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Transcrição:

O squatting carrega uma nuvem negativa, mas é uma maneira de reciclar espaços vazios para a criação de espaços artísticos Spanky Mc Spankson, administrador da 491 Gallery, onde mora como squatter há seis anos Área comum e social da 491 Gallery, onde vivem Spanky Mc Spankson (à dir.), 32, e a artista plástica Indigo, 34 Sem família. sem tradição. sem propriedade. O termo squat originalmente significa acocorar-se ou agachar-se, mas há quatro décadas squatting designa habitar uma propriedade em desuso ou inabitada, com o propósito de acomodação ou uso como centro de atividades sociais. Hoje, milhares de pessoas jovens e sem grana transformam imóveis abandonados em moradias, fazendo do squat um lifestyle : seus participantes decoram esses locais com mobília reciclada, defendem causas ambientais, criam regras de convivência social e disfarçam a precariedade com criatividade. Mas a batalha é dura, exigindo paciência para encontrar a situação e o local certos. Por Gareth Owen Fotos Benoît Audureau 122 ffwmag! nº 10 2008 ffwmag! nº 10 2008 123

Assim que entrei no prédio, me senti como se tivesse voltado pra casa. Conheci pessoas que têm uma idéia diferente sobre o mundo, e o que podemos fazer para mudá-lo. Quero fazer parte disso Debbie Ackenson organiza exposições de arte e administra o bar da 491 Gallery, onde também mora Acima, Debbie Ackenson (à dir.), 23, e Sandra, 26, na sala de estar da 491 Gallery. Na página ao lado, o jardim da galeria A cena squatting em Londres não vem de agora. Surge historicamente de um fato especialmente curioso no século XVI, durante a ocupação do que era conhecido como terras devolutas por um grupo chamado de Levellers. Mesmo assim, a prática não se tornou conhecida até o fim da Segunda Guerra Mundial. Durante os anos 1960, o squatting ressurgiu quando o movimento Family Squatting tentava abrigar pessoas sem-teto nos prédios abandonados da cidade. Quatro décadas depois, em 2008, os squatters ainda ocupam (ilegalmente) incontáveis prédios na capital econômica mais importante da Europa. Vale notar que, cada vez mais, as pessoas optam por esse estilo de vida. Quase sempre são artistas ou figuras criativas que não conseguem meios de sobreviver na economia de Londres, cidade com serviços de custos bastante elevados. Alguns se conformam: como nunca poderiam pagar regularmente um aluguel, se entregam aos benefícios de viver de graça. O movimento squat nem sequer dispõe de estimativas confiáveis, já que nem todos se declaram invasores para as pesquisas oficiais. Em 1979, eram cerca de 50 mil pessoas no Reino Unido, e 30 mil viviam em Londres. Hoje, calcula-se extra-oficialmente que os squatters, apenas em Londres, formem um contingente de 15 mil pessoas. Diante dessas evidências, surgiu uma lei que garante direitos aos squatters. Apesar de não ser uma atividade ilegal, mas uma prática (em certos casos) acatada pela lei, os squatters vivem pisando em ovos: podem ser expulsos ou presos com facilidade. Vale lembrar que os britânicos, de vez em quando, adoram cumprir suas normas legais. Squatting, segundo a lei Inglesa, é um assunto civil e não criminal. Mas se houver evidências de que uma determinada propriedade foi ocupada de maneira ilegal com arrombamento, por exemplo a polícia pode expulsar os ocupantes. Em casos em que os squatters têm a chave da porta da casa, o dono da propriedade terá que ir ao tribunal e provar que tem o direito de morar lá. Primeira lição quando ocupar uma casa: mudar a fechadura! O processo para expulsar os squatters de uma casa pode levar meses e até anos. Nesses casos, os proprietários costumam usar vários métodos para acelerar o processo, como intimar os ocupantes com violência ou pagar para que eles deixem o lugar. Por lei, os squatters têm direito de se declarar donos da propriedade depois de 12 anos de ocupação. ENQUANTO EXISTIREM PROPRIEDADES VAZIAS... Chris tem 39 anos e veio de Leeds, cidade próxima a Manchester. Ele é squatter há quatro anos e meio. Tentei morar um pouco assim em Leeds, mas era bem diferente. Fui ameaçado de despejo com violência e só restava deixar a minha região. Em Londres, ele mora no mesmo endereço há dois anos e meio. Mas nem sempre 124 ffwmag! nº 10 2008

O artista plástico Sy Hackney, 32, em seu quarto de squatter Este lugar era usado para despejar lixo. Quando chegamos aqui, tivemos que tirar umas quatro toneladas de lixo. A quantidade de prédios abandonados em Londres é o dobro da de pessoas sem teto Sy Hackney, squatter desde 2001 126 ffwmag! nº 10 2008 ffwmag! nº 10 2008 127

Produzir em um ambiente onde o dinheiro não é prioridade se tornou para mim o único modo de trabalhar, com mais liberdade e ainda podendo ajudar outras pessoas John, 24, é squatter há pouco tempo, mas sempre foi simpatizante do movimento Quarto do artista plástico Johnny, que mora e trabalha na NO ID Gallery, em Shoreditch, bairro revitalizado pela chegada de jovens designers e arquitetos Johnny na frente da NO ID Gallery, onde organiza workshops de grafite e exposições a barra é fácil. A maioria das pessoas é expulsa após três ou quatro meses, no máximo. Embora digam o contrário, as coisas estão ficando cada vez mais difíceis em Londres. O lugar onde ele mora hoje é o ex-escritório da gerência de uma sala de cinema abandonada. O depoimento de Chris que, desconfiado, prefere ser chamado apenas pelo apelido, resume a batalha de quem escolhe fazer squatting. Existe outra opção? Eu já imaginava que essa seria a única forma de viver aqui. Não teria como pagar aos proprietários. Eles não ligam para ninguém, só querem saber do dinheiro. Todos os meus amigos de Londres praticam o squatting. Mas alguns deles começaram a pagar uma taxa de aluguel porque a coisa apertou. É cada vez mais difícil encontrar lugares disponíveis e a maioria dos imóveis vazios tem alarmes. Eu aprendi a ser mais esperto em Londres, porque tem muita gente ruim por aqui. Todo mundo vem para cá querendo ganhar dinheiro. Eu vim para fugir do meu passado. Penso que a maioria das grandes cidades é movida por dinheiro, mas Londres é mais. Vivemos em uma das cidades mais caras do mundo. Para sobreviver, é preciso ter um salário legal. Mesmo assim, as sociedades precisam de indivíduos criativos. E essas pessoas precisam de liberdade para agir. Sem querer declarar o primeiro nome, Connor tem 21 anos e, diferentemente de outros squatters, nasceu em Londres. Faz parte de um grupo chamado 491 Gallery, que usa o espaço como plataforma criativa, além de abrigo. Entrei em outro grupo e fui expulso. Então me juntei a eles para vir para cá, abrir um espaço de eventos e criar coisas. No primeiro mês, éramos apenas dez pessoas. Logo, esse número subiu acima de 30 indivíduos, que aos poucos foram embora. Depois disso, começamos a usar o espaço para eventos. O dinheiro é mesmo essencial em comunidades assim, Connor? Existem pessoas que usam o espaço para fazer coisas que não são públicas, e outras pessoas que usam como estúdio musical, por exemplo. Em parte faço squatting por motivos políticos, além de gostar de dividir a vida comunitária com amigos. Um espaço não é definido apenas pelo dinheiro. O dinheiro é uma coisa tão bizarra! Devemos compartilhar nossas habilidades e não pagar por elas. Agora é a vez de Sandra ocultar o sobrenome. Ela tem 27 anos, nasceu em Birmingham e mora em Londres desde 2006 no 491 Gallery Project. Quando cheguei aqui, me senti em casa. As pessoas têm idéias geniais sobre como mudar o mundo. Eu não troco este lugar por nada. Aqui é possível sentir uma atmosfera especial, além de sempre existir oportunidades de apresentar alternativas viáveis. As pessoas que praticam squatting não fazem isso apenas porque é gratuito. Ela faz questão de evidenciar que existe uma ideologia alternativa no estilo squat. Queremos deixar clara a opção de viver fora de uma sociedade imprestável. Discordamos dessa sociedade e queremos mostrar que existem outras proposições. A valorização do senso comunitário tem se perdido, ninguém mais se importa com o próximo, por isso existe tanta confusão no mundo. O squat para Sandra também traz experiências de igualdade e fraternidade que suprem a ausência de vínculos familiares mais próximos: Quando eu morava em outro lugar, pagando aluguel, nunca conheci pessoas assim. Tenho grandes amigos aqui, pessoas em que posso confiar plenamente. Agora eles são a minha família. O gerente do curso de webdesign John, em uma das salas de reunião da NO ID 128 ffwmag! nº 10 2008 ffwmag! nº 10 2008 129

O squatting é um movimento que surgiu com força na Inglaterra desde a Segunda Guerra. Hoje reúne pessoas para criar coisas sem propósitos comerciais Raul, 31, squatter há seis anos Meu trabalho é organizar a galeria, abrir espaço para novos criadores. A pobreza cria arte nova Kevin Sauvin, 31, mora em uma casa ocupada em Hackney há três anos e é o criador da NO ID Gallery Professor de crianças e adolescentes com problemas de comportamento, Raul mora em uma casa ocupada em Hackney há seis anos ffwmag! nº 10 2008 131

Em alguns casos, as pessoas são expulsas depois de três ou quatro meses. Está ficando extremamente difícil ocupar casas vazias em Londres Chris, 39, na sala da casa em que pratica squatting, em Clifton Mansions, região de Brixton Quarto de Chris, que se autodefine como sonhador em tempo integral 132 ffwmag! nº 10 2008

Jiminy, 30, e a estilista Matilde, 28, no estúdio onde moram, adaptado de uma carroceria de caminhão. Matilde trabalha com materiais reciclados e faz performances Entrada do squat Cheese Factory; abaixo, o designer Nick AKA Ronin Existem pessoas que ocupam casas para fazer festas. Elas invadem o lugar por três dias: no primeiro, organizam o lugar, no segundo, rola a festa e, no terceiro, saem de lá Nick AKA Ronin, 29, que mora há quatro meses no squat Cheese Factory Mas, para gerar esse tipo de vínculo, houve alguma aproximação em comum? Sandra responde rápido: Sim, temos em comum o passado distante dos grupos sociais. Todos fomos os estranhos da turma. Agora encontramos o nosso lugar no mundo. Eu gostava de escrever, mas recentemente aprendi a desenhar e virei a coordenadora de workshops acessíveis para qualquer pessoa. Todos têm o direito de aprender algo novo e gratuito. Uma pessoa sozinha não pode mudar o mundo, mas é um efeito dominó. Dez pessoas numa comunidade podem começar uma revolução. Indigo, também na defensiva, não declara sobrenome nem a cidade de onde veio. Ele tem 34 anos, também pagava aluguel e hoje mora com o grupo 491 Gallery, onde começou a aprender o ofício de ourives. Aqui é o verdadeiro hotel California. Não considero esse local um squat, mas um centro comunitário estabelecido. Como estamos mais solidificados, posso dizer que somos a nova geração. Não se trata de mais um squat, se trata da nossa casa. É o mais próximo de uma tribo que você pode chegar dentro de uma cidade. A sua busca por ligações ideológicas se mistura ao espírito tribal e urbano: Temos uma fogueira, diversidade de pessoas, histórias... Eu posso me expressar com mais liberdade, sentir que pertenço ao local. Bastante diferente da minha experiência anterior. Estamos opostos a normas e regras sociais vigentes. Aqui, tudo é provisório. Quando você consegue se livrar do conceito material de posse, você está completamente livre. No Cheese Factory, temos uma geladeira industrial que hoje é usada como espaço para workshops, set de filmagens, festas e desfiles Jiminy, artista e produtor de TV no Cheese Factory 134 ffwmag! nº 10 2008

Quarto de Rafael em Clifton Mansions. Ele é recém-formado em psicologia, mas prefere se virar como músico Eu acho que a vida não é só ir para o trabalho, ganhar dinheiro, voltar pra casa e sair de férias, como querem os grandes capitalistas Rafael, 30, em sua sala em Clifton Mansions, Brixton 136 ffwmag! nº 10 2008

Sala da casa da artista plástica Verena em Clifton Mansions, Brixton Spanky Mc Spankson, 32 anos, é um rapper envolvido no projeto 491 Gallery. Eles fizeram um acordo com a empresa de transportes de Londres para habitar por alguns anos um dos edifícios abandonados pela rede oficial. O projeto tenta estender essa ação a outras corporações do governo, no intuito de ganhar espaços para espaços voltados à arte. Mas, claro, nem tudo são conquistas fáceis em sua vida. Existe algo muito negativo em torno do squatting, principalmente pela maneira como algumas pessoas o praticam. Não buscamos conforto nas moradias, queremos espaços para a regeneração das artes. A arte é um efeito colateral da comunidade unida. Todas as pessoas são criativas quando relaxam ou quando estão no ambiente correto. Creio que a maioria das pessoas tem um ciclo de vida de três semanas. Duas semanas no futuro e uma semana no passado. Metas de curtos ou longos prazos são coisas diferentes. Deve existir equilíbrio, mas me preocupo com as metas em longo prazo. Entretanto, nem todos na sociedade oposta compartilham dessa visão utópica, analisa Spanky: No começo eu não conhecia os meus direitos e fui expulso. Depois vim morar com pessoas mais descoladas. Tivemos alguns despejos violentos, com os donos chutando as portas e a nossa cabeça. Mas tudo sempre foi muito interessante. Aventuras pelo menos não faltam na vida de um squatter: Teve uma vez que o proprietário de um lugar apareceu durante a noite, dizendo que voltaria de manhã com os seus capangas. Eles voltaram, começaram a derrubar as portas com marretas. Daí eu liguei para a polícia e fiz uma voz de mulher desesperada: Por favor, por favor, alguns homens estão tentando invadir a minha casa, eu não os conheço... A polícia chegou rápido, mas disse que era melhor a gente sair. Os policiais ficaram de vigília para que os capangas não espancassem a gente. Então fomos embora. Agora eu procuro um lugar para morar com a minha caravana. O futuro da comunidade squatting em Londres é crescente, será estagnado, crescerá como causa política em um tempo de tantas mudanças sociais na Europa? Por um lado, mais e mais pessoas aderem ao movimento, dando força e credibilidade, se tornando mais imaginativos e efetivos. Por outro lado, os imóveis ficam mais difíceis de serem invadidos. As brechas da lei estão sendo preenchidas. Mas a maioria dos londrinos pensa a mesma coisa: os squatters precisam é de um bom emprego. A resposta óbvia seria legalizar o squatting ou no mínimo aceitar o que as pessoas fazem quando o valor da moradia é inacessível, enquanto existirem propriedades vazias. Mas isso não acontecerá tão cedo. Talvez a melhor posição seja ligar-se a organizações como o 491 Gallery Project, que propõe aproveitar edifícios oficiais sem uso, transformando-os em espaços coletivos para grupos que apresentem projetos realizáveis. Para os squatters normais, que invadem locais por motivos econômicos, políticos ou pessoais, as chances de mudança continuam distantes. Advisory Service for Squatters: www.squatter.org.uk Squatting: en.wikipedia.org/wiki/squatting Acho o movimento squatting importante. Se eu não morasse aqui, não conseguiria pintar, a minha grande paixão. E teria que passar a maior parte do meu tempo trabalhando para pagar o aluguel e aumentar a riqueza dos outros Verena, 26, mora em Clifton Mansions, Brixton, desde 2002 138 ffwmag! nº 10 2008