O licenciamento do uso de imagem de atletas profissionais e a criação de elevados passivos fiscais ocultos
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- Caio Padilha Oliveira
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1 O licenciamento do uso de imagem de atletas profissionais e a criação de elevados passivos fiscais ocultos O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Norberto Bobbio A Era dos Direitos. Piraci Oliveira 1 - maio/05 Muito se tem discutido acerca da legalidade do licenciamento do uso de imagem de atletas e treinadores de futebol, sempre com uma visão trabalhista ou cível. Este estudo tem a pretensão de avaliá-lo sob o ponto de vista fiscal, notadamente quanto à criação de passivos fiscais ocultos. 2 Como é consabido, vários clubes de futebol (outras modalidades também a adotam, porém com menor freqüência) têm por rotina a contratação do uso da imagem de atletas e treinadores. Há clubes que estendem esta forma contratual até mesmo a roupeiros e massagistas, o que se deixará a latere tamanho o despropósito destes fatos. Entendem os clubes, e parte da melhor doutrina, que esta forma de contratação é regida pelo Novo Código Civil que em seus artigos 16 e seguintes, 1 Advogado; contabilista; Mestrando em Direito Constitucional; autor do Livro Clubes de Futebol no Brasil Reflexos Fiscais Ed. Mauad 2004; Pós-graduado em Direito do Trabalho; Especialista em Direito Internacional Privado (Haia-Holanda); MBA em Direito Empresarial FVG/Universidade da Califórnia; 2 Entende-se por passivos ocultos a criação de obrigações não contabilizadas geradas, especialmente, por erros de procedimento ou inadequação de atendimento das determinações legais.
2 aliados ao artigo 49 da Lei no /98, conferem possibilidade para esta transação 3, sem que riscos se façam presentes. Ainda assim, desnecessário que se diga, há infindáveis demandas na Justiça do Trabalho questionando justamente a legalidade dessas contratações em face do que se extrai do princípio da primazia da realidade. No que diz respeito às questões fiscais, em recente postura, a Secretaria da Receita Federal, corroborada por julgados de seu Tribunal Administrativo 4, passou a entender que a contratação do uso de imagem de atletas e treinadores, não poder ser realizada por empresa interposta, visto ser impregnada do intuito personae e, portanto, deve necessariamente ser formalizada diretamente com a pessoa física envolvida. Há uma antinomia entre a regra estabelecida (Código Civil) e um princípio de direito, com nítida prevalência a este. A construção lógica aqui tratada pode ser conferida no presente julgado: CESSÃO DO DIREITO AO USO DA IMAGEM CONTRATO DE TRABALHO DE NATUREZA PERSONALÍSSIMA IMPOSSIBILIDADE DE SEREM PROCEDIDAS POR OUTRA PESSOA, JURÍDICA OU FÍSICA PRESTAÇÃO INDIVIDUAL DE SERVIÇOS JOGADOR/TÉCNICO SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA São tributáveis os rendimentos do trabalho ou de prestação individual de serviços, com ou sem vínculo empregatício, independendo a tributação da denominação dos rendimentos, da condição jurídica da fonte e da forma de percepção das rendas, bastando, para a incidência do imposto, o benefício do contribuinte por qualquer forma e a qualquer título (art. 3, par. 4, da Lei no , de 1988). Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes. Desta forma, os jogadores e técnicos, cujos serviços são prestados de forma pessoal, terão seus rendimentos tributados na pessoa física, 3 A este respeito confira-se Luiz Otávio Rodrigues Ferreira Breves comentários sobre temas relacionados ao direito de imagem no âmbito do futebol profissional brasileiro Revista Brasileira de Direito Desportivo no. 1, pg. 45;Carlos Eduardo Ambiel e Walter Godói dos Santos Júnior Relação entre contrato de trabalho e contrato de licença de uso de imagem idem, pg Conselho de Contribuintes.
3 incluídos aí os rendimentos originados no direito de arena/cessão do direito ao uso da imagem, sendo irrelevante a existência de registro de pessoa jurídica para tratar dos seus interesses. (Acórdão , publicado no DOU de 27/11/2003). 5 Em outras palavras, a receita federal posta-se no sentido de não admitir que uma empresa faça a intermediação desta contratação, visto que o intuito do clube foi o de contratar com o atleta e não com uma pessoa jurídica, nascendo daí a constatação de fraude à relação tributária. Já há, frise-se, ações civis públicas buscando a impossibilidade de pagamento de licenciamento de imagem aos atletas de futebol. 6 Este entendimento vem a reboque da desfiguração dos contratos de licenciamento, mediante a caracterização de vício, determinado pelos artigos 9 o. e 444 do Diploma Trabalhista. Ocorre que, especificamente no caso dos clubes de futebol, há uma particularidade que ganha contornos decisivos. As agremiações desportivas, formadas sob o modelo associativo, são isentas do recolhimento previdenciário ordinário. Há, de fato, a oneração de 5% (cinco por cento) de todas as suas receitas, sob a modalidade de substituição tributária (sob responsabilidade exclusiva dos patrocinadores), somada a um pagamento de 4,5% (quatro ponto cinco por cento) incidente sobre a folha de salários. Assim, o único benefício das agremiações que contratam licenciamento de imagem, está vinculado ao não pagamento de 13 o. salário, férias e do FGTS, o que totalizaria 31,90% (27,40% 7 a título de encargos trabalhistas e 4,5% de INSS sobre a folha de salários). 5 grifamos 6 Processo ACI Soma de 8,33 (13 o. Salário); 11,07 (Férias com 1/3) e 8 % (FGTS).
4 Por sua vez, o atleta deixa de pagar o IRRF - tabela progressiva (27,5%), mas passa a sofrer a incidência de 11,33% 8 pela tributação da pessoa jurídica, o que representa um ganho próximo a 16%. Esquematicamente, podemos dizer que os atletas são beneficiados em 16% e os clubes em 31,90%, ambos sobre o valor licenciado. Porém, se tomados os reflexos da decisão administrativa supratranscrita, esta suposta elisão fiscal, que se transfigura em verdadeira evasão tributária, passaria a onerar os clubes e atletas, sob a modalidade da solidariedade fiscal, nas seguintes proporções: IRRF 27,50% Multa (Fraude) 150% 41,25% FGTS 4,50% FGTS - Multa - 50% 2,25% SELIC Média 30% Total do Passivo Oculto 105,50% Como se constata, as agremiações, bem como os atletas, estão criando passivos desconhecidos, próximos a 105% 9 dos pagamentos de direitos de imagem mensais. Este panorama de incertezas e insegurança jurídica poderia ser sanado com uma legislação especial, in casu a malfadada Lei Pelé, que determinasse o percentual da remuneração de licenciamento de imagem que estaria fora do alcance da configuração salarial fraudulenta, como se opera, verba gratia, com o pagamento de diárias de viagens. Desafortunadamente, a minuta do novo Estatuto do Esporte, que pode ser aprovada a qualquer momento, ao invés de avançar numa postura corajosa 8 Somatória de 3 % (Cofins); 0,65% (PIS); 4,8 % (IRPJ) e 2,88 (CSLL). 9 Evidentemente no caso dos atletas não haveria a multa pelo FGTS.
5 e definidora, prefere a covardia da fuga do debate ao estabelecer em seu artigo 45, par. 3 o. que: Pertence ao atleta o direito de negociar individualmente ou por pessoa jurídica por ele constituída, mediante ajuste civil e sem natureza salarial, a cessão de sua imagem, voz, nome ou apelido sempre que alheia ou fora da situação específica de espetáculo ou atividade esportiva objeto de seu contrato de trabalho. Como se vê, estamos longe de uma situação que resolva as longas, onerosas e inseguras conseqüências geradas com a contratação em comento. Nas palavras de BOBBIO, necessitamos, não de justificativas para os direitos (como faz o estatuto), mas de proteção, ou seja, segurança aos contratos. Infelizmente, tanto os legisladores (Congresso Nacional) quanto os aplicadores (Julgadores Administrativos), não enxergam um palmo diante do nariz. Triste panorama. Pobre estatuto do esporte que já nascerá ultrapassado e demandando correções. Enquanto isto, os clubes se afundam em incertezas e débitos impagáveis. * * *
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