GEOGRAFIA DA SAÚDE AGRÁRIA: ESTUDO SÓCIO-AMBIENTAL EM DOIS ACAMPAMENTOS DE MATO GROSSO DO SUL
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- Francisco Washington Imperial Cortês
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1 GEOGRAFIA DA SAÚDE AGRÁRIA: ESTUDO SÓCIO-AMBIENTAL EM DOIS ACAMPAMENTOS DE MATO GROSSO DO SUL Arlinda Montalvão de Oliveira - Prof a Especialista substituta do DCH/UFMS/CPTL lindageo@zipmail.com.br Jodenir Calixto Teixeira - Prof. Me. Substituto do DCH/UFMS/CPTL. jodenir@ceul.ufms.com Lílian Aparecida Campos Dourado - Prof a substituta do DCH/UFMS/CPTL e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFMS lilian@ceul.ufms.br Francisco José Avelino Júnior - Prof. Dr. Adjunto do DCH/UFMS/CPTL china@ceul.ufms.br Quando eu morrer Cansado de guerra Morro de bem Com a minha terra: Cana, caqui Inhame, abóbora Onde só vento se semeava outrora Amplidão, nação, sertão sem fim Oh Manuel, Miguilim Vamos embora (Assentamento) Chico Buarque INTRODUÇAO O presente trabalho é resultado do projeto de extensão em realização junto aos departamentos DCH, DCN e DED da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFMS Câmpus de Três Lagoas, envolvendo alunos e professores dos cursos de Geografia, Enfermagem e Pedagogia. O principal objetivo desse trabalho é analisar a qualidade de vida da população dos acampamentos "Córrego do Moeda" e "Corrego do Pinto", localizados no município de Três Lagoas MS e fazer um trabalho de conscientização dos acampados. Utilizamos como metodologia um levantamento bibliográfico sobre a questão agrária e qualidade de vida nos acampamentos dos trabalhadores sem-terras; elaboração e aplicação de questionários junto aos trabalhadores acampados; observações empíricas e registros fotográficos; análise e organização dos dados coletados; apresentação do trabalho na comunidade acadêmica; promoção de palestras para os acampados visando à orientação e conscientização sobre os cuidados necessários nos acampamentos para prevenir doenças relacionadas à falta de saneamento básico. LUTA PELA TERRA E AS CONDIÇÕES DE VIDA NOS ACAMPAMENTOS Denomina-se acampados as famílias que ainda não conquistaram a terra, mas que se mantêm organizadas. Vivem em barracos de lona plástica, quase sempre à beira de estradas, despejadas, na maioria das vezes, das terras que ocuparam anteriormente. No acampamento, a organização básica se dá por meio dos Grupos de Famílias. Cada Grupo de Família escolhe seu Coordenador, que fará parte da Coordenação Geral do Acampamento. O acampamento em geral é formado por militantes dos movimentos envolvidos nas ocupações de terra. Buscando desenvolver os aspectos de organização e elevar a consciência crítica, realizam-se constantes reuniões e reflexões sobre os mais diferentes temas de interesse dos acampados, os
2 quais, além disso, vivem sempre em busca de soluções para seus problemas de alimentação, saúde e falta de terra. A lentidão na aplicação do Plano de Reforma Agrária, por parte do Governo Federal, leva os trabalhadores rurais sem terra a ocupar os latifúndios improdutivos para garantir a posse da terra para seu sustento. O descaso das autoridades com essas famílias é total. Sem perspectivas, jogadas nas margens das rodovias e sujeitas a fome e a doenças, essas famílias armam seus barracos e desencadeiam o processo de preparo do solo para o plantio de algumas culturas. Na maioria das vezes são surpreendidas por um batalhão de polícia, com armas e bombas de gás lacrimogêneo, a qual usa da violência para expulsar as famílias do local.(dellazeri, 1994). Historicamente o Brasil foi se tornando o país do latifúndio, com grande concentração de terras nas mãos de poucos proprietários e grandes extensões de terras improdutivas, o que gera conflitos pela posse. Nas últimas décadas as ocupações se tornaram constantes, sendo uma das principais formas de acesso a terra. Conforme Fernandes (2000, p 19): A ocupação é uma realidade determinadora, é espaço/tempo que estabelece uma cisão entre o latifundiário e o assentamento e entre o passado e o futuro. Nesse sentido, para os sem-terras a ocupação, como espaço de luta e resistência, representa a fronteira entre o sonho e a realidade, que é construída no enfrentamento cotidiano com os latifundiários e o Estado. A luta pela terra se tornou um dos principais elementos para a compreensão da questão agrária em um país carente de uma reforma agrária séria que beneficie os trabalhadores sem-terras e conseqüentemente, aumente a produção agrícola, beneficiando todo o país, tornando-o mais justo. No entanto, reforma agrária se tornou sinônimo de violentos conflitos, onde trabalhadores são tratados como marginais, e de acampamentos que formam verdadeiras favelas no campo, onde vivem homens, mulheres e crianças em condições desumanas. Em um país que não tem uma política que resolva os problemas do campo, as ocupações funcionam como pressão ao Governo e uma luta contra o capital. Ou como afirma Fernandes (2000, p.280) : A ocupação é uma ação que os trabalhadores sem-terras desenvolvem, lutando contra a exclusão causada pelos capitalistas e ou pelos proprietários de terra. É, portanto, uma forma de materialização da luta de classes. Porém, participar de uma ocupação não é uma tarefa simples, visto que os trabalhadores se submetem às condições precárias, transformando a própria vida, correndo riscos em busca de um objetivo. Assim, é normal a indecisão de algumas famílias, demonstrando medo, pois sabem que estão tomando uma decisão sem ter certeza dos resultados finais, pois muitas famílias ficam anos em acampamentos sem resultados satisfatórios. Mesmo assim, é real o aumento do número de acampamentos pelo país, com o propósito de formar assentamentos agrários. No entanto, esses acampamentos apresentam falta de infra-estrutura o que acarreta uma má qualidade de vida dos acampados, expondo-os à contaminação por várias doenças. Conforme salienta ABRAMOVAY apud FERNANDES (1996, p. 239), As famílias reúnem seus poucos pertences sob tendas de lona ou plástico nas quais vivem até doze pessoas, expostas ao calor, ao frio, e doenças, em precaríssimas condições...
3 Os acampamentos Córrego do Moeda e Córrego do Pinto, objeto de nosso estudo, não são exceção, apresentando os mesmos problemas, o que justifica a nossa preocupação na relização de uma análise da realidade e promover uma maior conscientização dessas pessoas em relação aos riscos que se submetem. À primeira vista, os acampamentos parecem ser ajuntamentos desorganizados de barracos. Todavia, possuem determinadas disposiçoes conforme a topografia do terreno e as condiçoes de desenvolvimento da resistência ao despejo e das perspectivas de enfrentamento com jagunços. Podem estar localizados em fundos de vale ou nos espigões (FERNANDES, 2000, p. 294) O Acampamento Córrego do Moeda, localiza-se na margem esquerda da rodovia MS 335, no sentido Três Lagoas-Brasilândia, com aproximadamente 25 Km do núcleo urbano, próximo ao córrego Moeda (figura 1). Iniciou-se em maio 2003 com um total de 345 famílas inscritas. O Acampamento Córrego do Pinto localiza-se na margem direita da BR 158 no sentidotrês Lagoas- Selvíria, próximo ao córrego do Pinto, com aproximadamente 6 Km do núcleo urbano de Três Lagoas. Se formou em 2003 com cerca de 300 famílias que chegaram após o cadastramento daquelas que acamparam próximo ao córrego Moeda. Assim, passaram a aguardar novo cadastramento, o que até o momento não ocorreu. Os dois acampamentos estão sob a responsabilidade do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, não possuindo vínculo com o MST. Figura 01: Carta Topográfica de Três Lagoas/MS com a localização dos Acampamentos Córrego do Moeda e Córrego do Pinto Acampamento do Córrego do Moeda Escala 1: Acampamento do Córrego do Pinto N Devido a falta de apoio e o fato de não terem previsão para formação do assentamento, aos poucos as familias foram abandonando os barracos, sendo que na atualidade apenas 3 familias continuam no acampamento Córrego do Moeda e 20 no acampamento Córrrego do Pinto. Mas, até mesmo
4 essas famílias que estão resistindo enfrentam muitas dificuldades. Apenas algumas famílias recebem uma cesta básica a cada 90 dias, sendo necessário trabalharem na cidade ou em fazendas vizinhas para sobreviverem, com exceção daqueles que já são aposentados e sobrevivem de um salário mínimo que recebem de aposentadoria. A maior parte delas plantam horta e criam animais como galinhas, patos e porcos para subsistência. Segundo informações obtidas no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Três Lagoas as famílias do acampamento Córrego do Moeda estão sendo transferidas para o acampamento do Córrego do Pinto, pelo fato de ser mais próximo ao núcleo urbano, considerando que parte dos acampados trabalham na cidade. Nas visitas aos acampamentos identificamos vários problemas relacionados a falta de infra-estrutura, proveniente do improviso que ocorrem, como a construção de barracos em locais inadequados, utilização da água dos córregos para uso geral sem nenhum tratamento e a ausência de sanitários. Assim, os riscos de contaminação são constantes, associados a falta de saneamento básico e falta de conscientização da maior parte das famílias acampadas. Em entrevista realizada com o Sr. Luis da Silva, de 35 anos, o mesmo afirmou que a água é boa para o consumo, menos nos dias de chuva, pois fica barrenta e é necessário coar. Isto demonstra o grau de desinformação dessas pessoas. Segundo os depoimentos doa acampados já foram constatados casos de verminose e diarréia devido ao uso da água dos córregos. Outra problemática encontrada nos acampamentos está relacionada a falta de consciência ambiental, assim, pode-se observar a presença de lixo em locais inadequados e a utilização de fossas abertas (latrinas) bem próximas aos barracos, provocando mal cheiro. O grau de instruçao entre os acampados é muito baixo, sendo composto por pessoas analfabetas e semi-analfabetas, apenas dois dos entrevistados disseram ter o ensino médio incompleto, o que justifica, em parte, o nível de desinformação sobre os riscos que estão correndo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A sustentação de um acampamento é, sem dúvida, uma forma de pressão para reivindicar o assentamento. Sem perspectiva da realização de uma política de reforma agrária que realmente acelere o processo, cada vez mais se formarão acampamentos à beira de rodovias. Porém, a trajetória dessa luta é penosa, com homens, mulheres e crianças se submetendo à condições desumanas, morando em barracos de lona plástica, dormindo em camas improvisadas, cozinhando em fogões a lenha construidos por eles e desprovidos de instalação sanitária. Essa é a realidade de quase todos os acampamentos do Brasil, incluindo os do Córrego do Moeda e do Córrego do Pinto. Há uma verdadeira falta de informações sobre os riscos que estão correndo. Assim, o trabalho de conscientização se faz necessário com urgência, ensinando a eles alguns cuidados básicos como por exemplo filtrar ou ferver a água utilizada.
5 Bibliografia ALMEIDA, R. A. Distinção e territorialização: o processo de (re) criação camponesa no Mato Grosso do Sul. Presidente Prudente, Tese (Doutorado em Geografia), Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, DELLAZERI, D. O movimento dos trabalhadores rurais sem-terras no Mato Grosso do Sul (1984 a 1993). Ijuí, Monografia (curso de História), Institudo de filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Ijuí, FERNANDES, B. M. MST Formação e territorialização. São Paulo: Hucitec, FERNANDES, B. M. A Formação do MST no Brasil. Petrópolis-RJ: Vozes, HELMAN, C. G. Cultura, saúde & doença. Porto Alegre: Artmed, 4 ª ed., MENDONÇA, F. Geografia e Meio Ambiente. São Paulo: Contexto, OLIVEIRA, A. U. A Geografia das Lutas no Campo. São Paulo: Contexto, 1999.
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