TOXOPLASMOSE: DIAGNÓSTICO PREVENTIVO EM GESTANTES DE POSTOS DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE PELOTAS-RS 1. INTRODUÇÃO

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1 TOXOPLASMOSE: DIAGNÓSTICO PREVENTIVO EM GESTANTES DE POSTOS DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE PELOTAS-RS CADEMARTORI, Beatris Gonzalez 1 ; RECUERO, Ana Lúcia Coelho 1 ; BERNE, Ana Cristina 1 ; FERNANDES, Cláudia Pinho Hartleben 3 ; FARIAS, Nara Amélia da Rosa 2 ; BROD, Claudiomar Soares 3 1 Pós Graduação em Parasitologia UFPel; 2 Instituto de Biologia da UFPel; 3 Faculdade de Veterinária Centro de Controle de Zoonoses UFPel biacademartori@yahoo.com.br 1. INTRODUÇÃO Atualmente, têm-se observado crescente interesse no estudo da toxoplasmose, devido ao aumento de casos incidentes de infecções pelo vírus HIV-1, mas ainda considerações importantes permanecem como foco principal da infecção como doença aguda em gestantes. A infecção é causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, de curso benigno em indivíduos imunocompetentes, mas pode causar lesões graves em imunossuprimidos e fetos (Jeffrey et al.,2001). O parasito reproduz-se de forma assexuada e sexuada nos felídeos, seus hospedeiros definitivos, e apenas de forma assexuada nos hospedeiros intermediários, mamíferos, aves, répteis e peixes Suas principais formas de transmissão ocorrem através da ingestão de oocistos, liberados nas fezes de gatos jovens não-imunizados, presentes em solos contaminados (jardins, caixas de areia, hortas, água), da ingestão de carnes cruas ou mal cozidas contendo cistos (formas de resistência do parasito no hospedeiro intermediário), ingestão de alimentos contaminados com oocistos como verduras e legumes crus, e congenitamente, sendo esta a forma mais grave (Neves et al.,2000). É importante salientar que a conseqüência principal da toxoplasmose congênita, que ocorre devido à transmissão transplacentária de infecção aguda materna, é o aparecimento de alterações congênitas como hidrocefalia, coriorretinite, retardo mental e surdez. Essas alterações podem estar presentes ao nascimento ou se desenvolverem mais tarde. Assim, a prevenção da doença assume importância fundamental, uma vez que as seqüelas são irreversíveis (Sáfadi et al., 2003). A prevenção da toxoplasmose pode ser realizada por diferentes meios, sendo uma das medidas mais efetivas prevenir a doença aguda na gestação, evitando os fatores de risco para infecção e implantando programas de educação em saúde (Kapperud et al., 1997). Outra importante medida é baseada no screening sorológico durante a gestação para identificar mulheres agudamente infectadas e suscetíveis à infecção. O tratamento durante a gestação resulta em significativa redução na incidência e gravidade das seqüelas, embora os estudos atualmente disponíveis não forneçam evidência de redução da transmissão vertical (Peyron et al., 2000). O objetivo deste estudo foi verificar a freqüência de soropositividade para toxoplasmose em gestantes que realizaram rotinas de pré-natal nos postos de saúde atendidos pelo Laboratório de Análises Clínicas da UFPel (RS).

2 2. MATERIAL E MÉTODOS Foram avaliadas amostras sangüíneas de 100 gestantes que realizaram rotinas de pré-natal nos postos de saúde atendidos pelo Laboratório de Análises Clínicas da UFPel, nos meses de junho, julho e agosto de Os postos de saúde que fizeram parte de pesquisa foram Areal Fundos, Centro Social Urbano, Vila Municipal e Ambulatório da Faculdade de Medicina. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa com seres humanos da Faculdade de Medicina e as amostras foram utilizadas após a assinatura, pelas pacientes, de um termo de consentimento livre, após esclarecimento. Após a coleta de sangue, aplicou-se um questionário epidemiológico referente aos fatores de exposição ao risco da infecção por Toxoplasma gondii e conhecimento da zoonose. Os fatores de risco relacionaram-se aos hábitos alimentares e higiênicos das gestantes, presença de felinos em suas residências, destino das fezes dos felinos e contato direto com o solo. Ao término da entrevista foi fornecido um folheto educativo com medidas de prevenção da doença. Utilizou-se para análise o método de quimiluminescência, no equipamento, IMMULITE ( DPC-Medlab,São Paulo), o qual possibilita a dosagem quantitativa de anticorpos IgG e IgM para Toxoplasma gondii. O IMMULITE é um analisador automatizado de imunoensaios, de acesso randômico que realiza testes quimiluminescentes automatizados. O método apresenta sensibilidade e especificidade de 98% e 100%, respectivamente. Paralelamente com as dosagens das amostras, foram realizados os controles positivo e negativo do kit, a fim de verificar a eficácia dos reagentes e a calibração do equipamento utilizado. Considerou-se soropositiva para toxoplasmose a gestante cuja medida de anticorpos IgG foi igual ou superior a 8 UI/mL e para anticorpos IgM, amostras com resultados iguais ou superiores a 1,1 UI/mL. A análise das variáveis foi processada pelo programa Epinfo RESULTADOS E DISCUSSÃO Verificou-se que 58% das gestantes analisadas apresentaram soropositividade para toxoplasmose com resultados variando de 8,4 a 750 UI/mL. Nenhuma paciente apresentou anticorpos IgM para T. gondii, ou seja, infecção em fase aguda. A idade das pacientes estudadas variou entre 15 e 38 anos. A freqüência de soropositividade para toxoplasmose encontrada é semelhante à verificada no estudo realizado em hospital público de Porto Alegre (RS) onde obtiveram um resultado de 59,8% de gestantes soropositivas para Toxoplasma gondii (Varella et al.,2003). Outros estudos realizados com gestantes em diversas regiões do Brasil, encontraram percentuais distintos de anticorpos IgG para Toxoplasma gondii, oscilando entre 34,2% na região metropolitana de São Paulo (Vaz et al.,1990) a 77,1 % no Rio de Janeiro (Meirelles-Filho,1985). Uma alta freqüência de reatividade é um indicador de maior exposição da população aos fatores de risco à infecção e varia conforme os hábitos alimentares, higiênicos e educacionais. É importante salientar que o foco de atenção deve ser direcionado para as gestantes suscetíveis à primoinfecção (42%) pois encontram-se expostas aos agentes determinantes da doença,exigindo maiores cuidados durante a gestação com a finalidade de reduzir transmissão fetal. Verificou-se que das 100 gestantes entrevistadas, 65% desconheciam a infecção e 35% informaram ter algum

3 conhecimento, destas 77,2% associaram a transmissão à presença de felinos, 20% ao consumo de carne crua e 2,8% ao consumo de vegetais e legumes crus. A análise das variáveis epidemiológicas referentes aos fatores de risco à infecção por T. gondii está apresentada na tabela 1. Tabela1 Freqüência dos fatores de risco e de reatividade à infecção por T. gondii em 100 gestantes de Postos de Saúde do Município de Pelotas-RS. Variável Diagnóstico Prevalência Freq. contato Pos. Neg. de positivos Consumo de carne mal cozida 51% ,7% Manuseio de carne crua 94% ,5% Consumo de vegetais crus 94% ,4% Contato das mãos diretamente no solo 28% ,3% Presença de felinos na residência 44% ,2% Consumo de leite não pasteurizado 21% ,4% Remoção das fezes dos felinos 12% ,3% Ausência de felinos na residência * 56% ,6% Total de gestantes OR= 3,02; (1,21 < OR < 7,58); P = 0,007. Na análise das variáveis observa-se maior freqüência dos fatores de risco no manuseio de carne crua e no consumo de vegetais crus, o que era de se esperar em se tratando de donas de casa, entretanto, ainda que a prevalência de 58,5% nos positivos (55/94) tenha sido maior do que a dos negativos (39/94), a diferença não foi estatisticamente significativa. Um inquérito epidemiológico realizado na região do Alto Uruguai verificou que o contato das gestantes com o solo e felinos foi o fator de risco que apresentou maior freqüência de aquisição da infecção (Spalding et al,2005). Acha & Szyfres (1986) citam que a soropositividade entre indivíduos que têm gatos em casa é duas vezes maior do que a positividade em indivíduos que não os possuem, entretanto, nesta pesquisa, a análise bivariável em relação à ausência de felinos na residência com a soropositividade para anticorpos IgG mostrou significância estatística, apresentando um razão de chances (OR) de 3,02, variando de 1,21 a 7,58, com um intervalo de confiança de 95% e um P = 0,007, ou seja, a ausência de felinos na residência faz com que as gestantes possuam até 7,58% mais chances de apresentarem anticorpos do tipo IgG do que gestantes com gatos em casa. Isto ocorreu porque em nenhuma das pesquisas verificou-se o contato com gatos jovens na residência, ou seja, os resultados obtidos pressupõem que proprietários de gatos teriam maiores cuidados higiênicos na contaminação dos alimentos, ou concordam com Ganley, & Comstock (1980) e com Bracho et al.(2001) que não encontraram relação entre a associação positiva da toxoplasmose com a presença de gatos na residência em seus estudos. Um estudo multicêntrico de caso controle executado na Europa não identificou os gatos como fator de risco para a soroconversão durante a gestação (Cook et al., 2000). Segundo Avelino et al. (2004), a presença de gatos na residência não é um fator de risco para toxoplasmose indicando que o simples fato de possuir gato em casa não habilita para a infecção toxoplásmica, sendo imperativo contato com outras fontes de infecção ou de contaminação para apresentar uma maior vulnerabilidade ao organismo invasor. Estes pesquisadores observaram que os fatores determinantes à infecção

4 foram à ingestão de leite de cabra não pasteurizado e carne mal cozida, sendo este, um dos fatores de risco encontrados nesta pesquisa. 4. CONCLUSÃO Os resultados obtidos por este estudo, referentes à falta de informação da população à infecção, suas formas de prevenção, somada à alta freqüência de soropositividade para toxoplasmose encontrada, permitem sugerir que sejam adotadas medidas de prevenção primária à toda população, através da instituição de campanhas educativas pelos órgãos competentes, reduzindo, assim, o risco de transmissão vertical da infecção toxoplásmica. Comprovou-se que o contato com gatos não representa fator de risco para infecção humana, embora tenha sido citado pela maioria das gestantes como principal fonte de infecção, o que também, precisa ser desmistificado junto à população. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACHA, P.N., SZYFRES, B. Zoonosis y enfermedades transmissibles comunes al hombre y a los animales. OPS/OMS, 2 ed. Publ. Cient. nº 503. p , AVELINO, M. M., CAMPOS JUNIOR, D., PARADA, J. B., CASTRO, A. M. Risk factors for Toxoplasma gondii infection in women of childbearing age. Braz. J. Infect. Dis., v.8, n.2, Salvador, Apri BRACHO, L., SANOJA, C. L., GRANADILLO, A. Seroepidemiology of Toxoplasma gondii Infection in pregnant women. Maracaibo dic.,v. 29, n. 2,2001. COOK, A. J., GILBERT, R. E., BUFFOLANO, W., ZUFFEREY, J., PETERSEN, E., JENUM, P.A., FOULON, W., SEMPRINI, A. E., DUNN, D.T. Sources of toxoplasma infection in pregnant women: European multicentre case-control study. European Research Network on Congenital Toxoplasmosis. B. M.J., v.321, p , GANLEY, J.P., COMSTOCK, G.W. Association of cats and toxoplasmosis. Am. J. Epid. 111: , JEFFREY, J. L., LOPEZ, A., WILSON, M., SCHULKIN, J., GIBBS, R. Congenital toxoplasmosis: a review. Obstet. Gynecol. Surv., n.56, p , KAPPERUD, G., JENUM, P..A., STRAY-PEDERSEN, B., MELBY, K. K., ESKILD, A., ENG, J. Risk factors for toxoplasma gondii infection in pregnancy: results of a prospective case-control study in Norway. Obstet. Gynecol. Surv., 52:158-9, MEIRELLES FILHO, J. Toxoplasmose e gravidez: inquérito sorológico em gestantes e seus recém nascidos na maternidade Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro. J. Bras. Ginecol., 95: ,1985. NEVES, D. A., MELO, A. L., GENARO, O., LINARDI, P.M. Parasitologia Humana.10 ed. São Paulo:Atheneu,p ,2000. PEYRON, F., WALLON, M., LIOU, C., GARNER, P. Treatments for toxoplasmosis in pregnancy. Cochrane Database Syst. Rev. ;( 2): CD001684, SÁFADI, M. A. P., BEREZIN, E. N., FARHAT, C. K., CARVALHO, E. S. Clinical presentation and follow up of children with congenital toxoplasmosis in Brazil. Braz. J. Infect Dis., n.7, p , 2003.

5 SPALDING, S.M., AMENDOEIRA, M.R.R., KLEIN, C.H., RIBEIRO, L.C. Serological screening and toxoplasmosis exposure factors among women in South of Brazil.Rev. Bras. Med. Trop., v.38, n.2, Uberaba, Mar/Apri.,2003. VARELLA, I.S. WAGNER, M.B., DARELA, A.C., NUNES, L.M., MÜLLER, R.W, Prevalência de soropositividade para toxoplasmose em gestantes.j.de Ped.,v.79, n.1, Jan. /Fev VAZ, A. J., GUERRA, E. M., FERRATO, L.C.C., TOLEDO, L. A. S., AZEVEDO NETO, R. S. Sorologia positiva para sífilis, toxoplasmose e doença de chagas em gestantes de primeira consulta em centros de saúde da área metropolitana, Brasil. Rev. Saúde Pública, 24: ,1990.