Capítulo III. Apresentação de dados em gráficos e tabelas
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- Wagner Martins Affonso
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1 Capítulo III Apresentação de dados em gráficos e tabelas 3.1. Organização de dados em tabelas Representação gráfica de grandezas físicas Eixos, símbolos, título, legendas e incertezas Relação linear entre as grandezas x e Linearização de dados Escalas não lineares Gráficos sensíveis a pequenas variações 4 Departamento de Física da FCTUC 32
2 Apresentação de dados em gráficos e tabelas 3.1. Organização de dados em tabelas. Sempre que se justifique e seja possível, o registo de valores medidos experimentalmente deve ser organizado directamente na forma de uma tabela. Além de ser uma maneira mais compacta de dispor os dados, se estes estiverem organizados em tabelas é mais fácil seguir a sua variação ao longo da experiência e detectar eventuais incorrecções. Enumeraremos aqui alguns aspectos formais a ter em conta quando se utilizam tabelas. Esses aspectos estão ilustrados nas tabelas 3.1 a 3.3. i) As tabelas devem ter uma legenda (em geral colocada acima da tabela) que claramente identifique o seu conteúdo e os símbolos utilizados. Tabela 3.1 Resistência (R) de um material em função da intensidade da corrente (I) que o atravessa. Todos os valores vêm afectados por uma incerteza de 1%. I (x1-3 A) R (x1-3 Ω) ii) Medidas de uma mesma grandeza devem ser preferencialmente registadas verticalmente, uma vez que a visão humana compara mais facilmente uma série de valores organizados na vertical (tabela 3.1). Contudo, se apenas houver uma variável a registar, é comum utilizar-se uma apresentação em linha (tabelas 3.2 e 3.3). Tabela 3.2 Tempo (T) que o disco leva a descer 1 cm no plano inclinado T±.1 (s) iii) As grandezas e as unidades dos valores apresentados devem vir claramente indicadas no cabeçalho das colunas (tabela 3.1) ou das linhas (tabelas 3.2 e 3.3). Tabela 3.3 Tempo que o disco leva a descer 1 cm no plano inclinado T±δT /s 3.2±.1 3.±.2 3.4±.4 3.3±.3 3.2±.1 3.4±.4 3.2±.1 Departamento de Física da FCTUC 33
3 iv) As unidades das grandezas em causa podem ser apresentadas entre parêntesis (tabelas 3.1 e 3.2) ou usando o símbolo / (tabela 3.3). A razão para se utilizar o símbolo / em vez dos habituais parênteses é que as tabelas devem conter apenas números. Para que tal aconteça é necessário dividir a grandeza (daí o símbolo /) pela unidade em que os números são apresentados. v) Sempre que os valores apresentados na tabela venham afectados por incertezas, estas devem ser também incluídas. Tal pode ser feito de três formas diferentes: na própria legenda da tabela (tabela 3.1) ou no cabeçalho da linha ou coluna (tabela 3.2), quando todos os valores vêm afectados pela mesma incerteza; ou junto a cada um dos valores, quando os erros diferem de valor para valor (tabela 3.3). vi) Além disso, quando os valores são muito grandes ou muito pequenos, é aconselhável escrevê-los em notação científica (por exemplo, 2.5x1-4 ou 2.5E-4) e colocar uma potência comum no próprio cabeçalho da linha ou coluna (tabela 3.1). Repetições desnecessárias e tabelas confusas devem ser evitadas Representação gráfica de grandezas físicas A representação gráfica de dados tem um papel central na apresentação e na análise de dados pois constitui, regra geral, um bom resumo dos resultados duma experiência, permitindo visualizar a forma como as grandezas representadas nos eixos do gráfico variam uma relativamente à outra e a dispersão que caracteriza os dados experimentais. Os gráficos ajudam-nos a identificar rapidamente resultados incorrectos ou inesperados e permitem-nos reconhecer comportamentos e tendências (por exemplo, a existência ou não de uma relação linear entre duas grandezas) que podem não ser perceptíveis se os mesmos dados estiverem simplesmente coligidos ou mesmo organizados em tabelas. Eixo das ordenadas (m) x (kg) -4-6 Figura 3.1 Gráficos bidimensionais. Representação das grandezas x e Eixos, símbolos, título, legendas e incertezas P (2,7) R (x 1, 1 ) Eixo das abcissas Os gráficos mais utilizados são bidimensionais, sendo definidos pelo eixo das abcissas e pelo eixo das ordenadas, associados às grandezas x e, respectivamente (Figura 3.1). A cada ponto i do plano definido pelos dois eixos está associado um par de valores (x i, i ) designado por coordenadas do ponto i. A utilização de linhas verticais e horizontais (grelhas), a que estamos habituados no papel milimétrico, e que facilita a leitura das coordenadas de cada Departamento de Física da FCTUC 34
4 ponto, é opcional quando preparamos o gráfico utilizando um programa informático adequado. Estes programas permitem também uma grande variedade de símbolos, cores e tamanhos para representar os pontos (x i, i ). Nos gráficos bidimensionais uma dada grandeza é representada em função de outra. É hoje uma convenção razoavelmente bem estabelecida que no eixo das abcissas, x, se representa a grandeza independente, ou seja, aquela cujo valor é escolhido pelo experimentador, e ao eixo se associam os valores da variável dependente. No gráfico da figura 3.2, por exemplo, ao fim de certos intervalos de tempo determinados pelo operador, mediu-se a massa de um eléctrodo de cobre e as duas grandezas foram representadas graficamente. Variação temporal da massa de um eléctrodo de cobre durante uma electrólise M (g) T (min) Figura 3.2 Variação da massa (M) de um eléctrodo de cobre em função do tempo (T), durante uma electrólise. A incerteza no tempo está contida na dimensão do símbolo. A linha corresponde ao ajuste de uma recta aos dados experimentais. Para que um gráfico seja verdadeiramente perceptível e útil é indispensável associar aos eixos x e a informação que permita identificar as grandezas físicas que estão a ser representadas e em que unidades. Em geral usa-se ainda um título e/ou uma legenda que ajudem a perceber o conteúdo do gráfico. O título do gráfico da figura 3.2 informa que se trata da variação das duas grandezas durante uma electrólise. Sempre que tal se justifique, os pontos experimentais representados num gráfico devem conter também a informação associada ao grau de confiança nos dados apresentados ou, dito de outro modo, devemos conhecer e introduzir no gráfico a incerteza associada a cada valor. Isso é feito através de barras de erro. No gráfico da figura 3.2 são apresentadas as barras de erro associadas à grandeza representada em e é dito na legenda da figura que os erros associados à grandeza representada em x têm uma dimensão que é igual ou inferior à do tamanho do símbolo usado. Para além dos valores das grandezas representadas em x e e das respectivas incertezas, os gráficos incluem muitas vezes linhas curvas ou rectas que pretendem reproduzir determinados comportamentos ou relações matemáticas entre as grandezas. Essas linhas podem ser curvas teóricas definidas para o mesmo intervalo de valores e apenas sobrepostas sobre os dados do gráfico, sendo destinadas a comparar comportamentos experimentais e teóricos, ou podem corresponder ao ajuste de uma determinada função matemática aos pontos Departamento de Física da FCTUC 35
5 representados graficamente, de forma a avaliar se a relação entre as duas variáveis segue esse comportamento matemático. No gráfico da figura 3.2, de acordo com a informação dada na legenda, conclui-se que até aos 3 minutos a relação entre o tempo de electrólise e a massa do eléctrodo é razoavelmente linear, ou seja, bem traduzido por uma recta. Finalmente, as escalas dos eixos e o tamanho dos números, legendas e símbolos devem ser escolhidos de modo a que a variação das grandezas representadas e a restante informação sejam bem perceptíveis. Em particular, nada obriga a que a origem dos eixos coordenados [ponto (,)] seja um dos pontos do gráfico. De facto, a necessidade de o tornar claro e informativo, exige muitas vezes que esse ponto não seja representado. Veja exemplos nos gráficos da figura Nº de contagens Nº de contagens t (s) Figura 3.3 O gráfico da esquerda contém o ponto (,), desnecessariamente, o que não permite avaliar correctamente a variação das grandezas ou os erros associados; no gráfico da direita, o eixo das ordenadas só contém o intervalo de valores da função, o que permite avaliar bem a variação relativa das grandezas e os erros associados. t (s) Relação linear entre as grandezas x e A relação matemática mais simples e fácil de trabalhar entre duas grandezas x e é a relação linear. Como sabemos, traduz-se por f(x) Ax B, sendo A o declive da recta e B a ordenada na origem. Dados dois pontos de coordenadas (x 1, 1 ) e (x 2, 2 ), o declive da recta 2 1 é calculado através de A e, como se pode ver no gráfico da figura 3.4, está x2 x1 relacionado com o ângulo entre a recta e o eixo x por A tg. (m) B x (s) Figura 3.4 Representação gráfica das grandezas x e. A linha contínua sobre os pontos representa o ajuste de uma recta do tipo = Ax+B aos pontos (x i, i ). As incertezas em x e foram desprezadas. Departamento de Física da FCTUC 36
6 Num capítulo futuro veremos como proceder para determinar a recta que melhor se ajusta a determinado conjunto de dados experimentais. Contudo, muitas grandezas físicas que estudaremos ao longo do curso não estão relacionadas entre si por uma função tão simples como uma recta. Como proceder nestes casos? Linearização de dados Quando sabemos de antemão qual é a relação matemática que existe entre as grandezas em estudo (e ela não corresponde à equação de uma recta), podemos escolher as variáveis a representar graficamente de forma a obtermos uma relação linear entre elas. Este processo é conhecido por linearização de dados. Vejamos um exemplo. A relação entre o período de oscilação T da massa m suspensa numa mola e o valor dessa massa não é uma relação linear, como se vê pela fórmula: m T 2. k Isto pode ser confirmado graficamente, se representarmos os valores obtidos experimentalmente para m e T. Como se pode ver no gráfico da figura 3.5-a), a relação entre as variáveis não é bem traduzida por uma linha recta. Contudo, se em vez de T em função de m, representarmos T em função de m, o gráfico já corresponde a uma linha recta (figura m b)). Na verdade, tomando a equação anterior temos: T 2 m que se k k 2 assemelha à equação de uma recta do tipo Ax onde A, o declive da recta, é dado por. k 5, 5, 4,5 4,5 4, 4, 3,5 3,5 3, 3, T (s) 2,5 2, T (s) 2,5 2, 1,5 1,5 1,,5 a) 1,,5 b),,2,4,6,8 m (kg),1,2,3,4,5,6,7,8,9 1, m 1/2 (kg 1/2 ) Figura 3.5 Variação do período de oscilação (T) de uma mola a) em função da massa (m) ou b) da raiz quadrada da massa (m 1/2 ) do corpo suspenso na mola. As incertezas em m e em m 1/2 estão contidas no tamanho dos símbolos. A linha contínua no gráfico b) representa o ajuste da recta =Ax+B aos pontos experimentais. A comparação entre a equação geral Ax B e a relação matemática conhecida entre T e m permitem então determinar a constante elástica da mola (k) a partir do valor do parâmetro A, o declive da recta. Por outro lado, a partir da mesma comparação, seria de esperar que se obtivesse o valor zero para a ordenada na origem. Assim, se B for diferente de zero isso pode indiciar a existência de erros sistemáticos. Na verdade, como veremos num capítulo à frente, os valores de A e B extraídos do processo de ajuste vêm afectados por incertezas (tal como os dados experimentais) e essas incertezas propagam-se para os valores das grandezas deles extraídos. No exemplo referido, obteríamos um intervalo de valores para k (centrado no Departamento de Física da FCTUC 37
7 melhor valor, é claro) e esperaríamos que o valor zero estivesse contido no intervalo de valores de B, para estarmos em condições de descartar erros sistemáticos. Outros exemplos de linearização de funções i) Função exponencial (x) - varia exponencialmente com x segundo a forma geral: bx ae (3.1) onde a e b são constantes e e = é o Nº de Euler, base do logaritmo neperiano. A relação entre as grandezas x e pode ser linearizada calculando o logaritmo da eq. 3.1: ln lna bx (3.2) A representação de ln (em vez de apenas ) em função de x, permite obter uma recta de declive b e ordenada na origem ln a (Figura 3.6) 6x1 12 5x1 12 4x1 12 3x1 12 2x1 12 1x1 12 ln Figura 3.6 Representação gráfica da função 3.1, à esquerda, e da sua linearização (eq. 3.2), à direita, para k =.5 e b = 1. ii) Função hiperbólica (x) varia com o inverso de x segundo a forma geral: k (3.3). x 1 A representação de em função de (em vez de simplesmente x), permite obter uma x recta de declive k e ordenada na origem nula (Figura 3.7).,8,8,7,7,6,6,5,5,4,4,3,3,2,2,1,1,, ,,2,4,6,8 1, Figura 3.7 Representação gráfica da função 3.3, à esquerda, e da sua linearização, à direita, para k =.7. Departamento de Física da FCTUC 38
8 iii) Função potência de x varia com x elevado à potência b, segundo a forma geral b kx (3.4) 2 A função quadrática x é conhecida por PARÁBOLA. É possível linearizar esta função através do cálculo do logaritmo decimal da função 3.4, obtendo-se: log logk blog x (3.5) A representação de log (em vez de apenas ) em função de log x (em vez de apenas x) permite obter uma recta de declive b e ordenada na origem log k (Figura 3.8). 5 3, 4 2,5 2, 3 1,5 2 log 1,,5 1, ,5 -,2,,2,4,6,8 1, 1,2 1,4 1,6 Figura 3.8 Representação gráfica da função 3.4, à esquerda, e da sua linearização (eq. 3.5), à direita, para k =.5 e b = Escalas não lineares No caso de relações matemáticas cuja linearização envolva o cálculo de logaritmos (por exemplo, as funções i) e iii) acima), uma alternativa ao cálculo do logaritmo dos valores envolvidos é a representação directa em gráficos cujas escalas, em vez de lineares, sejam logarítmicas. Assim, no caso da função i) se a escala em for logarítmica e a escala em x linear (neste caso o gráfico diz-se semi-logarítmico) a representação dos dados também será bem ajustada por uma recta (figura 3.9). No caso da função iii) se tanto as escalas lineares em como em x forem ser substituídas por escalas logarítmicas, os dados representados também mostrarão o comportamento de uma recta (figura 3.1). Há também outras situações em que, por mais cuidadosa que seja a sua escolha, uma escala linear obscurece a interpretação visual dos dados. É o que acontece quando os dados experimentais num dos eixos (ou nos dois) se espalham por muitas ordens de grandeza. Nesse caso, se escolhermos uma escala linear onde se consigam ler bem os valores mais elevados, os valores inferiores não conseguem ser lidos e vice-versa. Assim, dados cujos valores se estendam por várias ordens de grandeza devem ser representados em escalas logarítmicas 1 e não lineares. 1 Lembremos que a aplicação do logaritmo é uma forma de reduzir grandes números a números mais pequenos. Departamento de Física da FCTUC 39
9 e 27 e 22 e 17 e 12 e 7 e Figura 3.9 Representação semi-logarítmica da função 3.1. A escala linear em foi substituída pela escala logarítmica. Repare-se que as legendas dos eixos não foram substituídas. Compare-as com as da figura Figura 3.1 Representação logarítmica da função 3.4. As escalas lineares em x e em foram substituídas por escalas logarítmicas. Compare com a figura 3.8, dando atenção às legendas dos eixos Gráficos sensíveis a pequenas variações Por vezes, para percebermos de forma mais imediata se a relação entre a grandeza e a grandeza x segue ou se afasta de determinado comportamento esperado, é útil substituirmos a representação da grandeza no eixo das ordenadas por uma função z de x e que seja mais sensível a pequenas variações. Vejamos um exemplo. Imaginemos que pretendemos avaliar rapidamente se a relação entre duas determinadas grandezas se afasta muito da equação da recta = x. Uma forma normal e correcta de o percebermos, é fazermos o gráfico de em função de x e depois tentarmos ajustar uma recta de equação = kx e avaliarmos a qualidade do ajuste (nomeadamente se obtermos um valor próximo de 1 para o parâmetro k). Contudo, a representação de outras funções relacionadas com x e, como z = /x ou z = -x, é mais sensível a pequenos afastamentos relativamente à equação de uma recta. Esta situação está ilustrada nos gráficos da figuras 3.11, onde, para os Departamento de Física da FCTUC 4
10 mesmos valores de x, a percepção de que não varia linearmente com x segundo a recta = x é questionável na 1ª representação mas inquestionável na 2ª. 1,4 -x (m) (m) 5,2, x (m) x (m) Figura 3.11 A questão depende linearmente de x? não é visualmente respondida pelo gráfico da esquerda, que representa (x), mas tem uma resposta claramente negativa no gráfico da direita. Os valores de x e são os mesmos nas duas representações mas na da direita a função (-x) é mais sensível a pequenas variações de em relação a x. Departamento de Física da FCTUC 41
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