Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região

Transcrição

1 PRC01 Recorrentes: Recorridos: 1) Total Transporte e Logística Ltda 1) José Roberto da Costa 2) Recan Serviços de Transportes Ltda 3) Casas Bahia Comercial S.A. EMENTA: DANO MORAL INDENIZAÇÃO O dano moral é o sofrimento humano estranho ao patrimônio material, repercutindo no patrimônio ideal da pessoa natural. A indenização por dano moral decorrente do contrato de trabalho pressupõe a existência de um ato ilícito praticado pelo empregador, de um prejuízo suportado pelo ofendido e de um nexo de causalidade entre a conduta injurídica do primeiro e o dano experimentado pelo último, a teor dos artigos 186 e 927 do Código Civil e artigo 7.º, XXVIII, da CF/88. O pressuposto básico do cabimento da reparação do dano moral, portanto, é a ofensa ou violação a um direito ínsito à personalidade. Na hipótese, considerando que o demandante logrou demonstrar, conforme lhe competia, a teor dos artigos 818 da CLT e 333, I, do CPC, que ele sofreu constrangimento e humilhação, por se ver privado, quando da sua doença, do recebimento de benefício previdenciário, caracterizado está o abalo moral indenizável e correto o deferimento do pedido indenizatório. RELATÓRIO O Juízo da 2.ª Vara do Trabalho de Betim, decisão, f. 383/388, proferida em 14 de maio de 2014, julgou procedentes, em parte, os pedidos, para condenar as 1.ª e 2.ª reclamadas, solidariamente, e a 3.ª, subsidiariamente. A 2.ª reclamada, Total Transportes e Logística Ltda, recorre, f. 389/404, quanto: a) responsabilidade solidária; b) prescrição qüinqüenal; c) dano moral; d) obrigação de fazer; e) multa do artigo 477,

2 RO parágrafo 8.º, da CLT. Custas processuais, f. 406, e depósito recursal, f Contrarrazões do reclamante, f. 409/412. Não houve remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho para emissão de parecer circunstanciado, ante a ausência de interesse público na solução da controvérsia (art. 81 do Regimento Interno deste TRT). É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE O recurso ordinário interposto pelo reclamada é próprio, tempestivo e a representação está regular. Ademais, o recolhimento das custas e do depósito recursal foi comprovado, a tempo e modo, pelos documentos de f. 405/406. Conheço, portanto, do recurso, porque atendidos os pressupostos de admissibilidade. MÉRITO RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA A recorrente insurge-se contra o reconhecimento de que compõe grupo econômico com a reclamada Recan Serviços de Transportes Ltda. ME, argumentando que se tratam de empresas distintas, com administração própria, e o fato de terem objeto social idêntico e prestarem serviços para uma mesma 3.ª empresa não faz pressupor que integrem o mesmo grupo empresarial. Contudo, sem razão. O artigo 2.º, parágrafo 2.º, da CLT, dispõe que para caracterização do grupo econômico, é necessária a vinculação de uma

3 empresa a outra, a qual se verifica quando estiverem sob a mesma direção, controle ou administração. O grupo econômico para fins justrabalhistas não necessita se revestir das modalidades jurídicas típicas ao Direito Econômico ou Direito Comercial, bastando que haja elo empresarial e integração entre as empresas, a concentração da atividade empresarial em um mesmo empreendimento, ainda que sejam diferentes as personalidades jurídicas. Na hipótese, o acervo probatório evidencia a contratação do reclamante pela empresa Recan Serviços de Transportes Ltda, inequivocamente pertencente ao mesmo grupo econômico da 2.ª reclamada, para exercer a função ajudante, em benefício da 3.ª reclamada, tomadora dos serviços. A testemunha Carlos Roberto, inquirida por indicação das reclamadas, de forma convincente e incisiva, declarou:...a 1.ª e a 2.ª reclamada trata-se da mesma empresa, f Ademais, a identidade de objeto social e o fato de terem contratado o mesmo escritório de advocacia para a defesa dos seus interesses corrobora, mais ainda, o que já está sobejamente e incontestavelmente demonstrado nos autos. Assim, nos termos do artigo 2.º, parágrafo 2.º, da CLT, os argumentos recursais de distinção entre as empresas revelam-se inócuos. Com amparo nesses fundamentos, mantém-se a condenação solidária das duas primeiras reclamadas pelos créditos deferidos nesta ação. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL Após retorno dos autos da instância ad quem que admitiu, reconheceu o vinculo de emprego com a Transportadora Recan (vide, f. 347/348- verso), o julgado, f. 383 e seg., manteve a prescrição declarada f. 305, ou seja, pretensões anteriores a 23/08/2006, exceto com relação às parcelas de natureza declaratória, como anotação na CTPS, bem como para Fundo de Garantia que tem a prescrição trintenária. A recorrente recorre, diz que o recorrido terá direito apenas a 13.º salário relativo ao período de 09/2006 a 12/2006 e as férias do período aquisitivo de 2005/2006, de forma proporcional. De igual forma, roga pela exclusão do período correspondente a 18 meses em que não

4 houve prestação se serviços por parte do reclamante, dizendo ter sido penalizada duplamente. A prescrição foi declarada. O direito existe, porém, encontra-se prescrito o que deverá ser observado quando da liquidação de sentença, ao se apurar as verbas trabalhistas. De outro lado, a questão de ser o reclamante trabalhador autônomo já foi sepultada pelo acórdão do Tribunal, proferido f. 347/348v, não cabendo mais discussão a respeito. Quanto ao período de afastamento do reclamante de suas atividades por motivo de doença, não vejo motivo para a exclusão como pretende a recorrente. Assim, como o juízo de piso, entendo que este não poderá ser deduzido do cálculo das verbas trabalhistas, já que não houve recolhimento de contribuições previdenciárias por culpa das reclamadas que não anotaram a CTPS do autor. Excluir este período seria prejudicar o autor, duplamente. O fato das reclamadas terem sido condenadas em danos morais e no recolhimento das contribuições previdenciárias não ameniza o prejuízo sofrido pelo autor à época da sua doença, quando mais precisava do recebimento do auxílio previdenciário, do qual se viu privado, diga-se, por culpa exclusiva das rés, arcando, sem qualquer tipo de recebimento, com a dor emocional e financeira do tratamento. Diga-se que se as reclamadas não tivessem se esquivado de suas obrigações legais (anotação da CTPS e contribuições previdenciárias, entre outras) não estaria sendo acionada pelo judiciário, com conseqüente condenação legal, não havendo qualquer penalidade em duplicidade, como pretende fazer crer. DANO MORAL INDENIZAÇÃO A recorrente afirma que não cometeu nenhum ato ilícito, não havendo nexo causal algum entre o fato ocorrido e a conduta da recorrente. Roga pela exclusão da responsabilidade de qualquer pagamento de indenização a título de dano moral. Afirma, ainda, que o valor atribuído à indenização foi exagerado, requerendo sua redução. Assevera que o dano moral deve ser de amparo imediato e urgente, com a finalidade de reparar o prejuízo moral sofrido, não podendo dar tempo ao tempo, sob pena da perda do dano, pois é ele estritamente moral. Analiso.

5 O dano moral é o sofrimento humano estranho ao patrimônio material, repercutindo no patrimônio ideal da pessoa natural. A indenização por dano moral decorrente do contrato de trabalho pressupõe a existência de um ato ilícito praticado pelo empregador, de um prejuízo suportado pelo ofendido e de um nexo de causalidade entre a conduta injurídica do primeiro e o dano experimentado pelo último, a teor dos artigos 186 e 927 do Código Civil e artigo 7.º, XXVIII, da CF/88. O pressuposto básico do cabimento da reparação do dano moral, portanto, é a ofensa ou violação a um direito ínsito à personalidade. Na hipótese, considerando que o demandante logrou demonstrar, conforme lhe competia, a teor dos artigos 818 da CLT e 333, I, do CPC, que ele sofreu constrangimento e humilhação caracterizadores de abalo moral indenizável, ficando em situação de desespero, correto o deferimento do pedido indenizatório. Não há negativa de forma direta das rés quanto à enfermidade narrada na inicial, o que é confirmado pelo relatório médico, f. 17, constando: acometido de enfermidade de código C-32: neoplasia maligna da laringe. Ademais, a CTPS, f. 13, aponta que o último contrato de trabalho formal encerrou-se em 1997, ou seja, quando da sua doença ela já havia perdido a condição de segurado (artigo 15 da Lei 8.213/91), não fazendo jus ao recebimento do auxílio-doença através do INSS, conforme disposto nos artigos 25, I, c/c 59, caput, da Lei 8.213/91 não cumprimento de período de carência. De outro lado, a testemunha José Pinheiro confirmou: o reclamante parou de trabalhar porque ficou doente, f Claro está que o reclamante ficou doente, sem trabalho, sem recebimento de benefício previdenciário, o que se presume que o reclamante sobreviveu, durante o seu tratamento (o qual, como se sabe, já causa um dor indescritível), por meio de doações de amigos e parentes, na dependência de caridade alheia, como descrito na inicial. Não há qualquer dúvida de que ele sofreu abalo moral, o que afetou diretamente o seu estado psicológico, encontrando-se humilhado, constrangido, desesperado, pela doença em si e pela falta de condições financeiras a amparar as suas despesas pessoais e familiares. Com certeza, isso atrapalhou ou até mesmo pode ter influenciado no tratamento da doença (tempo, cura, etc). E no caso, a culpa da 1.ª reclamada é evidente, porquanto se a empresa tivesse registrado sua admissão e cumprido com suas obrigações legais, procedendo aos recolhimentos previdenciários, com certeza, o reclamante não se veria privado de receber benefício

6 RO previdenciário, o que teria preservado a sua forma de sobrevivência e ele se dedicaria exclusivamente a seu tratamento, em busca da cura da doença (com mais esperança e força). Entrementes, a empresa contribuiu para que o reclamante ficasse desamparado, no pior momento de sua vida, em que a pessoa se acha no fim, um trapo de gente. A indenização é devida e o valor a ela atribuído está em consonância, com a capacidade econômica das reclamadas (em especial a tomadora final dos serviços), o dano suportado, o caráter pedagógico da indenização, tudo nos termos dos artigos 5.º, X, da Constituição Federal, c/c 186, 927, caput, e 944, caput, todos do CCB. Nada existe a ser reparado no julgado. OBRIGAÇÃO DE FAZER A responsabilidade solidária é ampla e deve abarcar todas as verbas deferidas na sentença. Ressalto que, embora a anotação de CTPS, entrega das guias TRCT/01 e CD/SD sejam, de fato, obrigações personalíssimas da primeira ré (empregadora), a qual foi condenada ao cumprimento. Também é certo que a eventual conversão da obrigação de fazer no pagamento de multa, como registrado no julgado, afasta o caráter personalíssimo da obrigação. Logo, a responsabilização solidária da segunda reclamada açambarca a eventual multa, em caso de não cumprimento das obrigações de fazer. FUNDAMENTOS PELOS QUAIS, O Tribunal Regional do Trabalho da 3 a Região, por sua Sétima Turma, em sessão ordinária realizada no dia 28 de agosto de 2014, unanimemente, conheceu do recurso, porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade. No mérito, sem divergência, negou-lhe provimento. PAULO ROBERTO DE CASTRO DESEMBARGADOR RELATOR