Professor Álvaro Villaça Azevedo Titular da Faculdade de Direito da USP
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1 Indicação nol SC Comissão de Direito de Família AUTOR DA INDICAÇÃO: ADVOGADO MARCOS NUNES CILOS EMENTA PAI SOCIOAFETIVO: ART E 1.595, AMBOS DO CC/2002. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO TÉCNICA A FIM DE COMPORTAR A FIGURA DO PAI SOCIOAFETIVO ATUANTE, FRENTE À REALIDADE SOCIAL. FUNÇÃO SOCIAL E EDUCATIV A DO PAI SOCIOAFETIVO ATUANTE. PARECER DO PROFESSOR ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO 1- RELATÓRIO O Autor apresenta com a ementa acima e com fundamento nos arts e do CC/2002, a Indicação ora analisada, entendendo que "seja fundamental que o novo cônjuge ou companheiro participe do poder familiar, tendo em vista exatamente o principio do melhor interesse da criança e do adolescente, sem discriminar as famílias reconstituídas (art /CC de 2002)". Pugna, assim, para que o Código Civil atualizado, quanto às questões relativas à figura do pai socioafetivo.
2 Acreditando que as questões que envolvem proteção dos filhos, relação de parentesco e poder familiar precisam ser revistas e atualizadas, destaca duas questões fundamentais que devem ser discutidas: "a) Qual é o parentesco que existe entre o filho que o novo cônjuge ou companheiro traz à nova família? Irmãos? b) Quais as responsabilidades CIVIS do novo cônjuge ou companheiro com efetivo poder familiar?" li-parecer atual. Vivemos a era do afeto no Direito de Família Apesar dos avanços da tecnologia biomédica, nos últimos anos, a paternidade biológica exerce um papel secundário no Direito de Família, especialmente quando confronta com os princípios da afetividade, da igualdade entre os filhos e da dignidade da pessoa humana, que imperam na convivência familiar. Esses princípios, que fundamentam a paternidade socioafetiva, foram consagrados pelo nosso ordenamento jurídico e, por isso, sobrepõem-se e prevalecem até mesmo ante uma prova biológica, por exemplo, um exame de DNA com resultado positivo, que aponte o verdadeiro genitor, mas que jamais teve uma convivência familiar com os filhos biológicos mencionados no exame.
3 Em nossa Constituição Federal de 1988, além do artigo 1, inciso Ill, que define a dignidade da pessoa humana como um dos princípios fundamentais de nossa ordem jurídica, destacam-se outros dispositivos que cuidam, especificamente, de relações familiares entre pais e filhos. Realmente, o artigo 227, 6, estabelece que todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem, incluindo, especialmente, nesse âmbito da igualdade de direitos, os filhos havidos por adoção. O caput desse mesmo dispositivo constitucional assegura à criança e ao adolescente o direito à convivência familiar, sem qualquer negligência, crueldade ou discriminação, não sendo prioridade, portanto, a origem genética. O artigo 226, 4, atribui à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida. No âmbito infraconstitucional, nosso Código Civil de 2002, em seu artigo 1.593, reconhece outras espécies de parentesco civil (outras origens), além do decorrente da adoção, acolhendo, assim, essa nova base de vínculo parental, a paternidade socioafetiva fundada na posse de estado do filho. Outros dispositivos do Código Civil de 2002 destacam-se também no sentido de acolherem o paradigma da paternidade socioafetiva. O artigo estabelece que todos os filhos, independentemente de sua origem, possuem os mesmos direitos, conforme se verifica de sua redação, verbis : "Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação".
4 o artigo 1.597, inciso V, ao presumir concebido na constância do casamento o filho havido por inseminação artificial heteróloga, com a prévia autorização do marido, acaba admitindo uma origem parcialmente biológica desse filho, pois o marido que autorizar a reprodução humana assistida com utilização de sêmen alheio, será um pai exclusivamente socioafetivo, o que não poderá ser impugnado por investigação de paternidade posterior, uma vez que a lei autoriza o aludido procedimento artificial. o artigo 1.605, inciso li, prevê que, na falta ou defeito do termo de nascimento, poderá ser provada a filiação por qualquer modo admissível em direito, especialmente, "quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos", por exemplo, quando existe um tratamento pessoal e afetivo recíproco entre duas pessoas, como pai e filho e vice versa; quando uma pessoa provê a educação e o sustento da que é por ele criada, o que também é conduta típica entre pai e filho; quando duas pessoas se apresentam em público, reciprocamente, como pai e filho, sendo essa convivência pessoal e afetiva, específica e típica do relacionamento entre pai e filho, reconhecida pela sociedade e pela família; entre outros exemplos possíveis. Esse dispositivo legal consagra a posse de estado de filiação, que abrange as hipóteses do filho de criação e da adoção de fato, esta também denominada "adoção à brasileira". E o artigo admite que o filho rejeite o reconhecimento do estado de filiação, requerido posteriormente pelo pai biológico que não efetuou o registro após seu nascimento. Como se nota, as aludidas normas constitucionais e infraconstitucionais demonstram que a paternidade e a filiação socioafetivas
5 5 foram acolhidas e consagradas pelo nosso ordenamento jurídico, de maneira a possibilitar o seu reconhecimento, mesmo que não exista vínculo biológico. Portanto, a figura do pai socioafetivo está plenamente reconhecida pela nossa legislação que assegura ao afeto sua posição privilegiada no Direito brasileiro, atuando em clima de verdadeira função social, na integração familiar de seus membros. Pelo cogitado art. l.636 do CC de 2002, ele não desprestigia a figura do pai socioafetivo, e, sim, garante que, em nova união familiar, o pai ou a mãe não perde quanto a seus filhos anteriores os direitos ao poder familiar, que se exerce sem interferência do novo cônjuge, entretanto, nada impede que esse novo cônjuge ou companheiro exerça seu afeto quanto aos filhos do outro cônjuge ou companheiro. Pode ser que, socialmente, venham essas atuações a existir, mais uma do que a outro, mas sempre no interesse dos filhos. Quanto às questões levantadas, não há parentesco entre o filho do novo cônjuge ou companheiro e o filho do cônjuge ou companheiro anterior. Podem ser considerados afins. O tempo de convivência pode levar a uma afetividade como de irmãos, em situação de fato (irmãos de criação). o poder familiar é exercido pelos pais dos respectivos filhos, que pode ser substituído por uma situação de afeto e que transforme quem nunca foi pai biológico em pai socioafetivo. A lei não pode prever situações futuras de fato, de dependem do relacionamento entre pessoas. O novo companheiro continua exercendo seu poder familiar sobre seu filho, como o outro cônjuge ou companheiro sobre seu filho. Nada impede que um cônjuge ou companheiro venha a exercer influência
6 com o filho do outro e vice versa, desenvolvendo socioafetivo. clima de amor e/ou de amizade A lei não pode criar o afeto entre os filhos do cônjuge ou companheiro, paralelamente ao poder familiar do novo cônjuge ou companheiro, porque o afeto não nasce da lei e sim do amor. Todavia, se for criado qualquer dispositivo legal em regulamentação ou aperfeiçoamento, do sistema atualmente existente, serei favorável, o que tornará o Código Civil mais humano e respeitoso à dignidade da pessoa humana. Reservo-me o direito de manifestar-me sobre eventual projeto de lei. É o meu Parecer, São Paulo, 31 d julho de 2012., Advogado e Consultor Jurídico
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