Fundamentos de Físico-Química. Anne Michelle G. P. Souza



Documentos relacionados
Introdução à Ciência da Computação. Hendrik Teixeira Macedo

Botânica Sistemática e Econômica. Ana Paula do Nascimento Prata

História do Brasil Colônia. Maria Izabel Ladeira Silva

Geologia Geral. José Wallace Bezerra Nascimento Ana Cláudia da Silva Andrade

Geomorfologia Estrutural. Hélio Mário de Araújo Ana Claudia da Silva Andrade

Métodos de Física Teórica II. Osmar S. Silva Jr.

!,* $ 4 Aldo Dinucci São Cristóvão/SE 2007

Elementos de Anatomia Humana. José Aderval Aragão

Histologia Básica. Marlúcia Bastos Aires Rosilene Calazans Soares Shirlei Octacílio da Silva Elizabeth Ting

Matemática para o Ensino Médio I. Ângelo Alberti

Didática e Metodologia para o Ensino de Física II. Divanizia do Nascimento Souza

Termodinâmica Química. Anne Michelle G. P. Souza

Estágio Supervisionado em Ensino de Matemática. Denize da Silva Souza

Métodos de Física Teórica I. Osmar de Souza e Silva Júnior

Linguagem da Termodinâmica

Se um sistema troca energia com a vizinhança por trabalho e por calor, então a variação da sua energia interna é dada por:

Instrumentação para o Ensino de Física IV. Vera Lucia Martins de Mello

1 - Etapas do método científico.

CALORIMETRIA, MUDANÇA DE FASE E TROCA DE CALOR Lista de Exercícios com Gabarito e Soluções Comentadas

Equações Diferenciais Ordinárias. Lúcia de Fátima de Medeiros Brandão Dias

TERMODINÂMICA CONCEITOS FUNDAMENTAIS. Sistema termodinâmico: Demarcamos um sistema termodinâmico em. Universidade Santa Cecília Santos / SP

Estágio Supervisionado em Ensino de Letras. Fátima Bezerra Negromonte

Propriedades de uma Substância Pura

TERMODINÂMICA EXERCÍCIOS RESOLVIDOS E TABELAS DE VAPOR

Quantidade de calor, calorimetria e mudanças de fase

ATIVIDADES SOBRE TRABALHO, CALOR, ENERGIA INTERNA, PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA E ENTALPIA

Curso de Farmácia. Operações Unitárias em Indústria Prof.a: Msd Érica Muniz 6 /7 Período DESTILAÇÃO

ESTADOS DA MATÉRIA. O átomo é composto por outras partículas ainda menores.

Do ponto de vista da Termodinâmica, gás ideal é aquele para o qual vale, para quaisquer valores de P e T, a equação de estado de Clapeyron:

Propriedades físicas e químicas das substâncias

Introdução. Muitas reações ocorrem completamente e de forma irreversível como por exemplo a reação da queima de um papel ou palito de fósforo.

AULA PRÁTICA DE QUÍMICA GERAL Estudando a água parte 32

CAPACIDADE TÉRMICA E CALOR ESPECÍFICO 612EE T E O R I A 1 O QUE É TEMPERATURA?

CADERNO DE EXERCÍCIOS 1D

PROPRIEDADES DA MATÉRIA

Matemática para o Ensino Fundamental. Éder Matheus de Souza

LISTA DE EXERCÍCIOS ESTUDO DOS GASES

SUBÁREA DE FÍSICA E QUÍMICA PLANEJAMENTO ANUAL PARA A DISCIPLINA DE FÍSICA 2ª SÉRIE DO ENSINO MÉDIO Identificação e Conteúdo Programático

Transformações físicas de substâncias puras Aula 1

Aula 2: O estudo da matéria

Sumário. Do Sol ao aquecimento. A energia no aquecimento/arrefecimento de sistemas 04/05/2015

grandeza do número de elétrons de condução que atravessam uma seção transversal do fio em segundos na forma, qual o valor de?

Leis Ponderais e Cálculo Estequiométrico

Organizada por: Pedro Alves. A tabela a seguir contém algumas integrais que podem ser úteis durante a prova.

Água e Solução Tampão

Bacharelado em Engenharia Civil

3.2 Equilíbrio de Fases Vapor - Líquida - Sólida numa Substância Pura Consideremos como sistema a água contida no conjunto êmbolo - cilindro abaixo:

Propriedades físicas e químicas das substâncias

p A = p B = = ρgh = h = Por outro lado, dado que a massa total de fluido despejada foi m, temos M 1 m = ρ(v 1 + V 2 ) = ρ 4 H + πd2 4 h = H = 4

Calor absorvido; gás ideal; expansão isotérmica e reversível: a energia das moléculas não varia quando T é cte

Disciplina : Termodinâmica. Aula 5 ANÁLISE DA MASSA E ENERGIA APLICADAS A VOLUMES DE CONTROLE

Introdução à Química. Prof. Fernando R. Xavier

Controle de Processos Aula: Balanço de massa

Mudanças de Fase. Estado de agregação da matéria

Sumário. Materiais. Algumas propriedades físicas e químicas dos materiais

MATÉRIA Mestranda Daniele Potulski Disciplina Química da Madeira I

- A velocidade da reação direta (V1) é igual à velocidade da reação inversa (V2) V 1 = V 2

Bioestatística. Samuel de Oliveira Ribeiro

Termoquímica. Disciplina de Química Geral Profa. Marcia Margarete Meier

COLÉGIO SANTA TERESINHA R. Madre Beatriz 135 centro Tel. (33)

a) Qual a pressão do gás no estado B? b) Qual o volume do gás no estado C

Aula 15 TERMOQUÍMICA. Eliana Midori Sussuchi Samísia Maria Fernandes Machado Valéria Regina de Souza Moraes

Módulo VIII - 1ª Lei da Termodinâmica Aplicada a Volume de Controle: Regime Permanente, Dispositivos de Engenharia com Escoamento e Regime Transiente.

COMENTÁRIOS DA PROVA DE FÍSICA DO SSA-UPE 2 ANO

Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe

Química Ambiental. Carlos Alexandre Borges Garcia Elisangela de Andrade Passos

ESTADOS FÍSICOS DA MATÉRIA

Separação de Misturas

A Matéria Química Geral

Química Geral PROF. LARISSA ROCHA ALMEIDA - CURSINHO VITORIANO 1

Ciclo: 3º Ano: 7º Disciplina: Físico-Química. Atividades / Estratégias. Nº aulas previstas. Avaliação

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE ALIMENTOS ANÁLISES TÉRMICAS DE ALIMENTOS

Leonnardo Cruvinel Furquim TERMOQUÍMICA

Apostila de Química Geral

PROF. KELTON WADSON OLIMPÍADA 8º SÉRIE ASSUNTO: TRANSFORMAÇÕES DE ESTADOS DA MATÉRIA.

Matéria: Química Assunto: Materiais Prof. Gilberto Ramos

CURSO DE LICENCIATURA EM FÍSICA

QUÍMICA QUESTÃO 41 QUESTÃO 42

REPRESENTAÇÕES E IMAGENS DA ENERGIA

DISCIPLINA AMB30093 TERMODINÂMICA - Aula 3 17/10/2013. Prof. Robson Alves de Oliveira robson.aoliveira@gmail.com.br robson.oliveira@unir.

Física. Setor B. Índice-controle de Estudo. Prof.: Aula 9 (pág. 102) AD TM TC. Aula 10 (pág. 102) AD TM TC. Aula 11 (pág.

CALORIMETRIA - TEORIA

RESUMOS TEÓRICOS de QUÍMICA GERAL e EXPERIMENTAL

PLANO DE TRABALHO DOCENTE DOCENTE RESPONSÁVEL : MARIA LUIZA TONUSSI DE OLIVEIRA

Janine Coutinho Canuto

Marco Antônio Moreira Instituto de Física UFRGS Porto Alegre RS Paulo Rosa Escola Estadual de Ensino Médio do Bairro Rio Branco Canoas RS

4.2 Modelação da estrutura interna

EQUILÍBRIO QUÍMICO 1

Termodinâmica Química Lista 2: 1 a Lei da Termodinâmica. Resolução comentada de exercícios selecionados

Aula: 20.2 Conteúdos: Máquinas

CAPÍTULO 6 Termologia

A Matéria e Diagrama de Fases. Profº André Montillo

Fase Identifica um estado uniforme de

2.1 Calor, trabalho e a 1ª lei da termodinâmica Swallin cap2

Os microrganismos e suas funções

Reações a altas temperaturas. Diagrama de Equilíbrio

USP EEL - Escola de Engenharia de Lorena Reatores Aula 1 Introdução a Engenharia de Reatores

Capacite Capacitação em Inovação Tecnológica para Empresários

PLANEJAMENTO ANUAL DE QUÍMICA

Natureza e História. Valéria Maria Santana Oliveira

Transcrição:

Fundamentos de Físico-Química Anne Michelle G. P. Souza São Cristóvão/SE 2009

Fundamentos de Físico-Química Elaboração de Conteúdo Anne Michelle G. P. Souza Projeto Gráfico e Capa Hermeson Alves de Menezes Diagramação Lucílio do Nascimento Freitas Ilustração Gerri Sherlock Araújo Revisão Edvar Freire Caetano Copyright 2009, Universidade Federal de Sergipe / CESAD. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização por escrito da UFS. Ficha catalográfica produzida pela Biblioteca Central Universidade Federal de Sergipe S729t Souza, Anne Michelle Garrido Pedroso de Termodinâmica química / Anne Michelle Garrido Pedroso de Souza. - São Cristóvão : Universidade Federal de Sergipe, CESAD, 2009. 1. Termodinâmica química. I. Título. CDU 544.3

Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a Distância Carlos Eduardo Bielschowsky Reitor Josué Modesto dos Passos Subrinho Chefe de Gabinete Ednalva Freire Caetano Coordenador Geral da UAB/UFS Diretor do CESAD Antônio Ponciano Bezerra Vice-coordenador da UAB/UFS Vice-diretor do CESAD Fábio Alves dos Santos Vice-Reitor Angelo Roberto Antoniolli Diretoria Pedagógica Clotildes Farias (Diretora) Hérica dos Santos Mota Iara Macedo Reis Daniela Souza Santos Janaina de Oliveira Freitas Diretoria Administrativa e Financeira Edélzio Alves Costa Júnior (Diretor) Sylvia Helena de Almeida Soares Valter Siqueira Alves Coordenação de Cursos Djalma Andrade (Coordenadora) Núcleo de Formação Continuada Rosemeire Marcedo Costa (Coordenadora) Coordenadores de Curso Denis Menezes (Letras Português) Eduardo Farias (Administração) Haroldo Dorea (Química) Hassan Sherafat (Matemática) Hélio Mario Araújo (Geografia) Lourival Santana (História) Marcelo Macedo (Física) Silmara Pantaleão (Ciências Biológicas) Núcleo de Avaliação Guilhermina Ramos (Coordenadora) Carlos Alberto Vasconcelos Elizabete Santos Marialves Silva de Souza Núcleo de Serviços Gráficos e Audiovisuais Giselda Barros Núcleo de Tecnologia da Informação João Eduardo Batista de Deus Anselmo Marcel da Conceição Souza Assessoria de Comunicação Guilherme Borba Gouy Coordenadores de Tutoria Edvan dos Santos Sousa (Física) Geraldo Ferreira Souza Júnior (Matemática) Janaína Couvo T. M. de Aguiar (Administração) Priscilla da Silva Góes (História) Rafael de Jesus Santana (Química) Ronilse Pereira de Aquino Torres (Geografia) Trícia C. P. de Sant ana (Ciências Biológicas) Vanessa Santos Góes (Letras Português) NÚCLEO de Material Didático Hermeson Menezes (Coordenador) Arthur Pinto R. S. Almeida Carolina Faccioli dos Santos Cassio Pitter Silva Vasconcelos Edvar Freire Caetano Isabela Pinheiro Ewerton Lucas Barros Oliveira Neverton Correia da Silva Nycolas Menezes Melo Universidade Federal de Sergipe Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos Av. Marechal Rondon, s/n - Jardim Rosa Elze CEP 49100-000 - São Cristóvão - SE Fone(79) 2105-6600 - Fax(79) 2105-6474

Sumário AULA 1 Introdução a Termodinâmica Química... 07 AULA 2 As propriedades dos Gases... 17 AULA 3 A Primeira Lei da Termodinâmica... 43 AULA 4 Funções de estado: Energia Interna e Entalpia... 57 AULA 5 Atividades sobre Trabalho, Calor, Energia Interna, Primeira Lei da Termodinâmica e Entalpia... 67 AULA 6 Termoquímica... 77 AULA 7 Segunda e Terceira Leis da Termodinâmica... 97 AULA 8 Energia Livre e Potencial Químico... 125 AULA 9 Atividades sobre a Segunda e Terceira Leis da Termodinâmica, Energia Livre e Potencial Químico... 143 AULA 10 Equilíbrio Químico... 153 AULA 11 Equilíbrio Químico e de Soluções... 163 AULA 12 Exercícios de Equilíbrio Químico e Misturas... 171 AULA 13 Eletroquímica... 181 AULA 14 Exercícios de Eletroquímica... 199 AULA 15 Introdução à Termodinâmica Estatística... 207

INTRODUÇÃO À TERMODINÂMICA QUÍMICA Aula 1 Meta Apresentar os conceitos básicos da Termodinâmica. Objetivos Ao final desta aula, o aluno deverá: compreender alguns conceitos básicos da Termodinâmica (sistemas, vizinhança, processos, propriedades termodinâmicas); entender algumas relações fundamentais da Termodinâmica. Pré-requisitos Compreender aspectos básicos de Química Geral; conhecimento de Cálculo Diferencial e Integral. Representação de um sistema termodinâmico, mostrando entrada de uma fonte de calor (caldeira), à esquerda, e saída para um redutor de calor (condensador), à direita. O trabalho, neste caso, é extraído por uma série de pistões. (Fonte: http://upload.wikimedia.org)

Fundamentos de Físico-Química Introdução A Físico-Química é um ramo da Química que estabelece e desenvolve princípios fundamentais; seus conceitos visam a explicar e interpretar observações sobre as propriedades físicas e químicas da matéria. Esta é uma área essencial para o desenvolvimento e interpretação das técnicas modernas da determinação da estrutura e propriedades da matéria, como por exemplo, dos materiais sintéticos novos e das moléculas biológicas. A termodinâmica é a ciência que estuda as interações da energia nas quais as variações de temperaturas são importantes. Ela é fundamentada em leis, as quais são conhecidas como leis da termodinâmica. Os processos que são realizados cotidianamente acontecem de forma a atender tais leis. Historicamente, a termodinâmica teve um grande desenvolvimento a partir do momento em que as máquinas térmicas começaram a se popularizar e um melhor entendimento teórico dos processos se fez necessário para o aumento das suas eficiências. 2 1 Representação da aeolípile de Herón (à esq.) e fotografia do motor a vapor de Watt (acima). Uma máquina térmica transforma calor em energia mecânica. A máquina térmica mais antiga foi construída pelo filósofo Herón, em Alexandria (Egito), há cerca de 2.000 anos. Conhecida como aeolípile, era um dispositivo muito simples, em que o vapor formado pelo aquecimento da água, ao escapar em sentidos opostos em dois tubos, colocava a esfera em rotação. No século XVIII, James Watt construiu um modelo de máquina a vapor que apresentava um rendimento razoável e, assim, tornava-se útil para movimentar máquinas de grande porte nas fábricas. Esta invenção impulsionou a Revolução Industrial. (Fontes: 1 - http://crv.educacao.mg.gov.br; 2 - http://pt.wikipedia.org) 8

Introdução à Termodinâmica Química Quando utilizamos a termodinâmica para analisar mudanças de energia, focalizaremos nossa atenção em uma parte do universo limitada e bemdefinida. Esta parte limitada chamamos de sistema; todo resto é chamado vizinhança. Quando estudam a variação de energia que acompanha uma reação química em laboratório, os químicos normalmente constroem um sistema. O recipiente e tudo além dele são considerados vizinhança. Nesta aula começamos com algumas definições importantes: sistema termodinâmico e as variáveis macroscópicas que o carcaterizam. Aula 1 SISTEMA, VIZINHANÇA Um sistema é qualquer parte identificada de matéria do universo que esteja sob investigação. A identificação é feita por uma fronteira ou limite, que o separa do meio. Logo o sistema não troca massa com o meio, sendo sua massa constante. Os sistemas podem ser considerados fechados ou abertos, dependendo se a massa é fixa ou o volume é fixo no espaço escolhido para estudo. Os sistemas que podemos estudar mais facilmente são chamados sistemas fechados. Um sistema fechado pode trocar energia com suas vizinhanças. Se não há troca de energia com as vizinhanças então o sitema é designado como isolado. Podemos citar como exemplo de um sistema o gás contido num cilindro, como ilustrado na Figura 1. Figura 1. Ilustração de um sistema e vizinhança, veja o caso de um gás contido num cilindro. 9

Fundamentos de Físico-Química Considere como outro exemplo, a mistura de gás hidrogênio (H2) e gás oxigênio (O2) em um cilindro. O sistema nesse caso é apenas o hidrogênio e o oxigênio; o cilindro, o embolo, e tudo além deles são as vizinhanças. Se os gases hidrogênio e oxigênio reagem para formar a água, onde libera-se energia: Esse sistema não troca matéria com sua vizinhança. Entretanto, ele troca energia com ela na forma de trabalho e calor. PROPRIEDADES E ESTADO TERMODINÂMICO Propriedade de um sistema é uma característica observável e passível de medida do sistema. Elas podem ser intensivas e extensivas. As propriedades intensivas são a quelas que não dependem da massa do sistema. Exemplo: pressão, temperatura, etc. Por outro lado, as propriedades extensivas são aquelas que dependem da massa do sistema. Exemplo: volume, entalpia, entropia, etc. Algumas observações são importantes de serem destacadas: - Todas as propriedades extensivas específicas são intensivas. Exemplo: volume específico v = V/m (m 3 /kg). - Qualquer propriedade pode ser expressa como função de duas outras propriedades independentes. Exemplo: z = f (x, y) ou P = P (V, T). - Uma propriedade independe do caminho do processo. Um estado termodinâmico é a condição em que um sistema se encontra, num determinado instante, caracterizado pelas suas propriedades independentes. Duas propriedades independentes identificam um estado termodinâmico. Exemplo: uma certa massa de ar está contida num cilindro, provido de um pistão, que se desloca a pressão constante de 200 KN/m 2, variando o seu volume de 3 m 3 até 6 m 3. Durante a mudança de fase de uma substância pura, a pressão e a temperatura são dependentes. Então é preciso, para identificar o estado termodinâmico, mais uma propriedade independente. Quando pelo menos uma propriedade termodinâmica do sistema varia o seu valor numérico, dizemos que o sistema experimenta uma mudança de 10

Introdução à Termodinâmica Química estado ou realizou um processo. Então a mudança de estado é definida pela variação do valor numérico das propriedades. O caminho da mudança de estado é chamado de processo termodinâmico. No exemplo anterior, o volume variou de 3 m 3 para 6 m 3 e a pressão permaneceu constante. Num diagrama P V, o processo é representado pelo segmento 1 2, indicando a mudança do estado 1 para o estado 2, conforme ilustrado na Figura 2. Aula 1 Figura 2. Ilustração de um diagrama P x V. Quando não há tendência de variação de estado termodinâmico de um sistema, dizemos que o mesmo está em equilíbrio. Durante o equilíbrio termodinâmico não há variação do valor numérico das propriedades. Exemplo: Um tanque, isolado termicamente, contém um líquido qualquer mantido a pressão e temperatura constantes. As válvulas de entrada e de saída estão fechadas. PROCESSOS REVERSÍVEIS E IRREVERSÍVEIS Um processo reversível é aquele que pode ser invertido sem deixar vestígio, no sistema e no meio, da sua ocorrência. Trata-se de um processo lento, no qual as propriedades apresentam variações infinitesimais, implicando numa série contínua de estados de equilíbrio. Fala-se que um processo reversível é aquele que pode fazer parte de um ciclo reversível. É evidente que se trata de um processo ideal. Um processo irreversível (processo real) é aquele no qual o sistema e o meio ficam afetados após a sua realização. Na prática ele é estudado através de um modelo, idealizado por um processo reversível entre os dois estados. O valor real é conseguido através do ajuste do valor encontrado com o uso de um fator, que é chamado eficiência do processo. 11

Fundamentos de Físico-Química MATÉRIA Uma substância é uma forma pura, bem definida, de matéria. A quantidade de substância n (ou número de mols) numa amostra é dada em termos de uma unidade especial, o mol. A definição formal de 1 mol é a de uma quantidade de substância que contém tantas unidades discretas (átomos, moléculas, íons, etc) quantos são os átomos em 12g exatos de carbono 12. Esse número, determinado experimentalmente, é cerca de 6,02 x 10 23. Se uma amostra contém N unidades discretas, o número de mols na amostra será n = N/N A, onde N A é o número de Avogadro: N A = 6,02 x 10 23 mol -1. ENERGIA O conceito central de todas as explicações na físico-química, e também em muitos outros ramos da ciência, é o de energia. Usaremos uma lei da natureza que, aparentemente, é universal: a energia se conserva. Ou seja, a energia nem é criada nem é destruída. Assim, embora se possa transferir energia de um sistema para outro, a energia total se mantém constante. A unidade no SI (Sistema Internacional) é o joule (J), que equivale a: 1 J = 1 kg m 2 s -2 Um joule é uma unidade muito pequena de energia. Por exemplo, cada batimento do nosso coração consome cerca de 1 J. A energia molar é a energia de uma amostra dividida pelo número de mols presentes na amostra. Normalmente se mede em joules por mol (J mol-1) ou num múltiplo desta unidade (kj mol-1). Em muitos casos, há adoção de outras unidades, como por exemplo, o elétron-volt, caloria ou quilocaloria. A relação entre elétron-volt e o joule é: 1 ev = 1,6 x 10-19 J; Já a relação entre caloria e joule é: 1 cal = 4,184 J. Uma quantidade de energia de 1 cal é suficiente para elevar de 10C a temperatura de 1 g de água. CONCEITOS DE ESTADO DA MATÉRIA E SUBSTÂNCIA PURA O que é uma substância pura? Propriedades características (ou específicas) exibidas pela matéria em seus diferentes estados: a) O Estado Fluido: caracterizado pela aptidão da matéria de escoar mais 12

Introdução à Termodinâmica Química ou menos facilmente, o que corresponde a um deslocamento livre das moléculas umas em relação às outras. Neste estado destacam-se: a.1 Gás: forma e volume variáveis, pouco denso, compressível, alto nível de desordem molecular, forte desagregação de partículas, máxima energia e movimentação de partículas. a.2 Líquido: forma variável e volume definido, denso, pouco compressível, forte agregação de partículas, mediana organização de partículas e moderada energia e movimentação relativa de partículas. b) Estado sólido: estado condensado da matéria que se caracteriza por apresentar arranjo geométrico definido, no qual os átomos se distribuem regularmente em posições relativas fixas. São características específicas exibidas por esse estado: Aula 1 - Fragilidade: facilidade de se quebrar; - Dureza: facilidade de riscar outros materiais; - Resistência: qualidade de suportar forças de tração sem se romper; - Elasticidade: tendência de retornar à sua forma original quando cessam as forças que o deformava. - Ductilidade e Maleabilidade: qualidade daquilo que é maleável, plasticidade; A partir de observações experimentais pode-se perceber que a água sólida, a água líquida e a gasosa representam estados distintos de uma mesma substância, caracterizados facilmente a partir de suas propriedades específicas e que só existem em condições físicas características de temperatura e pressão como demonstra a Tabela 1. Tabela 1. Propriedades físicas da água. Como vemos, a água pode transitar entre os estados sólido, líquido e gasoso, ela transforma-se em gelo, seu estado sólido, quando a temperatura ambiente torna-se inferior a 273,15 K (0 o C). À temperatura de 273,15 ela se liquefaz, enquanto que a 373,15 K (100 o C) ela se vaporiza, passa para o estado comumente conhecido como gasoso, terceiro estado no qual a matéria pode se apresentar na natureza. Um estado físico da matéria é a forma homogênea sob a qual se apresenta qualquer substância de composição fixa (substância pura), caracterizável a partir de propriedades físicas como: a densidade, o calor, a viscosidade, índice de refração, entre outras. 13

Fundamentos de Físico-Química a) Estado líquido CONCEITO DE FASE A Figura 3 retrata uma gota d água ampliada 10 9 vezes. Nela, os átomos de hidrogênio (esfera cinza) e de oxigênio (esfera preta) possuem raios da ordem de 1 a 2 angströms (1 Å = 10-8 cm). Trata-se de uma representação idealizada, já que os átomos constituintes das moléculas são representados por esferas bem delineadas, o que não corresponde à realidade. Além disso, as moléculas são partes integrantes de um arranjo bidimensional, quando na íntegra se movimentam em três dimensões. Figura 3. Água no estado líquido. Ainda, na mesma figura, as moléculas são estáticas, quando na realidade estão ziguezagueando umas em relação às outras em girando em torno de um eixo imaginário em movimento de rotação e com seus átomos vibrando incessantemente como molas em oscilações continuas. Outro aspecto não ilustrado na Figura 10 é o fato dos átomos de hidrogênio estarem ligados aos átomos de oxigênio através de ligações covalentes e, também, das moléculas de água se unirem entre si através de interações menos intensas. São as ligações por pontes de hidrogênio, ligações essas responsáveis pela integridade da gotinha d água. Assim ela mantém seu volume e flui de um local para outro mantendo a sua integridade, graças à atração molecular. b) Estado gasoso (vapor) Visto que a agitação molecular decorrente do movimento de translação molecular também é sinônimo de calor, o aquecimento da gotinha d água agitará as moléculas o suficiente para vencer as forças atrativas entre elas e separá-las umas das outras, como ilustra a Figura 4. 14

Introdução à Termodinâmica Química Aula 1 Figura 4. Água no estado de vapor. Esta é a forma pela qual se produz vapor a partir da água líquida. O aumento de temperatura promove o movimento de translação com intensidade suficiente para romper as ligações por pontes de hidrogênio e assim manter as verdadeiras moléculas de água (H 2 O) livres com características semelhantes às discriminadas na Figura. Agora, seguramente, podemos afirmar que uma fase é a identificação precisa de um estado da matéria, o que nos permite por em evidência a possibilidade de existência de várias fases distintas para um mesmo estado sólido. Por sua vez, para gases a distinção entre fase e estado não tem muito sentido, haja vista não ser possível caracterizar devido à agitação molecular, total desordem, a posição das moléculas presentes no seio da massa gasosa como no caso dos sólidos e líquidos. Como exemplo, citamos o nitrogênio, principal constituinte do ar atmosférico onde se encontra presente em uma única fase no estado gasoso. Conclusão Nesta aula foram apresentados os conceitos básicos e introdutórios da termodinâmica. Procuramos definir o que é a termodinâmica, os conceitos iniciais (Sistemas, Processos, Propriedades Termodinâmicas etc.), bem como algumas relações básicas da termodinâmica. Resumo As observações que a físico-química organiza e explica estão condensadas em leis científicas. Uma lei é um sumário de experiências. As leis da termodinâmica resumem as relações entre as propriedades macroscópicas da matéria e em especial,relata as observações sobre as transformações de energia. Nesta aula são apresentados algumas ideias fundamentais, cujos conceitos novos serão tratados com mais detalhes no decorrer do curso. 15

Fundamentos de Físico-Química As propriedades dos gases. Próxima aula Referências ATKINS, P. W. Físico-Química, v. 1, 6 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1999. ATKINS, P. W.; JONES, L. Princípios de Química: questionando a vida moderna e o meio ambiente, 3 ed. Porto Alegre: Bookman, 2006. BALL, D. W. Físico-Química, v. 1. São Paulo: Thomson, 2005. MACEDO, H. Físico-Química I. Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1981. PILLA, L. Físico-Química, v. 1. Rio de Janeiro: LTC, 1982. SMITH, E. B. Basic Chemical Thermodinamics, 4 ed. New York: Oxford, 1990. 16