Política para o desenvolvimento dos territórios rurais no Brasil: propostas e fundamentos



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Transcrição:

Política para o desenvolvimento dos territórios rurais no Brasil: propostas e fundamentos Maria Regina Teixeira da Rocha 1 Eduardo Ernesto Filippi 2 Resumo Este trabalho apresenta a estratégia de desenvolvimento rural sustentável com enfoque territorial no Brasil, abordando como ela surge, os fundamentos e os pressupostos subjacentes a ela. Identifica e caracteriza, a partir de documentos e da bibliografia existente, o conjunto de categorias que compõem o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais PRONAT, dentre elas a de território, participação e gestão social. Apresenta ainda as diretrizes e estratégias relacionadas às institucionalidades territoriais bem como os princípios e as premissas do referido programa. O objetivo deste trabalho é o de demonstrar como esta estratégia com suas diversas abordagens podem ajudar no debate teórico e conceitual sobre os distintos processos de desenvolvimento rural. Palavras-chave: políticas públicas; desenvolvimento rural sustentável; desenvolvimento territorial. 1 Doutoranda no Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Rural PGDR/UFRGS..Av. João Pessoa, 31, IEPE, 90.040 000 Porto Alegre RS. Fone: 55XX51-8426-7278 maria.rt@unitins.br. 2 Doutor em Economia Política e Professor Adjunto dos Programas de Pós-Graduação em Economia e em Desenvolvimento Rural da UFRGS. Av. João Pessoa, 31, IEPE, 90.040 000 Porto Alegre RS. Fone: 51-33163281 - E-mail: edu_292000@yahoo.com.br.

1. Introdução: Este texto apresenta um panorama geral da estratégia de desenvolvimento rural sustentável, com enfoque territorial, formulada e em execução pelo Governo Federal do Brasil, desde o ano de 2003, através da Secretaria de Desenvolvimento Territorial, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (SDT/MDA). Essa discussão a respeito do desenvolvimento territorial já vem sendo introduzida no meio acadêmico e por formuladores de políticas públicas no Brasil a partir da década de noventa do século passado e é precedida pela discussão em torno do desenvolvimento sustentável e de outras categorias a ele correlatas, como desenvolvimento local sustentável e desenvolvimento rural sustentável, entre outras. Nesse contexto aparece um elemento considerado central nesse processo, o da participação social 3, considerado central nas propostas direcionadas à promoção do denominado desenvolvimento sustentável 4. A participação social é uma categoria que definitivamente se incorporou aos processos de discussão em torno das políticas públicas 5, sendo considerada como um elemento fundamental para a democratização da gestão dessas políticas, aproximandoas do público alvo 6. Uma questão que se coloca nesse debate é como essa categoria foi incorporada aos diversos projetos políticos, que Dagnino (2006) chama de confluência perversa, assim denominada pelo encontro entre, de um lado, os projetos democratizantes que se constituíram no período da resistência contra os regimes autoritários, e os projetos neoliberais que se instalaram com diferentes ritmos e cronologias a partir do final dos anos 1980. Para essa autora, ambos os projetos não apenas requerem a participação de uma sociedade civil ativa e propositiva, mas se 3 Cf. Carlos Jara, esse termo significa o envolvimento dos diversos atores sociais na vida social, econômica e política, mediante mecanismos e canais que permitam entrar e influir na esfera decisória, na qual se define a direção que vai tomar o processo de desenvolvimento. 4 Conceituado como "Um processo de mudança na qual a exploração dos recursos, a orientação dos investimentos, os rumos do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional estão de acordo com as necessidades atuais e futuras..." (Comisión Mundial sobre el Medio Ambiente y el Desarrolo, apud, JARA, 1998:33-34). 5 Silva & Marques (2004) destacam que a participação social nos processos de discussão, elaboração, deliberação, gestão e/ou controle das políticas e ações governamentais foi uma das principais bandeiras no discurso de agentes sociais e políticos atuantes no processo de redemocratização brasileiro. 6 No caso do MDA seu público alvo é definido pela incidência de população rural caracterizada como agricultores familiares, comunidades indígenas e quilombolas, pescadores e extrativistas artesanais, famílias assentadas pela reforma agrária ou grupos de trabalhadores rurais que postulam acesso à terra, mobilizados 2

baseiam nas mesmas referências: a construção de cidadania, a participação e a própria idéia de sociedade civil. O presente trabalho apresenta, conforme dito no início, a estratégia de desenvolvimento rural sustentável com enfoque territorial, abordando como ela surge, os fundamentos, os pressupostos subjacentes a ela e o conjunto de categorias que a compõem. O texto está organizado em três seções, incluindo essa introdução. A segunda seção ficou dividida em três tópicos: o primeiro faz uma breve contextualização dos debates que antecederam a construção do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais - PRONAT; o segundo apresenta os princípios e as premissas do referido programa; e, o terceiro trata das diretrizes e estratégias relacionadas às institucionalidades territoriais. Por fim a terceira seção tece algumas considerações finais sobre as questões abordadas, concluindo que a noção de desenvolvimento não se restringe a um campo de competência e de saber específico, mas que ela perpassa vários domínios, várias posições, envolvendo distintos atores, diferentes agências, sendo amplamente utilizada em várias áreas do conhecimento. 2. A estratégia de desenvolvimento rural sustentável com enfoque territorial. 2.1 Antecedentes Nas quatro últimas décadas o debate em torno do desenvolvimento sustentável tem se ampliado e permeado o discurso das diferentes áreas de conhecimento, dos formuladores e executores de políticas públicas bem como da sociedade civil organizada em geral. Esse debate aparece para se contrapor ao modelo vigente de desenvolvimento econômico, apontado como responsável pela deterioração do meio ambiente, concentração de riquezas, pobreza, desemprego e exclusão social, visto que sua lógica baseia-se apenas no crescimento econômico, cujos processos produtivos utilizam intensivamente os recursos naturais, exercendo uma considerável pressão sobre o meio ambiente. Escobar (1998); Jara (1998); Viola (2000). Nesse mesmo sentido o desenvolvimento rural sustentável surgiu, segundo Navarro (2001), em meados dos anos oitenta, a partir da crescente difusão da expressão mais geral, desenvolvimento sustentável. Para este autor, o componente sustentável adicionada ao termo desenvolvimento rural, definido como uma ação previamente articulada que induz (ou pretende induzir) mudanças em um determinado ambiente 3

rural, sendo a melhoria do bem-estar das populações rurais o objetivo final do desenvolvimento rural, refere-se, exclusivamente, ao plano ambiental, indicando a necessidade incorporarem uma apropriada compreensão das chamadas dimensões ambientais. Nessa mesma linha de pensamento, Carlos Jara adverte que muitos desses processos de teorização sobre o desenvolvimento sustentável estão baseados no princípio de conciliação entre o crescimento econômico e a gestão racional dos recursos naturais. O conceito nunca perde sua matriz econômica de acumulação, ficando como discurso 7 que defende a necessidade de gerarem excedentes e competir nos mercados. Esse autor nos diz: "o conceito de desenvolvimento sustentável fica contaminado pela lógica do crescimento quantitativo e da maximização do lucro, a mesma que alimenta o conflito, e a desestabilização das relações, na tentativa de atingir competitividade, interpretada como motor da transformação(...) como resultado dessa visão parcial, o conceito está se aburguesando". (JARA, 1998, p.53) Nesse mesmo período um outro debate se fazia presente em vários espaços acadêmicos, políticos e no âmbito da sociedade civil. Era aquele relacionado à descentralização e desconcentração administrativa das políticas públicas. Particularmente no Brasil, a partir da segunda metade dos anos 80, período em que houve um intenso processo de mobilização popular em torno da constituinte, acentuouse o debate no sentido de reformar o Estado, a fim de dotá-lo de uma maior eficiência, para o processo de democratização do país. Como resposta às lutas da sociedade civil e dos movimentos sociais, a constituição brasileira de 1988 redefiniu o papel e o caráter do Estado nas políticas de descentralização com o pressuposto de transferência de responsabilidades no processo de implementação das políticas públicas, do governo federal para os governos estaduais e municipais. A descentralização, na definição de Jara (2001), visa reorganizar a gestão do Estado para aproximar os cidadãos, as associações e as organizações comunitárias dos poderes públicos. A partir daí foram criados diversos planos, programas e políticas, orientadas pela proposta de descentralização e desconcentração administrativa, tendo, como pano de fundo, os conselhos gestores idealmente criados para compartilhar responsabilidades na 7 Segundo Escobar, 1998 apud, (Rocha, 2002, p.67), pensar o desenvolvimento em termos do discurso permite concentrar-se na dominação e por sua vez, explorar, mas produtivamente as condições das possibilidades e dos efeitos penetrantes do desenvolvimento. 4

formulação, implementação e fiscalização dessas políticas e, ainda, para serem espaços de participação da sociedade civil nas tomadas de decisões relativas a políticas públicas e mais especificamente no controle social dos usos dos recursos públicos. No caso específico dos desafios relacionados ao processo de descentralização das políticas públicas voltadas para a promoção do desenvolvimento rural sustentável, estes ainda são grandes e complexos, principalmente pela necessidade de se atender às especificidades e as diferenças culturais dos vários grupos e povos existentes no País. Considerando essa problemática, no ano de 2003, o governo Lula, através da Secretaria de Desenvolvimento Territorial SDT, do Ministério de Desenvolvimento Agrário MDA, iniciou uma política de promoção de desenvolvimento dos territórios rurais, considerando que esses são espaços de integração, articulação e concertação da diversidade atores sociais, identidades culturais, interesses políticos e políticas públicas que nele se manifestam. Nesse mesmo ano iniciou-se a execução dessa política cujas ações estão ligadas ao Programa Nacional de Apoio aos Territórios Rurais - PRONAT, inserido no Plano Plurianual (2004-2008). Partindo de uma nova perspectiva conceitual e procurando superar no meio rural as persistentes desigualdades econômicas e sociais, o objetivo geral do Programa é promover e apoiar iniciativas das institucionalidades representativas dos territórios rurais que objetivem o incremento sustentável dos níveis de qualidade de vida da população rural, mediante três eixos estratégicos: i. Organização e fortalecimento dos atores sociais; ii. Adoção de princípios a práticas da gestão social; iii. Promoção da implementação e integração de políticas públicas. (Documentos Institucionais 02-2005. P. 7) Também definiu quatro áreas de resultados a serem alcançados: O fortalecimento da gestão social; fortalecimento das redes sociais de cooperação; dinamização econômica nos territórios rurais; e, articulação institucional. Para tanto, a SDT atua com duas linhas de ações em que se materializa seu referencial metodológico: a implementação de ações de apoio ao desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e o fortalecimento da Rede Nacional de Órgãos Colegiados formada pelos Conselhos Nacional, Estaduais e Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável assim como pelas instâncias de gestão do desenvolvimento territorial. (SDT/MDA Série Documentos Institucionais n.2, maio 2005). 5

Além desses eixos, das áreas de resultados e das linhas de trabalhos, a SDT definiu alguns princípios e premissas consideradas fundamentais no processo de promoção da redução da pobreza, do combate à exclusão social e da diminuição das desigualdades sociais e regionais. 2.2. Princípios e premissas: A política 8 de desenvolvimento territorial do Ministério de Desenvolvimento Agrário MDA parte do princípio de que criará as condições necessárias para que as políticas finalísticas do MDA e outros ministérios, que contribuam com o desenvolvimento rural sustentável, tenham maior eficácia. Em seus documentos referenciais 9 afirma que desenvolve uma ação inovadora, onde os sujeitos sociais são partes integrantes do processo de elaboração, gestão e de decisão das políticas. Assim entendida como, a ação que parte do reconhecimento do território como projeção e expressão de uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial (Orientações para a prática no apoio ao Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais.Brasília, 2004. P.04) A SDT assumiu como missão apoiar a organização e o fortalecimento institucional dos atores locais 10 na gestão participativa do desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e promover a implementação e à integração de políticas públicas. Nesse sentido o seu desafio é o de identificar e constituir institucionalmente os territórios a partir da composição de identidades regionais como elemento aglutinador e promotor do desenvolvimento sustentável. Pudemos identificar, através da leitura dos documentos-referências da SDT/MDA, algumas categorias que se inter-relacionam e são consideradas essenciais nesse processo. Dentre estas destacamos três que aparecem com recorrência em todos os documentos. São eles: território, participação social e gestão social. 8 Entendida aqui como aquelas ações do governo que visam atender as demandas presentes da população e planejar o atendimento de demandas futuras. 9 O MDA/SDT publicou uma série de documentos referenciais para apoio ao Desenvolvimento de Territórios Rurais. 10 Atores sociais são os membros reconhecidos pelas comunidades locais e territoriais que atuam em nome de grupos e segmentos sociais que a compõe. São também os representantes mandatários de entidades públicas e privadas, do Poder Público e da sociedade civil, desde que assumam posição ativa na comunidade. 6

como, O ponto de partida é o conceito de território e territórios rurais apresentados Um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial. Documentos Institucionais (op. Cit.) São os territórios, onde os critérios multidimensionais que os caracterizam, bem como os elementos mais marcantes que facilitam a coesão social, cultural e territorial, apresentam, explicita ou implicitamente, a predominância de elementos rurais 11. Nestes territórios incluem-se os espaços urbanizados que compreendem pequenas e médias cidades, vilas e povoados. (Referências para um Programa Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável. CONDRAF, Junho 2003. P.23) Esses espaços urbanizados são denominados de microrregiões rurais caracterizadas a partir de critérios demográficos (no caso aquelas que apresentam densidade demográfica menor do que 80 habitantes por km²) e população média por município de até 50.000 habitantes. As microrregiões rurais são ordenadas com o critério de maiores concentrações do público prioritário do MDA, citados na nota 4. Dialogando com outros autores que trataram desse tema, o território vai além das questões objetivas, como pode ser visto na formulação de Carlos Jara, ao considerar o território como um abrigo, uma referência, um campo vivo onde se misturam, de forma complexa terra, raça, gênero, riqueza natural, poder, cultura, comunidades, sistema de normas e valores, patrimônios intangíveis, imagens coletivas, passado e presente 12. Andrade (1995) chama atenção para que o conceito de território não seja confundido com o de espaço ou lugar, e sim que deve ser percebido como estando mais ligado à idéia de domínio ou de gestão de uma determinada área. Milton Santos (1994) chama a atenção para a necessidade de hoje refinarmos o conceito de território de modo a distinguir aquele território de todos, abrigo de todos, daquele de interesse das empresas 13. Nessa elaboração, Santos propõe que este seja 11 Ambiente natural pouco modificado e/ou parcialmente convertido a atividades agro-silvo-pastoris; baixa densidade demográfica população pequena; base na economia primária e seus encadeamentos secundários e terciários; hábitos culturais e tradições típicas do universo rural. 12 Carlos Julio Jara. Projeto Identidade: Construindo o Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Afrodescendentes do Estado de Maranhão. Apud SDT/MDA. Proposta Técnica para o fortalecimento do protagonismo das mulheres rurais, jovens e populações tradicionais na perspectiva do desenvolvimento territorial. Brasília, 2005. 13 O território de interesse das empresas é definido por Santos, como norma ou território das empresas. Esse é o espaço internacional, de interesse das empresas. 7

compreendido como uma mediação entre o mundo e a sociedade nacional e local. O território usado 14, para este autor, se constitui em uma categoria essencial para a elaboração sobre o futuro. Carrière & Cazella (2006, 24), tomando como referência (Lacour,1985) destacam duas noções desse conceito. São elas: a noção de espaço-território e a de espaço-lugar, que se diferenciam na discussão do desenvolvimento. O Espaço-lugar seria o suporte das atividades econômicas e o espaço-território é o lugar carregado de vida, de cultura e de potencial de desenvolvimento. Para a SDT/MDA, na abordagem territorial do desenvolvimento sustentável, o enfoque centra-se, principalmente, no paradigma do desenvolvimento humano, cujos princípios são: eqüidade entendida como igualdade de oportunidades para todos os seres humanos; sustentabilidade que traz implícita a idéia de um desenvolvimento que tem preocupação com as condições sociais das pessoas e dos grupos aos quais pertencem, bem como de uma preocupação com o meio ambiente; e, empoderamento - no sentido de elevar a auto-estima e a confiança das pessoas para a organização voltada para a conquista de direitos. A mesma justifica o uso da abordagem territorial por, ao menos, quatro aspectos. Primeiro, porque o rural não se resume ao agrícola. Mais do que um setor econômico, o que define as áreas rurais enquanto tal são suas características espaciais: o menor grau de artificialização do ambiente quando comparado com áreas urbanas, a menor densidade populacional e o maior peso dos fatores naturais. Segundo, porque a escala municipal é muito restrita para o planejamento e organização de esforços visando à promoção do desenvolvimento e, ao mesmo tempo, a escala estadual é excessivamente ampla para dar conta da heterogeneidade e de especificidades locais que precisam ser mobilizadas com este tipo de iniciativa. Terceiro, porque na última década e meia tem se acentuado o movimento de descentralização das políticas públicas, com a atribuição de competências e atribuições aos espaços locais. Por fim, em quarto lugar, o território é a unidade que melhor dimensiona os laços de proximidade entre pessoas, grupos sociais 14 Para aprofundamento dessa discussão vê o retorno do território. IN: SANTOS, M. et.al. (Orgs.). Território, Globalização e Fragmentação. São Paulo: Hucitec,1994.. 8

e instituições que podem ser mobilizadas e convertidas em um trunfo crucial para o estabelecimento de iniciativas voltadas para o desenvolvimento 15. A segunda categoria a ser destacada é a da participação social, considerada fundamental para o sucesso de sua política, não apenas no sentido de democratizar a gestão das políticas públicas e aproximá-las do público alvo, mas também no sentido de fortalecer a capacidade de auto-organização dos atores, do seu empoderamento no exercício pleno da cidadania e dos seus direitos, participando de maneira decisiva da definição dos rumos do desenvolvimento nos territórios em que vivem. Esta ênfase na necessidade da participação social nos processos de discussão, elaboração e gestão das políticas públicas é apontada por alguns autores, dentre eles Silva & Marques (2004), como um elemento marcante dos discursos e propostas políticas democratizantes dos anos 80 e 90 no Brasil. Ao tomarem como exemplo o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar Pronaf como espaço de exercício da participação social, destacam que este contribui para a propagação intensa de conselhos atuando em diversas esferas da vida social. Questionamentos levantados por estes autores sobre a efetividade no processo de democratização da elaboração e gestão das políticas de desenvolvimento rural, sobre mudanças produzidas nas configurações de poder localmente constituídase e, sobre o empoderamento dos agricultores familiares também podem ser aplicados nesse caso, visto que nessa proposta há o pressuposto de que a implementação do PRONAT seguida do fortalecimento dos órgãos colegiados 16 levará à redução das desigualdades sociais e regionais e à geração de riquezas com eqüidade social. Em outras palavras, o programa se propõe a promover o desenvolvimento sustentável dos territórios rurais como forma de reduzir as desigualdades regionais e sociais, integrando sujeitos e ações ao processo de desenvolvimento 17. Essa é uma questão que carece ser aprofundada particularmente no contexto atual do discurso acerca do desenvolvimento rural. A terceira categoria aqui destacada é a da gestão social, entendida pela SDT/ MDA como uma certa maneira de gerir assuntos públicos, nesse caso em particular as políticas e iniciativas voltadas para a promoção do desenvolvimento das áreas rurais. É 15 Marco Referencial para Apoio ao Desenvolvimento de Territórios Rurais. Brasília DF - Brasil 30 de maio de 2005 -SÉRIE DOCUMENTOS INSTITUCIONAIS 02-2005 16 Definidos como Institucionalidades territoriais que são espaços (fóruns, conselhos, comissões, comitês, consórcios, articulações e arranjos institucionais diversos) de expressão, discussão, deliberação e gestão, que congregam a diversidade de atores sociais e cuja atenção é voltada à gestão social das políticas e dos processos de desenvolvimento. 17 Cf. MDA/SDT. Orientações para elaboração de projetos nos territórios rurais em 2004.Brasília, 2004. 9

vista ainda como um processo amplo e participativo para a gestão de assuntos públicos, em sua conotação ampla, principalmente políticas de valor social para o desenvolvimento. A Gestão social implica compartilhar os processos de decisão e de gestão propriamente ditos, o que significa que todos os atores deverão preparar-se para assumir as responsabilidades que lhes couber. É considerada como o referencial mais relevante e efetivo para conferir sustentabilidade ao processo de desenvolvimento sustentável. Outros autores que vêm discutindo esse tema apontam para as tendências recentes da Gestão social 18, como é o caso de Dowbor (1999), que demonstra a necessidade de repensar formas de organização social, a redefinir a relação entre o político, o econômico e o social, a desenvolver pesquisas cruzando as diversas disciplinas, e a escutar de forma sistemática os atores estatais, empresariais e comunitários. Trata-se hoje, realmente, de um universo em construção. O fortalecimento da gestão social constitui uma das quatro áreas de resultado da SDT, conforme o planejamento de 2005-2006. 19 Isto porque há o entendimento de que esta pressupõe a existência de atores sociais e de gestores públicos capazes de levar adiante as estratégias de concentração dos agentes públicos e privados em torno de um projeto comum de futuro baseado na promoção dos trunfos de um território e na eliminação das barreiras e constrangimentos a que esse futuro se concretize. (Documento referencial para a elaboração de projetos de capacitação em gestão social para membros dos conselhos municipais de desenvolvimento rural sustentável CMDRS, 2005, P.3) Para esse fortalecimento, a SDT entende que a constituição de espaços de participação popular, definidos como institucionalidades territoriais, é um requisito fundamental. A partir desse entendimento, define, através de resoluções, as diretrizes e estratégias consideradas necessárias para implementação e fortalecimento dessas institucionalidades. 2.3. As Institucionalidades territoriais diretrizes e estratégias De acordo com a Resolução n o 52 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), de 16 de fevereiro de 2005, as institucionalidades 18 Este autor argumenta que os paradigmas de gestão que herdamos têm todos, sólidas raízes industriais. Só se fala em taylorismo, fordismo, toyotismo, just-in-time e assim por diante. Assim, na realidade, os paradigmas da gestão social ainda estão por ser definidos, ou construídos. 19 Planejamento da SDT 2005-2006. Brasília: SDT, 2005. 10

territoriais devem conformar espaços nos quais a gestão social do desenvolvimento territorial deve ser concretizada por meio de espaços de debate e concertação, com transparência e participação. Nesse mesmo sentido a Resolução n o 48 do CONDRAF, sugere que os colegiados de desenvolvimento rural sustentável tenham um caráter norteador, referenciador e definidor do processo de desenvolvimento rural sustentável. Os colegiados territoriais são espaços de formulação e gestão de políticas onde estão presentes as disputas de interesses, os conflitos, a coesão social e a inclusão de novos sujeitos. Nessa proposta os sujeitos sociais são partes integrantes do processo de elaboração, gestão e de decisão das políticas. É importante destacar que na visão governamental não há hierarquias estabelecidas entre os diversos níveis de colegiados de desenvolvimento rural sustentável. Portanto, as relações entre o Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), os Colegiados Estaduais, os Conselhos Municipais e as Comissões de Implantação das Ações Territoriais e/ou Conselhos de Desenvolvimento Territorial - CIAT/CODETER ocorrem por meio de articulações políticas. Ainda de acordo com as orientações do CONDRAF na composição dos colegiados, deve-se considerar a pluralidade, que pressupõe que as diferentes organizações (associações, sindicatos, cooperativas, etc) de uma mesma categoria estejam representadas, assim como todas as concepções de desenvolvimento rural existentes; a diversidade, definida como sendo a representação dos diferentes atores sociais que atuam no processo de desenvolvimento rural sustentável sejam jovens, mulheres, quilombolas, agricultores familiares ligados à diferentes comunidades e/ou arranjos produtivos, pequenos empreendedores, etc; a representatividade - entende-se que a base das organizações sociais esteja representada por essas entidades; Essas institucionalidades podem ter conformações distintas, segundo o entendimento dos próprios atores sociais, mas deverão sempre expressar a diversidade social, buscando a representatividade, a pluralidade e a paridade entre as forças sociais, para que processos horizontais de negociação e decisão transformem práticas verticalizadas de gestão em acordos multisetoriais de gestão social em processos de planejamento ascendente. Mesmo considerando que não existem orientações claras sobre a constituição dos colegiados, principalmente quanto ao formato, número de representantes e perfil, a difusão da Resolução 48, acima citada, que diz respeito à paridade, representatividade, pluralidade e diversidade, deixa pistas para o entendimento de que na composição 11

dessas institucionalidades existem os mais diversos formatos e diversidade de representação. Entretanto, destacam-se dois aspectos considerados desafios: primeiro, a identificação de um peso excessivo de organizações da sociedade civil em alguns, e em outros, a forte presença de organizações governamentais (prefeituras); o segundo diz respeito à questão da representatividade das diferentes categorias sociais na discussão do desenvolvimento territorial. Como as ações implementadas pela SDT/MDA têm por objetivo promover e apoiar as iniciativas da sociedade civil e dos poderes públicos em benefício do desenvolvimento sustentável dos territórios rurais, como forma de reduzir as desigualdades regionais e sociais, integrando sujeitos e ações ao processo de desenvolvimento 20, essa Secretaria têm apoiado até o presente momento a criação de 118 territórios rurais em todo o país, cujos critérios de seleção são proximidade geográfica, condições sócio-econômicas, ambientais e culturais dos seus habitantes, baixo índice de desenvolvimento humano (IDH), presença significativa de agricultores e agricultoras familiares, assentados e assentadas da reforma agrária, de populações tradicionais e outras. Cada território tem em sua configuração uma institucionalidade responsável pela elaboração de um Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável - PTDRS, os chamados colegiados territoriais ou institucionalidades similares 21. Apesar de características comuns, os territórios rurais são marcados pela heterogeneidade e diversidade de características e sujeitos, que se relacionam inclusive com outras territorialidades, a exemplo dos territórios étnicos e de identidades - indígenas, quilombolas, bacias hidrográficas, etc., ou seja, não são representados como espaços homogêneos. 3. Considerações Finais: As considerações apontadas na finalização deste trabalho são inconclusas, mas nos ajudam a perceber que essa noção de desenvolvimento não se restringe a um campo 22 de competência e de saber específico, mas que ela perpassa vários domínios, 20 Cf. MDA/SDT. Orientações para elaboração de projetos nos territórios rurais em 2004. Brasília, 2004. 21 A denominação que comumente é adotada para estas institucionalidades é CIAT - Comitê para Implantação das Ações Territoriais - uma referência ao processo inicial de tais institucionalidades, que acabou sendo difundida. Entretanto, podem ser encontradas denominações relacionadas aos fóruns de bacias hidrográficas, aos conselhos relacionados à segurança alimentar, dentre outros. 22 BOUDIEU; 1998:28, que o define como... as relações de forças entre as posições sociais que garantem aos seus ocupantes um quantum suficiente de força social ou de capital de modo a que estes tenham a 12

várias posições, envolvendo distintos atores, diferentes agências, sendo amplamente utilizada em várias áreas do conhecimento. No decorrer das leituras dos documentos-referências do MDA/SDT nos defrontamos com a recorrência das categorias território, participação e gestão social, entre outras, que podem ser tomadas como elementos centrais na estratégia de desenvolvimento rural sustentável com enfoque territorial. Observa-se, porém, que os desafios relacionados ao processo de descentralização das políticas públicas voltadas para a promoção do desenvolvimento rural sustentável ainda são grandes e complexos, principalmente pela necessidade de se atender às especificidades e às diferenças culturais dos vários grupos e povos existentes no País. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, M.C. de. A questão do território no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1995 BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998. 4ª ed. DAGNINO, Evelina (org.). Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. CARRIÈRE, Jean-Paul & CAZELLA, Ademir Antonio. Abordagem Introdutória ao conceito de desenvolvimento território. IN: DESENVOLVIMENT TERRITORIAL SUSTENTÁVEL Conceitos, experiências e desafios. EISFORIA, Florianópolis, v.4, n.especial, p. 1-336, dez.2006. DOWBOR, Ladislau. Gestão social e transformação da sociedade. 1999. Disponível na Internet via http://dowbor.org/8_gestaosocial.asp ESCOBAR, Arturo. La Invención del Terceiro Mundo: construción y desconstrución del desarrollo. Grupo Editora Horma, 1998. JARA, Carlos Julio. A Sustentabilidade do Desenvolvimento Local. Brasília: IICA: Recife: Secretaria da Planejamento do estado de Pernambuco. SEPLAN, 1998.. PROJETO IDENTIDADE: Construindo o Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Afro-descendentes do Estado do Maranhão, MDA/SDT. PRONAT: Referências para o apoio ao Desenvolvimento Territorial. Brasília/DF, outubro de 2004. Documento preliminar (circulação restrita). possibilidade de entrar nas lutas pelo monopólio do poder, entre as quais possuem uma dimensão capital as que têm por finalidade a definição da forma legítima do poder. 13

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