Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte

Transcrição

1 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte Procedimento Ordinário nº: Autor: F.C.L.N. Réu: Delphi Engenharia Ltda e Horizonte Macaíba Empreendimento Imobiliário Ltda DECISÃO F.C.L.N., já qualificado nos autos, via advogado legalmente constituído, ingressou perante este Juízo com AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PAGAS C/C PERDAS E DANOS C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA em desfavor de Delphi Engenharia Ltda e Horizonte Macaíba Empreendimento Imobiliário Ltda, também qualificados, alegando, em síntese, que: a) firmou com as parte rés contrato de promessa de compra e venda, tendo como objeto a unidade imobiliária descrita na inicial; b) pagou até a presente data o correspondente a R$ ,69 (quarenta e cinco mil quinhentos e quarenta e cinco reais e sessenta e nove centavos); c) o imóvel tinha previsão de entrega para o dia 20 de dezembro de 2011; e, d) sentindo-se lesado e desrespeitado, não vislumbrou outra alternativa senão procurar o judiciário, a fim de rescindir o contrato retromencionado. Escorada nos fatos narrados, a parte autora requer a concessão de medida liminar visando: a) a rescisão do contrato em lide; b) a devolução imediata, pelas rés, de todos os valores pagos devidamente corrigidos, como também, multa compensatória pela rescisão contratual, totalizando o importe de R$ ,75 (oitenta e quatro mil novecentos e vinte e um reais setenta e cinco reais) (planilha de fl. 20); c) a suspensão de cobranças relativas as obrigações reais do imóvel, tais como: taxa condominial, IPTU, encargos condominiais extraordinários, iluminação e limpeza pública, dentre outros;

2 d) a suspensão da cobrança das parcelas vincendas; e, e) que a parte demandada seja compelida a se abster de incluir o nome do autor nos cadastros restritivos de crédito. É o que importa relatar. Fundamento e decido. Do passeio realizado nos autos, não vislumbro a presença dos requisitos autorizadores da concessão da tutela antecipada no que toca ao pedido de rescisão contratual, por não vislumbrar perigo de dano irreparável e ou de difícil reparação. Quanto ao pedido de devolução dos valores pagos, ou da parcela incontroversa, verifico a irreversibilidade ou melhor, dificuldade para se reverter a medida que determinasse a devolução imediata de quantia em dinheiro, pois não haveria a mínima garantia de cumprimento da sentença que posteriormente não confirmasse a medida liminar. Como reforço, eis a dicção da jurisprudência: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL. TUTELA ANTECIPADA. LIBERAÇÃO DO SALDO DO FGTS VINCULADO AO CONTRATO. DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO NÃO DEMONSTRADOS. RISCO DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. A concessão de tutela antecipada exige prova inequívoca da possível lesão ou prejuízo ao direito do acionante, bem como da verossimilhança dos fatos alegados. No caso, não se verifica suficientemente demonstrada essa situação, considerando que não há indícios de que a não liberação do saldo do FGTS vinculado ao contrato, cuja resolução é buscada, possa causar dano irreparável ou de difícil reparação. Hipótese, ademais, em que, por se tratar de disponibilização de dinheiro, o deferimento da tutela antecipada poderia gerar perigo de irreversibilidade da medida.inteligência do artigo 273 do CPC. Precedentes jurisprudenciais. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO, ANTE A SUA MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. (Agravo de Instrumento Nº , Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 29/11/2012). Por outro lado, entendo ser cabível a suspensão das parcelas vincendas, haja vista que presente a verossimilhança e a prova inequívoca da alegação. Entendo inexistir razão para que a parte autora continue adimplindo um contrato que vem sendo descumprido pela parte ré há mais de dois ano, dando origem à presente ação de rescisão contratual. Além disso, é muito exigir do consumidor que seja adimplente com as parcelas que possivelmente serão objeto de devolução pela parte ré.

3 Saliente-se que também está presente o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, visto que a parte autora vem sendo obrigada a suportar uma parcela mensal que prejudica o seu orçamento doméstico. Some-se que não há perigo de irreversibilidade da medida pretendida, pois, acaso se comprove nos autos que a parte autora não observou os devidos trâmites legais para resilir/denunciar o pacto, o status quo poderá ser reestabelecido com a revogação da decisão. Nesta vertente: PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DE PARCELAS VINCENDAS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. 1. ADMITE-SE A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS PARCELAS VINCENDAS, QUANDO A PRETENSÃO POSTA EM JUÍZO OBJETIVA A RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA, RELATIVO A IMÓVEL QUE NÃO OBSERVA OS ITENS CONSTANTES DO MEMORIAL DESCRITIVO, TAL COMO INFORMADO POR OCASIÃO DO NEGÓCIO AOS CONSUMIDORES. 2. A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS PARCELAS VINCENDAS EM NADA PREJUDICA A PRETENSÃO DA CONSTRUTORA EM RECEBER EVENTUAIS VALORES DEVIDOS A TÍTULO DE CLÁUSULA PENAL, NÃO HAVENDO QUALQUER PERIGO DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. 3. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-DF - AGI: DF , Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Data de Julgamento: 12/06/2013, 3ª Turma Cível). Cabe, ainda, asseverar que a efetiva posse do imóvel, com a entrega das chaves, define o momento a partir do qual surge para o condômino a obrigação de efetuar o pagamento de todas as despesas decorrentes de seu imóvel, tais como: taxa condominial, IPTU, encargos condominiais extraordinários, iluminação e limpeza pública. Somente quando já tenha recebido as chaves passando a ter a possibilidade de assumir a posse direta do bem, é que se reconhece a responsabilidade do promitente comprador de unidade autônoma quanto às obrigações referentes aos apontados encargos. Essa é a orientação jurisprudencial que vem se firmando, conforme se infere do seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: "DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DESPESAS CONDOMINIAIS. COBRANÇA. TERMO INICIAL. POSSE DO IMÓVEL (ENTREGA DAS CHAVES).

4 1. Iterativos julgados desta Corte dão conta de que a obrigação de pagar as despesas condominiais surge a partir da posse, a qual se dá com a entrega das chaves. 2. Recurso especial a que se dá provimento." (STJ - Resp n.º Rel. Des. Honildo Amaral de Mello Castro [convocado] Publicação: DJe 04/08/2010). No mesmo sentido: "EMENTA: INDENIZAÇÃO - COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - CDC - PRAZO DE ENTREGA - INOBSERVÂNCIA - MULTA PACTUADA - EXIGIBILIDADE - TAXA DE CONDOMÍNIO E IPTU - RESPONSABILIDADE VENDEDOR ATÉ ENTREGA DAS CHAVES - RESTITUIÇÃO SIMPLES. 1. Tratando-se de contrato de adesão, através do qual o promitente comprador aceita uma situação contratual definida de forma prévia e unilateral pela construtora, tal relação jurídica deve ser regulada pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. É devida a multa pelo atraso na entrega do imóvel, se a condição contratual para entrega do bem era o comprador estar em dia com os pagamentos ajustados e não foi comprovada a inadimplência deste. 3. É abusiva e ilegal a cobrança de taxas de condomínio e de IPTU do comprador se este não foi imitido na posse do bem por culpa da construtora. 4. Se as cobranças efetuadas pelo credor resultaram de cláusulas contratuais até então vigentes, não tem lugar a aplicação do preceito do parágrafo único do art. 42 do CDC, ou seja, devolução em dobro dos valores cobrados a maior." (grifos nossos). (TJMG - Apelação Cível /001, Relator(a): Des.(a) Guilherme Luciano Baeta Nunes, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/06/2013, publicação da súmula em 20/06/2013). No caso em mesa, verifica-se que a parte autora ainda não foi imitida na posse do imóvel que é objeto do contrato de promessa de compra e venda realizado com a demandada, tornando inexigível, portanto, o pagamento dos encargos apontados relativos ao bem pela demandante. Ante o exposto, DEFIRO, EM PARTE, A TUTELA PRETENDIDA e, em decorrência, determino que a parte ré suspenda a cobrança das parcelas vincendas, bem como, se abstenha de inserir o nome dos autores nos cadastros de proteção ao crédito, tendo como fundamento as mensalidades do contrato e suas atualizações monetárias e ainda determino a suspensão da cobrança dos encargos apontados, decorrentes das obrigações reais do imóvel, enquanto não forem entregues à parte autora o imóvel em litígio, isso até ulterior deliberação deste Juízo, sob pena de suportar multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais) por cada evento/desconto que configure descumprimento aos termos desta decisão. Cite-se a parte demandada com as advertências legais. Expedientes necessários.

5 Natal/RN, 27 de janeiro de Karyne Chagas de Mendonça Brandão Juíza de Direito