PARECER 105/2011. Versam os autos acerca de recurso ao plenário formulado por Afonso de Oliveira.

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1 PARECER 105/2011 PROCESSO: 11/ SOCIEDADE LIMITADA. MEAÇÃO. INGRESSO DE EX-CÔNJUGE NO QUADRO SOCIETÁRIO. NÃO CONCORDÂNCIA DOS DEMAIS SÓCIOS. IMPOSSILIDADE. INTELIGÊNCIA DOS ARTS E 1027 DO CÓDIGO CIVIL. IMPROCEDÊNCIA. Versam os autos acerca de recurso ao plenário formulado por Afonso de Oliveira. Relata o recorrente que era casado com Alcioné Madeira, sócia detentora de 25% do capital social da sociedade empresária Plasticom Plásticos Indústria e Comércio Ltda., e que em 2005 ajuizaram ação de separação judicial, cuja sentença homologatória transitou em julgado no dia 19 de setembro daquele mesmo ano. Alega que pelo acordo firmado no processo de separação, passou a deter 50% das cotas sociais pertencentes à ex-esposa, ou seja, 12,5% da composição acionária da empresa Plasticom. Sustenta que embora tenha trazido a arquivo perante esta JUCESC a competente carta de sentença, não foi procedida à alteração social nos quadros da empresa Plasticom, e que após a averbação da sentença ocorreram duas mudanças importantes no contrato social da empresa sem a sua ciência. Aduz que a decisão judicial que homologou o acordo de separação judicial implicou na modificação do contrato social para que fosse incluído como sócio da empresa. Alega também que tais alterações podem ser equiparadas a falsidade documental justificando a suspensão dos atos administrativos lançados 1

2 após a averbação da sentença (05/02/2009) e futuros atos que vierem a registro até o julgamento do recurso. Reitera que em respeito ao art. 46 do decreto 1800/96 arquivou documento de interesse da sociedade empresária, a referida carta de sentença, mas que os sócios da empresa deixaram de proceder à alteração societária. Requer, assim, a sustação/suspensão imediata, com devido bloqueio no espelho e/ou no registro da empresa de todas as alterações contratuais registradas posteriormente a averbação da decisão judicial, e ainda, a sustação/suspensão de todos os atos futuros que venham a ser levados a registro até o julgamento do recurso, e, ao final, a anulação de todos os atos praticados. Em sede de contra-razões, por sua vez, João Madeira Junior, Luiz Geraldo Madeira, Laerte Madeira, Alcione Madeira e a empresa Plasticom Plásticos Indústria e Comércio Ltda., alegam que o recorrente jamais adquiriu a condição de sócio. Destacam que a Plasticom Plásticos Indústria e Comércio Ltda. tem caráter intuiti personae, é e sempre foi uma sociedade familiar, e que em nenhum momento foi admitido ou consentido no quadro social alguém que não fosse da família, conforme previsão da cláusula 14ª do contrato social, que estabelece que na hipótese de cessão de cotas, os sócios terão direito de preferência na aquisição das cotas, estando condicionada ao consentimento dos demais sócios a cessão para terceiros. E ainda, que o contrato social prevê na cláusula 16ª a regência supletiva pelas normas da sociedade simples. Alegam que o instrumento de partilha é assinado apenas pelos cônjuges, sem participação dos demais sócios da empresa, que a referida decisão judicial não faz qualquer referência à condição de sócio de Afonso de Oliveira, ou seu ingresso no quadro social, e ainda, que a carta sentença não contém determinação para que a Junta Comercial altere o contrato social da Plasticom. Invocam a aplicação dos arts. 987 e 1027 do Código Civil. Revelam que Afonso de Oliveira era contratado na condição de empregado da empresa Plasticom, nada mais, e que no dia 05/01/09 o recorrente notificou os sócios por escrito solicitando sua inclusão no quadro 2

3 societário, sendo prontamente respondido que jamais concordaram em ter um estranho no quadro social. Por fim, pugnam pela rejeição dos pedidos do recorrente, reconhecendo a impossibilidade do seu ingresso nos quadros sociais da Sociedade Plasticom Plásticos Indústria e Comércio Ltda., mantendo os atos praticados e registrados, bem como, reconheça a possibilidade prática de todos os atos societários futuros se de acordo com a legislação vigente. É o relatório Inicialmente, cumpre esclarecer que às Juntas Comerciais cabe apenas a análise formal dos atos trazidos a arquivo, e, no caso em tela, a atuação desta JUCESC observou fielmente as prescrições legais previstas pelo ordenamento jurídico vigente. Desta feita, cabia a JUCESC apenas o arquivamento da carta de sentença conforme requerido pelo recorrente, na forma do art. 46 e art. 47 do Decreto n.º 1.800/96, in verbis: Art. 46. Os documentos de interesse do empresário ou da empresa mercantil serão levados a arquivamento mediante requerimento do titular, sócio, administrador ou representante legal. Art. 47. Nos casos de decisão judicial, a comunicação do juízo alusiva ao ato será, para conhecimento de terceiros, arquivada pela Junta Comercial, mas os interessados, quando a decisão alterar dados da empresa mercantil, deverão providenciar também o arquivamento de instrumento próprio, acompanhado de certidão de inteiro teor da sentença que o motivou, transitada em julgado. Assim, era de responsabilidade dos interessados providenciar a alteração contratual para ingresso do recorrente no quadro social da empresa, caso fosse do interesse dos mesmos. Não obstante isso, entendo que não assiste razão ao recorrente quando alega que a sentença que homologou o acordo de separação conferiu-lhe a condição de sócio da empresa Plasticom. É fato incontroverso ter o casal se separado judicialmente, com partilha, em partes iguais, das quotas sociais da sociedade da qual a esposa é sócia. No entanto, o Código Civil freia a pretensão dos sucessores do cônjuge sócio falecido ou separado judicial ou extrajudicialmente, de exigirem a parte que lhes couber na quota social, ficando diferido este direito 3

4 para um momento posterior, podendo perceber a divisão periódica dos lucros, até a liquidação da sociedade, de modo a manter incólume o patrimônio da sociedade e barrando o ingresso de estranhos sem nenhuma affectio societatis. É texto expresso do artigo do Código Civil que: Art Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade. O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de decidir que a ação de apuração de haveres em sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada cabe somente a quem dela seja sócio, não se equiparando a tal quem adquire quotas de outro sócio, ainda que por partilha em dissolução de casamento pelo regime da comunhão de bens. Extrai-se do corpo do acórdão o seguinte trecho do voto do Min. Dias Trindade: O fato da partilha, contudo, não faz sócio o ex-marido da sócia, dado que não é apenas a aquisição de quotas que impõe a admissão societária, pois que necessário se apresenta o consentimento dos demais sócios e, em complementação, o arquivamento na Junta Comercial da alteração do contrato (REsp. nº RJ, 3ª Turma, rel. Min. Dias Trindade, j ). É que uma das principais características das sociedades limitadas é o fato de que as mesmas são organizadas em torno da qualidade pessoal dos sócios que a compõe, não sendo possível a admissão de novos sócios, sem a prévia aquiescência dos demais, tanto que o Código Civil, ao tratar do assunto dispõe: Art A cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade. Tal disposição vem ao encontro do primado constitucional estabelecido no art. 5º, XX, da CF, no sentido de que ninguém será compelido a associar-se ou a manter-se associado. Assim, o sócio tem a liberdade de a qualquer tempo retirarse da pessoa jurídica, todavia, aos sócios que regularmente constituem a pessoa jurídica assiste o direito de rejeitar o ingresso de novos participantes. 4

5 Santa Catarina: Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal de Justiça de AGRAVO DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PARTILHA DE COTAS SOCIAIS. DETERMINADA INCLUSÃO DO ESPÓLIO DA CÔNJUGE-VIRAGO NA SOCIEDADE. I MEAÇÃO NA PORCENTAGEM DE 25% DO CAPITAL SOCIAL. INVIABILIDADE. VARÃO QUE NÃO DETÉM MAIS A METADE DOS DIREITOS SOBRE A EMPRESA. AUMENTO DO CAPITAL SOCIAL POR APORTE DE VERBA EXCLUSIVA DO OUTRO SÓCIO. II INTEGRAÇÃO AO QUADRO SOCIETÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CONCORDÂNCIA DO SÓCIO NÃO ENVOLVIDO OU DE AUTORIZAÇÃO DO CONTRATO SOCIAL. NECESSIDADE DE RESPEITO AO AFFECTIO SOCIETATIS. PARTICIPAÇÃO EXCLUSIVAMENTE NOS PROVEITOS ECONÔMICOS. EXEGESE DO ART DO CC. III DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I Inconteste o aumento do capital social por aporte de recursos exclusivos do outro sócio, descabe pretender a meação de 50% (cinquenta por cento) sobre aquela base, muito embora este fosse o percentual do varão à época do matrimônio, devendo a meação ser calculada sobre as cotas atualmente pertencentes a este. II Na ausência de aquiescência dos demais sócios ou de permissão no contrato social, é vedado o ingresso da virago meeira (ou de seu espólio) no quadro societário da empresa que tem como sócio o varão, sob pena de violação da affectio societatis, devendo esta participar tão-somente nos resultados patrimoniais apurados, na medida das cotas representativas de sua meação, nos moldes do que dispõe o art do Código Civil. Do corpo do acórdão se extrai: Em regra, não pode o magistrado determinar seja o cônjuge-meeiro (ou seus herdeiros) integrado à sociedade, passando à condição de sócio da empresa, pois imprescindível a concordância dos demais sócios, sob pena de desrespeito ao affectio societatis. Vale dizer - não pode a partilha de bens determinada em sede de separação judicial atingir e interferir em direito de terceiros, alheios à sociedade conjugal finda. Não se cogita na espécie, por outro lado, da existência de previsão no contrato social acerca da possibilidade de ingresso de terceiros em caso de dissolução da sociedade conjugal, separação ou meação de patrimônio - hipótese excepcional de admissão da inclusão do meeiro. O contrato social, conforme oitava alteração contratual (fl. 103), prevê somente o ingresso dos herdeiros e sucessores no caso de falecimento do sócio e, ainda nesse caso, mediante aquiescência do participante remanescente (cláusula 21). Em situações tais, ainda que não se sane todos os inconvenientes da partilha destes bens peculiares, a única solução admissível e condizente com o necessário resguardo dos direitos dos demais sócios é a formação de espécie de "subsociedade" ou "sociedade interna" formada pelos ex-cônjuges (ou com os sucessores destes) para representar as cotas que devem ser partilhadas. A sociedade continua a ser representada por aquele consorte que integra o quadro social, não havendo interferência externa na vontade social, mas os resultados patrimoniais são repassados a ambos, na medida de sua participação na subsociedade. Isto é, entre os separandos deve haver a divisão periódica dos lucros da empresa, proporcionalmente às quotas partilhadas, o mesmo ocorrendo em caso de liquidação da pessoa jurídica ou alienação da quota-parte. Não há, porém, modificação do quadro social da empresa. 5

6 Nesse sentido, a jurisprudência pátria: I) APELAÇÃO CÍVEL. OPOSIÇÃO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COMERCIAL. OPOENTE PRETENDENDO PARTICIPAR NA SOCIEDADE EM QUE EX-CÔNJUGE ERA QUOTISTA. INEXISTÊNCIA DA AFFECTIO SOCIETATIS. RECURSO NÃO PROVIDO. A sociedade não pode ser compelida a aceitar como quotista ex-esposa de um dos sócios, tão somente pelo fato de terem sido casados pelo regime de comunhão universal de bens; esse regime assegura o direito dela perceber metade da participação do ex-cônjuge, e não de integrar a sociedade. [...] (TJSC, AC n , de Blumenau. Relator: Des. SÉRGIO IZIDORO HEIL, j em: ). II) AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA. DIREITO SOCIETÁRIO. PRETENSÃO VOLTADA AO LEVANTAMENTO CONTÁBIL DA MOVIMENTAÇÃO PATRIMONIAL DE PESSOAS JURÍDICAS, A FIM DE ESTIMAR O EFETIVO VALOR ECONÔMICO DAS RESPECTIVAS COTAS. DECISÃO SANEADORA INDEFERINDO PRELIMINAR INVOCADA PELAS DEMANDADAS. INSURGÊNCIA. REJEIÇÃO. DEMANDA MOVIDA POR EX-ESPOSA DE UM DOS SÓCIOS DAS LIMITADAS, A QUAL RECEBEU PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA POR PARTILHA REALIZADA EM SEDE DE AÇÃO DE DIVÓRCIO. POSSIBILIDADE DE ACESSO AOS LIVROS CONTÁBEIS E DEMAIS DADOS NECESSÁRIOS À QUANTIFICAÇÃO DO EFETIVO VALOR DO PATRIMÔNIO RECEBIDO PERANTE O ANTIGO CÔNJUGE (ART. 382 DO CPC). PROVIDÊNCIA, ADEMAIS, QUE, UMA VEZ NÃO ATENDIDA, INVIABILIZARÁ O EXERCÍCIO DOS DIREITOS TITULARIZADOS PELA AGRAVANTE. LEGITIMIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS RECORRENTES PARA RESIDIREM NO PÓLO PASSIVO DA ASSECURATÓRIA. PRECEDENTE DO STJ. INTERLOCUTÓRIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Diante das novas disposição introduzidas pelo Código Civil de 2002, fica evidente que a "meeira das cotas" não pode obrigar a sociedade, quer a aceitá-la em seus quadros, face a ineficácia da transação perante a pessoa jurídica nos termos do art do CC/2002, quer a apurar e consequentemente pagar os direitos societários que aquela adquiriu perante o ex-cônjuge (art do CC/2002), devendo aguardar a liquidação integral da sociedade ou das cotas titularizadas pelo último. De todo modo, tal entendimento não constitui óbice ao levantamento do efetivo valor patrimonial das cotas partilhadas e titularizadas pela ex-mulher do sócio, pois a ela, inegavelmente, compete o direito de apurar o quantum correspondente aos direitos que adquiriu. E, apurada a quantia, embora a meeira nada possa exigir das sociedades, poderá postular o adimplemento pelo ex-marido, ou, ainda, alienar os aludidos direitos a terceiros, eventualmente interessados na respectiva aquisição. (TJSC. AI n , de Joaçaba, rel. Des. MARCO AURÉLIO GASTALDI BUZZI, publicado em ) III) APELAÇÃO CÍVEL. MEDIDA CAUTELAR DE SEQUESTRO. SOBREPARTILHA. A PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA DE UM DOS CONSORTES, MESMO CASADO SOB O REGIME DA COMUNHÃO DE BENS, PODE SER PARTILHADA MEDIANTE A FORMAÇÃO DE UMA SOCIEDADE COM O OUTRO CÔNJUGE, ALUSIVA AO SEU QUINHÃO SOCIETÁRIO. NÃO HÁ INGRESSO DO OUTRO CÔNJUGE NA SOCIEDADE, MAS PODERÁ EXERCER DIREITOS SOBRE AS QUOTAS DO CÔNJUGE/SÓCIO, DENTRE ELES O DE PARTICIPAR DOS RESPECTIVOS LUCROS SOCIAIS, E PARTICIPAR NO ACERVO SOCIAL QUE FOR APURADO QUANDO LIQUIDADA A SOCIEDADE, TOMAR PARTE NA ADMINISTRACAO, COMO PREPOSTO DO SÓCIO OU COM A TOLERÂNCIA DOS DEMAIS SÓCIOS E PUGNAR PELA APURAÇÃO DE HAVERES 6

7 DAQUELA FRAÇÃO SOCIETÁRIA A QUE SE ASSOCIOU, VISLUMBRANDO, ASSIM, ENCERRAR AQUELA SUBPARTICIPAÇÃO. NEGARAM PROVIMENTO A AMBOS OS APELOS. (TJRS, AC nº , Sétima Câmara Cível, Relator: LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, j. em ). (Agravo de Instrumento n , de Balneário Camboriú,Relator: Juiz Henry Petry Junior) Além disso, a cláusula 6ª da constituição da sociedade convencionou que no caso de retirada de sócio, os sócios remanescentes teriam o direito de preferência na aquisição das cotas sociais do sócio retirante. Ressaltando ainda que tal disposição contratual nunca foi modificada pelos sócios, tendo sido mantida em todas as alterações posteriores, conforme se depreende da cláusula 14ª das alterações contratuais da empresa Plasticom. Tal cláusual reforça o caráter intuitu personae da sociedade. Assim, o acordo judicial de separação consensual não se sobrepõe ao contrato social, não podendo o recorrente exigir que os demais sócios aceitem sua inclusão no quadro social da empresa. Por fim, cabe ressaltar que não há qualquer nulidade nos atos contratuais trazidos a registro posteriormente à averbação da carta de sentença homologatória da separação judicial. Desta feita, opino pela IMPROCEDÊNCIA do recurso. É o parecer. Florianópolis, 06 de setembro de MICHELLE OLIVEIRA DA SILVA GUERRA PROCURADORA JURÍDICA - OAB/SC