada de acordo com os interesses estatais.

Por essa razão, a família para fins fiscais é formada pelos cônjuges, filhos menores, maiores inválidos ou que ainda estão matriculados em curso universitário à custa dos pais até a idade de 24 anos, ascendentes inválidos que vivam sob dependência do contribuinte e filho que não more com o contribuinte, se pensionado em razão de condenação judicial (art. 35, Lei nº. 9.250/95; art. 1º, Lei nº. 11.119/05; art. 77, 1º RIR/1999; art. 38, IN SRF nº. 15/2001). Ainda tratando do interesse estatal, para o Direito Previdenciário 1, a família é constituída pelo cônjuge, pelos filhos com até 21 anos (não emancipados ou inválidos), pais, irmãos menores de 21 anos (não emancipados ou inválidos e companheiro(a) do trabalhador), enteados ou menores de 21 anos que estejam sob tutela do segurado, desde que não possuam bens para garantir seu sustento e sua educação. Sob enfoque do interesse particular, o direito sucessório estabelece que família consiste em todas as pessoas ligadas pelo vínculo matrimonial, pela união estável e pela consangüinidade em linha reta descendente e ascendente até o infinito e na colateral até o 4º grau (art. 1.829 e seguintes, CC e art. 7º, Lei nº. 9.278/96). Por fim, para fins de alimentos a família é formada pelos cônjuges ou companheiros e todas as pessoas ligadas por vínculo de consangüinidade na linha reta ascendente e descendente até o infinito e na linha colateral até o 2º grau (CC, arts. 1.695 a 1.697) 2. O ponto em comum entre qualquer das abrangências familiares elencadas é a existência do filho como integrante da família. Sempre este membro é protegido, quer seja por interesse estatal, quer seja por interesse particular. Além da classificação quanto a abrangência, há outras classificações que tratam das espécies de família. 2.3. ESPÉCIES DE FAMÍLIA Dentre as espécies de família estudadas pelo Direito destacamos duas classificações: a) Quanto a causa de sua constituição: existem as famílias matrimonial (cônjuges legalmente casados) e não matrimonial (não há o casamento legal). b) Quanto aos membros que a compõem: existe a família biparental (cônjuges ou companheiros coabitam com ou sem filhos) e a família monoparental (um dos pais e o filho ou 1 Site:< http://www.mpas.gov.br/pg_secundarias/paginas_perfis/perfil_comprevidencia_02.asp>, acesso em 09/04/2007. 2 A diferença entre a família do direito sucessório e do direito alimentar traz certa inconsistência para o ordenamento, uma vez que o herdeiro parente de 3º ou 4º grau não possui o dever de prover alimentos ao dono da herança.

filhos, ou alguém que tenha sob seus cuidados pessoa que não seja filho (guardião/guardado, curador/curatelado, tutor/tutelado)). c) Quanto a sua constituição: as famílias podem ser heteroafetivas (constituída por cônjuges de sexo oposto) ou homoafetivas (constituída por cônjuges do mesmo sexo). Essa classificação é importante para se entender quais as famílias que devem ser protegidas. O tratamento igualitário entre essas famílias refletirá, necessariamente, no tratamento igualitário entre os filhos. 2.4 AS NOVAS FAMÍLIAS Ainda que tardiamente o Direito passou a considerar em seus estudos as novas famílias da sociedade brasileira. Características até então comuns em toda família tornaram-se antiquadas e cada vez mais escassas. Analisar a família sob novos aspectos e com novas referências tornou-se crucial para a evolução e eficácia do direito de família contemporâneo. Assim, as principais características dessas novas famílias são: a) retração: a família patriarcal foi substituída pela família nuclear (apenas pais e filhos); b) democratização: ao invés da hierarquia comum nas famílias antigas há o companheirismo pautado na isonomia social; c) dessacralização: o elemento sagrado é deixado de lado e passa-se a valorizar as manifestações de vontade dos membros da família; d) desencarnação: a família deixou de ser formada apenas pelo elemento biológico e passou a ser formada, também, elemento psicológico ou afetivo, sendo este último ainda mais valorizado do que o primeiro. Conclui-se, portanto, que o subjetivo, o sentimento, o afeto, tornaram-se mais importantes nas relações familiares do que o objetivo, a genética, o sangue. Por óbvio que essa mudança também influi na formação da família, quer seja no momento de sua constituição (através dos cônjuges/companheiros), quer seja quando se tem filhos. A filiação é, assim, a relação familiar mais importante para o Direito, para o Estado e para o indivíduo, justamente pelo aspecto sentimental. Diante da importância desse vínculo afetivo e jurídico, passa-se a estudar sobre a filiação.

3 A FILIAÇÃO Para compreender melhor a filiação no direito brasileiro é necessário lembrar de como esta era tratada antes do advento da Constituição Federal de 1988. Para o Código Civil de 1916 os filhos eram classificados como: a) legítimos: os nascidos na constância do casamento; b) legitimados: os nascidos antes do casamento, em que o casamento posterior dos pais legitimava os filhos; c) naturais: filhos de pessoas não casadas legalmente, mas sem qualquer impedimento legal; d) espúrios: filhos de origem "imoral", que se subdividiam em adulterinos (decorrentes de relação adúltera) e incestuosos (oriundos de relação entre parentes); e) adotivo: os recepcionados por casais que não são pais naturais. A esse respeito é interessante lembrar que a pessoa casada não podia reconhecer filho adulterino, exceto para fins de alimentos. Ainda assim era formada apenas relação de dependência e não de vínculo familiar. Além disso, os filhos adotivos, mesmo que adotados plenamente, não possuíam direitos sucessórios caso os pais possuíssem filhos naturais. Por essa razão o filho adotivo era considerado um filho de segunda classe. Após a Constituição Federal de 1988 não há mais que se falar em qualquer diferença entre os filhos. O artigo 227, 6º permitiu o reconhecimento de filhos havidos fora do casamento e todos os filhos, sejam eles legítimos, legitimados, naturais, espúrios adulterinos, espúrios incestuosos ou adotivos, e os considerou iguais perante a lei, não podendo haver discriminação entre eles, nem mesmo em assentamentos de documentos. Atualmente a única classificação doutrinária aceita é para fins sucessórios na qual os filhos podem ser matrimoniais e extramatrimoniais. Assim, todos são apenas e tão-somente filhos, havidos ou não na constância do matrimônio. Essa previsão constitucional representa até os dias de hoje um grande avanço do ordenamento jurídico brasileiro no que diz respeito a filiação e a família, corroborando a tendência mundial em garantir aos seus cidadãos, principalmente à criança, o respeito à dignidade da pessoa humana.

3.1 FILIAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL E PERSONALÍSSIMO O direito ao reconhecimento da filiação, qualquer que seja sua natureza, constitui tanto direito fundamental quanto direito personalíssimo do indivíduo humano. O direito fundamental consiste, a priori, em um direito reconhecido constitucionalmente, que visa proteger o indivíduo dos abusos que poderiam ser cometidos pelo Estado. O direito de personalidade, por sua vez, trata dos direitos individuais por excelência, que são protegidos em face do Estado e dos particulares, a fim de garantir ao indivíduo humano o respeito pleno à sua dignidade. Não resta dúvidas de que conhecer suas origens biológicas e/ou socioafetivas constitui direito fundamental uma vez que garante ao indivíduo proteção de todos os direitos a elas inerentes. Conhecer seus ascendentes e ser por eles reconhecido juridicamente preserva os direitos previdenciários e fiscais do filho. O Estado deve reconhecer essa filiação e respeitar todos os direitos dela decorrentes. Da mesma forma, estabelecer e reconhecer os vínculos familiares do indivíduo constitui direito de personalidade, uma vez que garante ao cidadão sua individualidade, sua existência jurídica no mundo e todos os direitos dela decorrentes. No Código Civil está estampado no artigo 16 o direito ao nome e prenome 3. Por óbvio que, para se ter prenome é necessário conhecer suas origens. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam que: "a forma fundamental para adquirir-se o patronímico é a filiação. Pode-se adquiri-la, também, pela adoção, pelo casamento, por designação administrativa e pelo uso" (NERY; NERY, 2011, 237). Mais uma demonstração do direito fundamental e personalíssimo da filiação é o fato do Código Civil 4 reproduzir o texto legal constante no artigo 227, 6º da Constituição Federal 5. O primeiro documento legislativo trata do direito privado e o segundo do direito público. Em ambos há previsão de tratamento igualitário entre filhos e a proibição de quaisquer 3 Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. 4 Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. 5 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

discriminações em respeito ao princípio da dignidade humana constante no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal 6. 3.2 HIPÓTESES DE RECONHECIMENTO DE FILHO A legislação em vigor estabelece hipóteses de reconhecimento de filho de qualquer origem (artigo 1.607 e seguintes do Código Civil). São elas: a) Por presunção legal: artigo 1.597 do Código Civil. O filho biológico havido na constância do matrimônio possui filiação presumida do cônjuge. Essa presunção também ocorre quando há inseminação artificial homóloga e heteróloga (quando autorizado pelo cônjuge). Assim, não é necessário formular um reconhecimento específico e expresso. b) Por declaração espontânea: se o filho biológico for havido em relação extramatrimonial faz-se necessária a declaração de reconhecimento da filiação expressa perante o registrador ou o magistrado (se na esfera judicial), nos atermos da Lei 8.560/1992. c) Por via judicial: quando o reconhecimento se dá mediante sentença judicial transitada em julgado proferida em ação de investigação de paternidade ou maternidade, que é imprescritível, de direito personalíssimo e indisponível conforme dispõe o artigo 27 da Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Apesar de rara a ação de investigação de maternidade, uma vez que é de fácil constatação, há a possibilidade de se ingressar com referida ação judicial para estabelecer a real ascendência do indivíduo. Se por via judicial, o reconhecimento será irrevogável. Tendo em vista que o reconhecimento implicará necessariamente na constituição de parentesco entre genitor(a) e filho, tem-se que a finalidade do reconhecimento é a aquisição do estado de filiação, não podendo comportar condição ou termo, ou qualquer cláusula que venha a limitar ou alterar os efeitos admitidos por lei" (GOMES, 1981, p. 365). Os meios juridicamente reconhecidos para que seja estabelecida a filiação estão previstos nos incisos do artigo 1.609 do Código Civil, a saber: no registro de nascimento, por escritura pública ou escrito particular, por testamento e por manifestação direta e expressa perante o juiz. Diniz (2003-2004, p.) enumera as consequências do reconhecimento do filho, que são: 1- estabelecer liame de parentesco entre o filho e seus pais; 6 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana; [...]

2- dar ao filho reconhecido, que não reside com o genitor que o reconheceu, direito à assistência e alimentos; 3- sujeitar o filho, se menor ao poder familiar (art.1616); 4- conceder direito à prestação alimentícia tanto ao genitor que reconhece como ao filho reconhecido (1694); 5- equiparar para efeitos sucessórios, os filhos de qualquer natureza (art.1829, I e II e 1845); 6- autorizar o filho a propor ação de petição de herança. Inquestionável que, além dos efeitos acima elencados, há consequências de foro íntimo do filho reconhecido. Este tornar-se-á um indivíduo humano conhecedor de suas origens, genética ou socioafetiva, ocorrendo, portanto, a satisfação do direito fundamental e personalíssimo de possuir uma identidade pessoal. 3.3 A FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA Antes de tentar conceituar ou delimitar a filiação socioafetiva, necessário estabelecer primeiramente o que é considerado parentesco sob o ponto de vista jurídico. Inobstante o Código Civil não possuir conceito legal de parentesco, o artigo 1.593 inaugura o tema estabelecendo como se dá o parentesco. Para fins deste trabalho é importante transcrevê-lo: Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem. Diante disso, Lôbo (2003, P. 26) conceitua parentesco como: [...] o vínculo jurídico, estabelecido pela lei ou por decisão judicial, entre pessoas, principalmente em decorrência de relações familiares, que as identificam como pertencentes a um grupo social que as enlaçam num conjunto de direitos e deveres. [...] Para o direito, [...] o parentesco não se confunde com família, ainda que seja nela que radique suas principais interferências, pois delimita a aquisição, o exercício e o impedimento de direitos variados, inclusive no campo do direito público. Por outro lado, a família, para diversas finalidades legais, pode estar contida na relação entre pais e filhos, constitutiva do mais importante parentesco, a filiação. Corroborando o entendimento doutrinário acima, Dias (2011, p. 345), inclusive citando a mesma obra jurídica, trata do assunto da seguinte forma: Parentesco e família não se confundem, ainda que dentro do conceito de família esteja contudo o parentesco mais importante: a filiação. As relações de parentesco são identificadas como vínculos decorrentes da consanguinidade e da afinidade, ligando as pessoas a determinado grupo familiar.

Ambos os autores em comento destacam que a filiação, constitui a relação de parentesco mais importante. Sob o ponto de vista da filiação Boeira (1999, p. 60) entende que a filiação é a relação de parentesco que se estabelece entre pais e filhos, sendo designada, do ponto de vista dos pais, como relação de paternidade e maternidade. A atual redação do artigo 1.593 do Código Civil foi proveniente do III Congresso Brasileiro de Direito de Família 7 organizado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) que sugeriu a substituição da expressão adoção pela expressão outra origem, ficando referido dispositivo assim: O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consangüinidade ou outra origem (grifo nosso). O termo "outra origem" é decisivo para o reconhecimento de parentesco além dos previstos legalmente - biológico e por afinidade. Portanto, no que diz respeito especificamente a filiação, é possível reconhecer o parentesco decorrente de adoção, de inseminação artificial heteróloga e, também, de relação socioafetiva (artigo 1.609 do Código Civil). A abrangência do texto legislativo permite sua adequação as novas famílias brasileiras no sentido de garantir direitos a todos seus os membros, principalmente das crianças, que devem ser sempre protegidas primordialmente em face dos princípios da proteção integral da criança e do adolescente e da prevalência dos interesses do menor. Por esse motivo é que as mais modernas legislações e súmulas vinculantes editadas tratam da filiação socioafetiva sob os mais diversos aspectos. O afeto passou a ser o tema central de qualquer discussão jurídica a respeito do direito de família, e não foi diferente ao tratar da filiação. A possibilidade de se reconhecer juridicamente um filho com o qual se possui apenas vínculos afetivos transcende qualquer expectativa dos cientistas jurídicos e aplicadores do direito. E é justamente o que vêm ocorrendo. Não há dúvidas a respeito da relação jurídica criada pela adoção, na qual não existe vínculo biológico-genético entre genitores e filho, mas há o vínculo afetivo. A discussão sempre ocorreu em relação a vínculos afetivos entre pais que convivem diariamente com o filho, dirigindo-lhe carinho, cuidados e provendo-lhe o sustento material de 7 Site: <http://www.cjf.gov.br/revista/outras_publicacoes/jornada_direito_civil/16_direito_de_familia_e_ sucessoes.pdf>, acesso aos 24/04/2007.

maneira incondicional e voluntária. Almeida (2001, p. 159-160) traduz de forma translúcida o que significa a paternidade socioafetiva: O novo posicionamento acerca da verdadeira paternidade não despreza o liame biológico da relação paterno-filial, mas dá notícia do incremento da paternidade socioafetiva, da qual surge um novo personagem a desempenhar o importante papel de pai: o pai social, que é o pai de afeto, aquele que constrói uma relação com o filho, seja biológica ou não, moldada pelo amor, dedicação e carinho constantes. Como fundamento para o entendimento acima transcrito, que é o predominante na atualidade, há, além da previsão legislativa constante no Código Civil, os princípios constitucionais que passam a ser elencados: a) Princípio da igualdade (art.5º, caput); b) Princípio da proibição de discriminação entre filhos (art.227 6º); c) Princípio da supremacia do interesse dos filhos (art. 227, caput); d) Princípios da cidadania e da dignidade da pessoa humana (art.1º, II e III). A Constituição Federal de 1988 tem como um de seus alicerces a garantia dos direitos fundamentais dos indivíduos humanos e, para que esta se sustentasse, não poderia agir de outra maneira que não estabelecendo o princípio da igualdade em toda e qualquer esfera de atuação do direito, inclusive no direito de família e na filiação, abolindo as discriminações e as diferenças de direitos entre os filhos. 3.4 FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA NO REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E SUAS CONSEQUENCIAS Através do reconhecimento voluntário o(s) genitor(es) assume(m) a ascendência do filho. É o ato daquele que registra o seu filho voluntariamente. Impossível tratar do assunto sem relembrar que a filiação constitui direito fundamental e personalíssimo, e do princípio da proteção integral da criança e do adolescente previsto no artigo 227 da Constituição Federal. Diante disso, conclui-se que há interesse da sociedade e do Estado em legalizar os vínculos afetivos criados entre o "filho" e os "pais". Por essa razão, vários estados da Federação já regulamentaram a possibilidade de se reconhecer filho socioafetivo diretamente no Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais. Assim, a via judicial tornou-se prescindível em casos como tais. As Corregedorias Gerais de Justiça de

Pernambuco, Maranhão, Ceará e, mais recentemente, do Amazonas já editaram provimentos nos quais autorizam o reconhecimento voluntário da filiação socioafetiva na esfera administrativa. O Provimento 09/2013 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Pernambuco possui a seguinte redação: PROVIMENTO Nº 009/2013 Dispõe sobre o reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva perante os Oficiais do Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado de Pernambuco. O DESEMBARGADOR JONES FIGUEIRÊDO ALVES, CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO, EM EXERCÍCIO, no uso de suas atribuições legais; CONSIDERANDO o disposto no art. 226 da Constituição Federal segundo o qual a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado; CONSIDERANDO que a Carta Magna ampliou o conceito de família, contemplando o princípio de igualdade da filiação, através da inserção de novos valores, calcando-se no princípio da afetividade e da dignidade da pessoa humana; CONSIDERANDO que o instituto da paternidade socioafetiva, introduzido na doutrina brasileira pelo jurista Luiz Edson Fachin (1992), tem a sua existência ou coexistência reconhecidas no âmbito da realidade familiar; CONSIDERANDO que, segundo assente na doutrina e na jurisprudência pátrias, não há, a priori, hierarquia entre a paternidade biológica e a socioafetiva, tendo esta como fundamento a afetividade, a convivência familiar e a vontade livre de ser pai; CONSIDERANDO que é permitido o reconhecimento voluntário de paternidade perante o Oficial de Registro Civil, devendo tal possibilidade ser estendida às hipóteses de reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva, já que ambos estabelecem relação de filiação, cujas espécies devem ser tratadas com igualdade jurídica; CONSIDERANDO que as normas consubstanciadas nos Provimentos nº 12, 16, e 26 do Conselho Nacional de Justiça, as quais visam a facilitar o reconhecimento voluntário de paternidade biológica devem ser aplicáveis, no que forem compatíveis, ao reconhecimento voluntário da paternidade socioafetiva, tendo em vista a igualdade jurídica entre as espécies de filiação; CONSIDERANDO o disposto no art. 10, inciso II do Código Civil em vigor, segundo o qual os atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação devem ser averbados em registro público ; CONSIDERANDO o disposto no Enunciado Programático nº 06/2013, do IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Família, segundo o qual do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos os direitos e deveres inerentes à autoridade parental ; CONSIDERANDO, por fim, a existência de um grande número de crianças e adultos sem paternidade registral estabelecida, embora tenham relação de paternidade socioafetiva já consolidada; RESOLVE: Artigo 1º - Autorizar o reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva de pessoas que já se acharem registradas sem paternidade estabelecida, perante os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais no âmbito do estado de Pernambuco. Artigo 2º - O interessado poderá reconhecer a paternidade socioafetiva de filho, perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, mediante a apresentação de documento de identificação com foto, certidão de nascimento do filho, em original ou cópia. 1º - O oficial deverá proceder à minuciosa verificação da identidade da pessoa interessada que perante ele comparecer, mediante coleta, no termo próprio, conforme modelo anexo a este Provimento, de sua qualificação e assinatura, além de rigorosa conferência de seus documentos pessoais.

2º - Em qualquer caso, o Oficial, após conferir o original, manterá em arquivo cópia de documento oficial de identificação do requerente, juntamente com cópia do termo por este assinado. 3º - Constarão do termo, além dos dados do requerente, os dados da genitora e do filho, devendo o Oficial colher a assinatura da genitora do filho a ser reconhecido, caso o mesmo seja menor. 4º - Caso o filho a ser reconhecido seja maior, o reconhecimento dependerá da anuência escrita do mesmo, perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 5º - A coleta da anuência tanto da genitora como do filho maior apenas poderá ser feita pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 6º - Na falta da mãe do menor, ou impossibilidade de manifestação válida desta ou do filho maior, o caso será apresentado ao Juiz competente. 7º - O reconhecimento de filho por pessoa relativamente incapaz dependerá de assistência de seus pais, tutor ou curador. Artigo 3º - O reconhecimento da paternidade socioafetiva apenas poderá ser requerido perante o Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais no qual o filho se encontre registrado. Artigo 4º - Sempre que qualquer Oficial de Registro de Pessoas Naturais, ao atuar nos termos deste Provimento, suspeitar de fraude, falsidade ou má-fé, não praticará o ato pretendido e submeterá o caso ao magistrado, comunicando, por escrito, os motivos da suspeita. Artigo 5º - Efetuado o reconhecimento de filho socioafetivo, o Oficial da serventia em que se encontra lavrado o assento de nascimento, procederá à averbação da paternidade, independentemente de manifestação do Ministério Público ou de decisão judicial. Artigo 6º - A sistemática estabelecida no presente Provimento não poderá ser utilizada se já pleiteado em juízo o reconhecimento da paternidade, razão pela qual constará, ao final do termo referido, declaração da pessoa interessada, sob as penas da lei, de que isto não ocorreu. Artigo 7º - O reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva não obstaculiza a discussão judicial sobre a verdade biológica. Artigo 8º - Deverão ser observadas às normas legais referentes à gratuidade de atos. Artigo 9º - Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação. Publique-se. Cumpra-se. Recife, 02 de dezembro de 2013. DES. JONES FIGUEIRÊDO ALVES Corregedor Geral da Justiça em exercício O Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por sua vez, editou o Provimento nº 21/2013 que disciplina: PROV - 21/2013 Código de validação: E1A6EBD4C4 Dispõe sobre o reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva perante os Ofícios de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Maranhão, e dá outras providências. O DESEMBARGADOR CLEONES CARVALHO CUNHA, CORREGEDOR- GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO, no uso de suas atribuições legais e regimentais: CONSIDERANDO o disposto no art. 226 da Constituição Federal, segundo o qual a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado; CONSIDERANDO que a Carta Magna ampliou o conceito de família, contemplando o princípio de igualdade da filiação, através da inserção de novos valores, calcando-se no princípio da afetividade e da dignidade da pessoa humana;

CONSIDERANDO que o instituto da paternidade socioafetiva, introduzido na doutrina brasileira pelo jurista Luiz Edson Fachin (1992), tem a sua existência ou coexistência reconhecidas no âmbito da realidade familiar; CONSIDERANDO que, segundo assente na doutrina e na jurisprudência pátrias, não há, a priori, hierarquia entre a paternidade biológica e a socioafetiva, tendo esta como fundamento a afetividade, a convivência familiar e a vontade livre de ser pai; CONSIDERANDO que é permitido o reconhecimento voluntário de paternidade perante o oficial de Registro Civil, devendo tal possibilidade ser estendida às hipóteses de reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva, já que ambos estabelecem relação de filiação, cujas espécies devem ser tratadas com igualdade jurídica; CONSIDERANDO que as normas consubstanciadas nos Provimentos n 12, 16, e 26 do Conselho Nacional de Justiça, as quais visam a facilitar o reconhecimento voluntário de paternidade biológica devem ser aplicáveis, no que forem compatíveis, ao reconhecimento voluntário da paternidade socioafetiva, tendo em vista a igualdade jurídica entre as espécies de filiação; CONSIDERANDO o disposto no art. 10, inciso II, do Código Civil em vigor, segundo o qual "os atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação devem ser averbados em registro público ; CONSIDERANDO o disposto no Enunciado Programático n 06/2013, do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, segundo o qual "do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos os direitos e deveres inerentes à autoridade parental ; CONSIDERANDO, por fim, a existência de grande número de crianças e de adultos sem paternidade registral estabelecida, embora tenham relação de paternidade socioafetiva já consolidada; RESOLVE: Art. 1 Autorizar o reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva de pessoas maiores de dezoito anos que já se acharem registradas sem paternidade estabelecida, perante o oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Maranhão. Art. 2 O interessado poderá reconhecer a paternidade socioafetiva de filho, perante o oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, mediante a apresentação de documento de identificação com foto, certidão de nascimento do filho, em original ou cópia. 1 O oficial deverá proceder à minuciosa verificação da identidade da pessoa interessada que perante ele comparecer, mediante coleta, no termo próprio, conforme modelo anexo a este Provimento, de sua qualificação e assinatura, além de rigorosa conferência de seus documentos pessoais. 2 Em qualquer caso, o oficial, após conferir o original, manterá em arquivo cópia de documento oficial de identificação do requerente, juntamente com o termo por este assinado, do qual constarão, além dos dados do requerente, os dados da genitora e do filho. 3 O reconhecimento dependerá da anuência escrita do filho maior, perante o oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 4 A coleta da anuência do filho maior apenas poderá ser feita pelo oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 5 Na falta ou impossibilidade de manifestação válida do filho maior, o caso será apresentado ao juiz competente. 6 O reconhecimento de filho por pessoa relativamente incapaz dependerá de assistência de seus pais, tutor ou curador. Art. 3 O reconhecimento da paternidade socioafetiva poderá ser requerido perante qualquer ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Maranhão, independentemente do lugar do assento de nascimento no Estado do Maranhão. Art. 4 Sempre que qualquer oficial de Registro de Pessoas Naturais, ao atuar nos termos deste Provimento, suspeitar de fraude, falsidade ou má-fé, não praticará o ato pretendido e submeterá o caso ao magistrado, comunicando, por escrito, os motivos da suspeita.

Art. 5 Efetuado o reconhecimento de filho socioafetivo, o oficial da serventia em que se encontra lavrado o assento de nascimento, procederá à averbação da paternidade, independentemente de manifestação do Ministério Público ou de decisão judicial. Art. 6 A sistemática estabelecida no presente provimento não poderá ser utilizada se já pleiteado em juízo o reconhecimento da paternidade, razão pela qual constará, ao final do termo referido, declaração da pessoa interessada, sob as penas da lei, de que isto não ocorreu. Art. 7 O reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva não obstaculiza a discussão judicial sobre a verdade biológica. Art. 8 Deverão ser observadas às normas legais referentes à gratuidade de atos. Art. 9 Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação. Publique-se. Cumpra-se. Desembargador CLEONES CARVALHO CUNHA Corregedor-geral da Justiça Matrícula 13557 Documento assinado. SÃO LUÍS - TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 19/12/2013 09:23 (CLEONES CARVALHO CUNHA) O Provimento nº 15/2013 editado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Ceará possui redação semelhante, como é possível verificar: PROVIMENTO Nº 15/2013 Dispõe sobre o reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva perante os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Ceará. O DESEMBARGADOR FRANCISCO SALES NETO, CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ, no uso de suas atribuições legais; CONSIDERANDO o disposto no art. 226 da Constituição Federal segundo o qual a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado; CONSIDERANDO que a Carta Magna ampliou o conceito de família, contemplando o princípio de igualdade da filiação, através da inserção de novos valores, calcando-se no princípio da afetividade e da dignidade da pessoa humana; CONSIDERANDO que é permitido o reconhecimento voluntário de paternidade perante o Oficial de Registro Civil, devendo tal possibilidade ser estendida às hipóteses de reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva, já que ambos estabelecem relação de filiação, cujas espécies devem ser tratadas com igualdade jurídica; CONSIDERANDO que as normas consubstanciadas nos Provimentos nº 12, 16 e 26 do Conselho Nacional de Justiça, as quais visam a facilitar o reconhecimento voluntário de paternidade biológica devem ser aplicáveis, no que forem compatíveis, ao reconhecimento voluntário da paternidade socioafetiva, tendo em vista a igualdade jurídica entre as espécies de filiação; CONSIDERANDO o disposto no art. 10, inciso II do Código Civil em vigor, segundo o qual "os atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação devem ser averbados em registro público"; CONSIDERANDO o disposto no Enunciado Programático nº 06/2013, do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, segundo o qual "do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos os direitos e deveres inerentes à autoridade parental"; CONSIDERANDO, por fim, a existência de um grande número de crianças e adultos sem paternidade registral estabelecida, embora tenham relação de paternidade socioafetiva já consolidada; RESOLVE: Artigo 1º - Autorizar o reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva de pessoas que já se acharem registradas sem paternidade estabelecida, perante os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais no âmbito do Estado do Ceará. Artigo 2º - O interessado poderá reconhecer a paternidade socioafetiva de filho, perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, mediante a apresentação de documento de identificação com foto, certidão de nascimento do filho, em original ou cópia.

1º - O oficial deverá proceder à minuciosa verificação da identidade da pessoa interessada que perante ele comparecer, mediante coleta, no termo próprio, conforme modele anexo a este Provimento, de sua qualificação e assinatura, além de rigorosa conferência de seus documentos pessoais. 2º - Em qualquer caso, o Oficial, após conferir o original, manterá em arquivo cópia de documento oficial de identificação do requerente, juntamente com cópia do termo por este assinado. 3º - Constarão do termo, além dos dados do requerente, os dados da genitora e do filho, devendo o Oficial colher a assinatura da genitora do filho a ser reconhecido, caso o mesmo seja menor. 4º - Caso o filho a ser reconhecido seja maior, o reconhecimento dependerá da anuência escrita do mesmo, perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 5º - A coleta da anuência tanto da genitora como do filho maior apenas poderá ser feita pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais. 6º - Na falta da mãe do menor, ou impossibilidade de manifestação válida desta ou do filho maior, o caso será apresentado ao Juiz competente. 7º - O reconhecimento de filho por pessoa relativamente incapaz dependerá de assistência de seus pais, tutor ou curador. Artigo 3º - O reconhecimento de paternidade socioafetiva apenas poderá ser requerido perante o Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais no qual o filho se encontre registrado. Artigo 4º - Sempre que qualquer Oficial de Registro de Pessoas Naturais, ao atuar nos termos deste Provimento, suspeitar de fraude, falsidade ou má-fé, não praticará o ato pretendido e submeterá o caso ao magistrado, comunicando, por escrito, os motivos da suspeita. Artigo 5º - Efetuado o reconhecimento de filho socioafetivo, o Oficial da serventia em que se encontra lavrado o assento de nascimento, procederá à averbação da paternidade, independentemente de manifestação do Ministério Público ou de decisão judicial. Artigo 6º - A sistemática estabelecida no presente Provimento não poderá utilizar se já pleiteado em juízo o reconhecimento da paternidade, razão pela qual constará, ao final do termo referido, declaração da pessoa interessada, sob as penas da lei, de que isto não ocorreu. Artigo 7º - O reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva não obstaculiza a discussão judicial sobre a verdade biológica. Artigo 8º - Deverão ser observadas as normas legais referentes à gratuidade de atos. Artigo 9º - Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação. Publique-se. Registre-se. Cumpra-se. Fortaleza-CE, 17 de dezembro de 2013. DESEMBARGADOR FRANCISCO SALES NETO Corregedor-Geral da Justiça E, por fim, o mais recente Provimento editado com a finalidade de permitir o reconhecimento da filiação socioafetiva mediante o oficial de Registro Civil é o de nº 234/2014 providenciado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, cujo texto é o seguinte: PROVIMENTO Nº 234/2014-CGJ/AM DISPÕE sobre o reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva perante os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Amazonas, e dá outras providências. O Excelentíssimo Senhor Desembargador FLÁVIO HUMBERTO PASCARELLI LOPES, Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Amazonas, no exercício de suas atribuições legais,

CONSIDERANDO que compete à Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Amazonas baixar provimentos e instruções necessários ao bom funcionamento da Justiça, na esfera de sua competência, nos termos do art. 74, inciso XXIV, da Lei Complementar n.º 17/97; CONSIDERANDO o disposto no art. 226 da Constituição Federal, segundo o qual a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado; CONSIDERANDO que a Carta Magna ampliou o conceito de família, contemplando o princípio de igualdade da filiação, através da inserção de novos valores, calcando-se no princípio da afetividade e da dignidade da pessoa humana; CONSIDERANDO que o instituto da paternidade socioafetiva, introduzido na doutrina brasileira pelo jurista Luiz Edson Fachin (1992), tem a sua existência ou coexistência reconhecidas no âmbito da realidade familiar; CONSIDERANDO que, segundo assente na doutrina e na jurisprudência pátrias, não há, a priori, hierarquia entre a paternidade biológica e a socioafetiva, tendo esta como fundamento a afetividade, a convivência familiar e a vontade livre de ser pai; CONSIDERANDO que é permitido o reconhecimento voluntário de paternidade perante o Oficial de Registro Civil, devendo tal possibilidade ser estendida às hipóteses de reconhecimento voluntário de paternidade socioafetiva, já que ambos estabelecem relação de filiação, cujas espécies devem ser tratadas com igualdade jurídica; CONSIDERANDO que as normas consubstanciadas nos Provimentos nº 12, 16, e 26 do Conselho Nacional de Justiça, as quais visam a facilitar o reconhecimento voluntário de paternidade biológica devem ser aplicáveis, no que forem compatíveis, ao reconhecimento voluntário da paternidade socioafetiva, tendo em vista a igualdade jurídica entre as espécies de filiação; CONSIDERANDO o disposto no art. 10, inciso II do Código Civil em vigor, segundo o qual os atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação devem ser averbados em registro público ; CONSIDERANDO o disposto no Enunciado Programático nº 06/2013, do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, segundo o qual do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos os direitos e deveres inerentes à autoridade parental ; CONSIDERANDO a existência de um grande número de crianças e adultos sem paternidade registral estabelecida, embora tenham relação de paternidade socioafetiva já consolidada; CONSIDERANDO, por fim, a existência no âmbito dos Tribunais de Justiça do Maranhão, Pernambuco e Ceará de atos normativos (provimentos) que facilitam o reconhecimento de paternidade socioafetivo, inclusive com menção pelo do Conselho Nacional de Justiça, RESOLVE: Artigo 1º. Autorizar o reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva de filhos registrados sem paternidade estabelecida, perante os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Amazonas. Parágrafo único. As regras deste Provimento são aplicáveis pelos magistrados que conduzem, no âmbito deste Tribunal, o projeto Pai Presente desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça. Artigo 2º. O reconhecimento da paternidade socioafetiva somente poderá ser requerido perante o Ofício de Registro Civil de Pessoas Naturais no qual o filho se encontre registrado. 1º O interessado deverá comparecer pessoalmente perante o respectivo Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais munido de documento de identificação oficial com foto, certidão de nascimento do filho, original ou cópia autenticada. 2º. O oficial procederá à minuciosa verificação da identidade da pessoa interessada, mediante coleta, no termo próprio, conforme modelo anexo a este Provimento que será fornecido gratuitamente pela serventia, de sua qualificação e assinatura, além de rigorosa conferência de seus documentos pessoais. 3º. O oficial do Registro manterá em arquivo cópia devidamente autenticada do documento oficial de identificação do interessado, juntamente com cópia do termo por este assinado. 4º. Constarão do termo, além dos dados do requerente, os dados da genitora e do filho reconhecido, devendo o oficial do Registro colher a assinatura daquela, caso o mesmo seja menor de idade.

5º. Caso o filho seja maior de idade, o reconhecimento dependerá da anuência escrita do mesmo, também colhida perante o oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais respectivo. 6º. Apenas o oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais competente poderá realizar a coleta da anuência da genitora ou do filho maior de idade. 7º. Na falta da mãe, ou impossibilidade de manifestação válida desta ou do filho maior, o pedido será encaminhado ao Juiz competente para deliberação. 8º. O reconhecimento de filho socioafetivo por pessoa relativamente incapaz dependerá da assistência de seu outro genitor, tutor ou curador. Artigo 3º. Sempre que qualquer oficial de Registro de Pessoas Naturais, ao atuar nos termos deste Provimento, suspeitar de fraude, falsidade ou má-fé, deixará de praticar o ato de reconhecimento pretendido e submeterá o caso ao magistrado competente, expondo, por escrito, os motivos da sua recusa. Artigo 4º. Efetuado o reconhecimento de filho socioafetivo, o oficial da serventia em que se encontra lavrado o assento de nascimento deste, procederá à averbação da paternidade no registro respectivo, independentemente de ordem judicial. Artigo 5º. Este Provimento não se aplica caso o reconhecimento da paternidade socioafetiva seja objeto de demanda judicial em tramitação ou já transitada em julgado. Parágrafo único. O interessado declarará, sob as penas da lei, a inexistência de processo judicial no qual se discuta o reconhecimento da paternidade socioafetiva do filho. Artigo 6º. O reconhecimento espontâneo da paternidade socioafetiva não obstaculiza a discussão judicial sobre a verdade biológica. Parágrafo único. O reconhecimento da paternidade socioafetiva efetivado nos moldes deste Provimento é irrevogável. Artigo 7º. Deverão ser observadas as normas legais referentes à gratuidade de atos. Artigo 8º. Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação. REGISTRE-SE. PUBLIQUE-SE. CUMPRA-SE. Gabinete do Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Amazonas, 05 de dezembro de 2014 Desembargador FLÁVIO HUMBERTO PASCARELLI LOPES Corregedor-Geral de Justiça Apesar de já existir a necessidade de se facilitar o reconhecimento voluntário da filiação socioafetiva, essa tornou-se ainda maior com o julgamento da ADI 4277-DF que equiparou o casamento e a união estável de casais homoafetivos aos de casais heterossexuais. Com o reconhecimento jurídico da família homoafetiva a filiação socioafetiva ganhou ainda mais destaque e importância para o mundo jurídico, uma vez que os filhos havidos dessa união não são biológicos por um motivo ou outro. Inobstante a presunção de filiação por filho havido através de inseminação artificial heteróloga ocorrida durante o casamento valer para casamento homoafetivo (artigo 1.597, V, Código Civil), há circunstância em que seria impossível o reconhecimento voluntário do filho já no Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais. Caso marcante para o estudo que ora se apresenta é o Parecer nº 321/2014-E emitido pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, elaborada pelo Juiz Assessor da Corregedoria Gustavo Henrique Bretas Marzagão. Nesse parecer foi discutida a possibilidade de uma das mães, que constituía união homoafetiva, reconhecer a filiação socioafetiva perante o Registro Civil das Pessoas Naturais do

filho havido por sua companheira através de fertilização in vitro com doador anônimo durante a união estável. Ou seja, a criança era filha do casal homoafetivo. Juntas as companheiras planejaram, desejaram e lutaram para terem um filho, o que ocorreu, como dito, graças a fertilização in vitro. Contudo, apenas uma era reconhecidamente mãe biológica da criança e, por essa razão, apenas ela constava na certidão de nascimento como mãe. Juridicamente a outra mãe não possuía qualquer relação com o filho. Assim, uma vez comprovada nos autos a ligação afetiva entre mãe e filho não há como deixar de reconhecer a filiação socioafetiva como solução para o caso em concreto. Questão interessante tratada no referido parecer diz respeito ao receio em discriminar o casal homoafetivo e seus "filhos". O Douto Juiz Assessor da Corregedoria, em suas fundamentações, defendeu que: Assim, de acordo com a lógica construída na r. decisão e acatada pelo D. Procuradoria Geral de Justiça, se a presunção da paternidade contida no art. 1.597, V, do Código Civil, vale também entre companheiros, e se aos casamentos e uniões estáveis de pessoas do mesmo sexo são garantidos os mesmos direitos, não se pode recusar à mãe socioafetiva o direito de reconhecer como seu o filho havido nessas circunstâncias. Do contrário, criar-se-ia a seguinte situação injustificada de desigualdade: os cônjuges ou companheiros de sexos diferentes (relacionamento heterossexual) teriam acesso à via mais rápida do reconhecimento direto perante o registrador, ao passo que os companheiros ou cônjuges de mesmo sexo (relacionamento homoafetivo) teriam de trilhar a morosa e dispendiosa via judicial. De forma brilhante o autor do parecer fundamentou a possibilidade de reconhecimento voluntário da filiação socioafetiva do caso analisado no princípio da igualdade e na presunção de paternidade elencada no Código Civil. O parecer não possui caráter coercitivo. Para que realmente o Registro Civil de Pessoas Naturais possa formalizar esse reconhecimento sem ordem judicial é necessário a edição de um provimento, tal como nos estados já citados. Até lá os tabeliães somente poderão registrar a filiação socioafetiva mediante ordem judicial. De uma forma ou de outra, uma vez reconhecido, o filho socioafetivo tem os mesmos direitos e deveres que os demais filhos, devendo o aplicador do direito se pautar na aplicação de princípios constitucionais anteriormente citados para tanto. Assim, será feito ou alterado o registro civil de nascimento para que nele se conste o sobrenome de família do registrado e também os nomes de seus pais socioafetivos, inclusive com a

destituição do poder familiar dos pais jurídicos ou biológicos que no referido registro constem, nos termos do artigo 10 c.c. 1.603 c.c. 1.605, todos do Código Civil: Art. 10. Far-se-á averbação em registro público: I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal; II - dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação. Art. 1.603. A filiação prova-se pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil. Art. 1.605. Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito: I - quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos pais, conjunta ou separadamente; II - quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos. (Grifos nossos) Inobstante o direito personalíssimo do filho socioafetivo em conhecer sua origem genética, uma vez declarada a existência do estado de filho afetivo esta será irrevogável conforme os artigos 226, 4º e 7º, e 227, 6º e, de modo infraconstitucional, encontra fundamento nos princípios do melhor interesse da criança e do adolescente, conforme os artigos 1º, 6º, 15 e 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Se assim não fosse haveria total desrespeito aos princípios da igualdade entre as filiações e da boa-fé objetiva, já que a adoção e a paternidade biológica (quando comprovada através de um exame de DNA), não são suscetíveis de revogação Exceção se faz somente nos casos de falsidades ou de vícios de vontade ou de consentimento. Nesse sentido: DIREITO CIVIL - DESCONSTITUIÇÃO DE PATERNIDADE REGISTRAL. Admitiu-se a desconstituição de paternidade registral no seguinte caso: (a) o pai registral, na fluência de união estável estabelecida com a genitora da criança, fez constar o seu nome como pai no registro de nascimento, por acreditar ser o pai biológico do infante; (b) estabeleceu-se vínculo de afetividade entre o pai registral e a criança durante os primeiros cinco anos de vida deste; (c) o pai registral solicitou, ao descobrir que fora traído, a realização de exame de DNA e, a partir do resultado negativo do exame, não mais teve qualquer contato com a criança, por mais de oito anos até a atualidade; e (d) o pedido de desconstituição foi formulado pelo próprio pai registral. De fato, a simples ausência de convergência entre a paternidade declarada no assento de nascimento e a paternidade biológica, por si só, não autoriza a invalidação do registro. Realmente, não se impõe ao declarante, por ocasião do registro, prova de que é o genitor da criança a ser registrada. O assento de nascimento traz, em si, essa presunção. Entretanto, caso o declarante demonstre ter incorrido, seriamente, em vício de consentimento, essa presunção poderá vir a ser ilidida por ele. Não se pode negar que a filiação socioafetiva detém integral respaldo do ordenamento jurídico nacional, a considerar a incumbência constitucional atribuída ao Estado de proteger toda e qualquer forma de entidade familiar, independentemente de sua origem (art. 227 da CF). Ocorre que o estabelecimento da filiação socioafetiva perpassa, necessariamente, pela vontade e, mesmo, pela voluntariedade do apontado pai, ao

despender afeto, de ser reconhecido como tal. Em outras palavras, as manifestações de afeto e carinho por parte de pessoa próxima à criança somente terão o condão de convolarem-se numa relação de filiação se, além da caracterização do estado de posse de filho, houver, por parte do indivíduo que despende o afeto, a clara e inequívoca intenção de ser concebido juridicamente como pai ou mãe da criança. Portanto, a higidez da vontade e da voluntariedade de ser reconhecido juridicamente como pai consubstancia pressuposto à configuração de filiação socioafetiva no caso aqui analisado. Dessa forma, não se concebe a conformação dessa espécie de filiação quando o apontado pai incorre em qualquer dos vícios de consentimento. Ademais, sem proceder a qualquer consideração de ordem moral, não se pode obrigar o pai registral, induzido a erro substancial, a manter uma relação de afeto igualmente calcada no vício de consentimento originário, impondo-lhe os deveres daí advindos sem que voluntária e conscientemente o queira. Além disso, como a filiação socioafetiva pressupõe a vontade e a voluntariedade do apontado pai de ser assim reconhecido juridicamente, caberá somente a ele contestar a paternidade em apreço. Por fim, ressalte-se que é diversa a hipótese em que o indivíduo, ciente de que não é o genitor da criança, voluntária e expressamente declara o ser perante o Oficial de Registro das Pessoas Naturais ( adoção à brasileira ), estabelecendo com esta, a partir daí, vínculo da afetividade paterno-filial. Nesta hipótese diversa do caso em análise, o vínculo de afetividade se sobrepõe ao vício, encontrando-se inegavelmente consolidada a filiação socioafetiva (hipótese, aliás, que não comportaria posterior alteração). A consolidação dessa situação em que pese antijurídica e, inclusive, tipificada no art. 242 do CP, em atenção ao melhor e prioritário interesse da criança, não pode ser modificada pelo pai registral e socioafetivo, afigurando-se irrelevante, nesse caso, a verdade biológica. Trata-se de compreensão que converge com o posicionamento perfilhado pelo STJ (REsp 709.608- MS, Quarta Turma, DJe 23/11/2009; e REsp 1.383.408-RS, Terceira Turma, DJe 30/5/2014). REsp 1.330.404-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 5/2/2015, DJe 19/2/2015. Uma importante observação a ser realizada é a de que, se o filho socioafetivo desejar conhecer uma origem genética, não poderá firmar com o(s) pai(s) biológico(s) qualquer vínculo jurídico, uma vez que tais vínculos já existem com os pais socioafetivos 8. Inquestionável, também, que os pais socioafetivos, uma vez formalizada a filiação, passarão a ser titulares do poder familiar e de todos os direitos e deveres dele decorrentes: obrigação alimentar, direitos sucessórios, obrigação de ter o filho sob sua guarda e vigilância, de educar, etc. O direito/dever aos alimentos será recíproco entre pais e filhos socioafetivos nos termos do artigo 1.694 do Código Civil, observados sempre o binômio necessidade/possibilidade e a possibilidade de prisão civil se descumprida a obrigação, conforme estabelece o ordenamento jurídico brasileiro. 8 INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM PEDIDO DE ANULAÇÃO DE REGISTRO. Autora que, ao início do feito, já contava com mais de 50 anos de idade, tendo durante mais de meio século, constado como filha do marido de sua mãe, que a registrou como tal. POSSE DO ESTADO DE FILHO. A filiação, mais do que um fato biológico é um fato social. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO, NO CASO CONCRETO. Conteúdo imoral na demanda, que, convenientemente, como de regra ocorre, busca a troca de um pai pobre por um pai rico. Apelo desprovido, por maioria, vencida a Relatora. (Apelação cível nº 70004989562, tribunal de justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, julgado em 12/10/2002).