REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA, TERRITÓRIO E PODER NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

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Transcrição:

REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA, TERRITÓRIO E PODER NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Coordenação Maria Alzira Brum Lemos CONSELHO EDITORIAL Bertha K. Becker Candido Mendes Cristovam Buarque Ignacy Sachs Jurandir Freire Costa Ladislau Dowbor Pierre Salama

Floriano José Godinho de Oliveira REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA, TERRITÓRIO E PODER NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Copyright Floriano José Godinho de Oliveira, 2008 Direitos reservados para esta edição Editora Garamond Ltda Rua da Estrela, 79 - Rio Comprido - RJ 20251-021 Rio de Janeiro, Brasil Tel/fax: (21) 2504-9211 www.garamond.com.br editora@garamond.com.br Revisão Carmem Cacciacarro Editoração Eletrônica Luiz Oliveira Capa Estúdio Garamond CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE DO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. O47r Oliveira, Floriano José Godinho de, 1958- Reestruturação produtiva : território e poder no Estado do Rio de Janeiro / Floriano José Godinho de Oliveira. - Rio de Janeiro : Garamond, 2008. 304p. 14x21cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-7617-149-2 1. Geografia econômica. 2. Planejamento regional - Rio de Janeiro (Estado). 3. Espaço em economia. 4. Rio de Janeiro (Estado) - Condições econômicas. 5. Rio de Janeiro (Estado) - Política e governo. I. Título. II. Título: Território e poder no Estado do Rio de Janeiro. 08-3612. CDD: 910.98153 CDU: 910.133(815.3)

Dedico este trabalho, a meu pai, José, (em memória) e à minha mãe, Neuza por tudo que fi zeram juntos por nós. Às minhas amadas fi lhas, Clarissa e Marina, e à Eveline, pela paixão e compartilhamento da vida.

SUMÁRIO Prefácio...11 Introdução...17 O contexto amplo das mudanças...23 O Estado do Rio de Janeiro: mudanças e permanências na ordem local... 42 Capítulo I Economia, industrialização e organização política no estado do Rio de Janeiro: tendências no núcleo e no interior 1.1. Ocupação, desenvolvimento econômico e interiorização das atividades industriais no Estado do Rio de Janeiro... 57 1.2. A industrialização do núcleo e do interior e os eixos viários integradores... 64 1.2.1. O núcleo metropolitano... 64 1.2.2. O interior agroindustrial canavieiro e cafeicultor... 79 1.2.3. Os eixos integradores da industrialização no estado... 84 1.3. Alguns pressupostos institucionais do desenvolvimento industrial no país e no estado... 92 1.3.1. Do Estado da Guanabara à Fusão: a crise do abandono... 95 1.3.2. O estado da arte nos tempos da crise: da Fusão à década de 1980... 101

1.3.3. O segundo choque do petróleo e o fim do milagre brasileiro e... fluminense... 107 1.3.4. Alguns elementos positivos para a recuperação da crise... 113 Capítulo II Os novos caminhos de um novo estado 2.1. Mudanças na estrutura produtiva e a economia regional: considerações preliminares... 119 2.2. Observações acerca das mudanças... 133 2.3. Novos paradigmas produtivos e espaciais: a diversificação econômica e os setores empresariais dinâmicos no território...138 2.3.1. Em busca de novos caminhos... 144 2.3.2. O caminho da roça: por onde cresce a economia do estado...147 2.3.3. As atividades extrativistas como base da retomada do crescimento... 158 2.3.4. O Médio Vale do Paraíba: a siderurgia e os novos setores industriais... 186 Capítulo III A relação Estado-sociedade: paradigmas do poder local e do planejamento 3.1. As economias regionais e a escala local... 203 3.1.1. Um esforço de interpretação metodológica do que seja a escala local... 204 3.1.2. Região: um conceito carregado de significados e sentidos... 214 3.1.3. A reestruturação regional: economia e dinâmica territorial... 218 3.2. Políticas e estratégias de desenvolvimento: mito ou realidade... 224

3.2.1. Políticas de desenvolvimento e planos estratégicos locais...224 3.2.2. Instrumentos de gestão e políticas públicas... 230 3.3. Novos atores e formas de organização... 240 3.3.1. Os fóruns e instrumentos públicos de gestão... 240 3.3.2. Novas relações na organização do território local... 249 3.4. Mudanças nas relações de dominação no território... 268 Considerações finais: mudanças e novas dinâmicas no território... 271 Bibliografia...291

Siglas CBPF Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas Cefet-Campos Centro Federal de Educação Tecnológica de Campos dos Goytacazes Ceivap Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul Cenpes Centro de Pesquisas da Petrobras Cepal Comissão Econômica para América Latina e o Caribe Cepel Centro de Pesquisas da Eletrobrás Cetem Centro de Tecnologia Mineral Cide Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear Coppe Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia CPRM Companhia de Pesquisas de recursos Minerais Embrapa Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias ENCE Escola Nacional de Ciência Estatística Flupeme Federação Fluminense das Micros, Pequenas e Médias Empresas Ibam Instituto Brasileiro de Administração Municipal Ibmec Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais IEN Instituto de Engenharia Nuclear IME Instituto Militar de Engenharia Impa Instituto de Matemática Pura e Aplicada Inmetro Instituto Nacional de Metrologia INT Instituto Nacional de Tecnologia Ipea Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas Iplanrio Instituto de Planejamento do Município do Rio de Janeiro LNCC Laboratório Nacional de Computação Gráfica NDI Núcleo de desenvolvimento Industrial ON Observatório Nacional URV Unidade de Referência de Valores VTI Valor da Transformação Industrial

PREFÁCIO A análise do desenvolvimento regional do Estado do Rio de Janeiro não tem sido tema recorrente dos pesquisadores cariocas ou fluminenses, talvez porque a tradição de pensar o Brasil tenha se sobreposto a um olhar sobre si mesmo. O legado de ter abrigado a sede do Império e a capital federal influencia o olhar que busca freqüentemente compreender muito mais o desenvolvimento nacional do que o regional. O autor deste livro se coloca o desafio de mergulhar num olhar interior, voltando-se para o desenvolvimento regional do Estado do Rio de Janeiro, motivado em compreender as transformações recentes que aí vêm ocorrendo. Mas seu olhar não é redutor e nem tem a pequenez da restrição da análise de um lugar aos seus condicionantes locais, situando-se no desvendamento das transformações por meio de uma teia de relações que abrange várias escalas geográficas de análise. Tendo como parâmetro a tríade reestruturação produtiva, território e poder enquanto dimensões do capital, do espaço e da política, Floriano José Godinho de Oliveira mostra como vem se desenvolvendo uma maior integração do território fluminense, decorrente do desenvolvimento de complementaridades entre as regiões do estado, muitas das quais guardam estreita relação com a recente reestruturação produtiva. O enfoque sobre a reestruturação produtiva é o fio que conduz a análise dos fundamentos da transformação.

12 Reestruturação produtiva, Território e Poder no Estado do Rio de Janeiro Essa perspectiva lhe permite compreender como a industrialização atual, que se baseia em novos segmentos produtivos e em novas tecnologias, deslocou a primazia industrial do núcleo metropolitano, ou seja, da cidade do Rio de Janeiro, para fora desse núcleo, tecendo uma nova relação entre a capital e as regiões fluminenses, bem como novas relações entre regiões. Sua análise da reestruturação produtiva não se restringe ao trato do econômico; ela se desenvolve buscando apreender uma dimensão mais oculta, que transcende à dinâmica econômica e se situa no âmbito da política, que é a das práticas sociais locais e das mudanças nas práticas de gestão do território. É essa conjunção da problemática da reestruturação produtiva com a das práticas dos sujeitos sociais que alça a análise elaborada pelo autor a um plano superior, contribuindo de forma inovadora para uma maior compreensão da dinâmica territorial. Ele defende, claramente, que o território tem passado, história, não se constituindo num espaço liso, pelo contrário. Possui marcas e normas instituídas historicamente pelos sujeitos sociais que o organizam e dominam. Por isso, as formas como se relacionam ações, organizações e instituições locais nas práticas sociais e de gestão do território são aspectos que não podem ser desprezados... Considera a perspectiva regressiva e utiliza em sua argumentação a referência ao processo de industrialização do estado, tendo como objetivo mostrar o quanto esse processo foi dependente do governo federal, que tinha sua sede no Rio de Janeiro, além de ter contado, também, com o apoio de várias administrações estaduais. Essa particular e única situação de abrigar a capital federal levou a se considerar prioritários os laços entre os lugares e a capital. Privilegiou-se, portanto, o desenvolvimento de alguns eixos viários garantindo a relação com a cidade do Rio de Janeiro. A primazia

Floriano José Godinho de Oliveira 13 era desses eixos, em detrimento do desenvolvimento de uma rede viária mais complexa e menos linear. Sem exagero nenhum, era a capital federal que mediava as relações regionais do Estado do Rio de Janeiro, o que acabou redundando numa fraca integração territorial do estado fluminense. O autor tece um texto precioso nesse aspecto e defende a idéia de que ante o recuo, sobretudo dos auspícios do governo federal, o estado fluminense acabou por conhecer uma franca decadência industrial. À frouxidão nas relações regionais fluminenses soma-se essa decadência, fazendo o Estado do Rio de Janeiro conhecer uma fase francamente regressiva de desenvolvimento. Somente com a emergência de uma nova estrutura produtiva, que se impõe à anterior implicando o desenvolvimento de novos setores industriais, é que se consolidam relações mais fortes de complementaridade entre as regiões fluminenses. Imbuído de análise fundamentada em documentos e elementos consistentes, o autor vai mostrando, sustentado pelo rigor nos argumentos elaborados, que novos fluxos econômicos e sociais passaram a redesenhar o território e os contornos das regiões, a exemplo da reconfiguração da região norte canavieira e da região turística dos lagos. Igualmente, chama a atenção para a distensão dos pólos siderúrgicos e metal-mecânico, até então praticamente restritos às cidades de Volta Redonda e Barra Mansa. Faz ver que a presença do setor automobilístico e a reestruturação do setor químico também se constituem elementos significativos nas mudanças territoriais que se operam, assim como as atividades relacionadas à produção de petróleo e gás. As mudanças foram de tal monta que, segundo o autor, chegaram a alterar o núcleo central de regiões. Menciona a cidade de Macaé como um exemplo por ter deslocado a primazia da cidade de Campos, vinculada historicamen-

14 Reestruturação produtiva, Território e Poder no Estado do Rio de Janeiro te à produção agrícola regional, passando a se constituir um núcleo urbano concorrente na região, dada a sua relação com a produção extrativa de petróleo e gás que tomou a cena. Acertadamente, Floriano de Oliveira relaciona o desenvolvimento das infra-estruturas à dinâmica industrial, porém escapa do simplismo empobrecedor da antiga tradição de se falar em causas e conseqüências, ainda desastrosamente presentes quando a questão é a localização industrial. Para ele, os novos eixos de desenvolvimento visíveis no território, aliados à renovação de alguns eixos tradicionais e ao adensamento das redes de canalização de gás, energia elétrica e fibra ótica, bem como as mudanças na atividade portuária, que foi se deslocando do centro metropolitano para Itaguaí, somados ao redimensionamento dos portos de Angra dos Reis e Macaé e na perspectiva de criação do porto do Açu, em São João da Barra, tiveram implicações diretas na nova geografia industrial fluminense e na alteração dos recortes regionais. Em suma, sua cuidadosa análise deixa claro que a reterritorialização pela qual passou a atividade industrial fluminense recoloca na cena principal a questão da região e do território. Seu pensamento se insere entre aqueles que pensam o possível, que pensam nas possibilidades infinitas do homem e que não se dobram aos discursos hegemônicos ou midiáticos. Esse aspecto é que faz com que o autor desconfie do império da guerra dos lugares. Ao analisar a administração pública e o sentido regional de alguns problemas e demandas, destaca, por meio de vários exemplos, como algumas administrações municipais têm buscado formas conjuntas de gestão de serviços, bem como têm procurado compartilhar alguns programas, como os problemas relativos à proteção ambiental ou à gestão dos recursos hídricos.

Floriano José Godinho de Oliveira 15 Afirma que as políticas e projetos que se estendem para além dos limites municipais indicam uma inflexão positiva na gestão do território. Mesmo que essas ações não abarquem muitos municípios e nem incorporem muitas questões, o fato do autor enfatizar esse aspecto é importante porque, de certa forma, esmaece a posição comum de que se vive sob o império da guerra dos lugares. Ora, é importante dizer aqui que essa posição compromete qualquer projeto de desenvolvimento regional, afastando-nos do compromisso de se pensar o possível e de encontrar caminhos. Seu texto se funda em uma primorosa investigação de fontes secundárias e de dados que se alia a um trabalho de campo de extrema acuidade, sobretudo no que diz respeito às informações obtidas em entrevistas efetuadas com representantes de associações, órgãos e instituições, cuja análise esclarece e responde às indagações e, em especial, captura tensões subjacentes e conflitos presentes nos sujeitos sociais. Este livro, que cobre uma lacuna e que por certo se colocará como importante bibliografia para todos aqueles que buscam compreender o desenvolvimento brasileiro, é fruto de sua tese de doutorado, desenvolvida no Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) e posteriormente vencedora do Prêmio O Globo de Revitalização do Rio 2005, em que foram analisadas teses submetidas nos anos 2002, 2003 e 2004, pela banca composta por destacados cientistas fluminense, como André Urani (UFRJ), Carlos Lessa (UFRJ), Maria Alice Rezende de Carvalho (Iuperj), Marieta de Moraes Ferreira (IFCS/UFRJ e FGV) e Paulo Knauss (UFF). Durante os anos em que compartilhamos a relação de orientadora e orientando, anos de mútuo aprendizado, busquei garantir rigor teórico e metodológico na pesquisa, ao que constantemente Floriano respondeu. Sua tese,

16 Reestruturação produtiva, Território e Poder no Estado do Rio de Janeiro agora editada em livro, é mais do que um texto sobre reestruturação produtiva, território e poder. Seu texto expressa aquilo que me é mais caro: o rigor teórico e metodológico que se constitui no fundamento orientador de minha ação na contribuição para a formação científica de pesquisadores. A exposição do texto segue os ensinamentos de Marx, de que o método de exposição não se confunde com o método de investigação e o que pode ser chamado de teórico e empírico constitui uma unidade. Nesse sentido, o livro que agora vem a público é importante porque também é a expressão de um exercício teórico e metodológico. Não há uma divisão entre o teórico e o empírico, como entes estranhos um ao outro, como se o teórico fosse construído sem referência ao empírico e como se fosse possível um empírico esvaziado de teoria, esquecendo-se que qualquer fato científico é também uma construção teórica. Ao longo da leitura, as questões vão sendo apresentadas a partir do exame da realidade, e as contribuições teóricas e os diálogos estabelecidos vão sendo criticamente analisados na consideração dos problemas objetos de exame. Esse exercício de método competentemente elaborado pelo autor qualifica o trabalho, constituindo-se num verdadeiro exemplo de produção do conhecimento. Reestruturação produtiva, território e poder se constitui numa leitura obrigatória para os interessados na problemática do desenvolvimento e que buscam compreender os dilemas do processo de industrialização e os impasses nas práticas sociais a ele referidas. Interessa, portanto, a diferentes várias áreas do conhecimento. Convido o leitor a usufruir dessa rica leitura. Sandra Lencioni