AVALIAÇÃO DAS CARACTERISTICAS FÍSICO-QUÍMICAS DO ÓLEO DE LICURI (SYAGRUS CORONATA) L. M. da Silva, I. M. de C. Tavares, N. Jorge Departamento de Engenharia e Tecnologia de Alimentos Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas UNESP, São José do Rio Preto, SP, Rua Cristóvão Colombo, 2265, Jardim Nazareth, 15054-000. Email: luciemendes7@gmail.com RESUMO Os óleos ricos em ácido láurico têm sido largamente utilizados pelas indústrias farmacêutica e de alimentos. O óleo de licuri obtido da espécie Syagrus coronata é típico do semiárido nordestino e possui considerável percentual desse ácido graxo. Portanto, esse trabalho objetivou avaliar as características físico-químicas do óleo de licuri e compará-las a dados existentes na legislação brasileira, para o óleo de coco. As análises realizadas foram de qualidade e autenticidade e seguiram normas da AOCS. Foi possível observar que o óleo de licuri pode vir a ter potencial para uso em alimentos e que o mesmo possui semelhança com o óleo de coco, largamente utilizado no Brasil. ABSTRACT Acids rich in lauric acid are taken in large amounts by pharmaceutical and food proteins. The obtained liquor oil of the species Syagrus coronata is typically semi-arid Northeastern and has an optimum percentage of fatty acid. Therefore, this work had the objective of performing physical and chemical analyzes of coconut oil and. How were the standards of quality and authenticity and followed AOCS standards. It was possible to observe that the liquor oil may have potential for use in food and that the same has similarity to the coconut oil, widely used in Brazil.PALAVRAS-CHAVE: gorduras láuricas; coco; ácidos graxos de cadeia média, qualidade de óleos KEYWORDS: lauric fats; coconut ; quality of oils 1. INTRODUÇÃO A palmeira da espécie Syagrus coronata, é típica do semiárido nordestino, embora possa estar presente em matas semidecíduas e áreas de transição com a restinga e o cerrado, abrangendo o norte de Minas Gerais, ocupando toda a porção oriental e central da Bahia, até o sul de Pernambuco, incluindo também os Estados de Sergipe e Alagoas (Salles et al., 2010; Belviso et al., 2013). Os frutos, enquanto verdes apresentam o endosperma líquido, que se torna sólido no processo de maturação, dando origem à amêndoa (Bondar, 1938). A amêndoa possui coloração branca, revestida por uma película marrom e possui elevado valor calórico. Os lipídios são constituintes majoritários, sendo dessa forma, uma fonte para extração de óleo, o qual é predominantemente composto por ácido láurico (Crepaldi et al., 2011). As gorduras láuricas, caso do óleo de licuri, são muito importantes na indústria. São muito usadas na indústria de cosméticos, mas em função das suas propriedades físicas e de resistência à oxidação, são também muito empregadas no preparo de gorduras especiais para confeitaria, sorvetes, margarinas e substitutos de manteiga de cacau (Dijkstra, 2016). Por muitos anos, mundialmente, o principal óleo láurico foi o de coco (Cocus nucifera), produzido a partir de copra, a polpa dentro do coco. Porém, a produção do óleo de coco deu lugar ao
óleo de palma (Elaeis guineensis) o qual é obtido do mesocarpo dos frutos das palmeiras e que também se trata de um óleo láurico (Dijkstra, 2016). No Brasil, as principais fontes de gorduras láuricas são os óleos de coco, palmiste e babaçu. Sendo assim, o objetivo desse trabalho foi caracterizar o óleo de licuri, e comparar com valores estabelecidos para o óleo de coco, determinados pelo Codex Alimentarius Commission e com dados encontrados na literatura. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Preparo da Amostra Cinco amostras foram adquiridas de uma micro indústria processadora de óleo de licuri, em diferentes meses do ano de 2016, localizada em Caldeirão Grande, Bahia, Brasil. Os óleos foram filtrados, reservados em frasco âmbar, inertizados com nitrogênio gasoso e mantidos sob refrigeração. As análises foram realizadas em triplicatas e os resultados foram expressos dentro de um intervalo entre valores mínimos e máximos 2.2 Caracterização físico-química Ácidos graxos livres - Expressos como ácido oleico ou outro ácido graxo que apresente-se em maior quantidade no óleo. Foi utilizado o método AOCS Ca 5a-40 (2009). Índice de peróxidos - expressos em milequivalentes de oxigênio ativo contidos em um quilograma de óleo, calculado a partir do iodo liberado do iodeto de potássio, operando nas condições indicadas no método proposto pela AOCS Cd 8b-90 (2009). p-anisidina - foi determinado conforme o método Cd 18-90 da AOCS (2009) Valor total de oxidação (Totox) - calculado a partir da fórmula: Totox = (2 x Índice de peróxido) + Índice de p-anisidina. Dienos conjugados - foram determinados de acordo com o método Ti 1a-64 da AOCS (2009) Índice de saponificação - definido pela quantidade em miligramas de hidróxido de potássio necessária para saponificar um grama de óleo, calculado segundo o método Cd 3a-94 AOCS (2009), expresso em mg KOH/g. Índice de iodo - calculado segundo o métodologia Cd 1c-85 da AOCS (2009), expresso em g I 2/100 g. Densidade - realizada de acordo com o método oficial Cc 10a-25 da AOCS (2009). Índice de refração - realizado de acordo com o método Cc 7-25 AOCS (2009), utilizando-se refratômetro de Abbé. A leitura foi feita na escala que dá diretamente o índice de refração absoluto a 40ºC. Estabilidade oxidativa - foi conduzida pelo método proposto pela AOCS Cd 12b-92 (2009), utilizando o aparelho Rancimat 2.3 Perfil de ácidos graxos O extrato lipídico foi trasesterificado com solução metanólica de hidróxido de potássio (2M) de acordo com ISO 12966-2:2011. (2011). O perfil de ácidos graxos foi determinado usando um
cromatógrafo de gás Chrompack CP 9001 (Middelburg, Holanda), com injetor split-splitless, detector de ionização de chama e amostrador automático (Chompack CP-9050). Os compostos foram separados em coluna capilar de sílica fundida CP-Sil 88 (50 m x 0,25 mm). As temperaturas do detector e injetor foram 250 e 230 C, respectivamente. A razão de divisão foi de 1:50, o volume injetado 1 µl e o gás de arraste foi o hélio. A identificação dos picos cromatográficos foi realizada por comparação com uma mistura comercial de ésteres metílicos (Supelco-37 FAME MIX). Os resultados foram expressos em porcentagem relativa. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1. Caracterização físico-química Algumas características físico-químicas dos óleos de licuri e coco estão apresentadas na Tabela 1. O índice de refração dos óleos de licuri estavam em estreita concordância com os resultados relatados para óleo de coco. A respeito da densidade, os resultados apresentaram-se no intervalo (0,929-0,937) g/cm 3 e o índice de refração a 40 C foi de 1,451, em ambas as análises os valores que também estavam próximos aos estabelecidos para óleo de coco. As propriedades químicas são parâmetros importantes para determinar a qualidade e autenticidade dos óleos brutos. O percentual de ácidos graxos livres é uma medida valiosa da qualidade do óleo, enquanto as medidas índice de iodo e saponificação dão informações sobre as insaturações e sobre os grupos reativos a álcalis em óleos. Os valores de ácidos graxos livres das amostras de óleo avaliadas (no intervalo entre 0,47 e 1,36% ácido oleico) foram similares aos encontrados por Miranda (2011) quando estudou óleos obtidos de diferentes genótipos de licuri e encontrou valores que não ultrapassaram 2%, e estão dentro do estabelecido Resolução RDC nº 270 da ANVISA para óleos brutos (BRASIL, 2005), e do Codex Alimentarius Commission (2003) que estabelecem máximo de 5% para óleos brutos. Tabela 1 - Caracterização físico-química do óleo de licuri e coco Licuri Coco* Ácidos graxos livres (% láurico) 0,33-0,94 -- Ácidos graxos livres (% oleico) 0,47-1,36 5 Peróxidos (meq/kg) 0,21-3,07 10 p-anisidina 0,18-0,50 -- Totox 0,74-1,98 -- Dienos conjugados (%) 0,11-0;12 -- Saponificação (mg KOH/g) 244,84-246,28 248-265 Iodo (g I 2/100 g) 14,85-17,27 6-11 Densidade (g/cm 3 ) 0,929-0,937 0,903-0,921 Refração (40ºC) 1,450-1,451 1,448-1,450 Estabilidade oxidativa (h) 54,3-101,85 -- *resultados obtidos a partir do Codex Alimentarius (2003) Os índices de Iodo, neste estudo (14,85-17,27) g I 2/100 g foram inferiores aos valores reportados por Miranda (2011), que obteve para óleo de licuri resultados que variaram de 19,64 a 25,99 g I 2/100 g. Os valores encontrados são superiores aos estabelecidos para o óleo de coco. Os resultados encontrados podem ser atribuídos às características particulares do óleo e a região de cultivo (Miranda, 2011), além da metodologia de análise. Valores de saponificação foram semelhantes
entre as amostras estudadas (244,84-246,289) g KOH / 100 g de óleo. Esses valores foram próximos aos estabelecidos para o óleo de coco. O estado oxidativo e a estabilidade dos óleos extraídos foram avaliados pelo seu valor de peróxido, dienos conjugados, valor de p-anisidina e método de Rancimat. Os resultados desses parâmetros podem ser vistos na Tabela 1, mostrando uma excepcional estabilidade oxidativa. Os valores de peróxidos, (0,21-3,07) meq/kg encontrados nos óleos analisados estão abaixo do limite adotado pela Resolução RDC nº 270 da ANVISA para óleos brutos (BRASIL, 2005b), e do Codex Alimentarius Commission (2003) 15 meq/kg para óleos brutos. Os óleos apresentaram baixos teores de dienos conjugados de 0,11-0;12%. As análises de dienos conjugados assim como os dados de peróxidos constituem-se uma boa estimativa de oxidação de óleos. A formação de dienos conjugados está relacionada com a oxidação dos ácidos graxos poliinsaturados do óleo, formados pelo deslocamento de duplas ligações (JORGE, 2009). Do mesmo modo, o índice de ρ-anisidina é utilizado para confirmar a oxidação sofrida pelo óleo e a rápida conversão dos hidroperóxidos em produtos secundários de oxidação, essencialmente aldeídos, estimados por esse índice. O óleo de licuri mostra uma baixa formação desses compostos (0,18-0,50), e em combinação com o valor totox (0,74-1,98) indicam que os óleos apresentam uma boa estabilidade oxidativa. O período de indução valida a resistência dos óleos e gorduras aos processos de oxidação (sob condições de estresse térmico e de oxigênio), bem como seu status de preservação. Alta estabilidade oxidativa foi encontrada em todas as amostras, com valores variando de 54,3-101,85 h. A alta estabilidade obtida pode ser relacionada com algumas características dos óleos de licuri avaliados tais como, a composição em ácidos graxos, o índice de peroxido e a acidez. 3.2 Perfil de ácidos graxos A composição detalhada em ácidos graxos para os óleos de licuri e de coco esta apresentada na Tabela 2. Das porcentagens relativas mostradas, podemos concluir que ambos os óleos de licuri e coco, são compostos em sua maioria por ácidos graxos saturados. Tabela 2 - Perfil de ácidos graxos dos óleos de licuri e coco Ácido Graxo (%) Nomenclatura Licuri Coco* Mín Máx C6:0 Ácido caproíco 0,35 0,53 --- C8:0 Ácido caprílico 9,06 11,6 4,7 C10:0 Ácido cáprico 6,03 6,7 4,1 C12:0 Ácido láurico 42,6 44,6 40,8 C14:0 Ácido mirístico 13,2 14,8 20,3 C16:0 Ácido palmítico 6,5 7,1 12,3 C18:0 Ácido esteárico 2,96 3,9 --- C18:1 Ácido oléico 11,4 13,1 9,9 C18:2 Ácido linoléico 2,5 3,8 3,6 C18:3 C24:1 Ácido ɣ-linolênico Ácido nervônico 0,01 0,18 0,03 0,2 --- --- Saturados 80,7 89,23 --- Insaturados 14,13 17,13 --- *resultados obtidos a partir de Correia et al. (2014).
Dentre os ácidos graxos, o que se apresenta em maior quantidade é o ácido láurico (42,5 a 44,6%), seguida pelo ácido caprílico (9,06 a 11,6) e cáprico (6,03 a 6,7), demostrando que o óleo de licuri é rico em ácidos graxos de cadeia média. É sabido que esses ácidos podem ser adequados para aplicações biomédicas (indústrias cosmética e farmacêutica), como mostrado por Leal et al. (2013); para produção de biodiesel (Salles et al., 2010); como um importante antimicrobiano com ação comprovada para Staphylococcus aureus (Leal et al., 2013, Bessa et al., 2016) e como potencial uso para alimentos (Bauer et al., 2010). Além de serem associados a benefícios à saúde, quando consumidos em quantidade adequada, além de terem importantes propriedades tecnológicas. De acordo com o perfil de ácidos graxos, dos óleos de licuri e coco é possível perceber semelhança entre os mesmos, embora difiram nas quantidades relativa de cada ácido graxo. 4. CONCLUSÕES Os resultados encontrados para o óleo de licuri demostraram semelhanças aos reportados para óleo de coco. De acordo com o perfil de ácidos graxos, o óleo de licuri é composto em sua maior parte por ácidos graxos de cadeia média, os quais podem trazer benefícios à saúde. Dentre os ácidos graxos o que se apresenta em maior quantidade é o ácido láurico, o qual tem importantes caraterísticas industriais, indicando que esse óleo pode ser melhor explorado tanto para a indústria de alimentos como pela indústria farmacêutica podendo assim, abrir perspectivas para melhorar o consumo dessa fruta nativa do Nordeste Brasileiro. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AOCS, 2009 American Oil Chemisys Society AOCS - Official Methods and Recommended Practices of the American Oil Chemists Society. Washington. Bauer, L. C., Damásio, J. M. A., da Silva, M. V., Santana, D. A., Gualberto, S. A., Simionato, J. I. (2013) Chemical characterization of pressed and refined licuri (Syagrus coronata) oils. Acta Scientiarum Technology, 35, 771-776. Belviso, S., Ghirardello, D., Giordano, M., Ribeiro, G. S., Alves, J. de S., Parodi, S., Risso, S., Zeppa, G. (2013). Phenolic composition, antioxidant capacity and volatile compounds of licuri (Syagrus coronata (Martius) Beccari) fruits as affected by the traditional roasting process. Food Research International, 51, 39 45. Bessa, C. M. A. S., do Nascimento, R. S., Alves, R. C. C., Anselmo, J. M., da Silva, A. P. S., da Silva, A. G., Lima, V. L. M., Tavares, J. F., da Silva, L. C. N., da Silva, M. V., & Correia, M. T. S. (2016). Syagrus coronata seed oils have antimicrobial action against multidrug-resistant Staphylococcus aureus. Journal of Medicinal Plants Research, 10 (23), 310-317. Bondar, G. O licurizeiro e suas potencialidades na economia brasileira. (1938). Salvador: Instituto Central de Fomento Econômico da Bahia. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (2005). Resolução RDC n. 270, de 22 de setembro de 2005. Aprova o Regulamento técnico para óleos vegetais, gorduras vegetais e creme vegetal. Diário Oficial da União; Poder Executivo.
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