A morte e o morrer. Prof. Dr. Carlos Cezar I. S. Ovalle

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Transcrição:

A morte e o morrer Prof. Dr. Carlos Cezar I. S. Ovalle

Conceitos de morte Morrer é o cessar irreversível: 1- da função de todos órgãos, tecidos e células; 2- do fluxo de todos os fluídos do corpo incluindo o sangue e o ar; 3- do funcionamento do coração e do pulmão; 4- do funcionamento espontâneo do coração e do pulmão; Francisconi/2000

Conceitos de morte Morrer é o cessar irreversível: 5- do funcionamento de todo o cérebro, incluindo o tronco cerebral; 6- da capacidade corporal de ser consciente. Francisconi/2000

Quatro valores nucleares da Medicina 1- Prevenção da doença e do dano; promoção e manutenção da saúde. 2- Alívio da dor e do sofrimento causado pelas doenças. 3- Cura e cuidado dos doentes e cuidados para aqueles que não podem ser curados. 4- Evitar a morte prematura e procurar a morte tranqüila. Hastings Ctr Report,26:6,1996 Francisconi/2000

Morte Prematura no momento errado Evitar a morte pelos motivos errados na maneira errada

Morte Tranqüila Morte tranqüila é aquela em que a dor e o sofrimento são minimizados por paliação adequados, na qual os pacientes não são abandonados ou negligenciados, e na qual os cuidados com aqueles que não vão sobreviver são avaliados tão importantes como aqueles que são dispensados a quem irá sobreviver. Hastings Ctr Report,26:6,1996

O bem do paciente 1-0 bem médico, biomédico ou clínico O bem que pode ser atingido pela intervenção médica em um estado particular de uma doença. 2-0 melhor interesse do paciente A alteração na qualidade de vida que uma intervenção médica pode produzir; concilia a ação médica com os planos, objetivos e metas dos pacientes. Pelegrino&Thomasma Francisconi/2000

O bem do paciente 3- O bem do paciente como uma pessoa humana. O bem que busca a capacidade da pessoa em raciocinar, escolher e expressar suas vontades. 4- O bem último ou definitivo Telos (finalidade) da vida humana através da percepção do paciente: o sentido e o destino da existência humana. Pelegrino&Thomasma

Eutanásia, Distanásiae Ortotanásia

A tecnologia deve estar a serviço da vida!

Estamos ampliando a vida ou simplesmente adiando a morte? Deve a vida humana, independente de sua qualidade, ser sempre preservada? Pode o médico sustentar indefinidamente a vida de uma pessoa? Até que ponto é lícito sedar a dor, ainda que isso signifique abreviar a vida?

Deve-se empregar todos os meios e equipamentos disponíveis para acrescentar um pouco mais de vida a pacientes terminais, ou deve-se interromper o tratamento? O que fazer com crianças que nascem com defeitos congênitos graves, cujo futuro será somente sofrimento ou uma mera vida vegetativa?

Questões Conceituais... Eutanásia: do grego eu = boa e thanatos = morte. Se traduz literalmente por boa morte, morte suave, sem sofrimentos atrozes. Intervenção da medicina para atenuar as dores da doença ou da agonia - mesmo com risco de suprimir a vida prematuramente.

Distanásia: obstinação terapêutica, isto é, utilização de processos terapêuticos cujo efeito é mais nocivo do que os efeitos do mal a curar, ou inútil, porque a cura é impossível. Obsessão de manter a vida biológica a qualquer custo. Ortotanásia: morte digna e humanitária, na hora certa.

Mistanásia: a eutanásia social Mortesocial, foraeantesdoseutempo... Fatores geográficos, sociais, políticos e econômicos juntam-se para espalhar em nosso continente a morte miserável de crianças, jovens, adultos e anciãos. Omissão de socorro estrutural, que atinge milhões de doentes durante sua vida inteira, e não apenas nas fases avançadas e terminais de suas enfermidades.

Definição de morte Constatação de morte encefálica, como critério para declarar uma pessoa morta. Resolução CFM 1480/97: A morte encefálica será caracterizada através da realização de exames clínicos e complementares durante intervalos de tempo variáveis, próprios para determinadas faixas etárias. Revoga-se a Resolução CFM nº 1.346/91.(D.O.U.; Poder Executivo, DF, nº 160, 21 ago. 1997. Seção 1, p. 18.227-8)

O que diz o Código de Ética Médica? Artigo 66 veda ao médico utilizar, em qualquer caso,meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal Artigo 57 proíbe também ao médico deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento ao seu alcance em favor do paciente. No parágrafo 2º do Artigo 61 (que proíbe ao médico abandonar o paciente sob os seus cuidados ), reza que salvo por justa causa, não pode abandonar o paciente por ser este portador de moléstia crônica ou incurável, mas deve continuar a assisti-lo ainda que apenas para mitigar o sofrimento físico ou psíquico

Resolução CFM 1805 / 2006 - Ortotanásia Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal. (Resolução suspensa)

Meios ordinários: são todos os remédios, tratamentos e operações que oferecem um benefício razoável para o paciente e que podem ser obtidos e utilizados sem gasto excessivo, dor ou outros inconvenientes. Meios extraordinários são aqueles remédios, tratamentos e operações que não podem ser feitos sem que haja um gasto excessivo, dor ou outro inconveniente, ou então, quando usados, não oferecem uma esperança razoável de benefício.

A morte no século XXI é vista como tabu, interdita, vergonhosa; por outro lado, o grande desenvolvimento da medicina permitiu a cura de várias doenças e um prolongamento da vida. Entretanto, este desenvolvimento pode levar a um impasse quando se trata de buscar a cura e salvar uma vida, com todo o empenho possível, num contexto de missão impossível: manter uma vida na qual a morte já está presente. Maria Julia Kovács - Bioética nas Questões da Vida e da Morte Psicologia USP, 2003

Esta atitude de tentar preservar a vida a todo custo é responsável por um dos maiores temores do ser humano na atualidade. Que é o de ter a sua vida mantida às custas de muito sofrimento, solitário numa UTI, ou quarto de hospital, tendo por companhia apenas tubos e máquinas. Maria Julia Kovács - Bioética nas Questões da Vida e da Morte-Psicologia USP, 2003

O curso da existência não é mais dependente de uma lei superior que reserva o homem a condição de espectador, muito pelo contrário, é ele hoje, o agente das transformações e tem, a sua disposição, toda a existência e nela intervém como bem lhe aprouver.

Seqüela neurológica grave