Documentário (DOCPOP).
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- Sofia Maranhão Cabral
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1 DOCUMENTÁRIO LIXO EXTRAORDINÁRIO: REPRESENTAÇÕES, CULTURA E SOCIABILIDADES DOS CATADORES DE MATERIAL RECICLÁVEL DE JARDIM GRAMACHO. Priscylla Leite de Moraes 1 Maria Clara Tomaz Machado 2 O presente trabalho busca compreender a relação entre história e arte, através do vídeo documentário Lixo Extraordinário e das fotografias produzidas pelo artista plástico Vik Muniz no aterro sanitário Jardim Gramacho, local onde milhares de pessoas tiravam o seu sustento. Através dessas ferramentas imagéticas o artista evidenciou a vida dessas pessoas assim como suas perspectivas e angústias. Ao mudar o foco historiográfico para o micro, e não mais dos grandes acontecimentos, a história passa a buscar novas fontes de pesquisa: objetos culturais, mentalidades, passam a ser buscados intensivamente para descobrir novas histórias, com isso as ferramentas imagéticas tornam-se importantes para a documentação histórica. Iremos seguir a perspectiva da escola dos Annales, pioneiros a falar na busca pelas fontes, para investigar problemáticas e escrever este projeto. Utilizando as narrativas filmográfica e fotográfica para tal estudo. Paralelo a isso estará em foco as relações de afetividade contidas no aterro, as lutas da Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano Jardim Gramacho (ACAMJG) para se manter naquele local, por melhores condições de trabalho, e como as narrativas historiográfica e fílmica podem retratar esta problemática por meio do diálogo com os sujeitos sociais em cena. Durante certo tempo a história se preocupou em encontrar a verdade por trás dos acontecimentos históricos, com o surgimento do movimento dos Annales na França esse foco passa a ser a interpretação da sociedade, com isso surge à necessidade da busca de novas 1 Graduanda em História pela Universidade Federal de Uberlândia. Bolsista pelo Laboratório de Pesquisa em Cultura Popular e Vídeo Documentário (DOCPOP). 2 Universidade Federal de Uberlândia. Coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Cultura Popular e Vídeo Documentário (DOCPOP). 1
2 fontes, cujos recursos imagéticos serão requisitados dentre eles: o cinema, a imagem, a imagem técnica, o rádio, a televisão. E este trabalho terá como objetos de análise o vídeo documentário intitulado Lixo Extraordinário e as fotografias produzidas pelo artista plástico brasileiro consagrado internacionalmente Vik Muniz 3. Em ambos os trabalhos (fotografia e documentário) há uma característica de criar representações sobre a realidade com seus resultados chegou a chocar espectador. Tal como tratado pelo filósofo Roland Barthes, nas imagens há sempre um spectrum, passado pelo autor e um punctum, encontrado por quem assiste à obra, cujos significados dependem da experiência, da subjetividade e do contexto histórico daqueles que a aderiram. 4 A grande maioria das pessoas que tiveram contato com o trabalho de Vik relata que se impressionam com as fotografias, até porque o lixo é algo utilizado por toda sociedade, desde os mais pobres até os mais ricos, e perceber como pessoas vivem desse material é algo chocante para quem descarta, essa preocupação social com os materiais recicláveis é recente, porém tem sido foco de diversos estudos, devido à preocupação com a contaminação do solo, dos lençóis freáticos e nascentes de rios abrindo espaço para a consciência ecológica e o desenvolvimento da legislação ambiental. Nesse viés, o lixo que será transformado em matéria prima com a reciclagem, transforma também a vida de milhares de trabalhadores que sofreram com o encolhimento do número de empregos formais: Como conseqüência, um número cada vez maior de pessoas perdeu suas fontes tradicionais de remuneração, encontrando-se diante da necessidade de buscar alternativas. Neste contexto, a rua constituiu-se como um espaço dentro do mercado de trabalho que parecia abrir suas portas aos trabalhadores desempregados. Assim, o 3 Responsável por diversos trabalhos como Crianças de Açúcar, Monaliza de Geleia, e também quadros de chocolate como a capa do CD do grupo Tribalistas, e também de lixo, capa da novela global Passione, e do documentário Lixo Extraordinário, foco deste trabalho 4 BARTHES, Roland. A câmara clara. São Paulo: Ed. Nova Fronteira,
3 trabalho dos catadores aparece como uma das diversas formas que hoje fazem da rua seu lugar de trabalho ( pp ). 5 Nesse contexto Vik decide conhecer um pouco mais da vida de quem é responsável por reaproveitar essa matéria-prima criando o vídeo documentário Lixo Extraordinário. Nele retrata o descaso da sociedade com os catadores de lixo. Como tentativa de reverter esta situação ele utiliza o material de trabalho da vida dos catadores com a intenção de contribuir para mudança de suas vidas, transformando lixo em arte. Desse modo, materiais descartados pela sociedade como melissas, baldes, etc. irão se transformar em brilhantes quadros que evidenciam a vida dos catadores de Gramacho que lutavam todos os dias por melhores condições de vida, e que sem perceber formam uma identificação cultural, prova disso é a Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano Jardim Gramacho (ACAMJG). O trabalho que o artista faz se assemelha muito a pesquisa historiográfica com recursos imagéticos que busca retratar a cultura através de filmes, imagens, músicas, etc. A única questão é se há um compromisso da estética abstrata com a verdade que a história visa na sua produção de conhecimento sobre uma dada realidade. Nesse viés, o lixo que será transformado em matéria prima com a reciclagem, transforma também a vida de milhares de trabalhadores que sofreram com o encolhimento do número de empregos formais: Como conseqüência, um número cada vez maior de pessoas perdeu suas fontes tradicionais de remuneração, encontrando-se diante da necessidade de buscar alternativas. Neste contexto, a rua constituiu-se como um espaço dentro do mercado de trabalho que parecia abrir suas portas aos trabalhadores desempregados. Assim, o trabalho dos catadores aparece como uma das diversas formas que hoje fazem da rua seu lugar de trabalho. 6 5 GORBÁN, Débora 6 GORBÁN, Débora. 3
4 O contexto histórico trabalhado é retratado pela primeira vez, segundo o historiador Antônio de Pádua Bosi por volta de 1947 na obra de Manuel Bandeira O Bicho, que retratava a vida de pessoas que caçavam comida no lixo, mas ainda sem fins lucrativos. Apenas por volta de 1970 com o surgimento de tecnologias disponíveis para a reciclagem, a cata desses materiais passa a visar o lucro, como retrata Plínio Marcos em 1978, na peça de teatro Homens de Papel : Nela, salientou os conflitos entre Berrão, que comprava e revendia papel para reciclagem, e diversos catadores que recolhiam o material em sacos. Na rotina diária da catação de papel, os catadores tentavam disputar com Berrão o controle sobre o trabalho. 7 De lá para cá o número de pessoas que sobrevivem dessa prática aumentou drasticamente, principalmente após a preocupação com a contaminação do solo, dos lençóis freáticos e nascentes de rios, abrindo espaço para a consciência ecológica e o desenvolvimento da legislação ambiental. Essa nova profissão irá enfrentar vários problemas, o primeiro a acentuar é o da informalidade de seu trabalho, que não lhe oferece os devidos direitos legislativos como nas demais profissões. O segundo é a descriminação social em relação a essas pessoas, que, por trabalharem com o lixo, são mal vistas pela sociedade que joga de escanteio esses trabalhadores por não estarem nos padrões adequados de roupas e cheiros. A questão da saúde dos catadores no aterro também é algo preocupante visto que o lixo é fonte de transmissão de muitas doenças como leptospirose, tétano, dengue, febre tifóide, cólera, esquistossomose, câncer, intoxicação, alteração do ciclo menstrual, malária, etc. Ao criar personagens Muniz procura associá-los as atividades que eles desenvolviam no trabalho ou nas relações afetivas e de gênero que perpassam a realidade deles como a mulher que conta de sua trajetória com seus filhos e que é fotografada como mãe, Tião que é visto como revolucionário colocasse como o suicídio de Marat, a mulher que criou uma alternativa de trabalho em cozinhar para os catadores é a cozinheira. 7 BOSI, Antônio de Pádua 4
5 Alguns episódios retratados no filme mostram também através das memórias das pessoas elementos sociais presentes na periferia como o relato de pessoas sobre o assalto em que levaram ,00 que os catadores haviam ganhado após um dia de trabalho. E outros como o relato de uma personagem que viu um bebê morto no lixão. Além de aparelhos tecnológicos desprezados pela classe média são exaltados por estas pessoas, por exemplo, a empolgação dos catadores ao verem um gravador de voz no lixão. No lixo podemos perceber a diferença de classes, pois aparelhos descartados por outras pessoas são valorizados pelos catadores, além do que podemos deduzir de qual classe social vem uma melissa e a qual classe social pertence um aparelho celular com touch screen. É percebendo esta realidade através de livros também descartados por outras pessoas de Nietzsche e Maquiavel que Tião Santos decide formar a ACAMJG Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho e torna-se presidente. Atualmente as ferramentas imagéticas tem sido um grande material de apoio para a pesquisa historiográfica, pois podemos utilizá-las para compreender a sociedade inovando as formas de registro das experiências vividas por anônimos e excluídas sociais, mas sempre vinculado aos textos, por isso o vídeo documentário torna-se uma das melhores formas de registro das experiências de vida. E assim como o documentário as obras de arte as imagens também são responsáveis por definir o mundo em que vivemos. Referências bibliográficas AMENGUEL, Barthélémy. Chaves do cinema. São Paulo: Civilização Brasileira. ARNHEIM, R. A arte do cinema. Lisboa: Ed AGEL, H. Estética do cinema. São Paulo: Cultrix, BARTHES, Roland. A câmara clara. São Paulo: Ed. Nova Fronteira, O óbvio e o obtuso. São Paulo: Ed. Nova Fronteira, BERNARDET, Jean-Claude. Cinema Brasileiro: propostas para uma história. São Paulo: Cia das Letras,
6 . O olhar e a cena: melodrama, Hollywood, Cinema Novo. São Paulo: Cosac Naify, O que é cinema. São Paulo: Brasiliense. BURKE, Peter. A escola dos Annales ( ): A Revolução Francesa da Historiografia. São Paulo: Edunesp, CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL, FERRO, Marc. Cinema e história. Rio de Janeiro: Paz e terra, GINSBURG, Carlo. Mitos emblemas e sinais: morfologia e história. São Paulo: Cia das Letras, O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela inquisição. São Paulo: Cia das Letras, LE GOFF, Jacques e NORA, Pierre (org). História: novos problemas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, MACHADO, Maria Clara Tomaz e PATRIOTA, Rosangela Ramos (org.) Política, Cultura e Movimentos Sociais: Contemporaneidades historiografias. Uberlândia: Ed. UFU, MARTINEZ, Paulo Henrique. O sentido da devastação: para uma história ambiental no Brasil: Esboço, Florianópolis, nº13, MUNIZ, Vik. Reflex: Vik Muniz de A a Z. São Paulo: Cosac Naif, Vik Muniz: Obra Completa Rio de Janeiro: Capivara, PARANHOS, Kátia e outros (org.). História e imagens: textos visuais e práticas de leituras. Campinas SP; Mercado de Letras, 2010; Lendo imagens. São Paulo: Cia das Letras,
7 PELEGRINI, Sandra. Cultura e natureza: os desafios das práticas preservacionistas na esfera do patrimônio cultural e ambiental. Revista Brasileira de História. São Paulo, n. 26, n 51, PESAVENTO, Sandra Jatahy (org.) História e linguagens: texto, imagem, oralidade e representações. Rio de Janeiro: 7 letras, História e História Cultural. Belo Horizonte: Autêntica, RAMOS, Alcides Freire, CAPEL, Heloísa Selma Fernandes e PATRIOTA, Rosangela Ramos (org.) Criações artísticas, representações da História. São Paulo: HUCITEC, RAMOS, Fernão Pessoa. Mas afinal... o que é mesmo documentário? São Paulo: Editora SENAC São Paulo, REVEL, Jacques. Proposições: Ensaios de história e historiografia. Rio de Janeiro: Eduerj, ROGER, Chartier. À beira da falésia: a história entre certezas e inquietudes. Porto Alegre: Ed. UFRGS, ROSENDAHL, Zeny (org.) Paisagem, tempo, cultura. Rio de Janeiro: Ed. UERJ,
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