Enfoque Multicritério para Decisões de Investimento Público em Saúde

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1 Enfoque Multicritério para Decisões de Investimento Público em Saúde Autoria: Ruben Huamanchumo Gutierrez, Eduardo Picanço Cruz, João Carlos Correia Baptista Soares de Mello Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar uma metodologia de tomada de decisão por parte de gestores públicos, no que tange a investimentos na área de saúde. Na linha de outros trabalhos sobre já existentes sobre orçamento público procura-se quantificar opiniões. Para tal são utilizadas ferramentas do Apoio Multicritério à Decisão. Este ramo da Pesquisa Operacional exige uma completa estruturação dos problemas em tela, com a clara definição de alternativas, critérios e decisores. Após essa definição aplica-se o método da soma ponderada para obter uma função de utilidade multiatributo. Os pesos usados, e a quantificação dos critérios subjetivos é feita com o métodos MACBETH, implementado através do software de mesmo nome. São usados, respectivamente, os módulos weights e scores. A função utilidade obtida entra como função objetivo de um programa de programação linear inteira, cuja principal restrição é o orçamento, e que determina a quantidade de investimento em cada alternativa. 1 - INTRODUÇÃO O mundo globalizado e competitivo pressiona cada vez mais os administradores dos Órgãos e Instituições Públicas e da iniciativa privada. Essa pressão se expressa, de maneira mais acentuada, no ritmo imposto pelos mercados e pelos fluxos de investimentos mundiais, principalmente para a Administração Pública de países como o Brasil, que basearam sua política financeira na necessidade constante desses ingressos de capitais. Percebe-se assim uma sucessão de problemas decorrentes da tentativa de acompanhar o mercado. O principal problema que pretendemos analisar traduz-se nos motivos que concorrem para que alguns gerentes se transformem em meros "apagadores de incêndios". Nesse sentido, a dificuldade de estruturar uma decisão, seja por falta de tempo, seja por não existir uma metodologia absolutamente inquestionável, têm levado alguns doutrinadores a sugerir o uso da experiência e até o absurdo do "ilógico" na tomada de decisão (Motta, 1997). Alguns trabalhos exploram sua investigação a partir da teoria e de estudos de caso acerca de modelos decisórios que visam auxiliar as decisões do administrador público de forma a maximizar os benefícios utilitários da decisão. Dentre esses trabalhos, podemos destacar os que enfocam a aplicação de técnicas multicritério e multidecisor (Cova, 2000), e a analise comparativa entre os métodos Prométhée e Todim (MORAES, 1999). Este trabalho segue uma linha semelhante, propondo um modelo quantitativo capaz de levar em conta aspetos subjetivos, baseado na metodologia MACBETH (Bana e Costa & Vansnick, 1994 e 1997). A partir deste e de outros estudos, é possível questionar a capacidade de se capturar um mínimo de subjetividade no contexto da problemática a qual o modelo pretende solucionar, mesmo que esta esteja vinculada às idiossincrasias de um decisor apenas. 2 - O PROCESSO DECISÓRIO A administração moderna oferece aos pesquisadores uma série de áreas específicas de conhecimento. Faz-se mister aparecerem então, especialistas dedicados a cada uma dessas particularidades. É evidente que tal fenômeno ocorre atualmente em todos os ramos da ciência, pois, antes de tudo, fazer ciência consiste na busca pela resposta das perguntas e na 1

2 formulação de outras tantas quanto forem necessárias. Assim, surge a idéia de árvore de conhecimentos, que se expande na medida em que se generaliza. Longo (1989), ressalta esse crescimento exponencial da geração de conhecimentos científicos. Uma área que vem sendo partilhada por Administradores, Engenheiros, Psicólogos e Sociólogos entre outros é a chamada Teoria da Decisão. É comum encontrarmos, em algumas Escolas de Administração, esses diversos profissionais ministrando a disciplina curricular equivalente a Processo Decisório, Teoria da Decisão, Decisão Empresarial e suas variantes. O que se pretende esclarecer é o fato de que o assunto encontra-se em área multidisciplinar, e que deve ser observado o problema sob as diversas óticas: Econômico, Social, Financeira, etc. Na história da gerencia, percebe-se que a primeira Escola de Administração decididamente interessada em estruturar uma decisão foi a Escola Comportamental. Herbert Simon apresenta ao mundo assim uma seqüência de etapas do processo decisório: Preparação da Situação Análise e definição do problema Definição dos objetivos Procura de alternativas de solução avaliação e comparação dessas alternativas Escolha da alternativa mais adequada Implementação da alternativa escolhida A partir desse momento, como todo modelo acadêmico de representação, a estrutura de Simon foi constantemente questionada. Merecem destaque as análises de Motta (1997 onde são contrapostas razão e intuição na tomada de decisões. O autor apreenta ainda o que chama "enganos da racionalidade", defende o absurdo uso do ilógico na tomada de decisão e justifica a necessidade de criar experiência de gestão do administrador para que ele desenvolva a habilidade de decidir. Como contraponto existe a escola de otimização, que quantifica os benefícios da decisão e transforma-os em complexos problemas de maximizações e minimizações. Nessa mesma visão também procurou-se a valorização monetária das decisões tomadas. Assim, dentre os vários modelos decisórios, encontramos aqueles que se destinam a resolução de questões econômicas e financeiras nas empresas, públicas ou privadas. Um grande número de decisões econômico-financeiras tem como base fundamental aspectos estritamente quantitativos traduzidos em valores monetários, distribuídos em fluxos de caixa periódicos e devidamente descontados por taxas arbitrárias. Não obstante, tais decisões deveriam ser fundamentadas em outros aspectos qualitativos, que não menos importantes que os anteriores traduzem o ambiente nebuloso, que, via de regra, não é internalizado na análise. Tal circunstância pode vir a se constituir em determinante fonte de fracasso ou de inconsistência de um projeto a ser escolhido com base em critérios estritamente quantitativos. Por fim, as decisões públicas também foram alvo de grande destaque neste campo, pois além de merecerem todos os tratamentos econômico-financeiros usualmente empregados, ainda necessitam de uma análise dos impactos sociais, ambientais e políticos desta decisão. Destaca-se ainda que a atual ênfase do Governo Federal no planejamento plurianual, fundamentado no decreto 2829/98 M.P.O. (Ministério do Planejamento e Orçamento), justifica critérios de escolha acerca de projetos complexos e de longa duração que envolvam distintos aspectos de natureza político, econômico, social e ambiental. Dessa forma o trabalho nos parece atual e relevante. 3 - METODOLOGIAS MULTICRITÉRIO Barba-Romero e Pomerol (1997) apresentam a seguinte situação para uma decisão multicritério, "quando um decisor se encontra em situação de escolher entre várias 2

3 possibilidades e tem diversos pontos de vista a observar". Bana e Costa & Vansnick (1994 e 1997) desenvolvem uma metodologia de analise Multicritério denominada MACBETH - Measuring Attractiveness by a Categorical Based Evaluation Techinique. "Método que propõe uma escala de valores cardinais sobre um conjunto de alternativas,a partir de juízos absolutos de diferença de atratividade entre duas ações". Destarte existam diversas outras propostas metodológicas, Soares de Melo (et al, 2001) destaca os benefícios deste Método, explicitado em programa de computador com mesmo nome, cujas versões FREE WARE são executáveis na internet. O programa se divide em dois módulos, no primeiro, chamado de Macbeth Scores, as alternativas são confrontadas uma a uma para estabelecer as ordens de preferência, de acordo com cada critério de escolha, assim, ao final do processo, temos uma escala de valores para cada alternativa no que tange cada critério utilizado pelo decisor. No segundo módulo, denominado Macbeth Weights, os critérios são confrontados, par a par, para estabelecer a relação de ordem entre si e apresentação dos pesos de cada critério. Assim, o decisor teria condições de, a luz dos pesos das alternativas e dos seus critérios, estabelecer qual alternativa seria mais interessante, do ponto de vista de maximização das subjetividades contidas nos diversos critérios. 4 - ESTUDO DE CASO O estudo de caso em tela segue as orientações pessoais de determinados decisores, os autores, baseando-se em um município de médio porte, aproximadamente 150 km 2 e população de habitantes. Dessa forma então, sugerem-se as seguintes alternativas: - Construção de grande hospital geral, capaz de realizar as principais cirurgias necessárias, inclusive com maternidade; - Construção de hospital de porte médio, com atendimentos de emergência e especialização apenas em determinadas cirurgias, haja vista que não tem estrutura suficiente para operações mais complexas; - Construção de posto de saúde com capacidade de realizar curativos para pequenos acidentes e equipes especializadas em prevenção de doenças e apoio a população local; - Construção de posto de médico de família com capacidade semelhante ao posto de saúde e equipes especializadas em prevenção de doenças e apoio a população local; - Não fazer nada. Esta ultima se justifica pelo fato de, na normalização da ordem (transformação em uma escala de 1 a 0) ela possa receber o menor valor (zero) e não interfira na soma final dos pesos. Com o intuito de analisar as alternativas acima, tentar-se-á agora estabelecer critérios de avaliação razoáveis. Essa escolha deve estar submetida aos axiomas de Bernard Roy (ROY e BOUYSSON, 1993), são eles: (1) Descrição completa do problema: Os critérios devem ser abrangentes; (2) Coerência: Se uma alternativa é melhor, individualmente, em todos os critérios, no total geral ela também deve ser melhor; (3) Não Redundância: Devemos eliminar os critérios fúteis. Assim, propõem-se os seguintes critérios: - Capacidade de atendimento de emergência 3

4 - Capacidade de medicina preventiva - Capacidade de internações mais complicadas - Capacidade de fornecer os medicamentos aos pacientes O McBeth Score utiliza-se de uma comparação das alternativas, para a par, onde o decisor identifica a preferência e seu respectivo grau em relação a cada critério. O resultado obtido são os pesos das alternativas individualmente segundo cada critério. Após essa análise chegou-se as seguintes conclusões: Capacidade de atendimento de emergência Capacidade de medicina preventiva Capacidade de internações mais complicadas Capacidade de fornecer os medicamentos aos pacientes Construção de um Hospital Geral (HG) Construção de um Hospital de Médio Porte (HM) Construção de um Posto de Médico de Família (MF) Construção de um Posto de Saúde (PS) 1,00 0,86 0,21 0,36 0,60 0,60 1,00 0,90 1,00 0,75 0,33 0,33 0,54 0,54 0,85 1,00 Tabela 1: Escala cardinal das alternativas nos critérios considerados. O Macbeth Weights faz uma comparação semelhante utilizando-se de alternativas fictícias onde uma alternativa é melhor em um critério e pior nos outros. O objetivo final é identificar os pesos dos critérios. Os resultados obtidos foram: - Capacidade de atendimento de emergência = 30,16 - Capacidade de medicina preventiva = 30,16 - Capacidade de internações mais complicadas = 23,81 - Capacidade de fornecer os medicamentos aos pacientes = 15,87 Estrutura de soma ponderada dos pesos dos dois programas: - Construção de HG: 1x 30,16 + 0,60 x 30, x 23,81 + 0,54 x 15,87 = 80,64 - Construção de HM: 0,86 x 30,16 + 0,60 x 30,16 + 0,75 x 23,81 + 0,54 x 15,87 = 70,46 - Construção de PS: 0,36 x 30,16 + 0,90 x 30,16 + 0, 33 x 23, x 15,87 = 57,84 - Construção de MF: 0,21 x 30, x 30,16 + 0, 33 x 23,81 + 0,85 x 15,87 = 61,73 - Não Fazer Nada: 0 x 30, x 30, x 23, x 15,87 = 0,00 Poder-se-ia então finalizar a analise concluindo que, de acordo com as subjetividades individuais daquele determinado decisor, a construção de um hospital geral seria a melhor alternativa. 5 - O PROBLEMA DA PROGRAMAÇÃO LINEAR INTEIRA Na tentativa de maximizar os benefícios obtidos a partir dos pesos referentes as alternativas propõe-se um modelo de Programação Linear. 4

5 Foram avaliadas da seguinte maneira as estimativas de custo para a construção de uma unidade de cada alternativa: - Construção de grande hospital geral = R$ ,00 Fonte EMOP - Niterói, com base no Hospital Estadual de São Gonçalo m 2 - Construção de hospital de porte médio = R$ ,00 Fonte EMOP - Niterói, com base no Hospital Estadual de Itaboraí m 2 - Construção de posto de saúde ou Médico de Família = R$ ,00 Fonte EMOP - Niterói m 2 - Não Fazer nada = R$ 0,00 Construção do Modelo de Programação Linear a) Função Objetivo: Máximo Benefício = 80,64 Hg + 70,46 Hm + 57,84 Ps + 61,73 Mf + 0,00 Nd Onde: Hg - Verba destinada para construção de Hospital Geral Hm - Verba destinada para construção de Hospital Médio Ps - Verba destinada para construção de Posto de Saúde Mf - Verba destinada para construção de Posto de Médico de família Nd - Não Fazer nada b) Sujeito as restrições: ( xHg) + ( xHm) + ( xPs) + ( xMf) Verba Orçamentária Destinada à Despesas de Capital, subconjunto Investimentos, na função 09 - Saúde Pública; Considerando os valores totais por cidade: 2 Hospitais Gerais, 5 Hospitais Médios e 1 Posto de Saúde, ou Médico de família para cada bairro; A cidade deve ter condições de, na próxima legislatura, manter as obras construídas. Ou seja, reservar verbas orçamentárias como Despesas Correntes, função 09 - Saúde Pública; Os resultados devem ser números inteiros; Não negatividade. 6 - EXEMPLO PRÁTICO Apenas como exemplo, serão utilizados alguns dados sobre a cidade de Niterói, localizada no estado do Rio de Janeiro, obtidas através de entrevistas com funcionários da Prefeitura local e em sites da internet. Em entrevistas com funcionários da Prefeitura de Niterói, foi relatado que a dotação Orçamentária Destinada às Despesas de Capital, subconjunto Investimentos, na função 09 - Saúde Pública, gira em torno de R$ ,00 anualmente, porém após os reajustes para Despesas Correntes, sobra aproximadamente 20% deste total, que em termos absolutos seria R$ Partindo ainda do preceito legal de que o mandato de um Prefeito de estende por 4 (quatro) anos, pode-se multiplicar o valor acima pelos anos de governo, haja vista que as obras posam durar mais que um ano legislativo. Logo o decisor teria, nos 4 anos aproximadamente R$ para a decisão. Nesse ponto não há necessidade de 5

6 utilização da atualização a valor presente pois entende-se que, a cada ano, o montante destinado a estas receitas aumentará, esse fato não está sendo considerado. A cidade possui 48 bairros, 14 postos de saúde, 21 postos de médico de família, 6 Hospitais públicos, sendo que apenas um destes tem as características relacionadas a um Hospital Geral proposto no Estudo de Caso, são eles: - Hospital Ari Parreiras (Tuberculose); HPJ de Jurujuba (Saúde Mental), Hospital Estadual Azevedo Lima; Hospital Orêncio de Freitas (Cirurgias); Hospital Getulio Vargas Filho; Hospital Universitário Antonio Pedro. Assim, propõe-se a seguinte estruturação do contexto de decisão: Função Objetivo: Máximo Benefício = 80,64 Hg + 70,46 Hm + 57,84 Ps + 61,73 Mf + 0,00 Nd Sujeito às restrições: ( xHg)+( xHm)+( xPs)+( xMf) ,00 Hg + Hm 1; Ps + Mf 13 Hg, Hm, Mf e Ps 0 Hg, Hm, Mf e Ps Є IN Aplicando a resolução para esse problema de programação inteira, obtêm-se: Construir 1 Hospital Geral Construir 13 Postos de Médico de família 7 - CONCLUSÕES Os resultados obtidos no trabalho não têm a pretensão de constituírem-se em panacéia universal para qualquer cidade de médio porte, o que se pretende é externar uma opinião de que esses resultados refletem a alternativa mais preferível para o decisor. A propósito do trabalho é que cada Administração Municipal utilize a metodologia para identificar as particularidades de sua cidade e que respeite as necessidades de manutenção dessas obras propostas. Pode ser perfeitamente observável que, em uma cidade com um trabalho já desenvolvido de prevenção as doenças, os pesos finais do Modelo de Programação Linear tendam mais para as alternativas Hg e Hm. Neste caso a função objetivo seria diferente e, conseqüentemente, o resultado final também. Em relação aos programas utilizados para a definição dos pesos, Macbeth Scores e Weights, faz-se mister ressaltar que, por ser uma versão gratuita, existia uma limitação em relação ao número de alternativas e critérios. Assim, esse impasse pode ser resolvido com a versão original que trará a possibilidade, para o decisor, de se utilizar de incontável número de critérios e obter um resultado ainda mais confiável. 6

7 Propõe-se ainda, a criação de um modelo que englobe as facetas de Multicritério e Multideisor. Acreditamos que, por se tratar de decisões públicas, o eleitorado deve ser ouvido. Tal circunstância constitui-se em motivação permanente de investigação acadêmica. 8 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BANA E COSTA, C.A., VANSNICK, J.C., Applications of the MACBETH approach in the framework of an additive aggegation model, Journal of Multi-Criteria Decision Analysis, 6, p , BANA E COSTA, C.A., VANSNICK, J.C., MACBETH - An interactive path towards the construction of a cardinal value funcions, International Transactions in Operations Research, 1, p , BARBA-ROMERO, S., POMEROL, J.C., Decisiones Multicriterio: Fundamentos Teóricos y Utilización Práctica. Colección de Economía, Universidad de Alcalá, Spain, COVA, C.J.G., Execução orçamentária pública: uma proposta de metodologia de tomada de decisão e avaliação de resultados. Tese de Doutorado em Engenharia de Produção da COPPE-UFRJ, Rio de Janeiro, LONGO, W.P., Ciência e tecnologia: evolução, inter-relação e perspectivas. Trabalho publicado nos Anais do 9 0 Encontro Nacional de Engenharia de Produção (ENEGEP) - vol. 1,42 (1989). MORAES, L.F.R., Avaliação multicritério de projetos de produção da industria de petróleo no Brasil: uma análise comparativa dos métodos Prométhée e Todim. Tese de Mestrado em Engenharia de Produção da UFF, Niterói, MOTTA, P.R., Gestão contemporânea: a ciência e a arte de ser dirigente. 8a edição. Rio de Janeiro: Editora Record, ROY, B., BOUYSSOU, D., Aide Multicritére à la Décision: Méthodes et Cas, Economica, Paris,