IX-006 - O USO DE CHECKLIST COMO FERRAMENTA DE INDENTIFICAÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS NA PRAIA DA PIPA RN

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Transcrição:

IX-006 - O USO DE CHECKLIST COMO FERRAMENTA DE INDENTIFICAÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS NA PRAIA DA PIPA RN Ada Cristina Scudelari (1) Engenheira Civil pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Engenharia Civil pela Pontifícia Universidade Católica (PUC/RJ). Doutora em Engenharia Civil pela COPPE/UFRJ. Professora Adjunta IV do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Sanitária (PPgES/UFRN). Kercyo Gurgel Braga (1) Engenheiro Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Mestre em Engenharia Sanitária pelo Programa de Pós-graduação (PPgES) da (UFRN). Filipe Augusto de Azevêdo Costa (1) Graduando de Engenharia Civil na UFRN, Bolsista do PIBIC/CNPQ. Endereço (1) : Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Tecnologia, LARHISA, Campus Universitário s/n, Lagoa Nova Natal - RN - CEP: 59072-970 - Brasil - Tel: (84) 215-3766 - e-mail: ada@ct.ufrn.br. RESUMO No Litoral oriental sul do Rio Grande do Norte, a erosão costeira gera diversos problemas, especialmente na praia de Pipa, onde a movimentação turística e a intensa especulação imobiliária ocasionam diversos conflitos ambientais. As propostas de obras costeiras, com o intuito de minimizar os impactos decorrentes dos processos erosivos, são feitas após a realização de um planejamento cuidadoso composto de diversas etapas. A primeira, e umas das principais fases na elaboração de uma proposta, é a identificação e caracterização dos processos erosivos atuantes. Uma ferramenta que vem sendo bastante utilizada mundialmente na execução dessa fase é o checklist. Neste trabalho é proposto um checklist adaptado às feições costeiras existentes na praia de Pipa-RN, caracterizada pela presença de falésias. O modelo proposto foi aplicado na área de estudo a fim de caracterizar detalhadamente os processos erosivos vigentes. Verificou-se que o checklist é uma ferramenta adequada na identificação de processos erosivos costeiros, sistematizando o processo de coleta e análise das informações referentes aos tipos erosões instaladas. PALAVRAS-CHAVE: Checklist; Praia de Pipa; Erosão Costeira; Falésias INTRODUÇÃO A linha de costa é um ambiente de forte dinâmica, onde atuam processos erosivos que causam profundas mudanças na área, tanto a curto como a longo prazo. Nesse ambiente, ocorre uma constante compensação entre os sedimentos depositados e aqueles retirados pela ação das correntes marinhas. Quando, devido a algum fator desestabilizador do equilíbrio, há mais retirada do que deposição em uma dada área, deflagra-se a erosão costeira, com o recuo ou avanço da linha de costa em direção ao continente. Tal recuo muitas vezes choca-se com a presença de estruturas e edificações humanas presentes na linha de costa, o que gera sérios danos tanto ao homem quanto à natureza. Sendo assim, a erosão costeira quando intensificada pelo conflito entre obras antrópicas construídas inadequadamente na costa e o meio ambiente local, afeta gravemente as comunidades litorâneas, com o impedimento de seu desenvolvimento sustentável, por causa da desarmonia que se instala entre progresso sócio-econômico e equilíbrio ambiental. Como forma de se garantir qualidade ambiental para regiões litorâneas, é de fundamental importância verificar a existência da erosão costeira na área, identificar os principais processos erosivos atuantes e adotar medidas de controle que venham a reduzir para níveis toleráveis os conflitos instalados. Uma ferramenta de grande utilidade nesse processo de identificação e controle da erosão costeira é o checklist. Ele padroniza e organiza as informações a serem coletadas, sistematizando a análise da área estudada. Por meio dele, é possível verificar de forma eficiente às características físicas da zona costeira, os possíveis ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

desencadeadores dos processos erosivos e a partir de então escolher medidas estruturais e/ou não-estruturais que sejam compatíveis e adequadas às condições do local. No presente trabalho, foi elaborado e aplicado um checklist para identificação dos processos erosivos atuantes na praia de Pipa-RN. Esta praia localiza-se no litoral oriental sul do Rio Grande do Norte, no município de Tibau do Sul. A altitude do município em relação ao nível do mar é de 38m (Altitude da Sede) e sua distância até a capital é de 88 km (Figura 1). Trata-se de uma zona costeira, a qual possui cerca de 16km de extensão, formada principalmente por falésias. A população residente no município é de 7.749 habitantes e a taxa de crescimento populacional é de 2,98 (período de 1999/2000) (IBGE, 2000). A partir da utilização do checklist, obtiveram-se os subsídios necessários para possíveis medidas de controle que venham a tornar possível um desenvolvimento sustentável da região, já que a mesma é um importante pólo turístico e econômico para o estado do RN. Figura 1. Localização da área de estudo. PROCESSOS EROSIVOS E MOVIMENTOS DE MASSAS EM ENCOSTAS As feições morfológicas que compõem a paisagem do planeta foram e são continuamente esculpidas por agentes modeladores externos desde milhares de anos atrás. Entre estes agentes, os mais importantes são: as chuvas, as marés e os vários tipos de intemperismo. A ação deles é geralmente no sentido de tornar o relevo plano. Contrapondo-se a essa ação, tem-se a resistência dos materiais que compõem as superfícies naturais. Quando os agentes modeladores externos atuam com intensidade superior à resistência dos materiais que formam uma encosta, podem ocorrer processos erosivos ou movimentos gravitacionais de massa. A erosão nas zonas costeiras ocorre de maneira mais intensa, em geral, como resposta ao desequilíbrio causado pelo homem. Ela se dá através principalmente da ação das ondas, do escoamento superficial de águas pluviais (erosão pluvial) e da percolação de águas subterrâneas. A ação das ondas depende principalmente da energia com que as mesmas chegam à costa e se chocam contra falésias vivas ou obras costeiras, solapando as bases das mesmas através da retirada de sedimentos. Sendo assim, torna-se importante verificar a existência de bermas, formações rochosas litorâneas e perfis de praia inclinados, além de outros elementos que absorvam parte da energia, minimizando os danos. Também é fundamental observar a dinâmica do transporte de sedimentos (depósitos e/ou retiradas) devido às correntes marinhas, intimamente relacionada ao processo de erosão costeira. A erosão pluvial começa no instante em que as primeiras gotas de chuva batem no solo. Tal momento é denominado de splash e pode resultar na ruptura dos agregados, selando o topo do solo e dando condições para ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2

formações de poças. A partir daí, a água começa a escoar na superfície, primeiramente em lençol, depois em fluxos lineares, evoluindo para microravinas, podendo formar cabeceiras, com algumas delas sofrendo bifurcação e formando novas ravinas. O aprofundamento das ravinas pode levar a formação de voçorocas. Estas se caracterizam por grande profundidade e formação de paredes laterais íngremes (Guerra et alli, 1999). Influenciam em tal processo a presença de planícies de escoamento, o grau de impermeabilização do solo da região, a existência de vegetação e ocorrência de precipitações muito intensas. Já a percolação de água subterrânea perturba a estrutura interior do solo, deixando-o com menor resistência, maior sobrecarga e vulnerável à ocorrência de movimentos de massa. Em geral, para sua identificação deve-se atentar para as características de drenagem do local, existência de estruturas como sumidouros ou valas de infiltração para saneamento das edificações existentes, presença de camadas intermediárias de solo de baixa permeabilidade, entre outros. A ação de tais processos erosivos pode causar processos de ruptura ou de desestabilização das encostas, resultando em movimentos coletivos de solo, rocha ou mistura de solo e rocha, chamados de movimentos de massas. De maneira geral, os movimentos podem ser classificados como: quedas (o material se destaca da encosta e se movimenta em queda livre), tombamentos (o material instável cai, girando em torno de um ponto de sua base), escorregamentos ou deslizamentos (a massa instável se desloca como um bloco ao longo de uma superfície de escorregamento), escoamentos (o material em movimento sofre intensa fragmentação, passando a se comportar como um fluido viscoso em condições de alta umidade do solo) e movimentos complexos (combinação de um ou mais dos principais tipos de movimentos descritos) (Silva, 2003). METODOLOGIA PROPOSTA PARA IDENTIFICAÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS A identificação dos processos erosivos atuantes em uma determinada zona costeira faz parte do rol de etapas que são realizadas quando é proposto algum tipo de intervenção na de linha costa, ou também para fins de gestão e planejamento da mesma. Anteriormente à implantação das medidas de controle, deve-se caracterizar e identificar qual a principal causa da erosão costeira, para que se proponha uma medida que venha de encontro ao agente causador. Por outro lado, as informações coletadas a respeito da linha de costa e dos fenômenos costeiros serão de grande valia na coordenação dos diversos setores responsáveis pela gestão da linha de costa, facilitando dessa forma a sua execução. Uma ferramenta que vem sendo bastante utilizada no mundo no processo de identificação e controle da erosão costeira é o checklist (Goda, 1995; ARC, 2000; Cambers, 1998). Ele permite que sejam padronizadas e organizadas as informações a serem coletadas, facilitando e dinamizando a análise da área estudada. Por meio dele, é possível verificar de forma eficiente às características físicas da zona costeira, e os possíveis desencadeadores dos processos erosivos. Para que a identificação dos processos erosivos costeiros ocorra de forma eficiente e sistemática, o checklist deve primeiramente identificar de forma geral o trecho em análise. Em seguida, deve-se caracterizar fisicamente a costa, avaliando itens como: tipo de costa (escarpada, dunas, mangues, outros); suas características geométricas (altura e inclinação de falésias, presença de bermas, perfil e extensão da faixa de praia); e seus materiais constituintes (tipo de solo, existência de formações rochosas e a distribuição da vegetação). Logo após, deve-se abordar os principais fatores desencadeadores da erosão costeira (ação da onda, escoamento superficial e percolação da água subterrânea). E por fim, analisar o local de atuação dos processos, suas intensidades e principais conseqüências para o equilíbrio ambiental. Na identificação dos processos erosivos atuantes na praia de Pipa-RN, foi elaborado e aplicado um checklist (Tabela 1) adaptado às feições costeiras existentes na área de estudo, ou seja, costas com falésias. O modelo proposto foi empregado durante as pesquisas de campo e é composto basicamente por três partes: a primeira referese à localização da área, com informações sobre: a data e horário da inspeção de campo, bem como os níveis da maré e fases da lua; a segunda parte é sobre a caracterização da falésia: seu tipo, altura, perfil do talude, distribuição da vegetação e os usos dados para encosta e seu entorno; a ultima parte corresponde aos processos erosivos instalados e se divide em: escoamento superficial, percolação da água subterrânea e ação da onda (Braga, 2005). Pesquisas de campo foram feitas com base na identificação dos processos erosivos ao longo da costa escarpada, percorrendo-se todo o trecho de estudo, tanto na faixa de praia, quanto no topo das falésias. Foram feitos registros fotográficos e todas as informações relevantes foram anotadas nos checklists. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3

CHECKLIST DE CARACTERIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO Nome/Lugar:. Lua:. Data/Horário:. Maré:. CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DO TRECHO Caracterização da Falésia: Falésias vivas Falésias recuadas Altura da falésia (aprox.). Perfil do talude (aprox.). Vegetação e sua distribuição: ( ) Topo; ( ) Face; ( ) Base. Uso da falésia: ( ) Acesso à praia; ( ) Mirante; ( ) Área de preservação; ( ) Outros:. Estruturas na Falésia: Uso da propriedade: ( ) Moradia; ( ) Veraneio; ( ) Pousada; ( ) Comércio; ( ) Outros:. Qual à distância da estrutura até a borda da falésia?. IDENTIFICAÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS NO TRECHO Escoamento superficial: Há uma planície que produz um escoamento descontrolado pela face da falésia? Há sistemas de fraturas, nesta planície, que condicionam o escoamento superficial? Erosão Pluvial, Qual? (ravinas, voçorocas). Contribuições na erosão superficial: ( ) Drenos de casa; ( ) Irrigação; ( ) Outros.. Percolação da água subterrânea: As maneiras que a água é infiltrada no topo da falésia: ( ) Tanques sépticos; ( ) Irrigação; ( ) Drenos; ( ) Piscinas; ( ) Outros. Há superfícies úmidas na face da falésia? Há deslizamentos ativos ou históricos? Qualquer outro tipo de movimento de massa. Qual?. Ação da onda: Na maré alta existe uma faixa de praia? Largura:. Linhas de arenito na faixa de praia. Tipo:. As ondas escovam o pé da falésia? Proteção no pé da falésia. Tipo:. Há alguma obra de controle da erosão? Tipo:. A obra causa mais erosão? Obs: Tabela 1. Checklist proposto. APLICAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS A aplicação do checklist proposto forneceu informações detalhadas a respeito dos processos erosivos atuantes na praia de Pipa-RN (Figura 2), conforme pode-se observar no checklist preenchido na tabela 02. A partir dele, foram realizadas análises a respeito dos tipos de erosões verificadas, com o intuito de subsidiar possíveis ações de gestão e medidas de controle. Figura 2. Esquema de localização. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4

CHECKLIST DE CARACTERIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO Nome/Lugar: _Praias urbanas de Pipa. Lua: nova minguante. Data/Horário: _23/06/2004 / 15:27 pm_- 16:41 pm. Maré: 07:51 am +2.1 m / 13:56 pm +0.6 m. CARACTERIZAÇÃO DO SUBTRECHO Caracterização da Falésia: Falésias vivas X Falésias recuadas X Altura da falésia (aprox.) 40 m. Perfil do talude (aprox.)_ forte_(aprox. 60º). Vegetação e sua distribuição: (X) Topo; (X) Face; (X) Base. Uso da falésia: (X) Acesso à praia; (X) Mirante; ( ) Área de preservação; ( ) Outros:. Estruturas na Falésia: Uso da propriedade: (X) Moradia; (X) Veraneio; (X) Pousada; (X) Comércio; (X) Outros: estacionamentos. Qual à distância da estrutura até a borda da falésia? instalada na borda. IDENTIFICAÇÃO DOS PROCESSOS EROSIVOS NO SUBTRECHO Escoamento superficial: Existe uma planície que produz um escoamento descontrolado pela face da falésia? X Existem sistemas de fraturas, nesta planície, que condicionam o escoamento superficial? Erosão Pluvial, Qual? (ravinas, voçorocas). Contribuições na erosão superficial: (X) Drenos de casa; (X) Irrigação; (X) Outros: impermeabilização. Percolação da água subterrânea: As maneiras que a água é infiltrada no topo da falésia: ( ) Tanques sépticos; ( ) Irrigação; ( ) Drenos; ( ) Piscinas; ( ) Outros. Há superfícies úmidas na face da falésia? Há deslizamentos ativos ou históricos? Qualquer outro tipo de movimento de massa. Qual?_deslizamentos, quedas e tombamentos. X Ação da onda: Na maré alta existe uma faixa de praia? Largura:. Linhas de arenito na faixa de praia. Tipo: grupos de arenitos ferruginosos tanto na faixa quanto fora. X As ondas escovam o pé da falésia? X Proteção no pé da falésia. Tipo: _alguns gruposde arenitos ferruginosos. X Há alguma obra de controle da erosão? Tipo: enrocamentos, paredões e bulkheads. X A obra causa mais erosão? Obs: Há uma forte ocupação na borda da falésia. Há um perigo visível de que grandes movimentos de massa sejam deflagrados e danifiquem as estruturas. Figura 3 Coordenada (0272814; 8311274), Figura 4 Coordenada (0273042; 9314229), Figura 5 Coordenada (0273574; 9311201), Figura 6 Coordenada (0273164; 9311209). Tabela 2. Checklist da praia de Pipa-RN. Compreendida a Oeste pela Ponta do Canto e a Leste pela Ponta da Cancela (Figura 2), a praia de Pipa caracterizase como uma região costeira muito habitada, apresentando forte atividade turística e sofrendo grandes pressões do mercado imobiliário. Figura 3. Deslizamento ocorrido numa falésia. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5

Em seu início (Oeste), ainda pouco habitado, as falésias são altas (aproximadamente 40 m) e vegetadas apenas em seu topo, estando sujeitas a movimentos de massa, como deslizamentos, quedas e tombamentos (Figura 3), ocorridos pelo fato da encosta ser íngreme, não ser vegetada na face e ter padrão de fraturamento que proporciona a compartimentação do maciço na forma de blocos. Tal fenômeno contribui para a formação de depósitos de tálus no sopé das falésias, guarnecendo-as contra a ação das ondas e fornecendo sedimentos ao sistema de deriva litorânea. Esses movimentos de massa são muitas vezes deflagrados pela água de intensas chuvas tropicais que preenchem as descontinuidades do maciço e atuam no sentido de expulsar blocos do talude. Figura 4. Incisões na base da falésia formadas pela ação das ondas. Também nessa área, as ondas escovam o pé das falésias (falésias vivas), solapando a base e formando incisões, na forma de pequenas cavernas (Figura 4). Essas incisões provocam instabilidade basal e conseqüente formação de depósitos de tálus. Na sua parte média e final (Leste), a praia de Pipa possui uma alta concentração de edificações, com pousadas, casas de veraneio, bares e restaurantes, que se estendem desde a beira-mar até o topo da encosta (de inclinação suave). A proximidade de tais obras em relação ao mar gera sérios problemas ambientais, já que o avanço da linha de costa em direção ao continente, devido à erosão costeira, choca-se com as obras de proteção. Essas obras, em geral, constituem-se de enrocamentos de pedra (marroada) e muros de concreto (Figura 5 e 6), que são erguidas pelos proprietários com o intuito de impedir a invasão das águas marinhas nos terrenos de seus estabelecimentos. Tais proteções antrópicas barram o ciclo natural de avanço e recuo da linha costeira e podem cortar o suprimento de sedimentos em uma dada área, agravando o fenômeno da erosão. Figura 5. Passeio protegido com enrocamento de pedra. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6

Pode-se observar claramente como conseqüência desse conflito instalado na Praia de Pipa, a existência de uma endentação da faixa de praia ao final de um muro de enrocamento de pedra na parte final da praia, onde se localizam barracas e quiosques. Nesse local, a linha de costa avançou somente onde não havia obras de proteção, estando na iminência de desencadear processos erosivos na parte lateral e posterior de tais obras (flanqueamento). Este é um fenômeno típico de erosão costeira provocada por obras elaboradas inadequadamente. Outro grave problema dessa região é a destruição da vegetação nativa e a alteração da topografia da encosta para a construção das casas, lojas, bares e pousadas. Isto ocasiona a impermeabilização da superfície e aumenta em muito o escoamento das águas pluviais, acentuando a erosão nas falésias adjacentes. Figura 6. Obras de proteção costeira. CONCLUSÃO O checklist apresentou-se como uma poderosa ferramenta na identificação de processos erosivos costeiros, dinamizando de forma organizada a coleta e análise das informações referentes área de atuação e características desencadeadoras da erosão litorânea. A partir dele, pôde-se constatar os conflitos existentes entre a erosão costeira e pluvial na praia de Pipa, agravado pela pressão da exploração turística local. Diante disso, observou-se a necessidade de intervenções na área, principalmente através de medidas não-estruturais e obras flexíveis. Sendo assim, o checklist mostra-se como um instrumento importante no auxílio das tarefas de controle e gestão ambiental e na promoção do desenvolvimento sustentável nas comunidades costeiras. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ARC - Auckland Regional Council. Coastal Hazard Strategy and Coastal Erosion Management Manual.. Technical Publication No. 130, 2000. 2. Braga, K. G. O uso de checklist na identificação de processos erosivos costeiros. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Sanitária, 2005. 3. Cambers, G. Coping with Beach Erosion. UNESCO Publishing, Paris, France, 1998. 4. Guerra, A.J.T.; Silva, A.S.; Botelho, R.G.M. Erosão e conservação dos solos: conceitos, temas e aplicações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. 5. IBGE (2000). Censo demográfico de 2000. Dados preliminares. 6. Northwest Regional Planning Commission. The Shoreline Stabilization Handbook. Lake Champlain Sea Grant. University of Vermont, 2003. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7

7. O'Neill, C. R. A Guide to Coastal Erosion Processes. New York Sea Grant Extension. Cornell University, Ithaca, 1986. 8. Silva, W. S. Estudo da dinâmica superficial e geotécnica das falésias do município de Tibau do Sul Litoral Oriental do RN. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Programa de Pós-graduação em Engenharia Sanitária, 2003. 9. Goda, Y. Guidelines for Coastal Reconnaissance for Shore Protecion and Coastal Development. Internacional Conference on Coastal and Port Engineering in Developing Countries. RJ Brasil, 25/29 Setembro 1995. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 8