Análise da evolução da pr o d u ç ã o de pr o c e d i m e n tos od o n to l ó g ic o s de média e alta complexidade na rede de serviços públicos em Santa Catarina Analysis of medium and high complexity dental procedures production evolution in Santa Catarina state public health service Claudia Flemming Colussi 1, Daniela Alba Nickel 2, Maria Cristina Marino Calvo 3, João Carlos Caetano 4, Ana Claudia Balladeli Silva 5 Re s u m o Foi realizado um estudo descritivo da atenção odontológica de média e alta complexidade no estado de Santa Catarina utilizando-se dados disponíveis nos Sistemas de Informação do SUS, no período de 2000 a 2006. Os procedimentos especializados contabilizaram, no ano de 2006, aproximadamente 6% do total da atenção odontológica, e seu custo representou menos de 20% do total de recursos destinados à odontologia. A rede ambulatorial pública do estado dispõe de 3.755 unidades e a rede hospitalar oferece 213 unidades hospitalares, das quais 21 disponibilizam atendimento odontológico, representando cerca de 1% do total de procedimentos odontológicos especializados realizados no estado. A média e a alta complexidades em odontologia em Santa Catarina caracterizam-se principalmente por uma demanda maior que a oferta de serviços, por uma pequena participação dos hospitais nessa oferta, e pela má distribuição das especialidades realizadas, características estas que certamente comprometem a integralidade do atendimento odontológico no estado. Pa l a v r a s-c h a v e Serviços de saúde bucal, níveis de atenção à saúde, atenção secundária à saúde, atenção terciária à saúde Ab s t r a c t The secondary and tertiary oral health care from Santa Catarina state was described using available data collected from the Information System of the Unified Health System (SUS), in the period between 2000 e 2006. The specialized procedures represented in 2006 approximately 6% of the oral health procedures, which cost represented less than 20% of the oral health spending. The public outpatient network of the state provides 3.755 units while the hospital network has 213 hospitals, of which 21 provide dental care, representing about 1% of the dental specialized procedures in the state. The medium and high complexity dental care in Santa Catarina state is mainly characterized by a demand greater than the available services, with a discreet hospitalized provision of this service, and poor distribution of the different specialized procedures offered. These features compromises the integral quality of the health care in the state. 1 Mestre em Saúde Pública UFSC - End.: Rua dos Gerânios Floridos, 69 CEP88040-555 Florianópolis, SC E-mail: claucolussi@hotmail.com 2 Doutoranda em Saúde Pública pela Universidade Federal de Santa Catarina. 3 Doutora em Engenharia de Produção. Professora adjunta da Universidade Federal de Santa Catarina. 4 Doutor em Odontologia Social. Professor Titular da Universidade Federal de Santa Catarina. 5 Doutora em Odontologia em Saúde Coletiva UFSC C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 939
C l a u d i a Fl e m m i n g Co l u s s i, Da n i e l a Al b a Ni c k e l, Ma r i a Cristina Ma r i n o Ca l v o, Jo ã o Ca r l o s C a e t a n o, An a Cl a u d i a Ba l l a d e l i Si l v a Key words Dental health services, health care levels, secondary health care, tertiary health care 1. In t r o d u ç ã o 1.1. Ca r a c t e r i z a ç ã o d o s níveis d e c o m p l e x i d a d e n o Si s te m a Ún i c o d e Saúde (SUS) A descentralização político-administrativa, com ênfase na municipalização, a regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde são princípios do sistema de saúde brasileiro. A fim de potencializar os recursos disponíveis, o sistema de saúde apresenta níveis de assistência de crescente densidade tecnológica. A atenção básica, que é o primeiro nível de atenção, também denominada de atenção primária, é responsável pela realização de ações nos campos da promoção, prevenção e assistência individual, e a prestação de serviços necessários à resolução dos problemas de maior prevalência e significado social em cada comunidade. A atenção de média e alta complexidade compreende um conjunto de ações e serviços ambulatoriais e hospitalares, cuja prática clínica demanda disponibilidade de profissionais especializados e a utilização de recursos tecnológicos de apoio diagnóstico e terapêutico de forma que não justifica a sua oferta em todos os municípios do país (Brasil, 2002a). A atenção básica é claramente definida como responsabilidade da gestão municipal, já a assistência de média e alta complexidade é vinculada a pactuação entre União, estados e municípios (Brasil, 2002a). Excetuando as ações mínimas da média complexidade, que devem ser garantidas no âmbito dos módulos assistenciais, as demais ações assistenciais de média complexidade, tanto ambulatoriais como hospitalares, podem ser garantidas no âmbito microrregional, regional ou estadual, conforme o tipo de serviço, a disponibilidade tecnológica, as características do estado e a definição no Plano Diretor de Regionalização. A garantia de acesso aos procedimentos de alta complexidade é de responsabilidade solidária entre o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde dos estados e do Distrito Federal (Brasil, 2002b). Além dos procedimentos de média e alta complexidade, existem as ações estratégicas que estão incluídas em políticas de indução para a ampliação da oferta de serviços como os transplantes, as cirurgias eletivas e os procedimentos para reabilitação de anomalias craniofaciais (Brasil, 2003). Assim, os procedimentos hospitalares e os procedimentos ambulatoriais, são classificados em média complexidade, alta complexidade e estratégicos. O rol 940 C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009
A n á l i s e d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o d e p r o c e d i m e n t o s o d o n t o l ó g i c o s d e m é d i a e a l t a c o m p l e x i d a d e n a r e d e d e s e r v i ç o s p ú b l i c o s e m Sa n t a Ca t a r i n a de procedimentos considerados de alta complexidade e estratégicos foi definido através da Portaria SAS/MS nº 968, de 11 de dezembro de 2002 e de outras portarias publicadas periodicamente pelo Ministério da Saúde para atualização da lista de procedimentos. Desta forma, aqueles procedimentos não contemplados nas duas classificações descritas, exceto os considerados de atenção básica, são classificados como média complexidade (Brasil, 2003). Existem dois sistemas de informação utilizados para o acompanhamento e pagamento dos procedimentos realizados pelos prestadores de serviço ao SUS: o Sistema de Informações Ambulatoriais SIA/SUS e o Sistema de Informações Hospitalares SIH/SUS. Os sistemas de informação ainda possuem um importante papel de subsidiar ações de planejamento, regulação, avaliação, e auditoria da atenção à saúde (Brasil, 2003). 1.2. A média e alta complexidade em odontologia Os procedimentos de média e alta complexidade em odontologia envolvem tanto serviços ambulatoriais quanto hospitalares. A assistência hospitalar no SUS é constituída por unidades públicas, privadas, universitárias e filantrópicas, sendo que a internação nessas unidades pode ser eletiva, por urgência e emergência, ou por causas externas. A rede ambulatorial pode ser do tipo básica, constituída pelas Unidades Básicas de Saúde, com ou sem estratégia de Saúde da Família, ou especializada, como as policlínicas, serviços de auxílio à diagnose e terapia, pronto-socorros e ambulatórios hospitalares. Os serviços ambulatoriais especializados em odontologia ganharam um apoio de infraestrutura a partir da Portaria MS/GM no 1.570, de 29 de julho de 2004, que estabeleceu critérios, normas e requisitos para a implantação e credenciamento de serviços de especialidades odontológicas e laboratórios regionais de próteses dentárias. Os Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) estão preparados para realizar as seguintes especialidades: diagnóstico bucal, com ênfase no diagnóstico e detecção do câncer bucal; periodontia especializada; cirurgia oral menor dos tecidos moles e duros; endodontia; atendimento a portadores de necessidades especiais; e serviço de próteses total e parcial removível (Brasil, 2004b). O atendimento odontológico nos hospitais direciona-se quase que exclusivamente aos portadores de trauma buco-maxilo-facial, embora outros casos também exijam atuação intra-hospitalar, como o atendimento a pacientes sob anestesia geral, dando suporte à rede especializada ambulatorial, e o atendimento a pacientes que, pela complexidade do agravo, não tenham condições C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 941
C l a u d i a Fl e m m i n g Co l u s s i, Da n i e l a Al b a Ni c k e l, Ma r i a Cristina Ma r i n o Ca l v o, Jo ã o Ca r l o s C a e t a n o, An a Cl a u d i a Ba l l a d e l i Si l v a momentâneas de atendimento ambulatorial ou necessitem de retaguarda hospitalar (Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, 2006). Segundo a tabela de procedimentos do Sistema de Informação Ambulatorial (SIA-SUS), os procedimentos de média complexidade em odontologia agrupamse em três categorias: a média complexidade 1, a média complexidade 2 e a média complexidade 3 (Brasil, 2006). Na média complexidade 1 encontram-se todos os procedimentos de endodontia e as radiografias periapicais e interproximais. Na média complexidade 2 estão incluídos procedimentos de periodontia não cirúrgicos, colocação de aparelhos ortodônticos, procedimentos protéticos e alguns procedimentos cirúrgicos (remoção de bridas musculares, correção de hipertrofia de rebordo alveolar, reimplante ou transplante dental, remoção de dente retido, remoção de material de síntese e remoção de foco residual). A média complexidade 3 é constituída por procedimentos de periodontia cirúrgicos (gengivectomia, enxerto gengival, gengivoplastia, cirurgia periodontal), procedimentos de cirurgia e traumatologia buco-maxilo-facial, procedimentos protéticos para grandes perdas maxilares e de face e cabeça, e ainda as radiografias de arcada, oclusais e telerradiografias (Brasil, 2006). A alta complexidade constitui-se de procedimentos estratégicos relacionados ao tratamento e reabilitação de anomalias craniofaciais e lesões labiopalatais, envolvendo as especialidades de ortodontia, implantodontia, cirurgia e prótese (Brasil, 2006). A tabela do Sistema de Informações Hospitalares não apresenta código específico para os procedimentos odontológicos, estes estão contidos em outros códigos, como o de atendimento de alta complexidade para as malformações labiopalatais, de caráter cirúrgico (Brasil, 2005). Este trabalho tem como objetivo caracterizar a atenção à saúde na média e alta complexidade odontológica no SUS, a partir da descrição dos dados do estado de Santa Catarina relativos a esses níveis de atenção, no período compreendido entre 2000 e 2006. 2. Me t o d o l o g i a Os dados que caracterizam a média e alta complexidade em odontologia em Santa Catarina foram obtidos nos sistemas de informação oficiais (DATASUS) e na Secretaria Estadual de Saúde (SES-SC), divisão de Saúde Bucal. Os dados da produção ambulatorial foram obtidos no SIA-SUS, sendo divididos por complexidade (básicos e especializados). Como o total de procedimentos básicos inclui os procedimentos coletivos, estes foram subtraídos, para que a 942 C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009
A n á l i s e d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o d e p r o c e d i m e n t o s o d o n t o l ó g i c o s d e m é d i a e a l t a c o m p l e x i d a d e n a r e d e d e s e r v i ç o s p ú b l i c o s e m Sa n t a Ca t a r i n a proporcionalidade de procedimentos básicos e especializados fosse comparada apenas em relação aos procedimentos individuais. Os procedimentos especializados foram agrupados nas seguintes categorias: Dentística, Periodontia, Ortodontia, Endodontia, Cirurgia e Traumatologia Buço-Maxilo-Facial, Implante, Prótese, Prótese de face e cabeça, e Radiologia. Os procedimentos especializados de Radiologia constituem um procedimento de apoio diagnóstico, e não um procedimento especializado de tratamento, mesmo assim foi incluído nas categorias, pois a tabela de procedimentos do SIA-SUS e os documentos oficiais não referem esta diferenciação. O número de unidades básicas e especializadas segundo presença de consultório odontológico foi obtido pelos registros da rede ambulatorial no SIA- SUS, sendo utilizado o ano de 2003 por ser o mais recente com disponibilidade de dados no período compreendido entre 2000 e 2006. A revisão teórica do tema foi realizada através de pesquisa nos documentos oficiais do Ministério da Saúde. Além disso, foi realizada pesquisa bibliográfica nas bases de dados Medline, Lilacs e BBO, com as palavras níveis de atenção, média complexidade, alta complexidade, atenção secundária e atenção terciária. 3. Re s u l t a d o s O estado de Santa Catarina situa-se na região sul do Brasil, possui uma população total de 5.958.295 habitantes, distribuída em 293 municípios. A rede ambulatorial do Sistema Único de Saúde do estado dispõe de 3.755 unidades, sendo que 2.484 unidades são consideradas do tipo básica (prestam atendimento no nível primário de atenção) e 444 são do tipo especializada, ou seja, prestam serviços de atenção secundária ou terciária. O restante de unidades não é tipificado nesta classificação ou não é especificado pelo sistema de informação. Nem todas as unidades da rede ambulatorial básica e especializada oferecem serviços de odontologia, conforme ilustra a Figura 1. A rede ambulatorial básica possui maior percentual de unidades com consultório odontológico, se comparada com a rede ambulatorial especializada. A rede hospitalar do estado de Santa Catarina oferece 213 unidades hospitalares, destas, 22 são unidades públicas, 182 privadas e 9 universitárias; a disponibilidade de leitos é de 14.422, sendo 1.741 leitos hospitalares públicos, 11.223 leitos hospitalares privados e 1.458 leitos hospitalares universitários. A disponibilidade de atendimento odontológico hospitalar no estado de Santa Catarina representa 10% do total do número de hospitais catarinenses, C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 943
C l a u d i a Fl e m m i n g Co l u s s i, Da n i e l a Al b a Ni c k e l, Ma r i a Cristina Ma r i n o Ca l v o, Jo ã o Ca r l o s C a e t a n o, An a Cl a u d i a Ba l l a d e l i Si l v a ou seja, 21 hospitais prestam atendimento odontológico hospitalar de média e alta complexidade. Fonte: Ministério da Saúde Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SIA-SUS); Departamento de Informática do SUS (DATASUS), 2007 Figura 1 Número de unidades básicas e especializadas segundo presença de consultório odontológico, Santa Catarina, 2003 Comparando o atendimento odontológico especializado prestado nas diversas unidades de saúde do estado de Santa Catarina (postos de saúde, policlínicas, ambulatórios, unidades móveis) com o atendimento hospitalar, este último possui uma representatividade de menos de 1% do total de procedimentos especializados. Quanto ao financiamento das ações em saúde em Santa Catarina, a distribuição percentual dos recursos para a saúde e dos recursos para a Odontologia destinados à atenção básica, média e alta complexidade e ações estratégicas, no período de 2000 a 2006, é apresentada na Figura 2. As Tabelas 1 e 2 apresentam a distribuição de frequência dos procedimentos odontológicos especializados, e a Figura 3 ilustra o número de procedimentos odontológicos especializados por nível de complexidade (média e alta), aprovados no período de 2000 a 2006 em Santa Catarina. 944 C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009
A n á l i s e d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o d e p r o c e d i m e n t o s o d o n t o l ó g i c o s d e m é d i a e a l t a c o m p l e x i d a d e n a r e d e d e s e r v i ç o s p ú b l i c o s e m Sa n t a Ca t a r i n a Fonte: Ministério da Saúde Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SIA-SUS); Departamento de Informática do SUS (DATASUS), 2007 Figura 2 Percentual dos recursos financeiros despendidos no período de 2000 a 2006, segundo grupo de despesa, SC Tabela 1 Distribuição de frequência dos procedimentos odontológicos (quantidade aprovada) nos anos de 2000 a 2006, Santa Catarina Ano Tipo de procedimento odontológico Básico* Especializado Total n % n % n % 2000 4.442.819 94,8 245.003 5,2 4.687.822 100,0 2001 4.642.372 95,3 227.317 4,7 4.869.689 100,0 2002 4.646.962 94,8 255.441 5,2 4.902.403 100,0 2003 4.867.121 94,2 297.214 5,8 5.164.335 100,0 2004 4.951.910 93,5 343.498 6,5 5.295.408 100,0 2005 4.701.270 92,2 397.198 7,8 5.098.468 100,0 2006 5.443.647 94,4 324.694 5,6 5.768.341 100,0 Fonte: SIA-SUS, 2007 * procedimentos do grupo 03 da tabela SIA-SUS, exceto procedimentos coletivos C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 945
C l a u d i a Fl e m m i n g Co l u s s i, Da n i e l a Al b a Ni c k e l, Ma r i a Cristina Ma r i n o Ca l v o, Jo ã o Ca r l o s C a e t a n o, An a Cl a u d i a Ba l l a d e l i Si l v a Fonte: SIA-SUS, 2007 Figura 3 Número de procedimentos odontológicos especializados, por nível de complexidade, aprovados no período de 2000 a 2006, Santa Catarina Tabela 2 Distribuição de frequência dos procedimentos odontológicos não básicos e valor aprovado, segundo especialidade, Santa Catarina, 2006 Quantidade de Valor Especialidade procedimentos n % n % Dentística 20.761 6,4 39.918,08 3,1 Periodontia 69.896 21,5 143.709,31 11,0 Ortodontia 9.259 2,9 149.622,12 11,5 Endodontia 46.271 14,2 127.443,36 9,8 Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo Facial 21.890 6,7 347.481,40 26,6 Implante 3 0,0 856,26 0,0 Prótese 12.344 3,8 233.338,19 17,9 Prótese de face e cabeça 4 0,0 188,24 0,0 Radiologia 144.266 44,4 262.481,50 20,1 Total 324.694 100,0 1.305.038,46 100,0 Fonte: SIA-SUS 4. Discussão Ao pesquisar os dados referentes à média e alta complexidade em odontologia, constatou-se uma escassez de publicações na literatura referentes ao assunto. Os serviços odontológicos especializados no âmbito do SUS em Santa Catarina correspondem a aproximadamente 6% do total dos procedimentos odontológicos realizados no estado (média do período 2000 a 2006), número acima da estimativa 946 C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009
A n á l i s e d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o d e p r o c e d i m e n t o s o d o n t o l ó g i c o s d e m é d i a e a l t a c o m p l e x i d a d e n a r e d e d e s e r v i ç o s p ú b l i c o s e m Sa n t a Ca t a r i n a de 3,5% referida na Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil, 2004a) (Tabela 1). Embora não haja dados específicos da demanda para procedimentos odontológicos especializados em Santa Catarina, sejam eles ambulatoriais ou hospitalares, o estado faz uma estimativa utilizando o parâmetro de 0,06 procedimentos especializados habitantes/ano, o que totaliza 357.497,7 procedimentos. Conforme os dados da Tabela 1, em 2006 foram realizados 324.694 procedimentos especializados, o que indica que há um déficit de 9%. Analisando-se o gasto total, as ações de saúde de média e alta complexidade detêm a maior parte dos recursos. Na Odontologia, as ações básicas detêm o maior percentual dos gastos, ultrapassando 60%. O total despendido pelas ações especializadas em odontologia no estado de Santa Catarina no ano de 2006 não apresentou valor substancialmente acima do referido no ano de 2000 (Tabela 2). Nota-se que os valores absolutos de procedimentos especializados têm aumentado desde o ano 2000 até o ano de 2006, no entanto, os valores percentuais relacionados com o total de procedimentos odontológicos permaneceram estáveis, uma vez que houve um aumento das ações odontológicas básicas no mesmo período. O Gráfico 3 ilustra essa elevação dos valores absolutos das ações especializadas em odontologia, segundo o nível de complexidade. A alta complexidade, representada pelos procedimentos de implantodontia e tratamento de anomalias craniofaciais, teve um crescimento aproximado de 100.000 procedimentos, principalmente a partir do ano de 2002, quando foi publicada a Portaria SAS/MS nº 968, de 11 de dezembro de 2002, que institui os procedimentos de alta complexidade e estratégicos como integrantes da política de indução de aumento de oferta. A média complexidade apresenta seu crescimento em número de procedimentos entre meados de 2003 e início de 2004, sendo que no período seguinte atingiu um crescimento de quase 200.000 procedimentos, provavelmente devido à publicação da Política Nacional de Saúde Bucal, criação do Programa Brasil Sorridente e consequente ampliação do número de Centro de Especialidades Odontológicas (Brasil, 2002b). Dentre a pequena porcentagem de procedimentos odontológicos especializados, o procedimento que mais ocorreu no estado de Santa Catarina no ano de 2006 é o de apoio diagnóstico de radiologia, seguido pelos procedimentos de periodontia, endodontia, cirurgia e dentística. Os procedimentos de prótese dentária e ortodontia representam, cada um, menos de 5% do total de procedimentos odontológicos especializados, e os procedimentos de implantodontia e prótese de face e cabeça contabilizam menos de 1%, cada um (Tabela 2). A pequena representatividade dos procedimentos de prótese dentária no total de procedimentos especializados se reflete nos resultados encontrados no SB Brasil para o índice de Necessidade de C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 947
C l a u d i a Fl e m m i n g Co l u s s i, Da n i e l a Al b a Ni c k e l, Ma r i a Cristina Ma r i n o Ca l v o, Jo ã o Ca r l o s C a e t a n o, An a Cl a u d i a Ba l l a d e l i Si l v a Prótese, que na faixa etária de 35 a 44 anos (região Sul) apresentou um percentual de 28,36% e 65,73% para os arcos superior e inferior, respectivamente Brasil, 2004c). Considerando o fato de que os procedimentos de radiologia são de apoio diagnóstico, e analisando-se sua grande participação no total de procedimentos especializados (cerca de 45%, conforme Tabela 2), conclui-se que o percentual de procedimentos especializados propriamente ditos, referentes ao tratamento e reabilitação das condições de saúde bucal, é ainda menor do que os 6% estimados para o estado. Volpato e Scatena (2006) encontraram um percentual ainda maior para procedimentos de radiologia (50%), ao analisarem os dados do município de Cuiabá, obtidos na mesma fonte dos dados aqui apresentados. 5. Considerações finais O número absoluto de procedimentos especializados apresentou aumento no período analisado, no entanto, em valores relativos não foi observada mudança, ao passo que também houve um aumento dos procedimentos do tipo básico. Este fato leva à hipótese de que, no período, houve um aumento do acesso aos serviços odontológicos, mas a oferta relativa de procedimentos especializados permanece com déficit. Possivelmente os procedimentos odontológicos do tipo básico detêm o maior percentual de gastos devido à baixa oferta de atendimento especializado. A inexistência de um sistema efetivo de referência e contrarreferência cria uma demanda reprimida, de modo que uma pequena parcela da população tem acesso aos procedimentos classificados como de média e alta complexidade em odontologia. Recomenda-se o desenvolvimento de estudos que caracterizem o sistema de referência e contrarreferência em odontologia e estudos sobre necessidades de tratamento e oferta de serviços especializados em odontologia. A média e alta complexidade em odontologia em Santa Catarina caracteriza-se principalmente por uma demanda maior que a oferta de serviços, por uma pequena participação dos hospitais nessa oferta, e pela má distribuição das especialidades realizadas, com grande destaque aos procedimentos de radiologia, que constituem procedimento de apoio diagnóstico, e não procedimento de tratamento; características estas que certamente comprometem a integralidade do atendimento em odontologia no estado. Ações como o incremento na oferta de serviços de prótese dentária e a maior participação dos hospitais no atendimento odontológico precisam ser inseridas no planejamento da atenção em saúde em Santa Catarina, ações que foram propostas na 3ª Conferência Nacional de Saúde Bucal para a organização da atenção odontológica. 948 C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009
A n á l i s e d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o d e p r o c e d i m e n t o s o d o n t o l ó g i c o s d e m é d i a e a l t a c o m p l e x i d a d e n a r e d e d e s e r v i ç o s p ú b l i c o s e m Sa n t a Ca t a r i n a Além disso, há que se rever os procedimentos odontológicos nos três níveis de atenção, conforme recomendado na Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil, 2004a), ampliando as ações de atenção básica a partir da inclusão de procedimentos como instalação de prótese dentária, tratamentos endodônticos e periodontais, a fim de aumentar a resolutividade dos serviços públicos odontológicos. R e f e r ê n c i a s Br a s i l. Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde. Departamento de Descentralização da Gestão da Assistência. Regionalização da Assistência à Saúde: aprofundando a descentralização com equidade no acesso. Norma Operacional da Assistência à Saúde: NOAS-SUS 01/02 (Portaria MS/GM n.º 373, de 27 de fevereiro de 2002 e regulamentação complementar). 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2002a. 108 p.. Ministério da Saúde. Portaria SAS nº 968, de 11 de dezembro de 2002b. Atualiza os Procedimentos de Alta Complexidade e Estratégicos do Sistema de Informações Ambulatoriais e Sistema de Informações Hospitalares SIA e SIH/SUS. Disponível em: <http://dtr2001.saude.gov.br/sas/ PORTARIAS/PORT2002/PT-968.htm>. Acesso em: 15 fev. 2008.. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Para entender a gestão do SUS. Brasília: CONASS, 2003.. Ministério da Saúde. Departamento de Atenção Básica. Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Brasília: Ministério da Saúde, 2004a.. Ministério da Saúde. Portaria GM nº 1.570, de 29 de setembro de 2004. Institui incentivo financeiro para os Centros de Especialidades Odontológicas e Laboratórios Regionais de prótese Dentária. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 set. 2004b. p. 71-72.. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde, 2004c.. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Regulação, Avaliação e Controle. Coordenação Geral de Sistemas de Informação. Manual do sistema de informações hospitalares do SUS. Brasília, 2005. Disponível em:<http://dtr2001.saude.gov.br/sas/download/download.htm>. C a d. Sa ú d e Co l e t., Rio d e Ja n e i r o, 17 (4): 939-950, 2009 949
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