Propriedade intelectual e políticas de comunicação



Documentos relacionados
introdução Trecho final da Carta da Terra 1. O projeto contou com a colaboração da Rede Nossa São Paulo e Instituto de Fomento à Tecnologia do

PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

AOS CANDIDATOS À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA DO BRASIL PROPOSTAS DE POLÍTICAS PARA A ÁREA DAS COMUNICAÇÕES

Realização de rodas de conversa e de troca de conhecimento para intercâmbio do que foi desenvolvido e produzido.

I Seminário Nacional de Controle Social A sociedade no acompanhamento da gestão pública Brasília, 25, 26 e 27 de Set/2009

Plataforma dos Centros Urbanos

SEDE NACIONAL DA CAMPANHA

PLANO SETORIAL DE DANÇA. DOCUMENTO BASE: Secretaria de Políticas Culturais - SPC Fundação Nacional de Artes FUNARTE Câmaras Setoriais de Dança

Trilha IV Internet e Direitos Humanos

PLANO DE EDUCAÇÃO DA CIDADE DE SÃO PAULO: processo, participação e desafios. Seminário dos/as Trabalhadores/as da Educação Sindsep 24/09/2015

RESOLUÇÃO CNAS Nº 11, DE 23 DE SETEMBRO DE 2015.

O Projeto Casa Brasil de inclusão digital e social

TEXTO BASE PARA UM POLÍTICA NACIONAL NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

Projeto de Lei de Iniciativa Popular para uma mídia Democrática

Projeto Prominp IND P&G 75 Propostas de Política para Mobilização e Desenvolvimento de APLs para o Setor de Petróleo, Gás E Naval

Elementos de legislação de telecomunicações, informática e comunicação social

MESTRADO EM MEMÓRIA SOCIAL E BENS CULTURAIS. 1.1 Matriz Curricular Disciplinas obrigatórias

Trilha 4 Diversidade e Conteúdo Matriz GERAL de sistematização

Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Tocantins decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

PLANO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO NO SISTEMA PRISIONAL PLANO DE AÇÃO

e construção do conhecimento em educação popular e o processo de participação em ações coletivas, tendo a cidadania como objetivo principal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: CAPÍTULO I DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Associação Brasileira do Agronegócio da Região de Ribeirão Preto. Comunicação no Agro. Setembro, 2011

Sheet1. Criação de uma rede formada por tvs e rádios comunitárias, para acesso aos conteúdos

EIXO 2 PROTEÇÃO E DEFESA DOS DIREITOS: PROPOSTAS APROVADAS OBTIVERAM ENTRE 80 e 100% DOS VOTOS

Profª.. MSc. Silvana Pimentel de Oliveira Manaus/2009

PPA PLANO DE DESENVOLVIMENTO ESTRATÉGICO PROGRAMA ESCOLA DO LEGISLATIVO

Comunidade de Prática Internacional para apoiar o fortalecimento e liderança da BIREME OPAS/OMS Fortalecimento institucional da BIREME OPAS/OMS

Nossa Missão, Visão e Valores

RESPONSABILIDADE SOCIAL: a solidariedade humana para o desenvolvimento local

Sociologia Movimentos Sociais. Colégio Anglo de Sete Lagoas - Professor: Ronaldo - (31)

Por que Projetos Sociais?

CONTEÚDOS DE SOCIOLOGIA POR BIMESTRE PARA O ENSINO MÉDIO COM BASE NOS PARÂMETROS CURRICULARES DO ESTADO DE PERNAMBUCO

CAPTAÇÃO DE RECURSOS ATRAVÉS DE PROJETOS SOCIAIS. Luis Stephanou Fundação Luterana de Diaconia

Universidade Estadual do Centro-Oeste Reconhecida pelo Decreto Estadual nº 3.444, de 8 de agosto de 1997

Plano de Ação do Centro de Educação e Letras

Fórum Social Mundial Memória FSM memoriafsm.org

SAÚDE COMO UM DIREITO DE CIDADANIA

PROCESSO DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS TURÍSTICOS

Projeto Pedagógico Institucional PPI FESPSP FUNDAÇÃO ESCOLA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA DE SÃO PAULO PROJETO PEDAGÓGICO INSTITUCIONAL PPI

UNIDADE 4. Introdução à Metodologia de Desenvolvimento de Sistemas

Curso de Especialização em Saúde da Família

Nova ética emergindo de crises mudança no sistema de emprego exclusão/marginalização social aumento das demandas sociais concentração de poder e

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO VIÇOSA/ALAGOAS PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGCIO

Ética e Legislação em Comunicação

REFORMA UNIVERSITÁRIA: contribuições da FENAJ, FNPJ e SBPJor. Brasília, outubro de 2004

CARTA DO COMITÊ BRASILEIRO DE DEFENSORAS/ES DOS DIREITOS HUMANOS À MINISTRA DA SECRETARIA DOS DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

II TEXTO ORIENTADOR 1. APRESENTAÇÃO

Projeto Político-Pedagógico Estudo técnico de seus pressupostos, paradigma e propostas

Princípios de Manila Sobre Responsabilidade dos Intermediários

Cooperação científica e técnica e o mecanismo de intermediação de informações

Qualificação. Horizontes. BSB, 22 de novembro. de 2005

MATERIAL DE DIVULGAÇÃO DA EDITORA MODERNA

PROPOSTA DE VEICULAÇÃO ONLINE NO PORTAL DO TRÂNSITO

O Crescimento da Educação a Distância nas Universidades do Brasil

1. Que os Estados partes fortaleçam o Instituto de Políticas Públicas de Direitos

CADERNO DE ORIENTAÇÃO DIDÁTICA PARA INFORMÁTICA EDUCATIVA: PRODUÇÃO COLABORATIVA VIA INTERNET

(Publicada no D.O.U em 30/07/2009)

gestão das Instâncias de Governança nas regiões turísticas prioritárias do país.

Especialização em Gestão Estratégica de Projetos Sociais

MATERIAL DE DIVULGAÇÃO DA EDITORA MODERNA

nossa vida mundo mais vasto

IMPLEMENTAÇÕES, AMEAÇAS, PERIGOS

POR UMA INTERNET LIVRE: As redes sociais como instrumento de mobilização social. Curtiu? Compartilhe.

GRUPO 5 - COMUNICAÇÃO

GUIA PARA O GT RECURSOS FINANCEIROS

CINEMA NOSSO. Ação educacional pela democratização e convergência do audiovisual

a Resolução CONAMA nº 422/2010 de 23 de março de 2010, que estabelece diretrizes para as campanhas, ações e projetos de educação ambiental;

PREFEITURA MUNICIPAL DE RESENDE AGÊNCIA DO MEIO AMBIENTE DO MUNICÍPIO DE RESENDE

Ministério das Comunicações

Carta para a Preservação do Patrimônio Arquivístico Digital Preservar para garantir o acesso

O marketing aplicado aos mandatos : A importância da leitura de cenário para o planejamento.

Lei N X.XXX de XX de XXXXX de XXX

Plataforma pelos direitos dos jornalistas, em defesa da mídia pública e da democratização da comunicação. I. RESPEITO AO JORNALISTA PROFISSIONAL

COMISSÃO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, COMUNICAÇÃO E INFORMÁTICA PROJETO DE LEI Nº 5.409, DE 2013

Mapa da Educação Financeira no Brasil

PRÓ-DIRETORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU POLÍTICA INSTITUCIONAL DE PROPRIEDADE INTELECTUAL DO INTA

Questionário a ser Respondido Pelos Estudantes em EaD.

MINUTA DE LEI DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE CARIACICA

José Fernandes de Lima Membro da Câmara de Educação Básica do CNE

Jornalismo Interativo

"Movimentos Sociais e Políticas Públicas na Interface com o Campo de Conhecimento. Maria da Glória Gohn UNICAMP/CNPq

WALDILÉIA DO SOCORRO CARDOSO PEREIRA

Documento em construção. Declaração de Aichi-Nagoya

Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares Universidade Estadual de Campinas

COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA. REQUERIMENTO Nº,DE 2008 (Do Sr. Rafael Guerra)

II. Atividades de Extensão

Mídia e Região na Era Digital: Diversidade Cultural & Convergência Midiática. (org. Anamaria Fadul e Maria Cristina Gobbi)

ANTONIO CARLOS NARDI

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº, DE 2009

Etapas para a Elaboração de Planos de Mobilidade Participativos. Nívea Oppermann Peixoto, Ms Coordenadora Desenvolvimento Urbano EMBARQ Brasil

Plano Municipal de Educação

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO. INSTITUTO MULTIDISCIPLINAR Campus Nova Iguaçu

DECLARAÇÃO DE BRASÍLIA

SECRETARIA DE GESTÃO ESTRATÉGICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS - ADMINISTRAÇÃO DIRETA

b) Políticas, normas e meios para assegurar pluralidade e diversidade de conteúdos;

EIXO EXERCÍCIO PROFISSIONAL

Universidade Federal de Alagoas. Mídias na Educação. A EAD na Universidade Pública Brasileira. Prof. Fernando Silvio C. Pimentel

Transcrição:

1 Fórum Para entender os eixos focais Propriedade intelectual e políticas de comunicação Graça Caldas O texto do prof. Rebouças oferece uma importante revisão histórica sobre os conceitos que permeiam as Políticas Públicas de Comunicação e a Propriedade Intelectual. Não se pode negar o papel do Estado e da Sociedade Civil como atores legítimos no processo de regulação do direito à informação e de proteção à autoria. Se por um lado o processo regulatório das Políticas Públicas de Comunicação na área de radiodifusão tem sido objeto de debate entre os grupos de interesse, já no setor de Propriedade Intelectual, só recentemente, no Brasil, o tema vem sendo objeto de discussão. É preciso, porém, distinguir a propriedade industrial (patentes, marcas, desenho industrial, indicações geográficas e proteção de cultivares) do direito autoral (obras literárias, artísticas, programas de computador, domínios na Internet e cultura imaterial), que atinge a área de Comunicação mais de perto. A comercialização do produto cultural, pela sua reprodutibilidade técnica, tem sido objeto de disputas acirradas entre as empresas e seus autores, que reivindicam participação no processo de venda e circulação do produto, assim como o reconhecimento da primazia das idéias, face às ações inescrupulosas de pessoas ou grupos na absorção ilegal e disseminação desses conteúdos. O reconhecimento do poder da informação e do conhecimento no processo de formação crítica da sociedade é essencial para a discussão deste Seminário de Mídia Cidadã. Se por um lado a concentração da propriedade dos veículos de comunicação em poucos grupos de mídia limita a diversidade de vozes e, conseqüentemente, a percepção pública sobre a variedade possível de enfoques nos problemas apresentados à sociedade, as restrições impostas à propriedade intelectual podem, também, ser consideradas como

2 fatores contrários aos interesses sociais, onde a diversidade cultural deve prevalecer como direito inalienável da humanidade. Como, porém, compatibilizar os ideais iluministas do art. 19 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, lembrados por Rebouças, em seu texto, com uma sociedade capitalista em que a informação é considerada business e não um direito social? Por outro lado, não podemos perder a utopia. A inserção do Direito à Comunicação como um Direito Humano, presente na Carta de Brasília de 18 de agosto de 2005, durante o Encontro Nacional de Direitos Humanos, revela a conscientização mais ampla de setores representativos da sociedade civil sobre o papel determinante da democratização da comunicação, de uma comunicação plural, em que diferentes vozes possam ser manifestar, garantindo, assim plena participação cidadã na definição das políticas públicas do país. Neste momento crucial em que diferentes setores da sociedade voltam a se mobilizar pela melhoria da qualidade na programação nas emissoras de televisão e em que as tecnologias de informação e comunicação (TICs) oferecem novos caminhos a serem trilhados com o processo de convergência dos diferentes suportes, é necessário acompanhar de perto os movimentos em curso na área de Comunicação. A promessa do atual governo de elaborar, definitivamente, uma Lei Geral de Comunicação de Massa que já se encontra em sua sétima versão --, é fundamental para a conquista de novos espaços no latifúndio do ar imposto ao país durante décadas. Por outro lado, a regulamentação dos artigos do capítulo V da Comunicação da Constituição de 1988 não pode ficar restrita, como anunciado, aos artigos 221 e 222. Para que se implementem mudanças substantivas no setor, deve incluir a regulamentação dos artigos 220, 223 e 224. Isto porque, discutem, especificamente, as questões de interesse público, tais como: a concentração dos grupos e o monopólio na área; o princípio de complementaridade dos sistemas privado, público e estatal, os critérios de concessão de rádio e TV e de cancelamento ou permissão de uso desses veículos, assim como a inclusão do Conselho de Comunicação Social (CCS) nas definições das políticas públicas da área.

3 Não se trata aqui, obviamente, de questionar o direito de funcionamento de emissoras privadas, nem estatais, assim como as emissoras educativas, universitárias, legislativas e judiciárias, mas de ampliar espaço nessas emissoras para programas de interesse público, assim como abrir novos espaços com as emissoras comunitárias e garantir, principalmente, a existência de emissoras de caráter público, como previsto na legislação federal. QUESTÕES PARA O DEBATE Com base nas reflexões provocadas pelo texto de Rebouças elaboro algumas questões para o debate neste Seminário de Mídia Cidadã: Propriedade intelectual 1) Qual o futuro da propriedade intelectual na Era da Informação? Qual o uso que queremos e podemos fazer da informação e do conhecimento na Era Digital? 2) Como estabelecer parâmetros de proteção à propriedade intelectual na Era Digital, uma vez que a Internet é considerada como ferramenta natural de inclusão social? 3) Em que medida a disseminação da informação e do conhecimento podem ser reguladas por interesses comerciais? 4) Qual a possibilidade de participação do Estado e da Sociedade Civil em defesa dos interesse público, face à briga que vem sendo travada por gigantes do setor privado: a Google e a Microsoft associada à Yahoo na construção de bibliotecas digitais e disponibilidade irrestrita a seus acervos? Neste caso, como ficaria a questão da propriedade intelectual? E o direito do cidadão de acesso ao conhecimento? 5) Como pode o Estado intervir, em nome do interesse público, na disseminação do software livre para ampliar o acesso à web? Políticas de Comunicação

4 1) A democratização do acesso à informação e a pluralidade dos meios de comunicação, já reconhecidas como direito humano e social, estão diretamente associadas ao processo regulatório do país. Como, porém, alterar as leis se grande parte dos parlamentares são proprietários de meios de comunicação ou têm envolvimento direto com os grupos de mídia? 2) Os movimentos sociais recentes em prol da melhoria da qualidade de televisão como a campanha Quem financia a baixaria é contra a cidadania, ao lado do papel desempenhado pelo Ministério Público tem ampliado o debate sobre a necessidade de maior fiscalização na programação das emissoras comerciais. Qual o papel da Universidade neste processo? 3) No dia 24 de outubro último, o procurador regional Sérgio Sulama, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão de São Paulo, ajuizou uma ação civil pedindo a cassação da TV Omega Ltda, a Rede TV. O pedido é baseado em uma série de violações de direitos humanos dos homossexuais no quadro de pegadinhas do programa Tarde Quente da emissora, apresentado pelo humorista João Kleber. Trata-se de mais uma ação promovida pela sociedade civil para melhorar a qualidade na TV. Discutir como modificar a relação de desigualdade de forças entre as representações sociais de interesse público e os proprietários de canais de rádio e TV. 4) A quem cabe fiscalizar a qualidade na televisão? Como delimitar as barreiras entre censura e controle? Em que medida as instituições organizadas podem e devem interferir na elaboração das políticas públicas de comunicação? 5) Liberdade de expressão pode ser usada como argumento para a produção de programas de qualidade duvidosa? 6) Os efeitos da babá eletrônica sobre a educação e formação cultural das crianças são objeto de freqüentes discussões nos fóruns especializados, como este de Mídia Cidadã. Qual é a responsabilidade social do Estado, da escola, dos pais e dos profissionais da comunicação na reflexão deste processo? 7) Como os conceitos de Mídia Cidadã podem ser usados em emissoras estatais, privadas e públicas? E nas mídias alternativas?

5 8) A inserção da Comunicação como Direito Humano e do direito à Comunicação como parte das metas da Convenção de Diversidade Cultural pressupõe diversidade de cultura e de vozes. A indústria cultural interfere diretamente na identidade dos povos, nas suas percepções do mundo. Em que medida estratégias e ações que promovam a cooperação dos povos pode ajudar a construir uma Mídia Cidadã para humanizar a globalização e garantir a manutenção das identidades regionais, locais como fator de resistência política e cultural? 9) Dominar as Tecnológicas de Informação e Comunicação (TICs), promover a inclusão digital podem ser consideradas como perspectivas promotoras de cidadania? De que forma?