O PRONOME SE EM ESPANHOL: TEORIAS, USOS E ENSINO



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Transcrição:

O PRONOME SE EM ESPANHOL: TEORIAS, USOS E ENSINO Elena ORTIZ PREUSS (Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões URI) ABSTRACT: This study analyzes the classifications of the SE and its implications in the context of Spanish education. It is presented the theoretical classification on SE, in traditional grammars, and its boarding in didactic books. It was noticed that theoretically exist convergent and divergent points and that, in the didactic books, the subject receives incipient treatment. KEYWORDS: SE; Spanish; education. 0. Introdução Existe, na Língua Espanhola, um grande número de construções com o clítico SE, entretanto ainda não há uma classificação homogênea sobre os usos desse pronome, o que dificulta a sua transposição didática. Em vista disso, esse artigo apresenta um trabalho desenvolvido sobre os usos do SE, tendo em vista os seguintes objetivos: apresentar e discutir o quadro classificatório dos usos do clítico SE, na Língua Espanhola, e suas implicações no contexto de ensino-aprendizagem dessa língua; verificar como se dá a relação entre a teoria e a prática de ensino do clítico SE em Espanhol para aprendizes brasileiros, analisando como alguns livros didáticos (a partir daqui LDs) apresentam esse conteúdo; refletir criticamente sobre as diferentes classificações do SE, a fim de evidenciar seus pontos convergentes e/ou divergentes, bem como, seus aspectos positivos e negativos. É preciso ressaltar que, sob hipótese alguma, a análise de gramáticas e livros visou a emitir qualquer juízo de valor sobre os mesmos. Em vista disso, na exposição, serão mencionadas somente as classificações existentes, incluindo os percentuais de aparecimento, mas não será citado explicitamente o nome das obras de referência. A discussão está organizada da seguinte maneira: inicialmente serão expostas as diferentes classificações do SE encontradas em obras de caráter teórico (gramáticas e livros especializados); em seguida será exposto o levantamento das classificações do clítico identificadas em LDs; por último, constam algumas considerações finais e as referências bibliográficas. 1. As classificações teóricas do clítico SE As classificações teóricas sobre o SE estão sintetizadas no seguinte quadro: Quadro1: As classificações teóricas do SE Classificação do SE Percentual Variante de le/les 100% Pronome reflexivo 85,72% Pronome com sentido recíproco 85,72%

Com verbos pronominais 71,42% Em orações passivas 57,15% Em orações quase-reflexivas 14,29% Em orações impessoais 85,72% Em construções de voz média 42,86% Em perífrases 14, 29% Expressar involuntariedade 14,29% Como componente ou morfema 14,29% verbal Com sentido expressivo 28,58% Dativo supérfluo ou de interesse 28,85% Dativo 14,29% Com sentido incoativo 14,29% Como operador aspectual 14, 29% Como um elemento 14,29% intransitivizante Conforme o quadro, nas sete obras consultadas foram identificadas dezessete classificações do clítico SE. Algumas delas são totalmente coincidentes, porém em outros casos existem algumas divergências. Assim, as análises serão expostas considerando o percentual de abrangência das classificações. Em todas as obras consultadas (100%), constatou-se a classificação do uso do SE como variante de le/les, isto é, como um pronome de complemento indireto usado para substituir os pronomes de complemento indireto quando da ocorrência de dois pronomes complemento: um direto (lo, los, la, las) e um indireto (le/les). Conforme o exemplo abaixo, no qual o complemento direto los libros foi substituído pelo pronome los e o complemento indireto para ella foi substituído pelo SE, pois correspondia ao pronome le. 1) Compré los libros para ella. Se los compré. Em 85,72% das obras analisadas foi identificada a classificação do uso do SE como pronome reflexivo, sendo um indicativo de coincidência entre o sujeito e o complemento da ação expressa pelo verbo, ou seja, quem pratica a ação verbal é o mesmo ser que é atingido por ela. A frase seguinte, na qual Maria é o sujeito que pratica e sofre a ação de pentear-se, ilustra esse uso: 2) María se peina. O mesmo percentual de classificação do SE como reflexivo (85,72%) foi constatado na classificação desse pronome com sentido recíproco, isto é, aquele que aparece em construções cujos sujeitos são duas ou mais pessoas ou coisas que exercem a ação sobre os outros, ao mesmo tempo em que a recebem. Este SE permanece com um caráter essencialmente reflexivo, embora a noção de reflexividade tenha sido redimensionada, conforme o anteriormente exposto. Assim, na frase (3) abaixo, constata-se que os sujeitos Juan e Pedro se aborrecem um com o outro. Porém, esta não é a única possibilidade de interpretação, pois os sujeitos podem ter se aborrecido um com o outro ou ambos,

simultaneamente, aborreceram-se com uma outra pessoa ou fato. Nesse caso, só o contexto evidenciará o sentido adequado. 3) Juan y Pedro se aborrecen. O valor reflexivo do SE procede também a dois tipos de orações: impessoais e passivas reflexivas. Nas análises, constatou-se que 57,15% das obras apresentam a classificação do uso do SE em orações passivas e 85,72% delas evidenciam a presença do clítico em orações impessoais. Há, entretanto, que se discutir alguns pontos divergentes no que se refere ao caráter de cada um dos tipos de orações. Ambas caracterizadas pela não presença do sujeito agente da ação expressa pelo verbo, foram diferenciadas pela presença da preposição a e a não concordância entre verbo e objeto no caso das orações impessoais e pela possibilidade de comutação em oração ativa, no caso das orações passivas, conforme os exemplos abaixo: 4) Se espera el premio. (passiva) 5) Se recibió a los turistas. (impessoal) Contudo, nas obras teóricas consultadas foram identificados alguns exemplos que contradizem tais afirmações, ou seja, a preposição a está presente numa oração passiva e o verbo concordou em número com o objeto numa oração impessoal. Esse fato está exemplificado nas seguintes frases: 6) Se seleccionó a los 17 jugadores. (passiva) 7) En verano se comen muchas verduras. (impessoal) Esses exemplos evidenciam que a distinção de orações passivas e impessoais ainda é confusa e não oferece subsídios confiáveis para o trabalho docente, merecendo ser melhor estudada e aprofundada teoricamente. Isso não será feito aqui, tendo em vista o escopo do trabalho 1. Em relação a tipos diferenciados de orações, houve também uma obra (14,29%) que apresentou a classificação do uso do SE em orações quase-reflexivas 2, consideradas construções reflexivas na forma e passivas no significado que expressam diferentes estados de alma. Apesar de ter sido apresentada uma análise dos usos e das relações verbais desse tipo de oração, é necessário um estudo mais aprofundado antes de qualquer julgamento mais específico, o que não atende ao escopo do trabalho. A frase seguinte ilustra esse uso: 8) Ella se enfada. 1 Sobre esse tema, foi desenvolvido um trabalho muito interessante por Sebastião L. dos Santos em sua dissertação de mestrado, que consta nas referências bibliográficas. 2 Tradução minha para as orações casi reflejas.

Outra classificação de uso do SE que apareceu em 71,42% das obras é como um pronome átono sem função sintática, aparecendo junto a verbos essencialmente pronominais, tais como arrepentirse e suicidarse. São verbos cuja construção está intrinsecamente baseada no uso de pronomes, conforme o exemplo abaixo: 9) Él se arrepiente de sus pecados Em algumas obras a classificação do SE junto a verbos pronominais se junta à classificação em orações de voz média, parecendo que estes usos não se contrapõem. Mas, aqui, optou-se por mantê-las separadas, para não cair no erro de se apresentar uma análise tendenciosa, cabendo ao leitor aprofundar-se mais nesse caso, se assim o quiser. A classificação do uso do SE em construções de voz média, ou seja, em construções cujo agente da ação verbal não é identificado, foi encontrada em 42,86% das obras analisadas. A frase seguinte (5) exemplifica esse caso. Nela, constata-se que o complemento el puente sofre a ação de hundirse, mas o agente não está expresso. 10) El puente se ha hundido. Outro contexto de uso do SE que apareceu em 14,29% das obras é junto a perífrases como em SE puede(n), nas quais o clítico caracterizado como reflexivo funciona como um incremento ao núcleo verbal, conforme a frase seguinte: 11) Se puede fumar? O contexto de uso do SE como componente ou morfema verbal, ou seja, como um elemento inerente, que compõe a construção verba,l apareceu em 14,29% das obras. A frase abaixo ilustra esse uso: 12) No se me ocurre nada. Nesse exemplo, argumentou-se que o infinitivo do verbo não seria ocurrir, mas sim ocurrirsele, ou seja, os pronomes fazem parte da morfologia verbal. O SE também apareceu em construções que expressam involuntariedade (14,29%), ou seja, que mostram um fato espontâneo em que o sujeito é mero espectador. Nesses casos o SE também é considerado reflexivo. A frase (13) exemplifica o uso: 13) se me cayó y se me rompió.

Apareceram, também, outras diferentes classificações do SE, tais como: SE com sentido expressivo (28,58%); como Dativo supérfluo ou de interesse (28,85%); como Dativo (14,29%). Em todas elas o clítico é opcional, uma vez que a sua presença somente traria maior expressividade ao enunciado. Os exemplos abaixo ilustram cada caso: 14) Pedro se bebió una botella de agua. (sentido expressivo) 15) Después de comer se fumó un habano. (dativo supérfluo ou de interesse) 16) Juan se comió todo el pastel. (dativo) Foi encontrado em uma obra (14,29%) o uso do SE com sentido incoativo, ou seja, que indica o início da ação, conforme a frase (17) em que a presença do clítico indica que Pedro começou a dormir. 17) Pedro se ha dormido. Em uma das obras (14, 29%) foi identificado o uso do SE como operador aspectual. Nesses contextos a presença do SE, que é opcional, indica que o evento está delimitado pela presença de um complemento, no caso dos verbos transitivos (ver frase 18), ou a delimitação é intrínseca ao significado do verbo, no caso dos verbos inacusativos (ver frase 19), conforme os exemplos: 18) Sara (se) ha fumado un puro. 19) El plato (se) cayó al suelo. Esta teoria abarca e explica os contextos apresentados nas classificações exemplificadas nas frases 13, 14, 15, 16 e 17. Nas frases 13 e 17, o SE aparece, pois, como se trata de verbos inacusativos, a delimitação do evento está intrínseca à significação verbal de caer e romper em (13) e de dormir em (17), mas nas frases 14, 15 e 16, todas com verbos transitivos beber, fumar e comer- a presença do clítico se justifica pelos complementos expressos: una botella em (14), un habano em (15), e todo el pastel em (16). Porém, em outra obra (14,29%) identificou-se a classificação do uso do SE como um elemento intransitivizante, isto é, a sua presença torna um verbo essencialmente transitivo em intransitivo, conforme o exemplo seguinte: 20) El niño se lava. El abuelo lava al niño.

Essa classificação, de certa forma, contrapõe a aplicação da teoria do SE como operador aspectual, uma vez que não garante que critérios puramente sintáticos, como a transitividade verbal, possam servir para orientar o uso do clítico. Assim, a partir da exposição de todas as classificações identificadas nas obras de caráter teórico, foi feita a apresentação e discussão dos pontos convergentes e divergentes das mesmas, em que se constatou que esse parece ser um conteúdo de alta complexidade, pois poucos são os aspectos em que se identificou homogeneidade de classificação e explicitação de uso. Será feita, na próxima seção, a apresentação e discussão dos usos do clítico em LDs, visando a verificar a prática da transposição didática desse conteúdo. 2. A apresentação do SE em livros didáticos (LD) Antes de expor os dados, é importante esclarecer que foram analisadas seis obras no total, sendo que algumas coleções compostas por dois ou três volumes foram consideradas em sua unidade, pois se entende que, como há gradação de conteúdos, é necessário considerar-se o todo da coleção. O Quadro 2 apresenta os dados a serem discutidos a seguir: Quadro2: Os usos do SE identificados nos Livros Didáticos (LD) Uso do SE Percentual Variante de le/les 100% Pronome reflexivo *83,34% Com verbos pronominais *83,34% Em orações passivas reflexivas 16,66% Em orações impessoais 83,34% Em perífrases 66,67% Expressar involuntariedade 50% Conforme o Quadro 1 acima, observa-se que das dezessete classificações identificadas nas obras teóricas, somente sete (equivalente a 41,18%) apareceram nos LDs. Esse não é um dado preocupante, pois, como foi exposto anteriormente, algumas classificações tiveram um índice de aparecimento muito baixo, outras se mostraram muito incipientes. Assim, esses resultados devem ser avaliados com mais cautela e profundidade. As análises mostraram que em todos os LDs analisados aparece a noção de SE como variante de le/les, com exemplos e atividades de fixação. Tal fato parece indicar que esse uso é de fácil transposição didática. O SE como pronome reflexivo, identificado em 83,34% dos LDs, nem sempre foi explicitado, pois desse percentual 80% refere-se exclusivamente a exposição de modelos de conjugação verbal, ou seja, não se fez nenhuma menção sobre o caráter do pronome. Caso semelhante ocorreu com o SE junto a verbos pronominais (83,34%), pois somente 50% desse percentual evidenciou que se tratava de verbos essencialmente pronominais, incluindo modelos de conjugação. Houve um baixo percentual de aparecimento de uso do SE em orações passivas reflexivas (16,66%). Vale lembrar que esse uso apareceu em 57,15% das obras teóricas. Tal fato motiva questionamentos tais como: essa seria uma estrutura pouco usada na Língua

Espanhola? Esse seria um uso de alta complexidade, o que dificulta a sua transposição didática? As divergências constatadas no âmbito teórico entre orações passivas reflexivas e orações impessoais seriam responsáveis por essa ocorrência? Não há subsídios, até o momento, que permitam ensaiar uma resposta definitiva, talvez essas questões motivem futuras investigações, a fim de compreender esse contexto. Quanto ao SE em orações impessoais, constatou-se que apareceu em 83,34% dos LDs, através de estruturas frasais prototípicas do tipo SE + verbo. Ao observar-se os exemplos usados nos LDs, foram encontradas orações que, pela teoria, poderiam ser consideradas orações passivas reflexivas, conforme a frase abaixo: 21) Se comen muchos dulces. Esse exemplo está refletindo as divergências identificadas também nas classificações teóricas, anteriormente discutidas. Tal fato parece indicar que essas divergências não transpareceriam no contexto de ensino-aprendizagem de LE, ao utilizar tais LDs, porque na maioria deles não se menciona a existência de um tipo de oração passiva reflexiva. Assim, haveria uma tendência à generalização das orações como sendo exclusivamente impessoais. Um dado significativo identificado nas análises refere-se aos usos do SE em perífrases, pois enquanto nas obras teóricas a ocorrência foi de 14,29%, nos LDs foi de 66,67%. Junto com a classificação havia a explicação semântica inerente á mesma, mas sem explicitar o papel exercido pelo clítico nesse contexto. Esse dado parece evidenciar que, assim como apresentam muitos modelos de conjugação verbal, os LDs tendem a apoiar-se na apresentação de estruturas frasais protípicas para explicitar a estrutura formal da língua. Outro dado extremamente importante foi identificado no aparecimento da classificação uso do SE em construções que expressam involuntariedade, porque foi identificado em uma única obra teórica (14,29%), mas apareceu em 50% dos LDs analisados. Isso poderia significar que essa é uma classificação de fácil transposição didática, tendo em vista algumas classificações e usos do SE que ainda estão longe de uma convergência teórica, como é o caso do SE como dativo, como operador aspectual, como intransitivizante, etc... A partir da exposição das análises dos LDs é possível constatar o distanciamento que há entre a teoria e a prática de ensino do clítico SE. Essa constatação não tem um caráter apreciativo, pelo contrário o tom que se quer dar é de reflexão para o contexto de ensinoaprendizagem de Espanhol, no que se refere aos usos do SE. Não se está pensando no desenvolvimento de uma unidade didática exclusiva sobre o tema, mas na importância de o professor saber discorrer sobre os diferentes usos do clítico de forma consistente e segura. 3. Considerações finais O estudo aqui desenvolvido tem um caráter essencialmente empírico, pela base analítica e observacional que o constitui. Ele surgiu da necessidade de reflexão sobre as classificações apresentadas teoricamente sobre o SE, que muitas vezes convergem ou divergem entre si, dificultando a sua transposição didática. As análises evidenciaram que há um grande distanciamento entre a teoria e a prática, uma vez que esta utiliza classificações de fácil transposição didática, além de simplificar os conceitos teóricos, através de modelos de conjugação, estruturas prototípicas e generalizações.

Outro fato que merece destaque é o redimensionamento dado ao conceito de reflexivo, que foi ampliado, não se referindo exclusivamente ao fato de o sujeito que pratica a ação ser também quem sofre a ação, mas aos efeitos da ação verbal no contexto frasal de um modo geral. Este trabalho não esgotou o tema, ao contrário, sinaliza para a necessidade de mais investigação, inclusive junto aos profissionais que atuam nos contextos de ensino de Espanhol para brasileiros, com o objetivo de verificar efetivamente o exercício de transposição didática desse conteúdo, abarcando outras dimensões que compõem o contexto de ensinoaprendizagem de LE. RESUMO: Este estudo analisa as classificações do SE e suas implicações no contexto de ensino de Espanhol. Apresenta-se a classificação teórica sobre o SE, em gramáticas tradicionais, e sua abordagem em livros didáticos. Observou-se que teoricamente existem pontos convergentes e divergentes e que, nos livros didáticos o tema recebe tratamento incipiente. PALAVRAS-CHAVE: SE; Espanhol; ensino. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALARCOS LLORACH, E. Gramática de la Lengua Española. Madrid: Espasa Calpe, 1995. ALVES, Adda-Nari M.; ALVES, Angélica M. Mucho: español para brasileños, 1ª ed. Volume Único. São Paulo: Moderna, 2001. ARTUÑEDO, Belén; DONSON, Cynthia. E/LE : curso de español para extranjeros. n º 2. Madrid: Ediciones SM, 1998. BELLO, Andrés. Gramática de la Lengua Castellana. Madrid: Edaf, S.A., 1997. BOROBIO, Virgilio. E/LE: curso de español para extranjeros. nº 1. Madrid: Ediciones SM, 1998. BRUNO, Fátima C.; MENDOZA, Maria A. Hacia el Español: curso de lengua y cultura hispánica. Nivel Avanzado. 1ªed. São Paulo: Saraiva, 2000.. Hacia el Español:curso de lengua y cultura hispánica. Nivel Intermedio. 1ªed. São Paulo: Saraiva, 1998a.. Hacia el Español: curso de lengua y cultura hispánica. Nivel Básico. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 1998b. CASTRO VIUDEZ, Francisca ; ROSA MUÑOZ, Soledad. Ven 3: curso de español para extranjeros. 1ª ed. Madrid: Edelsa, Grupo Didascalia, S.A., 1999. ; MARÍN ARRESE, Fernando ; MORALES GÁLVEZ, Reyes ; et al. Ven 1: curso de español para extranjeros. 6ª ed. Madrid: Edelsa, Grupo Didascalia, S.A., 1998.. Ven 2: curso de español para extranjeros. 2ª ed. Madrid: Edelsa, 1997. MARTÍN PERIS, Ernesto ; SÁNCHEZ QUINTANA, Nuria; SANS BAULENAS, Neus. Gente 3. Barcelona: Difusión, S.L.,2005. MARTÍN PERIS, Ernesto ; SANS BAULENAS, Neus. Gente 2. Barcelona: Difusión, S.L.,2004a.. Gente 1. Barcelona: Difusión, S.L.,2004b. MATTE BON, Francisco. Gramática comunicativa del español I: de la lengua a la idea. Madrid: Edelsa, 1999. MATTE BON, Francisco. Gramática comunicativa del español II: de la idea a la lengua. Madrid: Edelsa, 2004.

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