A Repetição do Indébito do ISS quando classificado como tributo indireto

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Transcrição:

A Repetição do Indébito do ISS quando classificado como tributo indireto José Hable Capítulo de livro publicado: HABLE, J. A Repetição do Indébito do ISS quando classificado como tributo indireto. In: Sergio Luiz de Moraes Pinto, Alberto Macedo e Wilson Jose de Araújo. (Org.) Gestão Tributária Municipal e Tributos Municipais. São Paulo: Editora Quartier Latin do Brasil, v. 5, pp. 133/150, 2015. INTRODUÇÃO Se um contribuinte paga valores a título de tributos que acabam se revelando indevidos, tem ele o direito de pedir a sua devolução, independente de protesto judicial, isto é, de uma providência cautelar que notifique judicialmente a Fazenda, para que lhe seja assegurado o seu direito, nos termos do art. 165, caput, do CTN. 1 O pagamento indevido de um tributo pode ter diversas causas, entre as quais, o pagamento a maior, em duplicidade, ou ainda, de tributo considerado ilegal ou inconstitucional, e se fundamenta na ausência de causa jurídica para a sua cobrança pela Fazenda Pública, concretizado no princípio que veda o enriquecimento sem causa. Quando se está diante de um processo administrativo tributário relacionado ao pedido de devolução de um tributo pago de forma incorreta, devem ser analisados alguns itens como: (a) a existência ou não de pagamento indevido; (b) o prazo para o seu pedido; (c) a natureza do tributo pago indevidamente, se direto ou indireto; e, (d) o atendimento dos critérios de devolução se for um tributo indireto, entre outros. Neste trabalho, serão discutidos alguns pontos polêmicos e de relevância no processo administrativo de repetição de indébito, quando se trata de tributo indireto, relacionados principalmente ao prazo de pedir, aos procedimentos previstos nas legislações tributárias, que têm gerado controvérsias tanto na doutrina quanto na jurisprudência de nossos tribunais. Para isso, busca-se responder aos seguintes questionamentos: 1 BRASIL. CTN. Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no 4º do artigo 162, nos seguintes casos : Disponível em: http://www.planalto.gov.br Acesso em: 12 maio 2015. 1

1. Quais os requisitos que devem ser verificados quando se inicia a análise do pedido? 2. Qual o prazo para pleitear a restituição e quando se inicia? 3. Qual a classificação dos impostos quanto à sua repercussão? 4. Há diferenças na análise de devolução de imposto considerado direto e indireto? 5. O contribuinte de fato tem legitimidade para pedir a devolução de tributo classificado como indireto? 6. Quais os critérios a serem atendidos e analisados no processo de devolução de tributo indireto? 2. A REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO O tema repetição de indébito tributário está disciplinado no CTN, nos seus arts. 165 a 169 (Seção III Pagamento Indevido), e não obstante isso, há quem entenda ser matéria de Direito Civil, por não ter natureza tributária. Nesse sentido, Alfredo Augusto Becker 2 leciona que: pagamento de tributo indevido não é pagamento de tributo, mas simplesmente prestação indevida. Há autores, 3 ainda, que preferem denominar de débito do Fisco, ao invés da expressão repetição do indébito tributário, entre outras. Paulo Roberto Lyrio Pimenta, 4 tendo entendimento diverso, defende: Parte da doutrina tem defendido que a prestação objeto da obrigação de devolver não tem natureza tributária, sendo uma prestação de fato. Divergimos desse entendimento. Em primeiro lugar, o adjetivo indevido apenas qualifica uma prestação, que não se desnatura com essa adjetivação. Para que a prestação se enquadre no conceito de tributo, basta que satisfaça os requisitos do art. 3o do CTN, dentre os quais não se inclui o fato de ser prestação devida, ou seja, esse atributo não é elemento do conceito. Ademais, tal dispositivo não exclui do seu conceito o montante pago indevidamente a título de tributo. 2 BECKER, A. A. Teoria geral do direito tributário. 3 ed., São Paulo: Lejus, 1998, p. 576. 3 SANTI, E. M. D. Decadência e prescrição no direito tributário. 2 ed., São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 98. Doutrina o autor: preferimos a expressão débito do Fisco a repetição do indébito tributário, que induz a uma aparente contradição: ora, se é indébito, indevido, então, não é jurídico e, portanto não pode ser tributário. 4 PIMENTA, P. R. L. Efeitos da decisão de inconstitucionalidade em direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 123. 2

Nesse sentido, Bernardo Ribeiro de Moraes 5 coloca que o assunto pertence ao Direito Tributário e é regido por normas específicas da legislação tributária que oferecem tratamento diverso em relação ao ônus da prova, embora se acolha o princípio contido no art. 964 do CC de 1916, 6 que trata do Pagamento Indevido. O termo repetição de indébito tributário significa o retorno de importância paga indevidamente, e se fundamenta na falta de causa jurídica para a sua cobrança pela Fazenda Pública, ou seja, na ilegalidade ou na inconstitucionalidade da cobrança, 7 concretizado no princípio que veda o enriquecimento sem causa. Independentemente da denominação dada ao valor pago de forma indevida à Fazenda Pública, o ato, que tem por objeto a busca do que se pagou além do devido, tem que ser executado pelo interessado dentro de um determinado lapso de tempo, sob pena desse direito ser extinto pelo decurso do prazo. 8 3. O PRAZO PARA EXERCER O DIREITO À DEVOLUÇÃO DE TRIBUTO Há normalmente a discussão da extinção, pela decadência, do direito de o Fisco formalizar a obrigação tributária pelo lançamento. Porém, outro direito, também sujeito à extinção por decurso de prazo, é o de pleitear a restituição de crédito tributário pago indevidamente, por meio da repetição do indébito. E esse pedido de restituição, que pode ser feito tanto por meio de processo administrativo quanto judicial, também deve ser efetuado dentro de determinado prazo legal. Desse modo, além dos prazos extintivos, disciplinados nos arts. 150, 173 e 174 do CTN, que tratam da extinção de direito da Fazenda Pública, tem-se o disposto no art. 168, que prevê a extinção pelo decurso de prazo do direito do sujeito passivo, isto é, contribuinte ou responsável tributário, de buscar a restituição de valores pagos indevidamente, a título de tributo. 3.1 A Natureza Jurídica do Prazo para a Repetição do Indébito 5 MORAES. B. R. Compêndio de direito tributário. 3 ed., Rio de Janeiro: Forense, 2v, 1997, p. 485. 6 O art. 964 corresponde ao art. 876, e seguintes, do CC de 2002. 7 MORAES, B. R. Obra citada, pp. 483-485. 8 HABLE, J. A Extinção do Crédito Tributário por Decurso de Prazo. Decadência e Prescrição Tributárias, São Paulo: Editora Método, 4ª ed., 2014, p. 245/246. 3

A natureza jurídica do prazo para se pleitear a restituição do tributo pago indevidamente causa divergências de entendimentos, questionando-se se seria um prazo decadencial ou prescricional. A tese que comumente é colocada para diferenciar o instituto da decadência do da prescrição alude-se à decadência o perecimento do direito e, à prescrição, o desaparecimento da ação (ou pretensão) que protege o direito e, bem assim, de toda sua capacidade defensiva. Essa distinção, entretanto, baseada no objeto (direito e ação), sempre foi muito criticada por grande parte da doutrina por considerá-la deficiente e insuficiente para tal finalidade. Para esses doutrinadores, 9 a distinção que explica o porquê de certo prazo ser considerado decadencial e outro prescricional reside na natureza do direito, buscada na classificação formulada por Chiovenda, que está fundamentada nos direitos potestativos aplicados à decadência, e nos direitos a uma prestação ou pretensão relacionados à prescrição. Lembramos, apenas, que essa distinção, com fundamento na natureza do direito, também é questionada e criticada por outra parte da doutrina. 10 Com todo respeito a que merecem os defensores de teses contrárias, há de se notar que o tema é polêmico, até porque, percebe-se que cada doutrinador, para defender sua tese, parte de teorias diferentes para justificar seu ponto de vista, e que em realidade, em termos práticos, o que importa saber é que existe um prazo para que o interessado se manifeste, decadencial ou prescricional, a depender do fundamento acolhido, sob pena de ser extinto o seu direito de haver de volta o que pagou a maior. 11 Ressalte-se, nesse sentido, que a jurisprudência de nossos tribunais, mais especificamente a do STJ, após inúmeros julgados divergentes, ora tratando como decadencial ora como prescricional, pacificou-se no sentido de o referido prazo ser prescricional. 12 9 Nesse sentido, MACHADO, H. B. Processo administrativo tributário, Caderno de Pesquisas Tributárias nova série, n. 5, Coord. de Ives Gandra, São Paulo: Centro de Extensão Universitária/Revista dos Tribunais, 1999, p. 148, e AMARO, L. S. Direito tributário brasileiro. 12 ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 428, entre outros. 10 CARVALHO, P. B. Curso de direito tributário. 4 ed., São Paulo: Saraiva, 1991, pp. 310-311 e CABRAL, A. S. Processo administrativo fiscal. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 241, entre outros. 11 HABLE, J., Obra citada, pp. 247/249. 12 BRASIL. STJ. EREsp nº 278311/DF, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, 1ª Seção, Data do Julgamento 27/08/2003, DJ 28.10.2003, p. 184: Consoante recente entendimento esposado pela 1ª Seção, o prazo prescricional qüinqüenal para haver a restituição do IR sobre verbas indenizatórias começa a fluir da extinção do crédito tributário, (...), entre outros. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 20 jun. 2015. 4

É cediço que o interessado pode pleitear a repetição diretamente no Poder Judiciário. Contudo, se exercer este direito na via administrativa, poderá o Fisco frustrar esta pretensão do requerente, denegando o seu pedido. Diante dessa frustração, o pedinte tem, conforme disciplina o art. 169 do CTN, 13 um prazo prescricional de dois anos para ingressar com a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição. 3.2 O termo inicial do prazo para se pleitear a restituição do indébito disciplinando: O CTN, ao dispor sobre a restituição total ou parcial do tributo, assim vem Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no 4o do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória. (...) Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I nas hipóteses dos incisos I e II do art. 165, da data da extinção do crédito tributário; II na hipótese do inciso III do art. 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória. (grifos não do original) Por esses excertos legais, está-se a disciplinar que o direito para se postular a repetição do indébito tributário fenece com o decurso do prazo de cinco anos a contar: a) DA DATA DA EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, nas hipóteses de cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido (CTN, art. 165, I) e de valores resultantes de erros relacionados ao pagamento (CTN, art. 165, II); e, b) DA DATA EM QUE SE TORNAR DEFINITIVA A DECISÃO, nos casos de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória (CTN, art. 165, III). 13 BRASIL. CTN. Art. 169. Prescreve em dois anos a ação anulatória de decisão administrativa que denegar a restituição. 5

O CTN, no seu artigo 156, vem prevendo todas as modalidades de extinção do crédito tributário. Contudo, quando estamos a tratar de tributos sujeitos ao lançamento por homologação, dúvidas sempre houve sobre o exato momento em que a extinção do crédito tributário ocorre para o fim de demarcar o início da contagem do decurso de prazo de cinco anos, principalmente quanto à definição exata da data da extinção do crédito tributário, disciplinada no inciso I do art. 168 do CTN. Nos tributos sob a modalidade de lançamento de ofício, ou seja, aqueles que são implementados pelo sujeito ativo como condição de sua exigibilidade, a exemplo do IPTU, 14 o direito de pleitear a restituição de tributo pago indevidamente extingue-se com o decurso do prazo de cinco anos contados do efetivo pagamento indevido, segundo dispõe o art. 156, I, do CTN. Nesse sentido, tem-se a jurisprudência firmada pelo STJ. 15 No que se refere, entretanto, aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, a exemplo do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), a polêmica estava em saber qual o exato momento em que a extinção do crédito tributário ocorria. Assim, para demarcar a data da extinção do crédito tributário, disciplinada no art. 168, I, do CTN, tínhamos que analisar a modalidade de extinção do crédito tributário, referente ao lançamento por homologação, que está discriminada no inciso VII, do art. 156 do CTN, nesses termos: Art. 156. Extinguem o crédito tributário: (...) VII o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no artigo 150 e seus 1o e 4o. (grifos não do original) Por esse dispositivo legal, podemos claramente perceber que a mencionada extinção somente se concretiza se ocorrerem duas proposições: o pagamento antecipado e a homologação do lançamento. 14 BRASIL. CF/88. Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana IPTU. 15 BRASIL. STJ. REsp 693178/PR, rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T, data de Julgamento 06/12/2005, DJ 19.12.2005: (...) 2. Em se tratando de ação de repetição de indébito de tributo lançado de ofício, (...) o direito de pleitear a restituição de tributo pago indevidamente extingue-se com o decurso do prazo de cinco anos contados do pagamento indevido. (...) (grifamos), entre outros. 6

A jurisprudência de nossos tribunais, em particular a do STJ, 16 tinha entendimento pacificado, até a edição da Lei Complementar (Lcp) nº 118, de 2005, 17 que a extinção do crédito tributário só se efetivava, quando não expressamente homologado, após o decurso do prazo legal da homologação tácita, podendo perfazer um prazo de até 10 (dez) anos, ou seja, atribuía-se natureza de cláusula suspensiva ao pagamento antecipado, postergando seus efeitos jurídicos. A doutrina, em sua grande maioria, opunha-se a este posicionamento. 18 Com a edição da Lcp nº 118, de 2005, deu-se nova interpretação ao tema, e a data da extinção do crédito tributário, disciplinada no art. 168, I, do CTN, ficou definida como sendo a data do pagamento, antecipado ou não, eliminando de vez discussões a este respeito. Suscitaram-se, com isso, grandes discussões, na doutrina e jurisprudência, ficando então firmado o entendimento no STJ, 19 que a tese dos cinco mais cinco será aplicada nas ações de repetição/compensação de valores indevidamente recolhidos a título de tributo sujeito a lançamento por homologação, desde que ajuizadas até 09 de junho de 2005, data em que entrou em vigência da Lcp nº 118, de 2005. Contudo, em julgados posteriores de Turma do STJ, 20 decidiu-se de forma diversa, ao delimitar a aplicação da tese dos cinco mais cinco à data do pagamento, ou seja, desde que o pagamento tenha sido efetuado antes da vigência da referida lei complementar, e não propriamente da data do juizamento da ação de repetição. Em outras palavras, por esses julgados, a referida Lcp nº 118/2005 só deve ser aplicada aos pagamentos efetuados após à sua vigência, independentemente de a ação de repetição ter sido ajuizada até 09 de junho de 2005, o que está a contrariar o entendimento exarado pela 1ª Seção da egrégia Corte (AgRg nos EREsp 573311/RS). 21 16 BRASIL. STJ. AgRg nos EREsp 509418/SC, rel. Min. João Otávio de Noronha, 1ª Seção, Data de julgamento 24/11/2004, DJ 17.12.2004: 2. A Primeira Seção, no julgamento dos EREsp 435.835/SC, concluído na sessão de 24.3.2004, firmou o entendimento de que, no tocante à prescrição dos tributos sujeitos à homologação, aplica-se a teoria dos cinco mais cinco, entre outros. 17 A Lei complementar nº 118/2005 deu nova interpretação ao inciso I do art. 168 do CTN, ficando definida que a data da extinção do crédito tributário é a do pagamento, independente de ser antecipado ou não. 18 SANTI, E. M. D. Obra citada, pp. 254 e 268, CASTRO, A. A. Breves considerações acerca das alterações efetivadas no Código Tributário Nacional pela Lei Complementar nº 118/2005. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 587, 14 fev. 2005. Disponível em: http://www1.jus. com.br/doutrina/texto.asp? id=6317 Acesso em: 17 fev. 2015, entre outros. 19 BRASIL. STJ. AgRg nos EREsp 573311/RS, rel. Min. Luiz Fux, 1ª Seção, data de julgamento 26/04/2006, DJ 22.05.2006. 20 BRASIL. STJ. AgRg no REsp 951233/SP, rel. Min. Luiz Fux, 1ª T, data de julgamento 16/12/2008, DJe 19/02/2009. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 08 maio 2015. 21 HABLE, J., Obra citada, pp. 252/253. 7

Em realidade, foi no dia 08 de junho de 2010, ou seja, 5 anos da vigência da Lcp, o último dia para se pleitear a restituição de valores pagos indevidamente em data anterior à vigência da Lcp nº 118/05. A mencionada Lcp nº 118, de 2005, que entrou em vigência no dia 9 de junho de 2005, operou modificações no CTN, adaptando as normas tributárias à nova Lei de Falências nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. E, no seu bojo, trouxe uma previsão que não se relaciona a nenhum tipo de recuperação judicial e extrajudicial, nestes termos: Art. 3º Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o 1o do art. 150 da referida Lei. (grifamos) Doutrinadores militantes do direito e juristas 22 posicionaram-se adversamente sobre o novel texto, sendo que um dos objetivos do mencionado art. 3º foi afastar os entendimentos já pacificados na jurisprudência, mormente do STJ, da tese dos cinco mais cinco, estabelecendo-se assim que para efeitos de interpretação do inciso I do art. 168 do CTN, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributos sujeitos a lançamento por homologação, no exato momento do pagamento, considerado indevido, independentemente de ser denominado antecipado ou não. Em termos práticos, com a definição do termo inicial do prazo para pleitear a repetição do indébito, houve uma redução do lapso de tempo, dos até dez anos para no máximo cinco anos, para fins de solicitar a restituição ou compensação de tributos pagos a maior. Os seus defensores 23 sustentam que, com a edição da Lcp nº 118, de 2005, procurou-se, por via legislativa, reafirmar a premissa clássica de contagem do prazo (de cinco anos) para restituição a partir do pagamento indevido, seja ele caracterizado como antecipado ou não. 22 PIMENTA, P. R. L. A aplicação da Lei Complementar nº 118/05 no tempo: o Problema das Leis Interpretativas no Direito Tributário, in RDDT nº 116, maio 2005. Entende o autor que o art. 3º da Lcp 118 de 2005 é norma pseudo-interpretativa, e como lei nova deve ser aplicada integralmente a fatos geradores posteriores a sua vigência, em face da aplicação da lei tributária no tempo. Já ROSSI, J. C., no artigo escrito: Lei Complementar 118/2005: Efeitos na Prescrição e Decadência dos Tributos sujeitos a Lançamento por Homologação, in RDDT nº 116, maio 2005, admite a validade do referido artigo, entendendo ser norma interpretativa compatível com o ordenamento jurídico, entre outros. 23 CASTRO, A. A. Breves considerações acerca das alterações efetivadas no Código Tributário Nacional pela Lei Complementar nº 118/2005. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 587, 14 fev. 2005. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6317. Acesso em: 17 fev. 2015, entre outros. 8

Há que se registrar ainda que logo que foi editada a mencionada Lcp nº 118/05, muitos especialistas afirmaram que esta nova interpretação iria reduzir significativamente o volume de tributos em compensação nos processos judiciais e administrativos já em andamento, ao se estabelecer que era uma lei interpretativa, podendo-se retroagir os seus efeitos. A discussão englobou assim diversos temas entre os quais, se o art. 3º da Lcp nº 118, de 2005, seria norma interpretativa ou um dispositivo que daria um novo tratamento ao instituto da prescrição ou decadência e, ainda, se seus efeitos seriam retroativos ou não, segundo prescreve o seu art. 4º: Art. 4o Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 Código Tributário Nacional. (grifamos) Tratando sobre o tema lei interpretativa e seus efeitos, o então Ministro do STJ, Luiz Fux, 24 desenvolveu brilhante estudo, no EREsp 476150/RS, concluindo que a Lei Complementar 118, de 09 de fevereiro de 2005, aplica-se, tão somente, aos fatos geradores pretéritos ainda não submetidos ao crivo judicial, pelo que o novo regramento não é retroativo mercê de interpretativo. E assim, no que se refere ao alcance da Lcp 118/2005, o STJ 25 firmou o seguinte entendimento: EMENTA (...) 1. (...) 2. A norma do art. 3º da LC 118/05, que estabelece como termo inicial do prazo prescricional, nesses casos, a data do pagamento indevido, não tem eficácia retroativa. É que a Corte Especial, em sessão de 06/06/2007, DJ 27.08.2007, declarou inconstitucional a expressão observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 Código Tributário Nacional, constante do art. 4º, segunda parte, da referida Lei Complementar. (grifamos) Importante observar que com a nova interpretação dada, via legislativa, ao comando legal disposto no art. 168, I, do CTN, além de ficar definido claramente o termo de início da contagem do prazo para restituição, extirpando de vez discussões doutrinárias e jurisprudenciais sobre o tema, ficou também estabelecido que: 24 BRASIL. STJ. EREsp 476150/RS, 1ª Seção, data de julgamento 14/09/2005, DJ 26.09.2005. 25 BRASIL. STJ. ERESP Nº 644.736/PE, rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª Seção, Data Julgamento 28/11/2007, DJ 17.12.2007. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 26 abr. 2013. 9

(a) é o pagamento, antecipado ou não, que extingue o crédito tributário, nos termos do art. 156, I, do CTN; e, (b) em sendo assim, ficou bastante reduzida e ofuscada a aplicação da modalidade de extinção do crédito tributário, disciplinada no inciso VII, do art. 156, do CTN, que assim dispõe: Art. 156. Extinguem o crédito tributário: (...) (...) VII o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no artigo 150 e seus 1o e 4o. (grifos não do original) Isso porque, não se pode aceitar que um mesmo crédito tributário venha a ser extinto em dois momentos completamente diferentes, a depender tão somente dos seus efeitos, quais sejam: si; e, (1) para efeitos de repetição do indébito, seria da data do pagamento em (2) para efeitos de fiscalização tributária, seria dos 5 (cinco) anos do fato gerador (com o pagamento antecipado e a homologação do lançamento), ou seja, na data da homologação expressa ou tácita. Assim, estando extinto o crédito tributário pelo pagamento, antecipado ou não, não há se cogitar em nova extinção pela homologação tácita, pelo transcurso de prazo de 5 (cinco) anos do fato gerador, nos termos do art. 150, 4º, do CTN. Em outras palavras, esvaziou-se a própria função da homologação tácita. 26 4. DO PAGAMENTO INDEVIDO DO TRIBUTO É cediço que, segundo as legislações tributárias, 27 para que possa haver devolução de tributo é necessário inicialmente que haja, entre outros, o recolhimento de tributo indevido, ou maior que o devido. Assim, após verificar se o interessado efetuou o seu pedido dentro do prazo prescricional de 5 anos da data do pagamento, sob pena de não ser recebido o pedido 26 HABLE, J., Obra citada, pp. 255/257. 27 DISTRITO FEDERAL. Lei nº 4.567/11, Art. 75. O sujeito passivo tem direito, independentemente de protesto prévio, à restituição total ou parcial do tributo, atualizado monetariamente, nos seguintes casos: I recolhimento de tributo indevido, ou maior que o devido; II erro na identificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito, ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão contrária ao contribuinte. Entre outras. 10

pela sua intempestividade, torna-se necessário analisar se o pagamento foi indevido ou não. São diversas as causas para um pagamento ser reconhecido como indevido, sendo as mais comuns, o pagamento a maior, em duplicidade, ou ainda, de um tributo que posteriormente venha ser considerado ilegal ou inconstitucional, entre outros. Entre as alegações mais comuns do interessado para pleitear a devolução de tributo pago indevidamente estão a aplicação incorreta da alíquota do serviço, por ter havido o pagamento a maior que o devido, ou seja, aplicou-se, por exemplo, a alíquota de 5%, quando a correta seria de 2,79%, por a empresa estar enquadrada no Simples Nacional, e erro na eleição do sujeito ativo, isto é, efetuou-se, por exemplo, o pagamento do ISS no local da prestação do serviço, quando o correto seria no domicílio do prestador. Nesses casos seria possível sua devolução? 5. O ISS E FENÔMENO DA REPERCUSSÃO ECONÔMICA A doutrina, para fins didáticos, costuma classificar os impostos, segundo sua repercussão, diferenciando-os em impostos indiretos e diretos. Nos impostos indiretos, a exemplo do IPI, ICMS e ISS, entre outros, diz-se que os contribuintes de direito e de fato estão em pessoas diversas, isto é, a pessoa que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação (contribuinte de direito), não é a que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo (contribuinte de fato). Desse modo, nos impostos indiretos, o peso do tributo pode ser "passado adiante", tendo como característica a repercussão econômica, por sua própria natureza. É o fenômeno econômico da transladação ou repercussão dos tributos. Essa classificação tem sua grande relevância na interpretação e aplicação do art. 166 do CTN, que trata da restituição desse tipo de tributo, que assim dispõe: "Art. 166 - A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la." Em se falando de restituição de tributo classificado como indireto, na letra do art. 166 do CTN, o valor pago indevidamente somente poderá ser devolvido, a quem comprove que efetivamente suportou o ônus financeiro do encargo, ou, esteja autorizado, por quem suportou o encargo, a pedir a repetição. 11

Essa interpretação do art. 166, do CTN, está sacramentada pela jurisprudência de nossos tribunais, conforme entendimento consolidado nas Súmulas 71 e 546, 28 do STF. Já nos denominados tributos diretos, a exemplo do IPTU, entre outros, os contribuintes de direito e de fato estão na mesma pessoa, ou seja, a pessoa, que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação, é a mesma que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo. Nessa hipótese, o peso do imposto não pode ser "passado adiante". Nestes termos, a exemplo do ISS, aquele que mantém a relação pessoal e direta com o Estado, o prestador do serviço - que recolhe o tributo - denomina-se contribuinte de direito. Entrementes, o tomador do serviço, estranho à relação jurídico-tributária principal, porém vinculado ao fato gerador é nomeado contribuinte de fato - porque de fato foi ele que sofreu o ônus fiscal. Importante colocar que o ISS é uma espécie de tributo que pode funcionar como imposto direto ou indireto, a depender da situação a ser analisada no caso concreto. Caso seja exigido em valores fixos, como ocorre com as sociedades de profissionais liberais, a sua natureza é direta, não se lhe aplicando a regra do art. 166 do CTN. Porém, se for cobrado por valores não fixos, proporcionais ao preço do serviço correspondente, será classificado como indireto, pois existe uma vinculação entre os serviços prestados e a base de cálculo do imposto, sendo próprio cogitar-se de transferência do ônus tributário, aplicando-se o art. 166 do CTN. E nesse caminhar, o ISS, como imposto indireto, é um tributo que comporta, por sua natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro, onde os contribuintes de direito e de fato estão em pessoas diferentes, em que pessoa que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação, no caso, a empresa prestadora do serviço (contribuinte de direito), não é a que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo, o tomador do serviço (contribuinte de fato. Para a jurisprudência de nossos tribunais, em especial, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é assim tratada a natureza do ISS: Na 1.ª Turma, no AgRg no Ag 692.583/RJ: 28 BRASIL. STF. SÚMULA 71 "Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto." e SÚMULA 546 "Cabe restituição do tributo pago, indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de fato o quantum respectivo." Disponível em: http://www.stf.gov.br/. Acesso em: 20 abr. 2015. 12

1. O ISS é espécie tributária que pode funcionar como tributo direto ou indireto, a depender da avaliação do caso concreto. 2. Via de regra, a base de cálculo do ISS é o preço do serviço, nos termos do art. 7.º da Lei Complementar n.º 116/2003, hipótese em que a exação assume a característica de tributo indireto, permitindo o repasse do encargo financeiro ao tomador do serviço. 3. Necessidade, na hipótese dos autos, de prova da não-repercussão do encargo financeiro do tributo, nos termos do art. 166 do CTN. [...] 29 Na 2.ª Turma do STJ, no REsp 724.684/RJ: Exame do inteiro teor do acórdão revela que as situações nas quais o ISS seria indireto seriam aquelas nas quais sua base de cálculo é o preço do serviço, aplicando-se o art. 166 do CTN. Entretanto, nas hipóteses em que o ISS é cobrado em valores fixos, como ocorre com as sociedades de profissionais liberais (Decreto-lei n.º 406, art. 9.º, 1.º e 3.º), sua natureza é direta e o art. 166 não se aplica, pois inexiste vinculação entre os serviços prestados e a base de cálculo do imposto municipal, sendo impróprio cogitarse de transferência do ônus tributário e, consequentemente, da aplicação do art. 166 do CTN 30 Assim, tratando do ISS como imposto indireto, em que tem como característica a repercussão econômica, onde seu valor integra o preço dos serviços, pago pelo tomador ou consumidor final, o contribuinte de direito é obrigado a recolher o imposto, por uma ficção jurídica, objetivando facilitar a arrecadação, pois quem suporta de fato e efetivamente o ônus do tributo é o tomador de serviço. Dessa forma, por exemplo, a afirmação de que seria a empresa prestadora do serviço que suporta o ônus do ISS não é verdadeira, porquanto ela apenas recebe do tomador do serviço e recolhe aos cofres públicos o imposto devido, que já vem embutido no preço do serviço. 6. O ISS E OS REQUISITOS PARA A DEVOLUÇÃO DO TRIBUTO Da leitura do texto normativo disposto no art. 166 do CTN, é de se compreender que nos tributos, em que o ônus é transferível a terceiro, a restituição somente será feita ao interessado que atenda a pelo menos um dos dois requisitos, quais 29 BRASIL. STJ, 1.ª T., AgRg no Ag 692.583/RJ, Rel. Min. Denise arruda, julgamento em 11/10/2005, DJ de 14/11/2005, p. 205, rep. DJ de 28/11/2005, p. 208. Disponível em: http://www.stj.gov.br/. Acesso em: 10 jun. 2015. 30 BRASIL. STJ, 2.ª T., REsp 724.684/RJ, Rel. Min. Castro Meira, julgamento em 3/5/2005, v. u., DJ de 1.º/7/2005, p. 493. Disponível em: http://www.stj.gov.br/. Acesso em: 10 jun. 2015. 13

sejam: I - prove efetivamente haver assumido o referido encargo; ou, II - esteja legitimado expressamente a recebê-la. 6.1 Comprovação que efetivamente suportou o ônus financeiro do encargo Quando o interessado protocola o pedido de devolução de tributo, considerado indireto, a exemplo do ISS, é comum a Administração tributária notificá-lo para apresentar documentos que comprovem ter assumido o encargo financeiro do ISS pago a maior. O interessado, por sua vez, normalmente alega que assumiu o encargo financeiro, por dever contratual, pois no contrato de prestação de serviços estaria prevista sob sua exclusiva responsabilidade o pagamento das obrigações trabalhistas, fiscais e da previdência, ou seja, de pagar todos os tributos, inclusive o ISS, e de manter em dia o pagamento de todos os tributos. Esses deveres contratuais, no entanto, de estar a empresa regularizada com suas obrigações trabalhistas, fiscais e previdenciárias, não é prova de que tenha assumido o encargo financeiro do ISS pago a maior. Isso porque o recolhimento efetuado pelo prestador é apenas fruto de responsabilidade obrigacional tributária de ter que repassar ao fisco o imposto devido na operação. Em realidade, o que está a determinar quem assumiu o encargo financeiro tributário é a natureza do imposto, e em termos práticos, torna-se muito difícil a comprovação pelo contribuinte de direito de que assumiu o ônus financeiro, porquanto é da natureza do tributo estar embutido no valor do produto vendido o montante devido do imposto, que vem destacado na nota fiscal e suportado pelo tomador do serviço, o consumidor final. Muito importante ressaltar ainda que, segundo recentes julgados do STJ, 31 o contribuinte de fato não faz parte da relação jurídica entre fisco e sujeito passivo e assim é parte ilegítima para pleitear a repetição do indébito. Ou seja, o contribuinte de fato apenas e tão somente poderá autorizar o contribuinte de direito, no caso, o prestador do serviço, a solicitar a devolução, e nessa interpretação jurisprudencial, ele próprio nunca poderá efetuar o pedido e receber a devolução, mesmo que consiga comprovar ter assumido o ônus dos encargos financeiros. 31 BRASIL. STJ. REsp 983814 / MG, rel. Min. CASTRO MEIRA, j. 04/12/2007. Disponível em: http://www.stj.gov.br/. Acesso em: 10 jun. 2015. 14

6.2 Autorização, por quem suportou o encargo, a pedir a repetição. Pelo artigo 166 do CTN, o outro requisito necessário para ser deferido o pedido de restituição é no caso tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la. É muito comum o interessado, em não conseguindo comprovar que assumiu o ônus financeiro, buscar uma declaração autorizativa de restituição. Além da normal dificuldade em consegui-la de quem tomou o serviço, o consumidor final, necessária é que a autorização seja expressa, e não apenas uma declaração em que se declare não ter qualquer óbice em relação ao pleito de restituição do tributo perante o fisco, desde que tenha amparo legal. Na autorização deve estar expressamente demonstrado o interesse ou intenção do contribuinte de fato em autorizar o pleito: autorizo.... Declarar apenas que não tem nada contra a restituição, ou nada com isso, desde que obedecida a legislação, não há qualquer delegação de poder ou autorização expressa, e sim simplesmente que não se opõe que se faça se assim tiver poder ou competência. Relevante assim, nos termos do art. 166 do CTN, que nos autos do processo de restituição que esteja comprovado que o interessado assumiu o referido encargo, e no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a receber a devolução. 7. ESTUDOS DE CASO análise. Colocamos, a título de exemplificação, alguns estudos de caso sobre o tema em ESTUDO DE CASO 01: (a) Empresa X prestou serviço a ente público UNIÃO, que efetuou a retenção do ISS. (b) Após a prestação do serviço, verificou-se que a alíquota foi lançada a maior (era 2% - lançou 5%). (c) no caso, constava no contrato a alíquota de 5%. 15

(d) quem efetivamente suportou o ônus financeiro? (e) resposta: A UNIÃO, contribuinte de fato, que suportou o ônus pagou do bolso o valor a maior. (f) pelo STJ, apenas a empresa X pode pedir, se tiver autorização da UNIÃO. ESTUDO DE CASO 02: (a) Empresa X prestou serviço a ente público UNIÃO, que efetuou a retenção do ISS. (b) Após a prestação do serviço, verificou-se que a alíquota foi lançada a maior (era 2% - lançou 5%). (c) no caso, constava no contrato a alíquota de 2%. (d) quem efetivamente suportou o ônus financeiro? (e) resposta: A Empresa X, contribuinte de direito, que suportou o ônus pagou do bolso o valor a maior. (f) A UNIÃO apenas reteve o valor que era devido à Empresa X. ESTUDO DE CASO 03: (a) Empresa X prestou serviço a ente público UNIÃO, que efetuou a retenção do ISS, mas o ISS era devido no local da prestação, e foi pago no domicílio do prestador (locais diferentes). (b) quem efetivamente suportou o ônus financeiro? (c) resposta: vai depender do que constava em contrato. Se pago conforme contrato, foi a UNIÃO, contribuinte de fato, que suportou o ônus pagou do bolso o valor indevido. (d) pelo STJ, apenas a empresa X pode pedir, se tiver autorização da UNIÃO. Se diferente do contrato, a Empresa X, contribuinte de direito, que suportou o ônus pagou do bolso o valor a maior. 8. AS FORMAS DE DEVOLUÇÃO DO VALOR A RESTITUIR Por fim, cabe colocar as diversas formas como o valor a restituir é devolvido ao interessado. As legislações tributárias dos entes federativos prevêem diversas formas 16

de devolução, que vai depender da situação do interessado, principalmente, se for contribuinte ou não. O mais comum e normal é a restituição mediante compensação, nas modalidades de estorno contábil ou compensação financeira, podendo ser também em moeda corrente. 32 As hipóteses de restituição em moeda corrente são mais restritas, compreendendo o recolhimento indevido de tributos diretos, a exemplo do IPTU, de tributos indiretos, quando o titular do direito for contribuinte autônomo do ISS ou não inscrito no Cadastro Fiscal do Fisco, ou ainda optante do Simples Nacional, 33 entre outros. CONCLUSÃO Na hipótese de um contribuinte pagar valores a título de tributos que acabam se revelando indevidos, tem ele o direito de pedir a sua devolução, que pode ter diversos motivos, a exemplo, de pagamento a maior, em duplicidade, e sua devolução se fundamenta na ausência de causa jurídica para a sua cobrança pela Fazenda Pública. Assim, respondendo aos questionamentos levantados na introdução desse trabalho, pode-se afirmar: 1. Quais os requisitos que devem ser verificados quando se inicia a análise do pedido? Resposta: quando se inicia a análise do pedido deve-se verificar em primeiro lugar se o pagamento realmente foi indevido, apresentando os fundamentos que levaram a essa conclusão. 2. Qual o prazo para pleitear a restituição e quando se inicia? 32 DISTRITO FEDERAL. Lei nº 4.567/11. Art. 79. A restituição será feita mediante compensação, nas modalidades de estorno contábil ou compensação financeira, ou ainda em moeda corrente. Disponível em: http://www.fazenda.df.gov.br Acesso em: 09 jun. 2015. 33 DISTRITO FEDERAL. Lei nº 4.567/11. Art. 80. A restituição em moeda corrente será feita na hipótese de recolhimento indevido de: I tributos diretos; II tributos indiretos, quando o titular do direito for contribuinte: a) autônomo do ISS; b) não inscrito no CF/DF; c) optante pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições Devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte SIMPLES NACIONAL, quanto aos tributos de competência do Distrito Federal, sem prejuízo da regulamentação específica do Comitê Gestor do Simples Nacional CGSN, com fundamento no art. 21, 5º, da Lei Complementar federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Disponível em: http://www.fazenda.df.gov.br Acesso em: 09 jun. 2015. 17

Resposta: o interessado tem o prazo de 5 anos a contar da data do pagamento indevido para pleitear o pedido, sob pena de extinção de seu direito pela prescrição. 3. Qual a classificação dos impostos quanto à sua repercussão? Resposta: A doutrina, para fins didáticos, costuma classificar os impostos, segundo sua repercussão, diferenciando-os em impostos indiretos e diretos. Nos impostos indiretos, a exemplo do ISS, diz-se que os contribuintes de direito e de fato estão em pessoas diversas, isto é, a pessoa que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação (contribuinte de direito), não é a que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo (contribuinte de fato). Nos denominados tributos diretos, a exemplo do IPTU, os contribuintes de direito e de fato estão na mesma pessoa, ou seja, a pessoa, que a lei tributária elegeu como sujeito passivo da obrigação, é a mesma que efetivamente suporta o ônus financeiro do tributo. 4. Há diferenças na análise de devolução de imposto considerado direto e indireto? Resposta: Sim, nos impostos indiretos, a restituição somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la, nos termos do art. 166 do CTN. 5. O contribuinte de fato tem legitimidade para pedir a devolução de tributo classificado como indireto? Resposta: segundo julgados recentes do STJ, o contribuinte de fato não faz parte da relação jurídica entre fisco e sujeito passivo e assim não é parte legítima para pleitear a repetição do indébito. 6. Quais os critérios a serem atendidos e analisados no processo de devolução de tributo indireto? Resposta: são dois: o interessado, sendo contribuinte de direito, terá que provar que efetivamente assumiu o referido encargo; ou, que ele esteja legitimado expressamente a receber a devolução, nos termos do art. 166 do CTN. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS AMARO, L. S. Direito tributário brasileiro. 12 ed., São Paulo: Saraiva, 2006. BECKER, A. A. Teoria geral do direito tributário. 3 ed., São Paulo: Lejus, 1998. 18

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