TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Transcrição

1 EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS -SEGURO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA DE EXCLUSÃO DE COBERTURA -EMBRIAGUEZ DO CONDUTOR - COMPROVAÇÃO PELO BOLETIM DE OCORRÊNCIA - AGRAVAMENTO DO RISCO CONTRATADO - INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA. O boletim de ocorrência, lavrado por servidor público, goza de fé pública, e, portanto, de presunção iuris tantum, somente podendo ser desconstituído, mediante prova robusta, a cargo da parte interessada. Em casos, que o boletim de ocorrência é a única prova dos autos a demonstrar, de forma clara, a ingestão de bebida alcoólica pelo condutor, por ocasião do acidente automobilístico, esta é suficiente para a comprovação da ocorrência do agravamento de risco. Nas hipóteses em que restar comprovada a embriaguez do condutor do veículo segurado, e que tal fato tenha acarretado efetivo agravamento do risco, sendo condição determinante para a ocorrência do acidente, indevida a indenização securitária. APELAÇÃO CÍVEL Nº /001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): SERGIO ROBERTO VIEIRA - APELADO(A)(S): PORTO SEGURO CIA SEGUROS GERAIS A C Ó R D Ã O Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. DES. LUCIANO PINTO RELATOR. Fl. 1/7

2 DES. LUCIANO PINTO (RELATOR) V O T O Sérgio Roberto Vieira ajuizou Ação de Indenização por Danos morais e materiais em face de Porto Seguro Companhia de Seguros, narrando, em síntese, que firmou com a ré contrato de seguro de um automóvel. Relatou que quando da ocorrência do sinistro, a ré negouse a pagar a indenização securitária, cancelando o contrato de seguro. Documentos a f.12/37. Devidamente citada a seguradora ré apresentou contestação (f. 41/77) com a qual vieram os documentos a f. 78/92, arguindo prejudicial de prescrição e, quanto ao mérito, narrou as circunstâncias do acidente que justificaram a negativa do pagamento da indenização pela ocorrência de risco excluído da cobertura, qual seja a embriaguez do condutor do veículo segurado. Impugnação à contestação a f. 93/106. Em audiência de conciliação a f. 114/114-v, a qual restou infrutífera, foi saneado o feito com a rejeição da preliminar. Audiência de instrução e julgamento a f. 121 não qual ausente a parte autora, com posterior justificativa (f. 124/134). Não houve produção de prova. Sobreveio sentença a f.137/138, que julgou improcedente o pedido, nos termos do art. 269, I, do CPC para condenar o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitrou em R$1.000,00 (hum mil reais), levando-se em consideração os critérios especificados no parágrafo 4o, do art. 20 do CPC. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação a f.140/147, alegando que em nenhum momento provou-se que seu filho, condutor do veículo segurado, encontrava-se com teor etílico, tendo em vista Fl. 2/7

3 que não foi submetido ao teste do bafômetro, não devendo portanto ser acolhida a hipótese da perda de direitos em relação à indenização securitária devido a embriaguez do condutor. Asseverou que instruiu a inicial com os documentos pertinentes à elaboração de pedido de danos morais e materiais. É o relatório. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Pelo que dos autos consta, estou que não assiste razão ao apelante em seu inconformismo. O presente recurso cuida de pedido de indenização por danos morais e materiais, decorrente de acidente de trânsito, interposto pelo segurado, ora apelante. A seguradora negou o pagamento da indenização na esfera administrativa ao fundamento de que, o condutor do veículo segurado estava embriagado no momento do acidente, configurando assim o agravamento do risco, o que a isentaria do pagamento do seguro (f.36/37). Remetendo-se ao boletim de acidente de trânsito realizado pela Polícia Rodoviária Federal, da narrativa da ocorrência a f.23, é possível observar que o condutor, inicialmente, confessou a ingestão de bebida alcoólica em momento anterior ao acidente, e a f.24, consta que havia vestígios de ingestão de álcool no condutor do veículo, fato corroborado pelo termo de constatação de embriaguez a f.88, o qual constatou hálito etílico, e olhos avermelhados no condutor, diante da negativa do condutor em se submeter a exames clínicos ou de sangue. Portanto, em que pese o entendimento contrário do apelante, diante das provas que se tem nos autos, é clara a demonstração de Fl. 3/7

4 ingestão de bebida alcoólica, por ocasião do acidente, pelo condutor do veículo segurado. Ressalte-se que o boletim de ocorrência, lavrado por servidor público, goza de fé pública, e, portanto, de presunção iuris tantum. Assim, o referido documento somente pode ser desconstituído através de prova robusta, a cargo da parte interessada, no caso, do apelante, fato este não ocorrido nesta seara. Sobre o tema, veja-se a jurisprudência do STJ: AGRAVO REGIMENTAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE. BOLETIM DE OCORRÊNCIA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. RECURSO ESPECIAL PELA ALÍNEA "C". DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO. I - O Boletim de Ocorrência Policial, em regra, não gera presunção iuris tantum da veracidade dos fatos narrados, uma vez que apenas consigna as declarações unilaterais narradas pelo interessado, sem atestar que tais afirmações sejam verdadeiras. II - Na hipótese em exame, contudo, a situação é diversa, por ter sido ele elaborado pela Polícia Rodoviária Federal, no local do acidente, instantes após a ocorrência do sinistro, firmando, em princípio, presunção relativa acerca dos fatos narrados, se inexistirem provas em sentido contrário, ante a fé pública de que goza a autoridade policial. III - Considerando que os precedentes colacionados versam sobre hipótese em que o Boletim foi elaborado a partir de informações exclusivas da vítima, não se prestam tais paradigmas à configuração do dissídio, dada a diversidade das Fl. 4/7

5 bases fáticas em que assentadas as conclusões dos julgados. Agravo Regimental improvido.(agrg no REsp /MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/10/2009, DJe 29/10/2009- (grifo nosso) Nesse sentido, o apelante não se incumbindo de trazer aos autos provas que derruíssem a constatação realizada pela Polícia Federal, demonstrado está que o condutor estava sob efeito de álcool no momento do acidente. No que se refere à demonstração de que o estado alcoolizado do condutor foi determinante para o agravamento do risco, e ocorrência do acidente, novamente remeto-me ao Boletim de ocorrência a f.23, o qual transcrevo in verbis: [...]Próximo ao quilômetro 794,1, município de Juiz de Fora, seu condutor perdeu o controle direcional, ocasionando sua saída de pista.[...] Depreende-se da narrativa acima transcrita que não houve abalroamento do veículo segurado com outro veículo na rodovia, e nem qualquer outra interferência de terceiro a provocar o acidente ocorrido, ou até mesmo a comprovação de avarias mecânicas. Através das fotos a f.32/34, conclui-se que o veículo saiu da pista e veio a colidir, ao final, com uma árvore. É cediço que o consumo de álcool provoca diversos efeitos como sono, alteração dos reflexos e da capacidade de discernimento das pessoas. Nesse sentido, diante da averiguação, pelo boletim de ocorrência, do estado alcoolizado em que se encontrava o condutor, a inferência lógica que se faz é que, de fato, o condutor, concorreu para o agravamento do risco, o qual culminou no acidente. Portanto, extrai-se do contexto probatório dos autos que a ingestão de bebida alcoólica por parte do condutor do veículo foi causa Fl. 5/7

6 determinante para a ocorrência do sinistro que acarretou os danos no automóvel, tendo em vista que este se chocou, imotivadamente, ao final, contra uma árvore ( f.34). Ora, estando provado o estado alcoolizado do condutor do veículo, e não existindo prova de falha mecânica ou do envolvimento de outro veículo, força é convir que a embriaguez ao volante foi, indubitavelmente, a causa promotora do sinistro, sem a qual o condutor não teria perdido seus reflexos e, consequentemente, o controle direcional do veículo e que saiu da pista, e se chocou contra um árvore. Acresço que, ao restar comprovada a embriaguez do segurado na condução do veículo, a jurisprudência do STJ admite a negativa de cobertura securitária, desde que se constate que tal fato tenha acarretado efetivo agravamento do risco, sendo condição determinante para a ocorrência do acidente. De outro lado, não se pode analisar o presente caso, tendo em vista uma interpretação restritiva do art.768, do CC, haja vista que o próprio segurado não estava conduzindo veículo. Isto porque, nas Condições Gerais da apólice do veículo ( f.36), está expressamente previsto que haverá perdas de direitos em casos que o veículo segurado estiver sendo dirigido por pessoa sob ação de álcool, e portanto, abrangiu-se não só atos praticados diretamente pelo segurado, mas também por qualquer outra pessoa que estiver conduzindo o veículo. Ademais, a f.18, também encontra-se explicitados,, de forma clara, quais são os condutores segurados na apólice, que, in casu, são o cônjuge do apelante, e pessoas na faixa entre 18/24 anos, o que daí infere-se, referir-se ao filho do apelante, condutor no momento do acidente em questão. Por tais razões, nego provimento ao recurso. Fl. 6/7

7 A DESA. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a). O DES. LEITE PRAÇA - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO." Fl. 7/7