TASSIANE NUNES GARCIA JUSTIÇA RESTAURATIVA E UMA PROPOSTA AO TRIBUNAL DO JÚRI

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1 TASSIANE NUNES GARCIA JUSTIÇA RESTAURATIVA E UMA PROPOSTA AO TRIBUNAL DO JÚRI Monografia apresentada ao curso de Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientador (a): Heloisa Maria Vivo Marques Mestre na área de Psicologia Jurídica. Brasília 2013

2 2 Bem-aventurados os que são brandos, porque possuirão a Terra. (S. Mateus, 5:5.) Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus. (S. Mateus, 5:9.) Digo-vos que, se a vossa justiça não for mais abundante que a dos escribas e dos fariseus, não entrareis no reino dos céus. (S. Mateus, cap. V, v. 20). O teu dever é lutar pelo direito, porém, quando encontrar o direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça. (Eduardo Couture).

3 3 AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço a Deus pela oportunidade abençoada de estudo, instrução e por todas as oportunidades de aprendizado, crescimento e luzes concedidas por sua infinita bondade e misericórdia ao longo de todo este curso maravilhoso, bem como, de minha caminhada pessoal. Agradeço também à minha amada família que em tudo me apoiou e continua a apoiar ao longo de minha trajetória e constituem a base para toda a minha vida. Agradeço, igualmente, a todos os meus professores e professoras que fizeram parte de minha formação enquanto estudante, acadêmica e cidadã, só tenho a agradecer pelo grande aprendizado, pelos conhecimentos transmitidos e pela enorme paciência com que me ensinaram. Ao Pai Maior e a todos que fazem parte de minha história, muito obrigada.

4 4 RESUMO Referência: GARCIA Nunes, Tassiane. Justiça Restaurativa e uma proposta ao Tribunal do Júri p. Monografia (Direito) Universidade Católica de Brasília, Brasília, O presente trabalho de conclusão de curso aborda a ideia de Justiça Restaurativa, suas práticas e no que consistem efetivamente seus princípios e ideais, simultaneamente, a temática tangencia aspectos vinculados ao Tribunal do Júri, na medida em que a proposta é de acompanhamento paralelo das vítimas e ofensores que se encontram no palco central da ocorrência delitiva julgada pelo Tribunal Popular. Sendo assim, a monografia visa refletir sobre o atual sistema criminal e aprofundar a compreensão sobre Justiça Restaurativa, a qual tem sido inserida no cenário nacional gradativamente, por meio de projetos e programas, aos quais, promovem uma aplicação mais humana do direito, com o engajamento entre vítima, ofensor e comunidade. Por ser assim, o trabalho visa também suscitar a reflexão quanto à possibilidade do Direito contribuir para a construção de uma cultura de paz. Palavras-chave: Justiça restaurativa; conflito; mediação; crime; paz; vítima; ofensor; comunidade; tribunal; júri; proposta; humanização.

5 5 ABSTRACT This monograph discusses the idea of restorative justice practices and what consisting effectively its principles and ideals. By the way, the thematic touches aspects related to the jury, in that the proposal is parallel monitoring of victims and offenders who are at the center of the criminal offense occurred and judged by the jury. Thus, the monograph aims to reflect on the current criminal system and deepen the understanding of Restorative Justice, which has been entered on the national scene gradually, through projects and programs that promote the application of human rights, with engagement between the victim, offender and community. Finally, the work also aims to raise the reflection on the possibility of law contribute to build a culture of peace. Keywords: Restorative justice; conflict; mediation; crime; peace; victim; offender; community; court; jury; proposal; humanization.

6 6 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1. Núcleo de Justiça Restaurativa do Fórum Desembargador Hugo Auler do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios Figura 2. Núcleo de Justiça Restaurativa do Fórum Desembargador Hugo Auler do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios Gráfico 1. Relatório Justiça Restaurativa 2005 a Gráfico 2. Análise comparativa 2009/ Gráfico 3. Mediações... 66

7 7 LISTA DE TABELAS 1. Diferenças entre Justiça Restaurativa e Justiça Retributiva Observação pesquisa de campo... 58

8 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA: CONSIDERAÇÕES GERAIS QUANTO ÀS ORIGENS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A JUSTIÇA RESTAURATIVA O PAPEL DE CADA UM ANÁLISE INTRODUTÓRIA DAS PRÁTICAS RESTAURATIVAS BREVE CONSIDERAÇÃO: JUSTIÇA RESTAURATIVA E O ORDENAMENTO PÁTRIO A FILOSOFIA: FUNDAMENTOS, OBJETIVOS, PRINCÍPIOS O QUE A JUSTIÇA RESTAURATIVA NÃO É? NECESSIDADES E PARTES NO PROCESSO RESTAURATIVO PRINCÍPIOS RESTAURATIVOS A noção de shalom Três pilares restaurativos Singela concepção circular A JUSTIÇA RESTAURATIVA E A HUMANIZAÇÃO DO DIREITO O DIFERENTE OLHAR: JUSTIÇA RESTAURATIVA E JUSTIÇA RETRIBUTIVA A COMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS DO ORDENAMENTO PÁTRIO O PLEITO DAS NAÇÕES UNIDAS: RESOLUÇÃO 2002/ PRÁTICA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA: DESAFIOS E CRÍTICAS AS PRÁTICAS E SUAS DINÂMICAS DESAFIOS E CRÍTICAS JUSTIÇA RESTAURATIVA POSSÍVEL: BREVE ESTUDO DE PRÁTICAS IMPLANTADAS NO BRASIL O PROJETO PILOTO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS NO NÚCLEO BANDEIRANTE EM BRASÍLIA/DF Questões institucionais Da pesquisa in loco Metodologia da pesquisa Do resultado da pesquisa Da observação e do ambiente restaurativo Da dinâmica dos trabalhos... 61

9 Dados estatísticos coletados Da discussão dos resultados DA PROPOSTA: POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA AO TRIBUNAL DO JÚRI BREVES APONTAMENTOS SOBRE O TRIBUNAL DO JÚRI COMO INSERIR A JUSTIÇA RESTAURATIVA NO ÂMBITO DO TRIBUNAL POPULAR A FIM DE PROMOVER UMA CULTURA DE PAZ? ATUAÇÃO PARALELA: UM BOM COMEÇO ATUAÇÃO INTEGRADA: PARA O FUTURO DA REFLEXÃO SOBRE A PROPOSTA CONCLUSÃO REFERÊNCIAS ANEXOS... 92

10 10 INTRODUÇÃO O tema do presente trabalho trata sobre o estudo da Justiça Restaurativa e suas práticas no âmbito do processo penal, bem como, suas contribuições para o sistema de justiça criminal tradicional, neste contexto, em que será aprofundada a abordagem do modelo restaurativo será trabalhada uma possível proposta de conciliação entre as concepções e princípios restaurativos com a realidade do Tribunal do Júri, verificando-se, assim, a possibilidade de inserção da Justiça Restaurativa no tratamento dos crimes mais graves. Ante o exposto, o presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivos principais os seguintes: Discutir e aprofundar as concepções acerca da Justiça Restaurativa e seus benefícios no que tange ao tratamento dos crimes como rompimentos das relações sociais; propor a conciliação entre a filosofia da Justiça Restaurativa e o Tribunal Popular conforme os preceitos estabelecidos na Constituição Federal; abordar a Justiça Restaurativa como uma janela para a humanização do Direito e promover a reflexão e o debate em face da realidade do Tribunal do Júri na atualidade. A justificativa deste trabalho se dá pela importância que existe em se debater e refletir o processo penal e o atual sistema de justiça criminal, para tanto, necessário buscar alternativas que tornem a aplicação do direito mais eficaz e próxima às pessoas. Com este pensamento que o trabalho foi formulado, após perceber que a realidade prática do direito penal envolve mais do que provas, papéis e autoridades do Estado, notou-se, que o processo penal lida diretamente com o fator humano, os sentimentos e as dores causadas pelo crime. Assim, a Justiça Restaurativa apareceu como tema chave para tratamento destas questões que não são solucionadas no processo judicial ordinário. Dito isso, a metodologia do trabalho esteve pautada na pesquisa bibliográfica em que se buscaram referências a respeito de cada ponto levantado na monografia e que estavam relacionados diretamente com os objetivos desta tese de bacharelado. Outro método utilizado para a presente pesquisa consistiu em entrevistas com profissional diretamente envolvido com a Justiça Restaurativa e a área criminal, bem como, a coleta de dados e informações em sede de pesquisa de campo com vistas a enriquecer o conteúdo e conceder uma visão ampla quanto à prática da Justiça Restaurativa no âmbito do Direito Penal. Nesse diapasão, o trabalho desenvolveu, primeiramente, uma noção introdutória sobre o processo restaurativo e sua compatibilidade com o ordenamento pátrio, em segundo momento, realizou-se uma análise da essência da filosofia restaurativa, seus princípios, objetivos e valores. Em seguida, tratou-se das questões comparativas da Justiça Restaurativa e

11 11 da Justiça Retributiva, com vistas, a verificar o quanto o modelo restaurativo se encontra apto a contribuir com a humanização do direito. Posteriormente, observaram-se quais os desafios e críticas enfrentados pela Justiça Restaurativa, nesse ínterim, foram estudadas às práticas e os projetos de Justiça Restaurativa existentes no Brasil. Foi realizada também sucinta pesquisa de campo, com vistas, a verificar a realidade prática do modelo restaurativo e suas possibilidades de aplicação quanto aos crimes mais graves, a formular uma proposta possível de aplicação paralela da Justiça Restaurativa ao Tribunal do Júri, sem que isso, viesse a ferir a competência deste tribunal. Finalmente, concluiu-se que a Justiça Restaurativa pode ser vista como um movimento de política criminal, que tem contribuído gradativamente para a humanização do direito, assim como o atendimento das vítimas e ofensores, ao mesmo tempo, pode-se iniciar uma aproximação entre as concepções restaurativas e o Tribunal do Júri no tratamento dos casos de crimes de maior potencial ofensivo.

12 12 1. DA JUSTIÇA RESTAURATIVA: CONSIDERAÇÕES GERAIS O presente capítulo versa sobre questões introdutórias da Justiça Restaurativa, como ela surgiu, quais as suas concepções basilares, quem são as partes diretamente e indiretamente envolvidas no processo restaurativo. Igualmente, serão abordados aspectos introdutórios sobre as práticas restaurativas, bem como, uma breve análise entre a compatibilidade da Justiça Restaurativa com o ordenamento jurídico pátrio. 1.1 QUANTO ÀS ORIGENS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA Em breve apanhado histórico pode-se afirmar que a Justiça Restaurativa no âmbito do direito encontra antecedentes históricos desde as concepções da Paideia 1 na Grécia e na Roma Antiga. Deve-se destacar que suas origens remotas também encontram raízes nas sociedades tribais, em que os nativos se reuniam em círculo para solucionarem conflitos, e as práticas aborígines Maoris, abarcada e impulsionada posteriormente pela Nova Zelândia que introduziu suas práticas na cultura nacional com vistas a solucionar lides de um modo mais pacífico. Por seu lado, os Estado Unidos também introjetou tal prática para a solução de seus embates judiciais e extrajudiciais ao findar do século XIX, quando passou a aplicar as ações restaurativas a fim de solucionar conflitos no plano trabalhista, do comércio, entre particulares e familiares. Durante as décadas de 70 e 80 tais práticas foram implementadas e nos anos 90 então: [...] passou a ser uma estratégia implementada em comunidades de assistência, em que familiares e amigos das vítimas e dos transgressores participavam de processos colaborativos denominados conferências ou círculos, para, mais recentemente, se inserir num leque ainda maior e alcançar adultos e para atender às experiências da dinâmica social e de soluções mais consensuais, participativas e conciliatórias, que demandam a satisfação de necessidades de atenção, solidariedade, responsabilidade, civismo e espírito comunitário. (TRINDADE, 2011, p. 423). Assim, percebe-se que na realidade às práticas restaurativas são uma construção cultural através dos tempos em que os povos buscavam meios de conciliação e composição de lides sem que tivessem que utilizar a autotutela. Sabe-se que nos tempos mais remotos e primitivos, o mais forte realizava a tutela de seu direito com as próprias mãos. Neste viés, a Justiça Restaurativa foi se formando nas culturas orientais, para posteriormente ser abarcada pelos americanos que começaram a utilizá-la com o fim de mediar conflitos. 1 Paideia era a concepção educacional grega voltada à formação do cidadão integral, assim buscava desenvolver o homem em todas as suas potencialidades.

13 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A JUSTIÇA RESTAURATIVA De acordo com Marshall (2000), um dos idealizadores da Justiça Restaurativa como instrumento jurídico, este é um método no qual todas as partes envolvidas mediata ou imediatamente pelo cometimento de um crime se reúnem para debater e discutir a ofensa, e buscar conjuntamente, através do diálogo, as soluções da lide tanto para o presente quanto para o futuro. O aspecto fundamental da Justiça restaurativa reside na consideração de que o crime causa danos às pessoas, e a justiça exige que esse dano seja reduzido ao mínimo possível. Em decorrência dessa concepção, o seu mecanismo nuclear de funcionamento se opera em torno do consenso. Busca-se uma mútua cooperação entre vítima e agressor com o fim de minimizar os resultados danosos produzidos pelo crime. (TRINDADE, 2011, p. 424, grifo do autor). Nessa medida, a Justiça Restaurativa procura trabalhar com os personagens principais do contexto conflitivo sempre com objetivo a reintegração social de todos os lados envolvidos. É deste modo, que a proposta restauradora não só, propõe uma integração vítima e ofensor, como também de todos aqueles que figuram como as partes centrais do delito, quais sejam as famílias, os amigos, ou seja, a microcomunidade interligada à vítima e ao ofensor. Ante o exposto, os pensadores Paul McCold e Ted Wachtel (2007) levantam questões, que devem ser respondidas pelas práticas restaurativas tais como: Quem foi prejudicado? Quais suas necessidades? Como atender a essas necessidades? Assim, podemos citar: Identificando as necessidades oriundas da violação e do trauma causado por um ato contrário à lei, a Justiça Restaurativa propõe que, em vez do autor ser simplesmente punido através de um sistema restritivo de liberdade de questionável eficiência, seja oportunizado ao transgressor assumir socialmente sua atitude, e agir de forma consciente para reparar seu erro, mediante a adoção de compromissos concretos. Essa conscientização é importante tanto para a vítima se sentir efetivamente reparada, quanto para o infrator, que ganha à oportunidade de se confrontar com seu ato e de se reinserir no grupo social de sua pertença. (TRINDADE, 2011, p. 424). Diante da busca de pacificação social a Justiça Restaurativa nos traz uma proposta inovadora que promove a escuta de todos os lados do conflito, sendo assim, é, por conseguinte, um tratamento mais democrático e mais plural de se abordar o processo criminal. Nesta perspectiva, promove uma solução mais humana para as marcas deixadas pelo crime, por meio, da interface entre vítima, ofensor, comunidade e Estado, com vistas, a resgatar a convivência social pacífica e de algum modo reequilibrado. A abordagem restaurativa, com alto controle social e apoio social, confronta e desaprova as transgressões, enquanto afirma o valor intrínseco do transgressor. A essência da justiça restaurativa é a resolução de problemas de forma colaborativa. Práticas restaurativas proporcionam àqueles que foram prejudicados por um incidente a oportunidade de reunião para expressar seus sentimentos, descrever como foram afetados e desenvolver um plano para reparar os danos ou evitar que aconteça de novo. A abordagem restaurativa é reintegradora e permite que

14 14 o transgressor repare danos e não seja mais visto como tal. (2011, apud TRINDADE; PAUL MCCOLD; WACHTEL, 2007, grifo nosso). Em face do pensamento supracitado, importante considerar que se por um lado a Justiça Restaurativa se foca sobre as angústias da vítima na tentativa de remediá-las, por outro, traz à baila os valores incutidos no âmago do ofensor ao convocá-lo para a responsabilidade. Nesta linha, torna-se evidente o caráter conjunto e colaborativo das práticas restaurativas para resolução da desarmonia social gerada pelo crime. 1.3 O PAPEL DE CADA UM Essencial frisar que a Justiça Restaurativa tem profundo apreço e preocupação com as necessidades das partes intricadas na lide, neste sentido, é de grande relevância considerar quais serão as respostas restaurativas às necessidades daqueles envolvidos na ação delituosa, por isso mesmo, devem ser analisados como envolvidos no delito tanto aqueles que possuem relação direta com a ocorrência do crime quanto os entes secundários, como por exemplo, amigos, parentes, sociedade representada pelo Estado. Desse modo, é dever da Justiça Restaurativa identificar e propiciar um campo de ação adequado, a fim, de suprir as necessidades surgidas a partir da prática criminosa, por meio, de respostas restaurativas adequadas, não podendo olvidar qualquer dos lados envolvidos. Tal concepção é, sem dúvida, um desafio na prática, mas, a Justiça Restaurativa também propõe soluções a tal desafio. Todas as partes interessadas principais precisam de uma oportunidade para expressar seus sentimentos e ter voz ativa no processo de reparação do dano. As vítimas são prejudicadas pela falta de controle que sentem em consequência da transgressão. Elas precisam readquirir seu sentimento de poder pessoal. Esse fortalecimento é o que transforma as vítimas em sobreviventes. Os transgressores prejudicam seu relacionamento com suas comunidades de assistência ao trair a confiança das mesmas. Para restabelecer essa confiança, eles devem ser fortalecidos para poderem assumir responsabilidade por suas ações. As suas comunidades de assistência preenchem suas necessidades garantindo que algo será feito sobre o incidente, que tomarão conhecimento do ato danoso, que serão tomadas medidas para coibir novas transgressões, e que vítimas e transgressores serão reintegrados às suas comunidades (2011, apud TRINDADE; PAUL MCCOLD; WACHTEL, 2007). Os desafios surgem principalmente, no que tange ao dar a voz a todas as partes envolvidas e quando do enfrentamento entre vítima e ofensor e, consequentemente, a expressão de seus sentimentos. Todavia, os próprios idealizadores da Justiça Restaurativa já propõem soluções a tal problema, a sugerir que o diálogo seja por escrito ou feito por meio de cartas, vídeos, já que a presença olhos nos olhos nem sempre é possível, devido à fragilidade da vítima.

15 15 Sendo assim, as práticas restaurativas vêm se flexibilizando e propondo novos meios de solução de conflitos, a dar voz para todos os envolvidos na ocorrência delituosa, por meio de vários instrumentos de comunicação, para que seja efetiva, mas sem imposição, a interface vítima e transgressor. 1.4 ANÁLISE INTRODUTÓRIA DAS PRÁTICAS RESTAURATIVAS Diante disso, temos que a abordagem conceitual da Justiça Restaurativa implica em, não só, buscar solucionar conflitos e danos causados por crimes de um modo mais democrático e humano, como também visa demonstrar que o modelo tradicional de punição desconsidera os fatores emocionais e sociais das pessoas envolvidas pelo crime. Ademais, as sanções ao invés de atender necessidades e minimizar dores acabam por estigmatizar o transgressor, além de ser essencialmente repressiva, algo que poderia se chamar de a punição da punição, ou punição em si mesma conforme ensina Hegel, tendo em vista, que a violação da norma jurídica gera uma repressão por parte estatal e sendo o crime a negação do Direito, acaba a pena corporificando a negação da negação do Direito. Nesse aspecto, torna-se essencial: romper com a ideia já arraigada de punição, abrindo a possibilidade para uma nova leitura do agir humano que valorize também o elemento relacional dos sujeitos e seu desenvolvimento individual e social. (TRINDADE, 2011, p.426, grifo nosso). Ante o exposto, percebe-se o movimento tendente à modificação e transformação do modelo tradicional de Justiça que visa como último fim a pena, que reflete uma compreensão reducionista do Direito Penal. Aceitar a hipótese da ruptura com o modelo tradicional, o do castigo penal como solução única, permite a aproximação com o pensamento em que a preservação do humano prevalece sobre qualquer outro interesse ou valor, onde o pensar não se limita em pensar a culpa do fato e o tamanho da resposta. Abre-se uma fresta no sistema, em que o respeito ao Outro, esse Outro insuscetível de reduções e definições, passa a ser o primeiro e o objeto central do pensar. E, nesse paradigma, o Outro e as relações com ele são instituidoras de responsabilidade, um modo genuíno de instituir o justo entre os humanos. (2011, apud TRINDADE; KONZEN, 2007 p. 426). Ao voltar o olhar e o pensamento centrados no ser humano e no seu potencial de reconstrução e na sua capacidade de criação, a Justiça Restaurativa pretende identificar o conflito e, de modo mais humano, o solucionar por meio dos verbos restaurar, reconstruir, recomeçar, reconstituir. Não se pode negar o caráter educativo e até mesmo lúdico da Justiça Restaurativa, conforme nos ensinam os pensadores desta filosofia, enquanto a justiça tradicional nos diz: Você fez isso e tem que ser castigado! A justiça restaurativa pergunta: O

16 16 que você pode fazer agora para restaurar isso? (2011, apud TRINDADE; PINTO, 2007, grifo nosso). Percebe-se que a abordagem da Justiça Restaurativa é bem diversa da compreendida atualmente pela justiça tradicional, outro ponto importante que deve ser considerado é que a Justiça Restaurativa visa evitar o enfoque excessivo nos agentes estatais, ou seja, procura a ação restaurativa tirar do palco central a figura do promotor, do policial, do juiz e do defensor, deixando-os em plano secundário, em que os personagens principais são àqueles diretamente afetados pelas dores do crime. No entanto, deve-se frisar que apesar de colocar em segundo plano os agentes do Estado, em nenhum momento, a Justiça Restaurativa aborda a plena e completa abolição às formas institucionalizadas, tampouco, exclui a justiça formal, a vigência da norma ou mesmo os princípios do estado democrático de direito. Na realidade, o que a Justiça Restaurativa traz em seu arcabouço e propõe de maneira singela, é um tratamento diferenciado as pessoas diretamente envolvidas no delito e que possam ter mais que direito ao silêncio ou direito de acusação, tenham direito a voz, a palavra simples e espontânea com vistas a expor seus intricados sentimentos e o que estão sofrendo ante a ruptura do equilíbrio social e das relações em face do crime. Muito diferente da Justiça Tradicional que em seu bojo confere a palavra através do faça o que mando ou responda o que é perguntado, como ocorre nos interrogatórios em geral, a Justiça Restaurativa pergunta: Você deseja falar sobre isso? Você quer restaurar isso?, a deixar a parte envolvida no conflito livre para responder se quer solucionar e trabalhar o problema de um modo diferente da Justiça Tradicional, neste viés, a Justiça Restaurativa passa a ser uma solução paralela para as lides na seara jurídica, sem, entretanto, se impor como ocorre no processo tradicional. Aliás, qualquer imposição no âmbito restaurativo seria a própria negação dos princípios restaurativos. Por isso, a justiça restaurativa não é proposta como justiça alternativa, mas como uma forma de solução paralela, que deve conviver com a justiça tradicional, visto que ela somente é aplicável circunstâncias peculiares, nas quais exige a admissão do transgressor quanto a verdade dos fatos e a concordância de todos os interessados na solução do conflito. (2011, p. 427, apud, TRINDADE; BRANCHER, 2007, grifo nosso). Enfim, pode-se concluir que a Justiça Restaurativa possui em seu bojo de princípios o reequilíbrio social, por meio, da humanização do direito e da convivência paralela com a justiça tradicional. A Justiça Restaurativa promove a reconstrução das relações e a minimização das dores envolvidas no crime. Assim, de modo muito singelo as práticas

17 17 restaurativas propõem soluções a considerar o Outro como Outro, por isso, em sua base também se encontra o respeito como guia para qualquer ação restauradora. 1.5 BREVE CONSIDERAÇÃO: JUSTIÇA RESTAURATIVA E O ORDENAMENTO PÁTRIO Em que pese o direito pátrio não possuir legislação e dispositivos específicos a tratar a Justiça Restaurativa, não se vislumbra, qualquer incompatibilidade grave entre o sistema jurídico brasileiro e a possibilidade de aplicação de práticas restaurativas. Ao contrário, ao que parece a Justiça Restaurativa preenche os requisitos precípuos da Lei Maior, que versa logo em seu art. 1º sobre os princípios fundamentais e traz em seu rol de princípios a dignidade da pessoa humana como fundamento da República. A seguir, não muito distante dos princípios fundamentais, a embasar de maneira a dar efetividade à abstração versada no primeiro artigo da Carta Magna, se encontra o art. 3º dos objetivos fundamentais do Estado, em que a promoção de uma sociedade mais justa e solidária se encontra em seu rol de objetivos. Além de se coadunar aos princípios e aos objetivos fundamentais da República, a Justiça Restaurativa encontra brechas no ordenamento pátrio que lhe permitem uma aplicação mais efetiva, observa-se no artigo 98, I, da Constituição Federal, quando a Lei Maior aborda a possibilidade de conciliação em procedimento oral e sumaríssimo, de infrações penais de menor potencial ofensivo. Desse modo, a fase preliminar prevista na Lei 9.099/95 e na Lei /01 pode abarcar os preceitos restaurativos, por outro lado, até mesmo a transação penal já configura um caminho para aplicação de ações restaurativas. Ademais, a Lei nº 7.210/84 chamada Lei de Execuções Penais traz em seus artigos uma tendência intrínseca às concepções restaurativas, na medida em que em seu art. 4º aborda a possibilidade do Estado recorrer à comunidade quando da execução das penas, além disso, ao longo de seu texto estabelece formas de assistência ao preso, oportunidade de trabalho interno e externo, bem como, vedações que concernem ao princípio da humanidade das penas conforme se verifica no art. 45 da mencionada legislação. De outro modo, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) também adota, de forma não expressa, uma parcela do modelo restaurativo, especificamente, em seu art. 126, que dispõe sobre a remissão como mecanismo de exclusão, suspensão ou extinção do processo no que tange a aplicação das medidas socioeducativas, havendo a promoção da participação do adolescente, seus familiares, e da vítima para busca da efetiva reparação dos danos causados (TRINDADE, 2011, p.430, grifo nosso). Ainda sobre as práticas

18 18 restaurativas no plano do ordenamento jurídico brasileiro, podemos destacar os seguintes projetos: (...) o Ministério da Justiça, através da Secretaria da Reforma do Judiciário, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, vem apoiando a implementação das práticas restaurativas em Porto Alegre e em São Caetano do Sul, abrangendo atividades relacionadas à Justiça da Infância e da Juventude, e no Núcleo Bandeirante, no Distrito Federal, abarcando os Juizados Especiais Criminais. (2011, apud, TRINDADE; BRANCHER, 2007). Portanto, percebe-se que a legislação pátria já demonstra contornos restaurativos, sem, contudo, afetar a prestação jurisdicional. Além disso, atende os parâmetros das garantias fundamentais que não podem ser suprimidas, pois não só negaria o viés restaurador como também afetaria diretamente o texto constitucional. Ademais, percebe-se uma tendência tanto no âmbito do direito interno como no direito internacional de promoção das ações restaurativas. Realizados os apontamentos quanto às noções introdutórias sobre a Justiça Restaurativa desde suas origens até a compatibilização com a legislação brasileira, passa-se ao próximo capítulo, em que serão aprofundadas as concepções restaurativas, para compreensão de suas bases, princípios e objetivos centrais.

19 19 2. A FILOSOFIA: FUNDAMENTOS, OBJETIVOS, PRINCÍPIOS. Após as considerações gerais sobre a Justiça Restaurativa, busca-se neste segundo capítulo refletir sobre os questionamentos que deram origem a esta modalidade que visa o melhoramento, ou talvez, uma reforma do sistema de Justiça Tradicional, ao qual, muito vem incomodando os profissionais que se debruçam sobre as ações do poder judiciário, mormente, vinculado a um sistema retributivo, principalmente, no que toca o âmbito do direito e do processo penal. Em uma primeira reflexão, as perguntas que logo surgem, ante o estudo da Justiça e como se refletem no plano penalista, são: Como reagir às ofensas? O que fazer em face da ocorrência de um crime? O que pede o nosso senso de Justiça? (ZEHR, 2012, p.13). Estas são algumas das perguntas, as quais, quando não são respondidas pela metade, acabam por precipitar-se no vácuo da ausência de qualquer resposta. O sistema jurídico atual, especificamente, no que tange a justiça criminal, apesar de ser um instrumento para o controle social, tem demonstrado limitações, especialmente, quanto ao atendimento das necessidades humanas envolvidas diretamente com o processo penal. Não raro, vítimas, ofensores, membros da comunidade sentem que o sistema tradicional deixa de atender adequadamente às suas carências. No plano social, crescem a insegurança, ansiedade e muitos pensadores e juristas chegam a considerar que o processo judicial aprofunda as chagas e os conflitos sociais ao invés de contribuir para uma pacificação. Sendo assim, a Justiça Restaurativa procura tratar de algumas dessas necessidades e limitações, a trabalhar de modo mais direto com os questionamentos supramencionados. Em algumas localidades, a Justiça Restaurativa tem sido um sinal de esperança, bem como, um instrumento a indicar novos caminhos para o futuro de uma prestação jurisdicional que se preocupa com as necessidades humanas envolvidas com a violência causada pela ação criminosa. Deve-se destacar que a Justiça Restaurativa começou com esforços para lidar com os chamados crimes contra o patrimônio, ou seja, assaltos, furtos, roubos, que socialmente são considerados crimes de menor gravidade. Todavia, as práticas restaurativas vêm ampliando o campo de atuação e já estão disponíveis em algumas localidades para lidar com crimes como morte causada por embriaguez ao volante, agressão, estupro e mesmo homicídio. A partir da experiência das Comissões de Verdade e Reconciliação na África do Sul, também vêm sendo realizado esforços para aplicar a estrutura da Justiça Restaurativa a situações de violência generalizada. Além disso, tais abordagens e práticas estão ultrapassando o sistema da justiça criminal e chegando a escolas, locais de trabalho e instituições religiosas. Alguns defendem a ideia de que a abordagens restaurativas como os círculos (prática

20 20 específica que nasceu nas comunidades indígenas canadenses) podem ser usadas para trabalhar, resolver e transformar os conflitos em geral. Outros veem as conferências de grupos familiares (modalidade com raízes na Nova Zelândia e Austrália, e também em encontros facilitados entre vítima e ofensor) como um caminho para construir e sanar comunidades. (ZEHR, 2012, p. 14). Finalmente, importante ressaltar que apesar do termo Justiça Restaurativa englobar várias ações, práticas e estar encabeçando alguns programas implementados por vários países, seus fundamentos estão baseados em um conjunto de princípios, a caracterizar uma filosofia, uma nova forma de pensar as ofensas e os meios de atender as necessidades das partes diretamente e indiretamente afetadas por esta ofensa. Assim, podemos colacionar: Em última análise, a Justiça Restaurativa oferece uma estrutura alternativa para pensar as ofensas. (ZEHR, 2012, p.15, grifo nosso). 2.1 O QUE A JUSTIÇA RESTAURATIVA NÃO É? Uma das preocupações dos pensadores da Justiça Restaurativa diz respeito a constante confusão quanto à utilização desta intitulação Justiça Restaurativa nos programas restaurativos e o afastamento da prática aos princípios preceituados por esta filosofia. Efeito este, natural, ante a agitação da realidade e sua difícil implantação diante dos instrumentos já existentes e disponibilizados pelo sistema vigente. Experiências anteriores para promover mudanças no campo da justiça nos advertem de que desvios e deformações acontecem inevitavelmente, apesar de nossas melhores intenções. Se os defensores da mudança não estiverem dispostos a reconhecer e atacar esses prováveis desvios, seus esforços poderão acabar produzindo algo muito diferente do que pretendiam. De fato, as emendas podem acabar sendo muito piores que o soneto que planejavam reformar ou substituir. Uma das salvaguardas mais importantes contra tais desvios é dar a devida atenção aos princípios fundamentais. Se estivermos bem conscientes deles, se planejarmos nossos programas com esses princípios em mente, se nos deixarmos avaliar por esses mesmos princípios em mente, se nos deixarmos avaliar por esses mesmos princípios, é bem mais provável que nos mantenhamos na trilha correta. (ZEHR, 2012, p , grifo nosso). Nesse viés, importa considerar que os princípios norteadores da Justiça Restaurativa são fundamentais para manter a unidade de concepção quanto a este novo modo de pensar as questões que envolvem a violência e o crime em meio à sociedade. Mesmo em face de um constante e rápido crescimento das ações restaurativas e da divulgação destas mesmas ações, torna-se fundamental manter seus princípios básicos, se admitindo, todavia, as flexibilizações necessárias a cada cultura e a cada comunidade. Por ser assim, é que se torna de suma relevância dizer e evidenciar o que a Justiça Restaurativa não é, e isso é sistematizado pelo pensador restaurador Howard Zehr que com

21 21 muita maestria e simplicidade, explica e anota cada ponto, ao qual, a Justiça Restaurativa não corresponde. A primeira questão que deve ser pontuada é que a Justiça Restaurativa não tem como objetivo principal o perdão ou a reconciliação, isto porque, algumas vítimas e defensores de vítimas possuem uma reação, algo hostil, quanto às práticas restaurativas por pensarem que o objetivo primordial do programa é forçar a vítima a perdoar ou se reconciliar com o ofensor. No entanto, o perdão ou mesmo a reconciliação não são os focos principais da Justiça Restaurativa, mesmo que suas ações promovam um contexto em que tal venha a resultar em um possível perdão ou mesmo conciliação entre os envolvidos diretos com o crime e a violência, entretanto, nada pode ser imposto a qualquer das partes envolvidas. De fato, algum grau de perdão, ou mesmo de reconciliação, realmente ocorre com mais frequência do que no ambiente litigioso do processo penal. Contudo, esta é uma escolha que fica totalmente a cargo dos participantes. Não deve haver pressão alguma no sentido de perdoar ou de buscar reconciliação. (ZEHR, 2012, p. 18). Assim, qualquer modo que venha a forçar algum dos participantes no programa restaurativo acaba por negar os próprios fundamentos preceituados pela Justiça Restaurativa, pois se desta forma proceder à ação restaurativa, acaba por deixar seu caráter restaurador, para ser mais um instrumento de busca da celeridade em um sistema tradicional e que visa, especificamente, a imposição ao invés da humanidade no âmbito litigioso. Outra questão que precisa ser aclarada diz respeito à mediação, muitos programas e mesmo ações restaurativas são classificadas como mediação, quando na realidade o termo mais adequado para as práticas restaurativas deveria ser o encontro e o diálogo, isto porque as abordagens restaurativas estão para além da reunião entre vítima e ofensor, a Justiça Restaurativa em sua essência busca atender necessidades e nem sempre será pela ação de colocar vítima e ofensor frente a frente que se estará praticando e atendendo as necessidades dos participantes do processo restaurativo. [...] muitos programas de Justiça Restaurativa são desenhados em torno da possibilidade de um encontro facilitado entre vítimas, ofensores e, possivelmente, membros da comunidade. No entanto, nem sempre se escolhe realizar o encontro, nem seria apropriado. Além disso, as abordagens restaurativas são importantes quando o ofensor não foi pego ou quando uma das partes não se dispõe ou não pode participar. Portanto, a abordagem restaurativa não se limita a um encontro. Mas, mesmo quando o encontro acontece, o termo mediação não constitui uma descrição adequada daquilo que vai acontecer. Num conflito mediado se presume que as partes atuem num mesmo nível ético, muitas vezes com responsabilidades que deverão ser partilhadas. Embora esse conceito de culpa partilhada seja válido em certos crimes, na maioria deles isso não ocorre. (ZEHR, 2012, p , grifo nosso). Ademais importa ressaltar que para ocorrer um encontro de Justiça Restaurativa, na maior parte dos casos, o ofensor deve admitir algum grau de responsabilidade pela ofensa

22 22 cometida, além disso, o programa trabalhará com uma linguagem que deixe evidente a ofensa e a reconheça como tal. Por essas razões, o termo mediação vem, gradativamente, sendo substituído pelos termos encontro e diálogo conforme supramencionado. Um dos aspectos de discussão e difusão para que os programas de Justiça Restaurativa ganhem aceitação é o foco quanto aos indicadores de redução da reincidência, ou seja, no intuito de aumentarem seu plano de atuação, alguns projetos desenvolvidos vêm se focando na redução das ações delitivas em série, entretanto, este não é o objetivo principal da Justiça Restaurativa. Na realidade, a diminuição da reincidência ou mesmo das ofensas em série são uma consequência, ou melhor, um subproduto da Justiça Restaurativa. Logo, não se deve conceber que às praticas restaurativas só podem ser fomentadas, quando reduzir a reincidência de determinados indivíduos, mas sim, pelo modo como o ato restaurador procura atender as vítimas ao mesmo tempo em que enseja ao ofensor a noção de responsabilidade quanto a seus atos e perante todos àqueles que sofreram com a ofensa. Há bons motivos para acreditar que tais programas reduzem de fato a criminalidade. As pesquisas realizadas até o momento com foco principalmente em ofensores juvenis são bastante animadoras em relação a esse quesito. No entanto, a redução da reincidência não é o motivo pelo qual se devam promover os programas de Justiça Restaurativa. [...] As necessidades das vítimas precisam ser atendidas, os ofensores devem ser estimulados a assumir responsabilidade por seus atos, e aqueles que foram afetados por seus atos devem estar envolvidos no processo [...]. (ZEHR, 2012, p. 20). Por outro lado, as diversidades culturais de cada comunidade devem ser levadas em consideração quando se aborda a possibilidade de promoção da Justiça Restaurativa, chega-se a dizer que ela deve ser construída de baixo para cima (ZEHR, 2012, p. 21), para que seja efetiva no meio social em que se insere. Mas, não se deve esquecer que sua construção se dará através do diálogo e reflexão sobre suas necessidades e recursos, a aplicar como base os princípios que lhe são próprios. É por este motivo que os pensadores da Justiça Restaurativa concebem-na como uma bússola e não um mapa, senão, vejamos: A Justiça Restaurativa não é um mapa, mas, seus princípios podem ser vistos como uma bússola que aponta na direção desejada. No mínimo, a Justiça Restaurativa é um convite ao diálogo e à experimentação. (ZEHR, 2012, p. 22, grifo nosso). Uma das concepções que fomentam discussões acerca da Justiça Restaurativa está vinculada ao senso comum que gira entorno da ideia, a qual, o processo restaurador fora concebido para ser aplicado somente as ofensas comparativamente menores ou a ofensores primários. Tal compreensão vem se desenvolvendo, pois possui maior aceitação social,

23 23 entretanto, a experiência com a Justiça Restaurativa tem evidenciado que suas perguntas e princípios podem e devem ser aplicados aos crimes de maior gravidade. Diante disso, a prática revela que uma compreensão superficial da Justiça Restaurativa e a falsa noção da obrigatoriedade de mediação, conciliação e o objetivo de redução de reincidências, alimenta o entendimento de que às práticas restaurativas devem se reduzir aos crimes de menor potencial ofensivo ou só podem ser tratadas com aqueles que cometeram um ato criminoso pela primeira vez. Esta visão tem deixado de lado as enormes contribuições que a Justiça Restaurativa detém e pode oferecer ante os crimes de maior gravidade. Outrossim, a Justiça Restaurativa não é uma panaceia (ZEHR, 2012, p. 22), ou seja, não pode nem deve ser considerada como um pretenso remédio para todos os males, principalmente, ante um processo penal intricado e complexo como o que vivenciamos na atualidade. Por isso, na realidade trata-se de um norteador a indicar caminhos melhores a seguir e a serem desenvolvidos. A Justiça Restaurativa não é, de modo algum, resposta para todas as situações. Nem está claro que deva substituir o processo penal, mesmo num mundo ideal. Muitos entendem que, mesmo que a Justiça Restaurativa pudesse ganhar ampla implementação, algum tipo de sistema jurídico ocidental (idealmente orientado por princípios restaurativos) ainda seria necessário como salvaguarda e defesa dos direitos humanos fundamentais. [...] A maioria dos defensores da Justiça Restaurativa concorda que o crime tem uma dimensão pública e uma privada. Creio que seria mais exato dizer que o crime tem uma dimensão social ao lado de uma mais local e pessoal. O sistema jurídico se preocupa com a dimensão pública, ou seja, os interesses e obrigações da sociedade representada pelo Estado. Mas esta ênfase relega ao segundo plano, ou chega a ignorar, os aspectos pessoais e interpessoais do crime. Ao colocar o foco sobre as dimensões privadas do crime, consequentemente valorizando seu papel, a Justiça Restaurativa procura oferecer um maior equilíbrio na maneira como vivenciamos a justiça. (ZEHR, 2012, p , grifo nosso). Nessa medida, é de se frisar que a Justiça Restaurativa não é necessariamente uma alternativa ao aprisionamento, o que significa dizer que ela pode ser aplicada conjuntamente com as penas de detenção, ou em paralelo a estas. Porém, o desenvolvimento da Justiça Restaurativa, sem dúvida, levará a uma mudança quanto à natureza dos estabelecimentos prisionais, bem como, reduzirá a utilização do recurso de cerceamento da liberdade que, historicamente, sempre foi utilizado, de modo até abusivo, pela cultura ocidental, que vê no encarceramento a principal forma de corrigir condutas criminosas e dar maior segurança. Desse modo, não se deve conceber que a Justiça Restaurativa se contraponha necessariamente à justiça retributiva, isto porque, ela pode caminhar em paralelo com a mesma e seus princípios podem ser introduzidos gradativamente no plano retributivo, a equilibrar a retribuição e torná-la um instrumento de restauração.

24 24 Dito isso, pensar em como agir em face de uma ofensa é pensar também em como preveni-la ou mesmo respondê-la e isto implica não só a sanção, mas, de que modo à sanção será efetiva e todos os lados afetados pela violência ouvidos e atendidos em suas necessidades. Ou seja, de certa forma, a Justiça Restaurativa está quase no meio termo entre as teorias legitimadoras das penas 2 e as teorias abolicionistas das penas 3. Sendo assim, seria um pouco equivocado considerar que a Justiça Restaurativa é um contraponto fundamental à justiça retributiva. 2.2 NECESSIDADES E PARTES DO PROCESSO RESTAURATIVO Depois da compreensão do que não corresponde aos objetivos e fundamentos da Justiça Restaurativa, passemos a uma abordagem mais aprofundada do que seja as tão faladas necessidades dos envolvidos com o crime e quais os seus papéis ante a ação delitiva que levou a desarmonia social. Estes dois pontos, são focos primordiais quando adentramos no estudo do processo restaurador. Nessa linha, os defensores da Justiça Restaurativa observaram que as necessidades dos interessados, bem como, daqueles diretamente envolvidos com o ato lesivo não estavam sendo atendidos pelo processo penal corrente. Além disso, perceberam que é por demais restritiva a visão quanto aos verdadeiros legitimados a participar ou a deter interesses no plano do processo judicial. A corroborar este entendimento vale citar: A Justiça Restaurativa amplia o círculo dos interessados no processo (aqueles que foram afetados ou têm uma posição em relação ao evento ou ao caso) para além do Estado e do ofensor, incluindo também as vítimas e os membros da comunidade. (ZEHR, 2012, p. 24, grifo nosso). Foi a partir desta concepção focada em necessidades e papéis que surgiu o movimento restaurativo, um processo com viés inclusivo e colaborativo, que demonstra o caráter participativo e ativo das partes. A Justiça Restaurativa tem profundo apreço pelas necessidades da vítima de atos ilícitos, em especial, aquelas que não estão sendo atendidas, adequadamente, pelo sistema de justiça criminal. O que se verifica na prática do direito penal é que as vítimas se sentem ignoradas e até mesmo agredidas pelo processo penal. Ou seja, como se não bastasse o trauma 2 As teorias legitimadoras das penas estão embasadas na necessidade de haver uma pena, ou seja, quando da ocorrência de um crime este deve ser punido e por isso a necessidade da pena. Algumas teoria legitimadoras como as absolutas, pautadas na compreensão de Kant e Hegel, vão mesmo mais longe, ao afirmar que não haveria direito penal se não existissem as penas. 3 Por outro lado, ante a crise do sistema penal retributivo e das teorias legitimadoras das penas, sugiram as teorias críticas das penas e neste âmbito iniciou-se a discussão quanto à completa ou gradual abolição da punição, por meio, da extinção das penas, o que vem sendo, igualmente, questionado.

25 25 infligido por uma violência e uma ocorrência criminosa, o próprio processo criminal acaba por agredir ainda mais as vítimas. Nessa perspectiva, uma pergunta paira na mente daquele que não está habituado com a prática jurídica e os conhecimentos da área do Direito: Como um sistema criado para proteger as vítimas pode agredi-las ao invés de defendê-las?, sem dúvida, um questionamento pertinente, no entanto, ao nos depararmos com o processo penal, logo se percebe que não são as vítimas que se encontram no polo passivo da agressão criminosa, mas, o Estado que toma as dores das vítimas para si e por isso relega-às ao segundo plano, deixando-as, por assim dizer, carentes quanto ao atendimento de suas necessidades, dentre elas, quatro tipos, parecem estar sendo negligenciadas pelo processo penal: Informação, voz para expressar sua experiência, empoderamento e restituição patrimonial. No plano da informação, temos que a vítima necessita de respostas quanto a sua experiência traumática, ela tem o desejo de saber por que os fatos ocorreram daquela maneira, o que levou o ofensor a realizar a ação criminosa, e estes questionamentos se encontram para além do processo judicial, senão vejamos: A vítima precisa de respostas às suas dúvidas sobre o ato lesivo por que aconteceu e o que aconteceu depois? Precisa de informações reais, não especulações ou informações oficiais vindas de um julgamento ou dos autos do processo. Conseguir informações reais em geral requer tenhamos acesso direto ou indireto ao ofensor que detém a informação. (ZEHR, 2012, p. 25). Outra necessidade que resta negligenciada pelo processo penal, está vinculada ao relato, ou seja, a necessidade que a vítima possui de vivenciar o crime por meio da narrativa quanto ao acontecimento. No processo terapêutico, é importante que a vítima reconte sua história várias vezes a fim de superar a marca deixada por uma experiência traumática é por isso que a Justiça Restaurativa se preocupa em dar voz a todos os lados intricados na lide, principalmente, às vítimas de uma violência. Um elemento importante no processo de recuperação ou superação da vivência do crime é a oportunidade de narrar o acontecido. De fato, na maioria dos casos é importante que a vítima reconte sua história várias vezes. Há bons motivos terapêuticos para tanto. Parte do trauma acarretado pelo crime advém da forma como ele perturba a nossa visão sobre nós mesmos e o mundo, nossa história de vida. Transcender essa vivência implica em recontar nossa vida, narrando a história em contextos significativos, muitas vezes em situações onde receberá reconhecimento público. Com frequência é importante para a vítima contar a história àqueles que causaram o dano, fazendo-o entender o impacto de suas ações. (ZEHR, 2012, p. 25). Por seu lado, o empoderamento aparece como uma carência que se configura na privação do controle da própria vida, quando da ocorrência de um crime é como se a pessoa perdesse o norte, o chão, o sentido de seus sonhos, então surge a necessidade de se apoderar novamente de sua realidade de vida, até mesmo para suprir a sensação de impotência

26 26 causada pela vivência de um ato criminoso. Neste sentido, a Justiça Restaurativa propõe um maior envolvimento com o processo judicial por parte da vítima, para que aos poucos desenvolva o senso de empoderamento do que aconteceu e retorne ao comando de sua vida, a dirimir, assim, as consequências do trauma. Em geral as vítimas sentem que a ofensa sofrida privou-lhes do controle controle sobre sua propriedade, seu corpo, suas emoções, seus sonhos. Envolver-se com o processo judicial e suas várias fases pode ser uma forma significativa de devolver um senso de poder às vítimas. (ZEHR, 2012, p. 26). Por fim, a outra necessidade evidente e não atendida no processo penal é a restituição patrimonial, que mesmo não suprindo e dor e o vazio deixado por um crime constituí um reconhecimento simbólico do prejuízo causado, responsabilização com um esforço para corrigir os danos causados, sem dúvida, esta é uma importante necessidade que deve ser observada, principalmente, quando o ofensor tem condições sociais e patrimoniais para restituir a vítima. A restituição patrimonial por parte do ofensor geralmente constitui elemento importante para as vítimas, por vezes, em virtude das perdas reais sofridas mas, igualmente, devido ao reconhecimento simbólico que a restituição dos bens representa. Quando um ofensor faz um esforço para corrigir o dano cometido, mesmo que parcialmente, isto é uma forma de dizer estou assumindo a responsabilidade, você não é culpado/a pelo que fiz. De fato, a restituição de bens é um sintoma ou sinal que representa uma necessidade mais básica a de vindicação. [...] A Restituição de bens é uma dentre muitas outras maneiras de atender a essa necessidade de igualar o placar. Um pedido de desculpas também pode contribuir para satisfazer essa necessidade de ter reconhecido o mal que nos foi infligido. (ZEHR, 2012, p. 26). Assim, temos as principais necessidades que a Justiça Restaurativa busca atender no que toca as vítimas, ao passo que o sistema jurídico penal tradicional não alcança ou demonstra limitações quanto ao atendimento destas carências. Importante ressaltar, todavia, que não se esgotam as necessidades das vítimas nos pontos supracitados, mas, são esses alguns dos principais, aos quais, restam omissos no âmbito do processo penal. No que tange aos ofensores, a Justiça Restaurativa traz como foco primordial a questão da responsabilidade daquele que comete uma ofensa. Diferentemente, da abordagem restaurativa o processo penal se preocupa, mormente, em dar a punição e responsabilizar o ofensor, sem que este compreenda as consequências de seus atos. O caráter adversarial do processo penal exige que àquele que cometeu um crime acabe por defender seus interesses sem a reflexão quanto à responsabilidade pessoal, bem como, sobre os danos causados contra a pessoa que sofreu a violência. Assim, o âmbito da justiça tradicional deixa o ofensor [...] desestimulado a reconhecer sua responsabilidade e tem poucas oportunidades de agir de modo responsável concretamente. (ZEHR, 2012, p.27, grifo nosso).

27 27 Nesse sentido, os estereótipos e racionalizações somente distanciam os ofensores das pessoas agredidas. Por isso, o senso de alienação social do ofensor tende a aumentar ao passar pelo processo penal e pela experiência prisional que apenas aprisiona ainda mais seus sentimentos humanos, a torná-lo indivíduo revoltado ante a sociedade. Ressalte-se, que por completa ausência de consciência de seus atos e suas consequências o indivíduo pouco compreende a razão da pena. Neste ponto não se está abordando dolo ou culpa, mas, a consciência, ou seja, a noção de responsabilidade perante a vida que é algo mais profundo do que a culpabilidade penal, na realidade, diz-se do caráter ontológico e do próprio Ser. Logo, o ofensor torna-se indivíduo inconformado com a punição, pois não desenvolveu qualquer senso de responsabilidade, deste modo, não compreende a sanção. Nesse ínterim, a Justiça Restaurativa tem promovido a chamada conscientização sobre os limites e os subprodutos da punição. Geralmente, as práticas restaurativas sustentam que o ato de punir não constitui uma responsabilização real, pois não insufla no indivíduo que praticou uma ação criminosa uma reflexão que o remeta a compreender o impacto de seu comportamento. A verdadeira responsabilidade consiste em olhar de frente para os atos que praticamos, significa estimular o ofensor a compreender o impacto de seu comportamento, os danos que causou e instá-lo a adotar medidas para corrigir tudo o que for possível. Sustento que este tipo de responsabilidade é melhor para as vítimas, para a sociedade e para os ofensores. (ZEHR, 2012, p. 27). De outro lado, além da responsabilidade para com as vítimas e a comunidade, o ofensor também possui necessidades. No plano da Justiça Restaurativa, para que o transgressor possa ter suas carências atendidas, importante que o programa ofereça as seguintes oportunidades: 1. Responsabilização que a. Cuide dos danos resultantes, b. Estimule a empatia e a responsabilidade e c. Transforme a vergonha 2. Estímulo para a experiência de transformação pessoal, inclusive: a. Cura dos males que contribuíram para o comportamento lesivo, b. Oportunidade de tratamento para dependência químicas e/ou outros problemas e c. Aprimoramento de competências pessoais. 3. Estímulo e apoio para reintegração à comunidade. 4. Para alguns, detenção, ao menos temporária. (ZEHR, 2012, p. 28 grifo nosso). Ante os tópicos trazidos por Howard Zehr, temos em primeiro plano a responsabilização que impulsionará a ação restaurativa tanto do ofensor como da vítima a

28 28 dirimir dores. Em segundo momento, tem-se o estímulo para a transformação pessoal, o que se poderia chamar de redescoberta pessoal, na medida em que a Justiça Restaurativa promove a mudança do ofensor quanto aos seus valores intrínsecos. Nesse diapasão, por meio do tratamento de vícios que acabam por lançar o indivíduo em derrocada existencial, bem como, pelo aprimoramento de competências pessoais, que se encontra diretamente vinculadas ao atendimento da necessidade que cada ser humano possui de sentir-se útil e produtivo, através do exercício de uma profissão ou ofício e a necessidade de instrução e estudo levam ao transgressor a redescobrir-se intimamente e assim modificar a sua conduta social. Em consequência, há a promoção e estímulo à reintegração social, extremamente importante para qualquer pessoa em recuperação. É a partir da sua integração comunitária que o indivíduo alcança a recuperação pessoal, a restauração da ofensa praticada, e isto implica em envolvimento da família, dos amigos, dos parentes e da sociedade representada pelo Estado. Destaque-se que o isolamento, em alguns casos até necessário, não deve, entretanto, ser a regra, ao contrário, deve ser considerado a exceção, pois se caracteriza por uma medida extrema e quase desumana a ser infligida a qualquer indivíduo e em muitos casos leva-o a insanidades mentais e desvios comportamentais quase irreversíveis, quando não, a estados de depressão profunda. A agressividade pode estar intimamente ligada ao isolamento social - é o que aponta a pesquisa de Theo Bibancos e Silvana Chiavegatto. Depois de submeter cobaias a crescer sozinhas, elas se tornaram mais agressivas e apresentaram mudanças não só comportamentais, mas também em estruturas cerebrais. [...] Como as variações encontradas nas cobaias assemelham-se àquelas encontradas em determinadas psicopatologias, podemos usar o experimento para entender como eventos ambientais podem modificar o desenvolvimento do cérebro de um ser. Esse tipo de pesquisa não tem como ser feita com a mesma eficácia em humanos, mas mesmo assim os resultados sugerem que pode haver uma ligação estreita com mesmas reações encontradas entre nós. Dessa maneira, talvez pudéssemos orientar as mães a não manter seus filhos em demasiado isolamento (como crianças que passam longas tardes sozinhas em casa, por exemplo), ou até criticar a imposição de solitária a um prisioneiro. Com pesquisas deste tipo, chegamos cada vez mais perto de explicações biológicas para manifestações comportamentais e psicológicas. (TORRES, 2013, grifo nosso). Por ser assim, a Justiça Restaurativa dá maior ênfase a integração social do que ao isolamento, entretanto, não desconsiderar a possibilidade de detenção temporária conforme o caso. Desta forma, mesmo considerando o isolamento uma exceção, por todas as consequências que acarreta, ele ainda é considerado uma alternativa de sanção, mesmo no âmbito restaurativo.

29 29 Há que se destacar por fim, que o ofensor também é visto como vítima, nos casos em que se detecta que o crime foi praticado em decorrência de um trauma 4, todavia, tal não implica em ausência de punição ou responsabilidade, de acordo com as considerações do sociólogo americano: Embora a realidade traumática não possa ser usada como desculpa para o crime, ela deve ser compreendida e tratada. (ZEHR, 2012, p. 43, grifo nosso). Noutro ponto têm-se os papéis e as necessidades apresentadas pela comunidade, relevante frisar que ao abordar o âmbito social toca-se tanto a micro como a macro comunidade, ou seja, a microcomunidade envolve as famílias, parentes, amigos, colegas de trabalho, vizinhança ligadas diretamente à desarmonia social e a um dos pólos do crime seja por parte da vítima, seja por parte do ofensor, por seu lado, a macrocomunidade compreende os representantes do Estado que se posicionam em nome da sociedade em geral. É de suma importância entender estes dois parâmetros de comunidade para a completa visualização do processo restaurativo. Nesse contexto, deve-se ressalvar que a Justiça Restaurativa está, mormente, vinculada à microcomunidade, na realidade, ela abarca como alvo principal as vítimas secundárias do crime, que são aqueles interessados direitos e que de algum modo tiveram suas vidas afetadas pela prática criminosa, assim, ela coloca em segundo plano, como um suporte à microcomunidade, a noção de macro comunidade que diz respeito aos entes estatais presentes no processo penal, no entanto, não mais o Estado se encontra no polo passivo da ação delitiva, ou melhor, da conduta ofensiva. As comunidades sofrem impacto do crime e, em muitos casos, deveriam ser consideradas partes interessadas pois são vítimas secundárias. Os membros da comunidade também têm importantes papéis a desempenhar e talvez, ainda, responsabilidades em relação às vítimas, aos ofensores e a si mesmos. (ZEHR, 2012, p. 28, grifo nosso). O envolvimento da comunidade de modo direto ao processo judicial dá ensejo a um fórum para discutir as questões relacionadas à violência, bem como, as necessidades que precisam ser atendidas no plano social, assim, os pontos de atenção que a justiça deve oferecer à comunidade são: Preocupação enquanto vítimas, oportunidade para construção de um senso comunitário e de responsabilidade mútua, estímulo para assumir suas obrigações em favor do bem-estar de seus membros, inclusive vítimas e ofensores, e fomento das condições que promovam convívio saudável. (ZEHR, 2012, p.29). 4 Este conceito é muito importante para a análise restaurativa, na medida em que é uma experiência considerada e tratada tanto na vivência da vítima como do ofensor, os males sofridos por uma pessoa diversos casos funciona como um instigador interno para a prática delituosa é com frequência percebe-se que uma ação violenta busca desfazer uma injustiça sofrida, entretanto, todos nós sabemos que há exceções e que nem todos os crimes surgem de um trauma.

30 30 Enfim, ficam elencadas as necessidades e o papel fundamental da comunidade como parte social importante no tratamento da vítima e do ofensor quando da desarmonia social, além disso, o envolvimento da sociedade se torna de grande relevância para reflexão e discussão do processo penal, principalmente, para o desenvolvimento de uma visão mais coletiva, com o fim de fomentar o bem-estar social, por meio, da promoção de responsabilidades mútuas. Em suma, o que se percebe em uma análise mais abrangente sobre as necessidades e papéis é que o sistema penal vigente se encontra centrado nos transgressores e na aplicação do castigo como punição, o que a Justiça Restaurativa questiona e propõe uma visão mais ampla do processo penal e centrada nas carências da vítima, ofensor e comunidade. Assim, a prática restaurativa apresenta uma tríplice visão no plano do direito penal. 2.3 PRINCÍPIOS RESTAURATIVOS Após a exposição quanto às necessidades e papéis dos entes diretamente e indiretamente afetados pelo crime, passa-se a compreensão dos princípios que norteiam e baseiam a Justiça restaurativa, entretanto, antes de adentramos na análise das fontes restaurativas, é relevante entender a noção de Shalom e o conceito de crime para a Justiça Restaurativa. Em apertada síntese, pode-se introduzir esta visão como um princípio cristão que concebe a sociedade como um todo integrado a formar interelações. De outro modo, o significado de crime para Justiça Restaurativa, diz respeito, a quebra das relações sociais A noção de shalom Na ótica restaurativa o crime consiste basicamente em um rompimento, uma violação às pessoas e relacionamentos interpessoais, a gerar conflitos e desarmonia social. Neste viés, as violações desembocam em obrigações e dentre elas a principal é dar tratamento e correção ao mal praticado. Atrelada a esta concepção se encontra a chamada visão shalom que nada mais é que: viver a vida imerso num sentido de retas relações com os outros, com o Criador e com o meio ambiente. (ZEHR, 2012, p.31, grifo nosso), trata-se de uma compreensão judaico-cristã que parte do pressuposto de que todos estamos interligados, e por isso o crime afeta diretamente as relações. Sendo assim, todas as pessoas estão ligadas umas às outras a formar uma grande teia de relacionamentos (ZEHR, 2012, p. 32, grifo nosso). A visão de shalom também nos lembra que o crime representa uma violação dos relacionamentos. Ele afeta nossa confiança no outro, trazendo sentimentos de suspeita e estranheza, por vezes racismo. Não raro ergue muros entre amigos, pessoas amadas, parentes e vizinhos. O crime afeta nosso relacionamento com todos à nossa volta.

31 31 O crime também representa um relacionamento dilacerado entre vítima e ofensor. Mesmo se eles não tinham um relacionamento prévio, o delito cria um vínculo, que em geral é hostil. Se não resolvido, esse relacionamento hostil afetará, por sua vez, o bem-estar da vítima e do ofensor. (ZEHR, 2008, p.171. grifo nosso). Portanto, a visão de que o crime consiste em um rompimento nesta teia de relacionamentos indica um desequilíbrio social e um sintoma de que algo se encontra fora do lugar no plano das relações sociais, por isso, é relevante corrigir tais comportamentos nocivos à sociedade. Esta noção de shalom também é inserida na Justiça Restaurativa Três pilares restaurativos Dando seguimento as ideias embutidas nas ações restaurativas, deve-se realizar uma breve consideração a respeito dos principais pilares da Justiça Restaurativa, aos quais se podem destacar: Dano cometido, obrigações e engajamento. (ZEHR, 2012, grifo nosso). Um dos focos restaurativos se encontra no dano cometido, assim as lentes restauradoras se voltam mais para o caráter humano do processo do que para o posicionamento do Estado no processo penal, o que significa dizer que as práticas restaurativas, repita-se, estão centradas naqueles entes diretamente afetados pelo crime e se resume nos relacionamentos interpessoais, a oferecer, assim, uma experiência reparadora para todos os envolvidos. Por sua vez, as obrigações estão vinculadas ao reconhecimento de responsabilidades, e esta parte, conforme já fora explicado anteriormente, cabe ao ofensor, aos quais, devem iniciar um entendimento quanto às consequências de seus comportamentos nocivos. Ademais, devem assumir um papel que busque corrigir a situação de desequilíbrio social, tanto concretamente como simbolicamente. Enfim, o engajamento diz respeito aos detentores de interesses, ou seja, todos os que por ventura foram afetados pelo ato criminoso devem de modo colaborativo e participativo, por meio, do diálogo buscar meios que melhorem o bem-estar social e que possa dar um novo significado para a vivência social para que novas condutas delitivas e ações criminosas possam ser diminuídas e evitadas Singela concepção circular Os princípios restaurativos possuem uma estrutura circular conforme observará adiante, mas, neste primeiro momento é importante entender quais são as fontes que fundamentam a Justiça Restaurativa.

32 32 Nesse viés, temos como primeiro princípio o foco nos danos causados e nas necessidades que daí decorre tanto para vítima como para ofensor e a comunidade, este princípio pauta todas as práticas restaurativas, por isso sua importância, conforme explicitado anteriormente, estas três faces feridas pela ação criminosa precisam com urgência de atendimento a suas necessidades no âmbito do processo litigioso. Como segundo princípio têm-se as obrigações que resultam daqueles danos causados pelo crime, neste contexto devem ser estimuladas a responsabilização e a conscientização no que toca as consequências geradas pelos danos do delito. Assim, tratar das obrigações é demonstrar para o ofensor e a comunidade o que consistem estes deveres e por fim estimular a responsabilidade pelos atos ou omissões praticados. Além desses princípios, temos uma fonte fundamental e central que se apresenta na Justiça Restaurativa como sendo a correção dos danos e males, pode-se dizer que este é o objetivo central das ações restaurativas, uma busca incessante de correção de danos e males causados pelo crime, mas, tal não se faz por intermédio das imposições, ao contrário, são sugeridas soluções, busca-se a pacificação e nada é forçado a ninguém. Vale lembrar, que as concepções restaurativas primam pela escuta e pelo respeito às diferenças, bem como, aos temores e dores de cada lado envolvido no conflito. Após apresentar os dois princípios basilares, os princípios seguintes possuem um caráter colacionado aos dois primeiros e se vinculam a eles diretamente. São eles: A utilização de processos inclusivos, envolvimento de todos os que tenham legítimo interesse na situação (ZEHR, 2012, grifo nosso). Nestes dois últimos princípios, fica patente a natureza colaborativa das práticas restaurativas, assim, o trabalho desenvolvido pela Justiça Restaurativa deve em sua base se pautar pelo engajamento, ou seja, no âmbito restaurativo amplia-se o campo de atuação e procura afetar a coletividade para além dos representantes do Estado que estejam envolvidos no plano do processo criminal. Ante o exposto, pode-se explicitar a característica circular da Justiça Restaurativa, conforme o entendimento apresentado pelo grandfather 5 do pensamento restaurador: É possível esquematizar a Justiça Restaurativa como uma roda. No centro está o foco principal: corrigir os danos e males. Cada um dos raios representa um dos elementos essenciais citados acima: focar o dano e as necessidades, tratar das obrigações que envolvem os interessados (vítimas, ofensores e a comunidade de apoio) e, na medida do possível, fazê-lo através de um processo cooperativo e inclusivo. Tudo isto, é claro, numa atitude de respeito por todos os envolvidos. (ZEHR, 2012, p. 45). 5 EASTERN, Mennonite University. Howard Zehr

33 33 Em que pese os princípios restaurativos serem importantes para a formação de uma base e norteadores para as ações restaurativas, há que se ter em conta que eles devem se encontrar fincados, ou melhor, enraizados em valores próprios da Justiça Restaurativa, para assim florescer os princípios de modo coerente. Nesse diapasão, a visão de interconexão trazida pela noção de Shalom e pela natureza de envolvimento que gera os projetos restaurativos, há uma preocupação com as particularidades de cada um no âmbito da coletividade, o que significa dizer que não é por conceber que estamos todos interligados a formar uma teia de relações que devemos desconsiderar a diversidade. Neste ponto, a Justiça Restaurativa conduz a uma percepção do Outro como Outro, distante de qualquer ideia que venha a massificar e generalizar a análise realizada para atendimento de todos os lados envolvidos na desarmonia deixada pelo crime. Sendo assim, pode-se mesmo dizer que os valores restaurativos transitam de modo transdisciplinar, ao considerarem tanto o plano sociológico como o antropológico, na medida em que se coloca como o observador e busca atender e compreender as necessidades do Outro o concebendo como Outro, nesta linha, se percebe uma clara preocupação em preservar a diversidade, bem como, a particularidade de cada um. A particularidade é a riqueza da diversidade. Isto significa respeitar a individualidade e o valor de cada pessoa, e tratar com consideração e seriedade os contextos e situações específicos nos quais ela se insere. A justiça deve reconhecer tanto nossa condição de interconexão quando a nossa individualidade. O valor da particularidade nos adverte que o contexto, a cultura e a personalidade são fatores importantes que devem ser respeitados. (ZEHR, 2012, p. 47). Diante disso, os pensadores restaurativos concebem que o valor primordial da Justiça Restaurativa consiste o respeito, o grande questionamento que resta e paira sobre as cabeças dos legisladores e pensadores afeiçoados ao positivismo e ao caráter objetivo das leis e do contexto jurídico é: Como adotar um sistema que tenha por base o valor como o respeito que é extremamente subjetivo?. Ora, o respeito é a base do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, é por assim dizer, a origem de todo sentimento de consideração pela pessoa humana seja ela quem for o respeito é a base da ética quando deixamos o eu para caminhar em direção ao nós e assim conceber uma visão mais coletiva e equânime, neste sentido, não há nada que se dirija na contramão da Constituição e de qualquer legislação. Aliás, é o respeito que deve promover as diretrizes para a formação e aplicação da norma jurídica 6, assim, não há porque 6 Diz-se norma jurídica, pois esta possui um caráter plástico por ser eivada de princípios que criam nuances e equilibram a lei, sendo assim, poderia se dizer que a norma jurídica diz respeito ao caso concreto e como a lei se moldará àquele caso e, deste modo, seguir os princípios constitucionais. Ao passo que a lei fala mais à hipótese,

34 34 não considerar este valor como um sustentáculo de uma nova abordagem jurídica, pois o respeito: [...] exige que tenhamos uma preocupação com todas as partes envolvidas (ZEHR, 2012, p. 48, grifo nosso). Finalmente, depois de realizar todas as considerações supramencionadas podemos chegar a uma definição do que seja Justiça Restaurativa que significa um processo de envolvimento de todos os legítimos interessados e afetados por uma ofensa, para que de modo colaborativo possam identificar e tratar os danos causados, bem como, as necessidades e obrigações decorrentes da ofensa, a fim de promover o restabelecimento das pessoas e buscar uma harmonia social, tudo embasado no respeito por todos os lados envolvidos. Justiça Restaurativa é um processo para envolver, tanto quanto possível, todos aqueles que têm interesse em determinada ofensa, num processo que coletivamente identifica e trata os danos, necessidades e obrigações decorrentes da ofensa, a fim de promover o restabelecimento das pessoas e endireitar as coisas, na medida do possível. (ZEHR, 2012, p. 49). Enfim, o conceito de Justiça Restaurativa com base em seus princípios, pilares e valores a partir de uma noção de interconexão entre os seres a formar uma grande teia de relacionamentos, evidencia a compreensão, a qual, a ofensa que afeta uma única pessoa não é só problema individualizado e somente dela, mas, trata-se de um problema da coletividade, por isso, o crime é concebido como chaga social que deve ser tratada, tendo em vista, o consequente rompimento de relações e a desarmonia social. Nessa esteira, o próximo capítulo abordará em que medida a Justiça Restaurativa juntamente com seus princípios podem auxiliar na promoção de uma cultura de paz, bem como, na humanização no plano de atuação jurídica. Igualmente, será trabalhada as principais diferenças entre a compreensão restaurativa e a visão retributiva de sistema criminal. a lei é positiva, objetiva e por isso mesmo rígida em suas palavras, por isso está inserida na norma jurídica que é uma composição, ou seja, enquanto a lei é um elemento do quadro a norma é a composição com perspectiva, profundidade e gradações de cor.

35 35 3. A JUSTIÇA RESTAURATIVA E A HUMANIZAÇÃO DO DIREITO Ao iniciar o presente capítulo cabe a reflexão quanto à possibilidade de contribuição da Justiça Restaurativa para a edificação de uma cultura de paz, não só isto, mas, também uma efetiva prestação jurisdicional voltada para a humanização do direito, já que suas lentes (ZEHR, 2008) são voltadas às pessoas envolvidas na desdita penal, ou melhor, no rompimento social causado pelo crime. Assim, é possível pensar numa justiça criminal que abra caminho para ampliação dos direitos humanos e da paz social? O questionamento supramencionado nos traz uma nova forma de pensar a aplicação do direito penal, de modo, mais comunitário e participativo e que promova a inclusão social e estimule o reequilíbrio social. Nesta linha, a Justiça Restaurativa busca um resultado individualizado, bem como, socialmente terapêutico e restaurador de relacionamentos de modo responsável. Então, o que pode se perceber é que a concepção restaurativa tem muito a contribuir com o caráter mais humanitário e democrático no modo de tratar as relações envolvidas na lide criminal. A perspectiva da Justiça Restaurativa caminha em direção a algo melhor do que a Justiça Criminal tradicional, todavia, não é arrogante a ponto de dizer para que se acabe com o modelo de Justiça Retributiva também conhecido como tradicional, mas, ao contrário propõe construção, trabalho conjunto, soluções paralelas como meio de atender o fator humano no âmbito da litigiosidade. 3.1 O DIFERENTE OLHAR: JUSTIÇA RESTAURATIVA E JUSTIÇA RETRIBUTIVA Em que pese, grande parte dos pensadores e doutrinadores sobre Justiça Restaurativa conceberem ela como um contraponto, ou uma antítese ao modelo retributivo, tal não se verifica de todo, na medida, em que tanto a Justiça Restaurativa como a Justiça Retributiva buscam dar uma resposta ao comportamento nocivo e desequilibrado que gera a chaga social chamada crime. Sendo assim, não se pode conceber a Justiça Restaurativa como uma total negação do modelo tradicional. No entanto, antes de adentrar a compreensão restaurativa, propriamente dita, deve-se realizar um pequeno apanhado das questões abordadas pela criminologia, no que tange às crítica perpetradas contra o atual modelo de justiça criminal. A criminologia nos traz o arcabouço filosófico e crítico quanto ao atual sistema criminal, a partir desta ciência que coloca do avesso o modelo de retributivo e revela que o ato de punir, muita das vezes, piora a situação social daqueles que dependem diretamente desta

36 36 intricada engrenagem de aplicação da punição, pode-se perceber o quanto a Justiça Restaurativa tem a contribuir para o melhoramento da justiça retributiva, a qual se encontra convalescente. A partir da formação do Estado burguês, frise-se, após a consolidação do contrato social, a pena passou a ser concebida como uma retribuição à perturbação da ordem, ou seja, todo àquele que descumpria o contrato firmado com o Estado, a violar as leis, era castigado e punido, como uma forma de restabelecer a ordem jurídica interrompida. Tanto é assim, que a essência das teorias retributivas absolutas está no fato delas reconhecerem no Estado, a figura do Juiz máximo, como guardião da lei e da liberdade individual. Os principais pensadores das teorias absolutas ou retributivas das penas são os filósofos alemães Kant e Hegel que concebem o fim do direito penal como sendo a pena. Kant entendia a lei como um imperativo categórico, ou seja, o indivíduo deveria se conduzir de acordo com o reto dever, ao passo que para Hegel a pena era um modo de compensar o delito, o que reflete uma compreensão, um tanto quanto, talional. A partir do desenvolvimento do sistema criminal tradicional, verificou-se que as penas ao invés de reduzir a insegurança e recuperar o condenado, acabavam, por, fabricar mais delinquentes, tal concepção resta patente ao se encarar o atual modelo de justiça criminal de frente. Assim, a justiça penal com todo seu aparato estatal, acaba por se tornar um [...] aparelho de espetáculo [...] para atender à demanda cotidiana de um aparelho de controle meio mergulhado na sobra que visa engrenar uma sobre a outra polícia e delinquência. (FOUCAULT, 2004, p. 234, grifo nosso). Surgida à crise no modelo de justiça criminal, passou-se a questioná-lo e até mesmo propor a completa abolição das penas. Entretanto, a tendência majoritária dos pensadores de direito penal caminha no sentido de melhoramento e mudanças no atual sistema, ou seja, [...] aperfeiçoar, a pena privativa de liberdade, quando necessária, e substituí-la, quando possível e recomendável (BITENCOURT, 2007, p.103, grifo do autor). Nesse contexto, a Justiça Restaurativa faz pensar o atual modelo, ao qual, se encontra convalescente há algum tempo. Mais que um novo paradigma, a Justiça Restaurativa fita a ocorrência do crime com outros olhos, diferente da Justiça Tradicional que não atende as necessidades dos entes envolvidos em dor, a Justiça Restaurativa propõe ações diferentes, por meio, de perguntas diferentes tais como: [...] Quem foi prejudicado? Quis são as suas necessidades? Quem tem obrigação e quem é responsável por atender tais necessidades? Quem tem interesse legítimo na situação? Que processo conseguirá envolver os interessados a fim de encontrar uma solução? A Justiça Restaurativa requer que troquemos não apenas nossas lentes, mas também nossas perguntas. (ZEHR, 2012, p. 76 grifo nosso).

37 37 Desse modo, tem-se que a Justiça Restaurativa possui uma concepção diferente para responder ao crime, muito diversa da Justiça Retributiva, no entanto, não propõe, de modo algum, a rejeição ao estado democrático de direito ou ao desenvolvimento do sistema jurídico pautado pela lei. Por isso, pode-se verificar de modo tabular as diferentes visões, tanto da concepção restaurativa como do modelo tradicional de Justiça Criminal: Tabela 1: Diferenças entre Justiça Restaurativa e Justiça Retributiva. Justiça Criminal O crime é uma violação da lei e do Estado. As violações geram culpa. A justiça exige que o Estado determine a culpa e imponha uma punição (sofrimento). Foco central: os ofensores devem receber o que merecem. Fonte: ZEHR, 2012, p.33. Justiça Restaurativa O crime é uma violação de pessoas e de relacionamentos. As violações geram obrigações. A Justiça envolve vítimas, ofensores e membros da comunidade num esforço comum para corrigir a situação. Foco central: as necessidades da vítima e a responsabilidade do ofensor de reparar o dano cometido. A perspectiva demonstrada pela abordagem restaurativa traz em suas bases a preocupação com o humano, por isso, se encontra em perfeita consonância com os direitos humanos e as ações pautadas pelo princípio dos princípios que é a dignidade da pessoa humana. O que permite a Justiça Restaurativa caminhar por vários ordenamentos jurídicos que prezam pelos direitos humanos, evidentemente, com as adaptações necessárias a cada cultura. Por ser assim, que o sociólogo americano Howard Zehr classifica os programas restaurativos como um continuum, haja vista, as peculiaridades de cada comunidade, de modo que as ações restaurativas caminhem de parcialmente restaurativas para totalmente restaurativas, tudo dependerá do modo como será aplicada, do caso concreto apresentado e de como será abarcada em cada cultura. Deste modo, devem-se preservar as diversidades, sem, no entanto, perder o norte dado pelos princípios restaurativos, conforme explicitado em tópico anterior. Diante disso, tem-se um novo modo de pensar a Justiça Criminal, a Justiça Restaurativa sugere uma nova abordagem para dar suporte aos protagonistas afetados pela ação criminosa. Porém, os doutrinadores de Justiça Restaurativa são recorrentes ao afirmar que por ser uma modalidade muito nova de reflexão e implementação no plano jurídico ainda há pouca discussão e até distorções a respeito das práticas restaurativas. Não se pode falar ainda em uma sistematização completa da concepção restaurativa, entretanto, como suas recentes práticas vêm gerando resultados muito positivos crescem os adeptos e a reflexão quanto à nova forma de pensar o Direito Penal.

38 38 O amadurecimento do modelo trazido pela justiça restaurativa deve precipitar uma discussão sobre quais são as expectativas dos protagonistas do acontecimento delitivo em relação às possíveis formas de reação do Estado, e bom por isso tal paradigma guarda um potencial revolucionário no que tange ao Direito Penal. Por decorrência da própria juventude do sistema em questão, a análise de seus resultados é diminuta e esparsa, mas as avaliações disponíveis indicam com segurança que o grau de satisfação das vítimas e demais envolvidos no conflito em relação ao processo é em muito superior quando se aplicampráticas restaurativas. A correta aplicação do modelo, deve provocar, em longo prazo, uma mudança de concepção em relação ao papel do Estado no fenômeno criminal com a definitiva inclusão da vítima e com o fortalecimento do papel da comunidade nesse processo. No entanto, em um contexto de proliferação da chamada cultura do medo e a amplificação, pelos meios de comunicação de massa, da doutrina da lei e da ordem, há que se cercar de todas as cautelas possíveis para que o empoderamento da comunidade na busca das soluções de seus próprios conflitos não se dê em detrimento de todo o processo histórico de proteção e afirmação dos direitos humanos. (VITTO, 2005, p.48). Assim, conforme supracitado há de se ter cuidado e cautela quanto ao alastramento da cultura do medo, da intolerância, bem com, da aplicação da doutrina da lei e da ordem sem qualquer viés humanitário, é exatamente neste ponto que a Justiça Restaurativa adentra para propor soluções. Nesta linha, há autores que chegam mesmo a considerar a Justiça Restaurativa como uma luz no fim do túnel (PINTO, 2005, p. 21, grifo nosso), uma esperança, para o caos do sistema criminal tradicional que vem se apresentando em vários países, especialmente, no Brasil. Finalmente, a crise no sistema de justiça criminal atual demonstra a necessidade de mudança da punição repressiva, desproporcional e estigmatizante 7 por um modelo que busque a restauração e assim reafirmar em caráter de urgência a necessidade de uma coexistência social pautada pela colaboração mútua, principalmente, no que tange a apensar as feridas causadas pelo crime: O Direito, por conseguinte, respalda-se no sentimento social e ao distanciar-se dele perde legitimidade. (SALIBA, 2009, p. 120, grifo nosso). 3.2 A COMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS DO ORDENAMENTO PÁTRIO Ressalte-se que a Justiça Restaurativa se coaduna perfeitamente com os princípios fundamentais, especificamente, a dignidade da pessoa humana, bem como, com os objetivos fundamentais da república brasileira, na medida em que dispõe o art. 3º da Constituição sobre a construção de uma sociedade mais justa e solidária. 7 A teoria do etiquetamento traz uma compreensão sobre a estigmatização do indivíduo que adentra o sistema criminal e tal estigma se torna tão veemente que o sujeito não consegue angariar oportunidades e acaba por retornar para o sistema, ou seja, etiqueta e marca o desviante como criminoso e determina um novo status social. (SALIBA, 2009, p. 92, grifo do autor).

39 39 Igualmente, a Justiça Restaurativa também se compatibiliza com alguns dos princípios regentes do direito penal pátrio, aos quais, podemos citar: Humanidade, intervenção mínima, adequação social, proporcionalidade e razoabilidade. No que tange ao princípio da humanidade e sua relação com a Justiça Restaurativa, fica evidente quando se analisa a forma como às ações restaurativas buscam atuar de modo a atender todos os lados envolvidos pela conduta criminosa, além disso, propõe uma nova maneira de abordagem do direito penal, por meio, de práticas que promovam a ressocialização, reintegração e restauração. Assim, dirimir o conflito social existente pela via mais digna e humana. É ainda por meio deste princípio que o Estado perde o caráter afligido principal do delito, para se enquadrar em uma posição subsidiária à vítima real aquela que sofreu o delito que passa a ter um papel atuante na lide penal. A vítima, como principal integrante da lide, é o elemento que sofreu os maiores danos. Recebe a agressão em diversas perspectivas, de modo que se faz necessário que o seu papel seja atuante para recuperação e superação do fato. (BIANCHINI, 2012, p ). Por seu lado, o princípio da intervenção mínima também se compatibiliza com a Justiça Restaurativa, na medida em que se pode apresentar como uma solução diversa ao encarceramento e mesmo a utilização excessiva do campo penal como meio de controle social, no plano restaurativo é enfatizado o caráter de ultima ratio do Direito Penal. Já o princípio da adequação social representa a conjunção entre o sistema penal e os valores sociais considerados relevantes, assim: Sempre que existir uma forma menos gravosa de resposta ao crime, porém adequada aos fins do Direito Penal, com melhores resultados e que traga um balanceamento nas relações, deve ser essa abordagem implementada. (BIANCHINI, 2012, p.115, grifo nosso). Enfim, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem pautar todo o ordenamento jurídico e não seria diferente com as ações e programas restaurativos, já que a Justiça Restaurativa se pauta por valores como o respeito e o equilíbrio das relações. Porém, não se deve confundir a razoabilidade e proporcionalidade com identidade de soluções (BIANCHINI, 2012, p. 117), quando se dá o diálogo entre vítima e ofensor, pois ficará ao cargo das partes a melhor solução do conflito, sem desconsiderar o elemento subjetivo de cada parte envolvida na lide. Feitas estas considerações preliminares quanto aos princípios de direito penal e a Justiça Restaurativa, passa-se a análise da Resolução 2002/12 do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, de 13 de Agosto de 2002 que definiu as diretrizes de aplicação das práticas Restaurativas em diversos países, inclusive no Brasil.

40 O PLEITO DAS NAÇÕES UNIDAS: RESOLUÇÃO 2002/12 O Conselho Econômico e Social reunido em sessão plenária ao verificar as crescentes práticas, programas e ações com base nos princípios e valores restaurativos resolveu delimitar terminologias, objetivos e diretrizes para a promoção da Justiça Restaurativa em vários países. O intuito era organizar melhor a implantação e organização da Justiça Restaurativa nos países, bem como, fomentar e dar apoio técnico àqueles Estados que desejassem dar início a um programa restaurativo. Em primeiro plano, a Resolução traz os conceitos necessários para a compreensão das práticas restaurativas, para as Nações Unidas pode ser entendida a Justiça Restaurativa como uma mediação 8 ou conciliação criminal, é o que está subentendido no conceito de processo restaurativo, ao qual, pode-se citar: Processo restaurativo significa qualquer processo no qual a vítima e o ofensor, e, quando apropriado, quaisquer outros indivíduos ou membros da comunidade afetados por um crime, participam ativamente na resolução das questões oriundas do crime, geralmente com a ajuda de um facilitador. Os processos restaurativos podem incluir a mediação, a conciliação, a reunião familiar ou comunitária (conferencing) e círculos decisórios (sentencing circles). (ONU, 2012, grifo nosso). Outro conceito que merece destaque na resolução das Nações Unidas e o termo facilitador, neste ponto, percebe-se uma pequena contradição terminológica, na medida em que não se concebe a figura do mediador, mas sim, de um facilitador imparcial que busque tratar todas as partes de modo digno, sempre em respeito às pessoas afetadas pelo crime envolvidas em um processo restaurativo. No que tange a utilização dos programas restaurativos, o Resolução vem a reforçar o fato de que tanto vítima e ofensor concordam voluntaria e espontaneamente em participar do processo restaurativo, bem como, deve ter provas suficientes a comprovar a ação nociva do ofensor. Além disso, o Conselho também determinou que as partes vítima/ofensor devem estar livres para expressar o não consentimento em prosseguir no processo, a optar, assim, pela via jurídica tradicional. Deste modo, não fica vedada a possibilidade de desistência de qualquer das partes atuantes em um processo restaurativo. Há também uma ênfase quanto a não utilização do processo restaurativo como meio de prova, com vistas a agravar ou majorar penalidades em face do ofensor, sendo assim, quando da desistência de uma das partes no processo restaurativo, este voltará ao 8 Apesar de não considerar o termo idealmente adequado e concordar com a concepção de Howard Zehr no que diz respeito à substituição da expressão mediação por diálogo ou encontro, a Justiça Restaurativa ainda é concebida em muitos programas e mesmo na terminologia da Resolução 2002/12 como mediação criminal.

41 41 procedimento ordinário e tramitará como um processo comum, sem prejuízo para nenhuma das partes. Neste ponto, deve ser realizada ressalva, pois se percebe a compatibilidade com o Pacto São José da Costa Rica, na medida em que veda a produção de provas contra si mesmo no âmbito litigioso. Assim, os processos restaurativos não podem ser utilizados como provas contra o ofensor, caso o acordo ou a composição do conflito não ocorra nos moldes restauradores. Processos restaurativos devem ser utilizados somente quando houver prova suficiente de autoria para denunciar o ofensor e com o consentimento livre e voluntário da vítima e do ofensor. A vítima e o ofensor devem poder revogar esse consentimento a qualquer momento, durante o processo. Os acordos só poderão ser pactuados voluntariamente e devem conter somente obrigações razoáveis e proporcionais. A vítima e o ofensor devem normalmente concordar sobre os fatos essenciais do caso sendo isso um dos fundamentos do processo restaurativo. A participação do ofensor não deverá ser usada como prova de admissão de culpa em processo judicial ulterior. (ONU, 2012, grifo nosso). A Resolução também faz ressalva quanto às diferenças culturais entre as partes, bem como, a segurança dos envolvidos no processo restaurativo. Não sendo possível ou aconselhável a aplicação das medidas restaurativas, deverá o processo ser encaminhado para às autoridades do sistema de justiça criminal para a prestação jurisdicional sem delonga (ONU, 2012, grifo nosso), observa-se que está implícito neste entendimento a razoável duração do processo mesmo que não ocorra o processo restaurador, tendo em vista, que as partes necessitam de uma prestação jurisdicional célere e efetiva. A operação dos programas restaurativos devem estar pautados nos princípios e valores da Justiça Restaurativa e a preocupação demonstrada neste tópico diz respeito à formação, treinamento e qualificação do facilitador, as condições de encaminhamento para o processo restaurador, bem como, o gerenciamento e códigos de conduta a serem implementados para direcionarem o programa restaurativo. O Conselho frisou que todo trabalho desenvolvido deve ter seus resultados judicialmente supervisionados, para evitar qualquer tipo de coação ou vício em uma conciliação restaurativa. Ademais, a Resolução dispõe expressamente que as garantias processuais fundamentais devem ser asseguradas tanto para a vítima como para o ofensor e aplicadas no âmbito restaurativo. E quando apropriado, os acordos oriundos dos programas restaurativos deverão ser incorporados às decisões ou julgamento judiciais, o que, por conseguinte, acarretaria em preclusão quanto a ulterior ação penal em relação aos mesmos fatos (ONU, 2012, grifo nosso). Por fim, a Resolução aborda a promoção do desenvolvimento contínuo das práticas restaurativos, para tanto os Estados-Membros do Conselho deveriam fomentar a pesquisa,

42 42 avaliação e monitoramento dos programas de Justiça Restaurativa e principalmente formular estratégias de políticas nacionais com o objetivo de desenvolver e ampliar projetos de teor restaurativo, em um trabalho conjunto com as comunidades locais, as autoridades do sistema de justiça criminal e os administradores dos projetos de Justiça Restaurativa. Concluí-se que a Justiça Restaurativa já é uma prática aplicada por várias nações, à tendência tem caminhado no sentido de um contínuo aumento de seus programas o que gerou uma demanda às Nações Unidas para concretização de uma resolução que trouxesse em seu fundamento, diretrizes para promoção e fomento dos processos restaurativos, com vistas a estimular uma abordagem mais humana para lidar com o sistema de justiça criminal tradicional. Depois de compreender como a Justiça Restaurativa tem sido utilizada como uma forma de humanização do direito e no plano internacional vem se expandindo, cabe, em seguida, apresentar quais os desafios e as principais críticas apresentadas em face da noção restaurativa.

43 43 4. PRÁTICA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA: DESAFIOS E CRÍTICAS Se fosse possível resumir em uma palavra a prática da Justiça Restaurativa, dir-se-ia que a palavra correta para tanto é encontro, pois todos os programas, ações e projetos restaurativos devem levar em conta o encontro de pessoas afetadas pelo crime, não só, a interface vítima/ofensor, mas também, o encontro com a comunidade, o encontro da vítima e sua família com um facilitador antes de qualquer encontro com o ofensor, entre outras questões que serão abordadas neste tópico. Assim, a essência das práticas restaurativas está fundamentada no ato de encontrar. 4.1 AS PRÁTICAS E SUAS DINÂMICAS Ao realizar a análise das práticas restaurativas percebe-se a tendência à promoção dos encontros vítima/ofensor, as conferências de grupos familiares, bem como, os círculos de Justiça Restaurativa. Além disso, algumas propostas restaurativas tem buscado a mescla destes modelos de aplicação prática da abordagem restaurativa. Esses encontros tem sua dinâmica liderada e mediada por um facilitador que supervisiona e orienta o processo, equilibrando o diálogo entre as partes envolvidas. Entretanto, há que se destacar que a figura do facilitador, diferentemente, da figura do árbitro, não impõem acordos, pois se assim agissem deixariam de atuar de modo restaurativo. Logo, repita-se, nada no plano restaurativo e dos encontros coletivos ou mesmo individualizados entre vítima/ofensor pode ser imposto, na realidade, as práticas restaurativas buscam promover um contexto em que os participantes explorem sentimentos, fatos, resoluções, traumas, ou seja, [...] eles são estimulados a contar suas histórias, fazer perguntas, expressar seus sentimentos e trabalhar a fim de chegar a uma decisão consensual (ZEHR, 2012, p. 56, grifo nosso). Nessa esteira, importante frisar os principais pontos das práticas restaurativas mais utilizadas nos processos restaurativos. Assim, podemos sintetizar cada modelo e sua metodologia de tratamento dos indivíduos. Pode-se dizer ainda que o encontro entre vítima/ofensor envolvem basicamente estas duas partes, evidentemente, nos casos em que for apropriado e indicado. Primeiramente, estas pessoas centrais da ocorrência criminosa trabalham em separado e, posteriormente, havendo consentimento, ocorre um diálogo entre os dois. Deve-se lembrar, entretanto, que o ofensor deve admitir uma cota de responsabilidade do ato praticado para que se dê o encontro com a vítima, porém, o conteúdo do encontro não deve ser divulgado nem utilizado em processo

44 44 criminal comum para incriminar e colocar em desvantagem o ofensor. Caso o processo restaurativo não prossiga, terá seguimento o processo pelas vias tradicionais e ordinárias. Por outro lado, as conferências de grupos familiares ampliam o círculo básico de participantes, que passa a incluir os indivíduos da microcomunidade, quais sejam os familiares, vizinhos, amigos, e outras pessoas consideradas relevantes pelas partes diretamente envolvidas. Estas conferências visam uma conscientização por parte do ofensor, visando estimular uma responsabilidade maior perante seus atos e modifique seu comportamento. Este modelo é mais dinâmico e mais inclusivo que o encontro entre vítima e ofensor e possui um caráter de formulação de sentença colaborativa em que todos os lados participam para ensejar a resposta mais adequada ao crime. Assim, podemos colacionar: Em virtude de normalmente fazerem o papel de tribunal, elas têm a função de desenvolver um plano completo para o ofensor, um plano que, além de reparações, inclua elementos de prevenção e, por vezes, punição. Até mesmo as acusações podem ser negociadas nessa reunião. É importante notar que o plano precisa obter a concordância de todos os presentes. (ZEHR, 2012, p. 61). Os Círculos são outra modalidade de abordagem restaurativa, existem vários tipos, desde os círculos de sentenciamento, que tem por objeto a sentença em processo criminal, como também círculos como forma de diálogo comunitário. O fato de se posicionarem em círculos dá o caráter de igualdade entre os envolvidos em um processo restaurador, ao passo que a figura do facilitador será de guardião do círculo (ZEHR, 2012, p. 62, grifo nosso). Nesta dinâmica, todos serão informados inicialmente sobre os valores que norteiam o processo restaurativo, bem como, o momento que cada um poderá falar. Geralmente, se utiliza um bastão de fala a indicar quem deve e está com a palavra no momento, no modelo de Círculos de Construção de Paz (ZEHR, 2012, p. 62), há maior participação da comunidade que poderá expressar suas necessidades, bem como, suas responsabilidades enquanto coletividade para poder aprimorar o apoio ao programa restaurativo, além de assistir melhor tanto vítimas como ofensores. Ademais, os encontros restaurativos levam a preocupação com o futuro, quais serão as medidas dali para frente, o que cada um pretende fazer e como pretendem colaborar no processo de pacificação social, como cada um irá se empoderar de sua própria vida e dará seguimento. Entretanto, há que se repisar que a participação das partes neste processo é inteiramente voluntária, bem como, informada de como se dará a dinâmica e quais possíveis consequências do processo restaurativo. No plano do trâmite processual, geralmente, as propostas de ações restaurativas se dão antes da sentença, após a realização da instrução criminal e alegações finais, e um alguns

45 45 casos o próprio Juiz pode propor o processo restaurador e encaminhar para o setor adequado para tanto. Há em experiências comparadas ações neste sentido, por exemplo, em Portugal (ROBALO, 2012, p.82), onde a Justiça Restaurativa vem sendo implantada, há necessidade de vista ao Ministério Público para que verifique se o encontro entre vítima/ofensor é adequado e se não ocorreu violações aos direitos de ambos, por outro lado, já na experiência da Nova Zelândia a dinâmica do encontro tem a figura do policial como uma das partes na decisão e no acordo. Feitas estas considerações sobre a prática restaurativa, deve ser abordada a questão dos programas restaurativos que além de envolverem as práticas supramencionadas possuem três classificações, conforme nos ensina Howard Zehr, são eles: alternativos, terapêuticos e de transição. Os Programas Alternativos visam a dar um tratamento diverso, ou melhor, oferecer uma via alternativa para a parte dos processos criminais ou para etapa de setenciamento. Assim, juízes podem encaminhar, desde que as partes concordem, o caso para um encontro restaurativo a fim de que sejam trabalhadas partes da sentença. Em alguns processos circulares, o juiz, o promotor e também o defensor poderão se juntar à comunidade a fim de desenvolver uma sentença sob medida para as necessidades da vítima, do ofensor e da comunidade. (ZEHR, 2012, p. 64, grifo nosso), estes tipos de programa já acontecem em países como Nova Zelândia e Estados Unidos. Por sua vez, os Programas Terapêuticos são desenvolvidos na modalidade de conferência e são utilizados para a ocorrência de crimes mais graves como assalto, estupro, homicídio. Nestes casos, o ofensor já se encontra preso e o encontro não tem como objeto principal o desfecho do processo, busca-se, na verdade, a conscientização do ofensor e o estímulo para que ele venha a modificar sua atitude. Por seu lado, a vítima recebe assistência e pode falar de suas dores, literalmente, desabafar o que tem demonstrado resultados expressivos para todos os envolvidos. Alguns programas chegam a trabalhar com painéis que abordem o impacto da ofensa, em que as vítimas têm oportunidade de relatar sua história. Outros oferecem seminários nas prisões, para que membros da comunidade juntamente com as vítimas se reúnem ante os ofensores para abordar questões em proveito de todos. Os Programas de Transição trabalham, mormente, com reintegração social dos ofensores recém-libertados, bem como, com a reintegração das vítimas à sociedade. Os círculos de apoio trabalham com ex-ofensores, a fim de fazê-los refletir ante suas

46 46 responsabilidades em comunidade, ao mesmo tempo em que recebem apoio para se reinserir em sociedade. Vale ressaltar, que a reintegração social é um dos entraves que o ex-ofensor encontra ao tentar voltar para a comunidade, à preocupação da Justiça Restaurativa com este ponto é de suma importância, pois muitas vezes, por conta da marginalização e da estigmatização, muitos ex-ofensores acabam reincidindo em virtude da falta de oportunidades e a insegurança geral com o seu retorno, por isso, a interface entre ex-ofensores e a comunidade é de grande relevância para reintegração em sociedade. Portanto, os programas restaurativos apresentam uma cadência de atendimento e busca de tratamento das necessidades das partes, simultaneamente, demonstram vantagens como a promoção de um processo judicial mais participativo, além de ser um meio mais célere 9 de solução de conflitos quando as partes concordam em passar por todo o processo restaurativo, ademais, fomenta uma efetiva prestação jurisdicional, mais próxima das pessoas e pronta a escutar suas necessidades após a ocorrência do delito. 4.2 DESAFIOS E CRÍTICAS Muitos são os desafios da Justiça Restaurativa, primeiramente, para ilustrar temos algumas perguntas que demonstram estes desafios e evidenciam os obstáculos que a Justiça Restaurativa deve transpor, no âmbito prático, segundo Howard Zehr (2012): Como proceder quando o ofensor não é preso ou não está disposto a assumir responsabilidade? De outro lado, o que acontece quando o ofensor está disposto a assumir responsabilidade, mas, a vítima não deseja participar do processo restaurativo? E os programas de reabilitação de ofensores podem ser chamados de restaurativo?. Um dos elementos de grande relevância para a implantação de um sistema de Justiça Restaurativa, diz respeito, ao atendimento à vítima, por isso, independente do fato de o ofensor ter sido preso ou não, o suporte às vítimas constitui um elemento fundamental para dar início a uma prática restaurativa e pode ser considerada como parcialmente restaurativa (ZEHR, 2012, p. 67). Ademais, caso não possa haver o encontro vítima/ofensor, o atendimento ao lado que sofreu com o crime, permite que a vítima tenha voz, possa trabalhar com o trauma sofrido, bem como, iniciar o processo de empoderamento de sua vida. Quando as vítimas não desejam encontrar com os ofensores, mesmo tendo este último reconhecido sua responsabilidade ante os fatos ocorridos, deve-se respeitar os desejos da

47 47 vítima, sem, no entanto, deixar de atendê-la, nem mesmo deixar de atender também ao ofensor. Deve-se sempre frisar que ambos têm necessidades que de alguma forma precisam ser tratadas e discutidas. Ressalte-se, que quando não for possível um encontro frente a frente, alguns programas têm optado pelo uso de vídeos, cartas e painéis que levem a conscientização do ofensor e atendimento de suas necessidades, bem como, permitem que a vítima fale de sua dor e tenha ela oportunidade de demonstrar o quanto o crime a afetou. Logo, as práticas restaurativas caminham na tendência a se tornarem totalmente restauradoras. Na outra linha, há o questionamento quanto aos programas de reabilitação de ofensores que dependerá do modo como é tratado e trabalhado. Segundo as concepções de Howard Zehr (2012) eles poderão ser potencialmente ou majoritariamente restaurativos. Pode ser visto como parte do trabalho preventivo do crime, assim, estes programas possuem uma afinidade relevante com a Justiça Restaurativa. De igual modo, se dá com os [...] programas de defesa dos ofensores e readmissão de presidiários, ou o ensino religioso nas prisões [...] podem desempenhar importante papel no sistema restaurativo [...] (ZEHR, 2012, p. 68, grifo nosso). Porém, poderiam se tornar ainda mais restaurativos se estimulassem a conscientização em face do crime que cometeram e levassem o ofensor a reconhecer sua parcela de responsabilidade, ensejando-lhe a busca da reparação deste erro e ofertasse-lhe oportunidades de reintegração social, principalmente, pelo trabalho e o incentivo de suas competências pessoais. Por outro lado, há algumas críticas perpetradas contra a Justiça Restaurativa, as quais, não se sustentam de todo, isto porque alguns autores se resumem a análise de dados, ou simplesmente, não procuraram inteirar-se da essência da filosofia da Justiça Restaurativa, deste modo, os críticos precisam ter uma boa compreensão dos valores essenciais da justiça restaurativa e precisam dirigir seus questionamentos a aplicações que reflitam efetivamente tais valores (MORRIS, 2005, p. 456, grifo nosso). Outrossim, não propõem soluções ao atual sistema e meramente criticam algo que busca melhorar e tornar mais humano o Direito e o próprio sistema criminal tradicional. De acordo com alguns doutrinadores, são várias as críticas contra a Justiça Restaurativa, no entanto, devem-se destacar às seguintes: [...] a justiça restaurativa erode direitos subjetivos; a justiça restaurativa aumenta a rede de controle social; a justiça restaurativa trivializa o crime (particularmente a violência do homem contra a mulher); a justiça restaurativa fracassa em restaurar vítimas e infratores; a justiça restaurativa não produz reais mudanças e não afasta a reincidência; a justiça restaurativa produz resultados discriminatórios; a justiça

48 48 restaurativa aumenta os poderes da polícia; a justiça restaurativa não afeta diferenças de poder; a justiça restaurativa encoraja o vigilantismo ; à justiça restaurativa falta legitimidade; e a justiça restaurativa fracassa em promover justiça. (MORRIS, 2005, p. 443). Quanto à crítica perpetrada à Justiça Restaurativa de quê ela não garante e fere os direitos fundamentais dos envolvidos, cabe salientar que se trata de um processo voluntário e que respeita a decisão dos envolvidos, ou seja, ao contrário do sistema tradicional, a Justiça Restaurativa nada impõe, mas, propõe. Dito isso, nada do que é utilizado no processo restaurativo pode ser utilizado contra o ofensor em um processo tradicional caso não venha a se chegar ao final de um processo restaurativo. Além disso, todas as partes envolvidas serão informadas previamente do que consiste a Justiça Restaurativa e se encontram livres para dar continuidade ao processo ou dele desistir quando achar necessário. As práticas restaurativas também têm permitido a participação dos entes estatais como promotores, defensores, advogados e juízes no sistema restaurativo o que denota perfeitamente o cuidado quanto à salvaguarda dos direito e garantias fundamentais. Por seu lado, crítica de que a Justiça Restaurativa aumenta o controle social e os poderes da polícia é em parte verdade quando de avalia alguns sistemas restaurativos, particularmente, nos Estados Unidos e na Austrália em que a figura do policial tem papel fundamental no âmbito dos encontros restaurativos. Todavia, não são todos os programas de Justiça Restaurativa que assim trabalham e os focos das práticas restaurativas se coadunam com seus princípios que são vinculados ao atendimento de necessidades daqueles diretamente e indiretamente afetados pelo crime, ou seja, se o controle social ocorre de maneira mais eficiente e mais rigorosa, há que se observar como o processo restaurativo esta sendo organizado e não criticar a Justiça Restaurativa como se este fosse algum de seus pilares, pois na verdade não é o seu objetivo primordial. Outra crítica é de que a Justiça Restaurativa trivializa o crime, porém, esta concepção não deve prosperar, na medida em que uma filosofia que propõe a promoção de uma cultura de paz e o tratamento do crime como um rompimento de relações sociais não pode ser vista como algo trivial. Ao contrário, a Justiça Restaurativa se preocupa com todos os lados, por isso, caminha na contramão da Justiça Convencional cujo foco se encontra em punir o infrator, dar-lhe o castigo, esquecendo-se das vítimas e da comunidade. Mais genericamente, é possível dizer que a justiça restaurativa lida com o crime de maneira mais séria que os sistemas criminais convencionais, na medida em que tem como foco as conseqüências do crime para a vítima e tenta, além disso, encontrar caminhos significativos para a responsabilização dos infratores. Ao contrário, o crime é efetivamente trivializado nos processos em que as vítimas não têm papel

49 49 algum (além de, algumas vezes, como testemunha) e nos quais os infratores não são mais do que meros observadores passivos. (MORRIS, 2005, p. 447). De outro lado, há a crítica de que a Justiça Restaurativa falha ao restaurar vítimas e infratores. Neste ponto, deve-se compreender o que significa restaurar no plano da Justiça Restaurativa, conforme já fora explicitado, o foco da ação de restaurar significa dar melhor dignidade, promover reequilíbrio social, recompor segurança, dar capacidade de empoderamento da própria vida, dar voz às partes envolvidas e estimular o autorrespeito e o senso de controle. Sendo assim, os programas restaurativos têm demonstrado eficácia quanto a estas questões: Não há nenhuma dúvida sobre o resultado das pesquisas nesse sentido: vítimas que tomam parte em processos restaurativos têm altos graus de satisfação com os acordos reparativos, pequenos níveis de medo e parecem possuir uma boa compreensão sobre o motivo pelo qual o crime ocorreu e se é provável que ocorra novamente (para os dados específicos, consultar Daly, 2001; Strang, 2001; Umbreit et al. 2001). (MORRIS, 2005, p. 448, grifo nosso). No que tange a crítica de que a Justiça Restaurativa não produz mudanças reais, pois não é efetiva no combate a reincidência, deve se ter em conta que este não é o objetivo fundamental da Justiça Restaurativa. Suas revoluções são silenciosas e a não reincidência se manifesta como um subproduto da Justiça Restaurativa, todavia, a ênfase da Justiça Restaurativa está em atender pessoas e buscar o reequilíbrio social, por meio, do diálogo e do encontro. Por ser assim, em sua essência a Justiça Restaurativa trabalha comportamento e na maioria dos processos restaurativos que se concluem com êxito, há uma diminuição na reincidência. A crítica mais contundente feita aqui, entretanto, é a de que a justiça restaurativa falhou em reduzir a reincidência. Poderíamos razoavelmente argumentar, por um lado, que o objetivo da justiça restaurativa não seria a redução da reincidência, mas sim a responsabilização efetiva dos infratores e a reparação, por parte deles, das vítimas. Por outro lado, também é razoável argumentar que, se um determinado processo utiliza os mecanismos restaurativos e alcança seus objetivos, então é possível esperar uma redução da reincidência. Dessa forma, se o infrator aceita a responsabilidade por seu crime, sente-se envolvido na decisão de como lidar com ela, sente-se tratado com justiça e respeito, desculpa-se e faz reparações à vítima no contexto de um programa que visa a tratar as causas subjacentes a seu crime, então nós podemos, no mínimo, prever que ele estará menos inclinado a reincidir no futuro. (MORRIS, 2005, p. 450). A outra crítica apontada, é que a Justiça Restaurativa geraria resultados discriminatórios. Esta compreensão não deve prosperar, pois vai de encontro ao valor fundamental da Justiça Restaurativa que é o respeito, ao mesmo tempo em que seus programas visam afetar o máximo da coletividade e criar a interação das partes, a Justiça Restaurativa se coloca a disposição de todos, ao contrário da Justiça convencional que muitas vezes se revela rigorosa e implacável contra aqueles que possuem pouca capacidade

50 50 socioeconômica de se defender, ao passo que àqueles que possuem padrões sociais e econômicos elevados, restam quase intocáveis. Aliás, se há programas restaurativos gerando resultados discriminatórios é porque em sua essência não são restaurativos. Por sua vez, a crítica quanto à questão de que a Justiça restaurativa não afeta as diferenças de poder, ao colocar uma vítima muito forte em face de um infrator fraco, não se sustenta na medida em que tal entendimento não aprofundou o real conceito de vítima e ofensor no âmbito restaurativo. Nessa medida, importante ressaltar que as partes são trazidas para uma interação voluntária, os ofensores tem seus direitos garantidos e respeitados, as vítimas podem relatar sua história e o ofensor pode relatar o que o levou a conduta nociva, para que se compreenda o cenário e o contexto do crime. Ao mesmo tempo, o depoimento da vítima, as demonstrações dos sentimentos das famílias levam a evidenciar qual o real dano causado pelo crime, daí ocorre a conscientização por parte do ofensor. Isto não significa que ele é parte fraca no processo restaurativo, haja vista, que pode desistir a qualquer momento e os relatos não serão utilizados contra ele no juízo tradicional, bem como, a própria família do ofensor faz parte da dinâmica restaurativa. A crítica de que a Justiça Restaurativa encoraja o vigilantismo (MORRIS, 2005, p. 454) no plano da comunidade é uma concepção no mínimo equivocada, tendo em vista, que a Justiça Restaurativa busca o envolvimento da comunidade de modo que esta assuma também responsabilidades ante a vítima e o ofensor, bem como, expresse as suas necessidades. Qualquer programa que vise o respeito mútuo e o processo de assumir papéis perante a ocorrência criminosa, não pode gerar condutas essencialmente retributivas, estigmatizantes e patriarcais como ocorre no vigilantismo que desemboca muitas vezes na busca de se realizar justiça com as próprias mãos ou nas vinganças privadas. Vazia também resta à crítica quanto a ser a Justiça Restaurativa sem legitimidade, este entendimento deve ser reportado ao próprio sistema atual, com a seguinte pergunta: Qual legitimidade tem o sistema de justiça criminal na atualidade? Qual a sua herança para as gerações futuras? paira a dúvida. Diversamente, a Justiça Restaurativa em suas ações e bases fundamentais busca fomentar a dignidade humana e os direitos humanos, como pode, então, restar sem legitimidade para atuar perante o crime? Logo, repita-se, é relevante que as críticas aprofundem o estudo sobre as concepções restaurativas. Alguns teóricos criticam a Justiça Restaurativa, no sentido, de que ela fracassa ao promover Justiça, na medida em que sanções de comum acordo realizadas por meio de processos restaurativos não seriam proporcionais à gravidade do crime. Neste ponto, a de se

51 51 ter em mente que a Justiça Restaurativa deixa a cargo das partes envolvidas o consenso ou não, e as penas acordadas entre vítima e ofensor demonstram um real equilíbrio quanto à aplicação da sanção. Diferente do que ocorre no sistema criminal tradicional que o Juiz condena e a vítima que não é escutada no processo, considera pouco a sentença prolatada, quando não, a absolvição de um culpado, ou mesmo a condenação severa e desproporcional que a todos choca. Então, o que será a justiça para os críticos? Neste sentido, vale ressaltar que: [...] a decisão consensual é uma premissa da justiça restaurativa. Todas as principais partes envolvidas vítimas, infratores e comunidades de apoio devem concordar com a conclusão apropriada. O Estado permanece participando do processo decisório por meio de seus representantes por exemplo, a polícia ou o judiciário -, dependendo do lugar em que se encontra o processo da justiça restaurativa no âmbito do sistema judicial criminal. A diferença,no entanto, é que estes representantes não são os principais tomadores de decisões. (MORRIS, 2005, p. 455). Enfim, restam, assim, elencadas as principais críticas quanto a Justiça Restaurativa, todavia, percebe-se que mesmo os teóricos e críticos precisam aprofundar suas concepções sobre Justiça Restaurativa para melhor criticá-la e fomentar o debate sempre salutar no campo acadêmico e das ideias, a fim de aprimorar as práticas restaurativas. Repassadas as críticas e os desafios a serem enfrentados quando da aplicabilidade prática da Justiça Restaurativa, adentrará o capítulo seguinte no âmbito dos programas e projetos implantados e fomentados no Brasil e que já refletem a concretização das ações restaurativas no cenário nacional, especificamente, dentro das portas do Poder Judiciário.

52 52 5. JUSTIÇA RESTAURATIVA POSSÍVEL: BREVE ESTUDO DE PRÁTICAS IMPLANTADAS NO BRASIL As concepções restaurativas começaram a ser debatidas no palco político do Poder Legislativo quando da propositura do Projeto de lei nº 7006/2006 da Câmara dos Deputados, que propunha alterações no Código Penal, bem como, no Código de Processo Penal com a implantação expressa da Justiça Restaurativa no âmbito penal. Todavia, o relator do projeto Deputado Antônio Carlos Biscaia, em 2009, aceitou que o projeto se conformava juridicamente com o ordenamento pátrio, pois considerou como sendo uma política que geraria maior impunidade e desagrado popular em sua efetivação prática. Assim, concluiu pela rejeição do projeto legislativo. Posteriormente, a Justiça Restaurativa no Brasil passou a ser uma questão de política pública a partir da Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, o que impulsionou alguns projetos sobre práticas restaurativas de mediação penal que estavam embrionários até então, principalmente, no plano dos juizados especiais criminais que começaram a trabalhar com processos restaurativos e dar maior efetividade a prestação jurisdicional. Recentemente, a resolução supramencionada veio a ser emendada, especificamente, a emenda nº 1 de 31 de Janeiro de 2013 veio determinando expressamente a implantação dos princípios de Justiça Restaurativa em nosso ordenamento, introduzindo a Resolução 2002/12 das Nações Unidas, quando em seu texto considera: [...] o disposto na Resolução nº 2002/12 do Conselho Econômico Social da Organização das Nações Unidas, que estabelece princípios básicos de Justiça Restaurativa; (BRASIL, 2013, grifo nosso). Por outro lado, já havia no sistema jurídico pátrio dois projetos restaurativos que se consolidaram e se destacam no Brasil por atuarem de modo condizente com os princípios e bases restaurativas e por evidenciarem resultados expressivos relevantes. Estes projetos são a Justiça para o Século XXI implantado no Rio Grande do Sul, que consiste em um programa restaurativo voltado para o trabalho com os menores infratores e o atendimento de vítimas, famílias e comunidades afetadas pelos atos infracionais e o Projeto Piloto do Núcleo Bandeirante implantado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. O projeto Justiça para o Século XXI se encontra voltado para as questões do Estatuto da Criança e do Adolescente e se consolidou junto aos Juizados e Varas da Infância e da Juventude na área criminal em Porto Alegre. Em março de 2005, o projeto "Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro", (PNUD/Ministério Justiça), com foco nos processos judiciais da 3ª Vara, tornou-se referência no impulsionamento dos estudos e

53 53 práticas inspiradas pelo novo modelo de Justiça. A contribuição da UNESCO/Criança Esperança, que a partir de agosto deu lugar à execução do Projeto "Justiça para o Século 21", expandiu a difusão e aplicação da Justiça Restaurativa ao atendimento técnico dos adolescentes infratores. Na Capital gaúcha, a ênfase em resolver conflitos, mais do que punir transgressões, começa a proliferar na Justiça da Infância e da Juventude inspirada nos ideais da Justiça Restaurativa combinada com a Doutrina da Proteção Integral da Infância e nos movimentos pela Cultura de Paz. Estudos teóricos e observação da prática judiciária sob o prisma restaurativo, iniciados ainda em 1999 sob a inspiração do professor Pedro Scuro Neto, e a inquietude pela renovação da Justiça e a busca de soluções para a falta de efetividade do Sistema de Justiça Penal Juvenil abriram essa nova frente do movimento internacional pela Justiça Restaurativa. (JUSTIÇA 21, 2013, grifo nosso). Nesse viés, deu-se surgimento ao projeto Justiça para o Século XXI com vistas à promoção de uma cultura de paz e a promoção dos direitos humanos. Além disso, uma dos objetivos do presente programa são a difusão dos princípios de Justiça Restaurativa e seus desdobramentos em políticas públicas que visem principalmente o trabalho com adolescentes e jovens infratores. As práticas de Justiça Restaurativa aplicadas no Rio Grande do Sul evidenciam um grande avanço e tem demonstrado que as implantações de ações restaurativas no plano nacional são de suma importância e se coadunam perfeitamente com a legislação brasileira e os preceitos constitucionais. Ademais, é uma alternativa cujos efeitos são imediatos em todos os envolvidos, pois o trabalho de recuperação dos jovens junto das famílias tem promovido resultados como um maior conforto, empoderamento e ressarcimento às vítimas, bem como, a conscientização e recuperação dos adolescentes que em sua maioria não voltam a delinquir após passar por um processo restaurativo. Em segundo plano, há que se destacar o projeto piloto implantado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJDFT, que aceitou a implantação da Justiça Restaurativa como uma alternativa de prestação jurisdicional no âmbito criminal. O projeto cresceu e já possuem dados e resultados relevantes que vêm aumentando e demonstrando a possibilidade concreta de promoção da Justiça Restaurativa como um instrumento válido e possível de reequilíbrio social, bem como, um modo diverso de tratamento dos conflitos. O programa se foca no trabalho do juizado especial criminal. Sendo assim, foi realizada pesquisa de campo suscita consistente em coleta de dados, entrevistas e observação do funcionamento do Núcleo de Justiça Restaurativa do TJDFT, com vistas, a apreciar como a Justiça Restaurativa se desenvolve na prática e como poderá ser realizada em outras frentes do direito e do processo penal.

54 O PROJETO PILOTO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS NO NÚCLEO BANDEIRANTE EM BRASÍLIA/DF O presente projeto promovido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, iniciou com um caráter experimental e posteriormente veio se consolidando ao longo dos anos com um crescente em suas demandas jurídicas e nas mediações realizadas, conforme será analisado, serão abordados às questões institucionais do projeto, estrutura, dinâmica dos trabalhos e seus fundamentos restaurativos Questões institucionais A cooperação técnica com a Organização das Nações Unidas foi concretizada com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) que impulsionou o desenvolvimento e a modernização do Sistema de Justiça brasileiro. Com isso, o PNUD propôs a introdução de modelos de Justiça Restaurativa e de Justiça Comunitária, bem como, a descentralização dos juizados especiais federais, para promover um acesso maior ao Poder Judiciário e tornar suas ações mais efetivas. Assim, o programa da ONU tem colaborado na produção de dados e na realização de diagnósticos das Defensorias Públicas no Brasil, dos conselhos de justiça e o mapeamento das resoluções de conflito de maneira pacífica. Nessa medida, o primeiro projeto de cooperação técnica foi firmado em 2003, com recursos próprios do PNUD (TRAC), com a Secretaria de Reforma do Judiciário que foi a assistência preparatória BRA/03/023 Programa de Modernização da Gestão do Sistema Judiciário 10, com objetivo de dar suporte e apoio, por meio de estudos, ao processo de reforma do poder judiciário, exigência feita pelo próprio Ministério da Justiça que se preocupava com o concreto desenvolvimento da Resolução 2002/12 no cenário nacional. Foi assim, que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios em seus objetivos e metas de modernização implantou a utilização de modalidades alternativas de composição de conflitos em complemento ao sistema de procedimento tradicional. Desta forma, desde 2005 o TJDFT vem testando e aplicando os princípios restaurativos no âmbito do Juizado Especial Criminal do Núcleo Bandeirante. A vinculação dos princípios e práticas restaurativas aos serviços do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios pode contribuir para a especialização e democratização da prestação jurisdicional trazendo efeitos desejáveis para a resolução de conflitos quando comparado ao processo judicial tradicional, como a redução da criminalidade e do impacto dos crimes sobre os cidadãos. Outro fator que atesta a importância do modelo restaurativo reside no potencial apresentado tanto no que se refere à eficácia integradora das partes afetadas pelo ambiente do 10 TJDFT, 2006, p. 118, grifo nosso (Anexo 3).

55 55 crime quanto no que diz respeito à eficiência na administração da justiça, vindo a contribuir para a obtenção e manutenção de relações sociais equilibradas e solidárias. (TJDFT, 2006, p. 135, Anexo 3). No ano de 2006, por meio da publicação da Portaria Conjunta 52, o programa de Justiça Restaurativa passou a ser vinculado à Presidência do Tribunal. Nesta linha, foi instituído o Centro de Resolução Não Adversarial de Conflitos CNRC, em Posteriormente, com a publicação da Resolução 5 de 2009 do TJDFT, especificamente, em seu art. 13º, promoveu a reestruturação dos serviços administrativos que levaram a criação do Sistema de Múltiplas Portas de Acesso à Justiça, ao qual, o Serviço de Apoio à Justiça Restaurativa ficou vinculado, conforme disposição do inciso III, 3º. Sendo assim, o Programa de Justiça Restaurativa do TJDFT tem como objetivos os seguintes: I a seleção, o recrutamento, a formação e o treinamento de facilitadores; II o acolhimento, a orientação e a preparação das partes e das comunidades de referência para o encontro restaurativo; III a ordenação das atividades dos facilitadores na condução do encontro restaurativo; IV a orientação das atividades dos facilitadores para a formalização do acordo restaurativo, quando alcançado; V o registro e a documentação dos casos enviados ao Serviço, para todos os fins que se fizerem necessários, qualquer que seja o resultado alcançado; VI a elaboração, o registro e a documentação de instrumentos de avaliação do Programa, conforme seja definido com instituição externa ou por equipe técnicocientífica; VII a promoção de estudos visando ao aprimoramento do Programa; VIII a organização e a realização de eventos objetivando a divulgação do programa e dos seus resultados; IX a celebração, com os facilitadores voluntários, de Termo de Adesão ao Serviço Voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício, bem como a manutenção e armazenamento de tais instrumentos; X o estabelecimento de relacionamento técnico e operacional com outras unidades, programas ou projetos do TJDFT e com outras instituições, visando aos objetivos do Programa; XI o fornecimento de apoio técnico e operacional aos Magistrados que assim o solicitarem; XII a manutenção de biblioteca básica de literatura nacional e estrangeira sobre Justiça Restaurativa, a fim de proporcionar a consulta dos facilitadores bem como para o treinamento dos mesmos; XIII a elaboração e atualização de Manual de Justiça Restaurativa, o qual deverá contemplar a boa técnica da metodologia de mediação vítima-ofensor; XIV o atendimento às demandas por intervenção restaurativa originárias de qualquer circunscrição judiciária do Distrito Federal, dentro das condições que lhe permitirem os recursos humanos e materiais; XV o desenvolvimento de gestão com organismos nacionais e internacionais visando à captação de recursos adicionais específicos para o desenvolvimento das atividades do Programa de Justiça Restaurativa. (TJDFT, Portaria Conjunta nº 52, 2006). Observa-se, assim, quanto aos objetivos à busca de viabilização prática do projeto piloto, focado na formação profissional dos facilitadores, bem como, no estudo aprofundado da Justiça Restaurativa, na gestão dos dados estatísticos e na captação dos recursos

56 56 necessários para o desenvolvimento do programa. Alguns destes objetivos supramencionados foram observados quando da pesquisa de campo realizada com a visita ao Núcleo de Justiça Restaurativa no Fórum do Núcleo Bandeirante Da pesquisa in loco Em primeiro plano, há que se ressaltar que a presente pesquisa é de caráter modesto e foi realizada com vistas a conseguir identificar como os programas de Justiça Restaurativa se desenvolvem na prática, bem como, analisar se os princípios de justiça restaurativa estão sendo seguidos pelos programas, quais são os desafios e qual a concepção de crime e de justiça restaurativa para os operadores que atuam diretamente com os projetos realizados com esta temática. Assim, temos a principal justificativa da realização da pesquisa de campo. Para avaliar o quão restaurativo é um programa é necessário analisar o que há de restaurativo tanto em seus valores quanto em seus processos, pois valores e processos são inseparáveis, posto que os valores determinam o processo e processo torna visíveis os valores. (PRUDENTE, 2011, p. 42). Destaque-se que a pesquisa de campo também é importante não só para enriquecer os estudos realizados, como também para dar aporte à própria proposta que será feita pelo trabalho quanto à possibilidade de aplicação paralela dos princípios e práticas restaurativas ao Tribunal do Júri. Por ser assim, é de suma relevância que se coletem dados e verifique se a Justiça Restaurativa está mesmo sendo utilizada abarcada pela ação efetiva, por meio de projetos e programas. No exterior os programas de Justiça Restaurativa se intensificam, principalmente, com o suporte dado pelas Nações Unidas aos vários países, por outro lado, no Brasil este é um ramo em franca ascensão, mas, que ainda precisa ser melhor explorado e trabalhado, até porque, as condições do sistema criminal brasileiro são bem diversas das condições de outros países. A corroborar este entendimento importante colacionar: O grande impulso às iniciativas restaurativas, contudo, aconteceu em 2004, quando o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria da Reforma do Judiciário (SRJ), elaborou o Projeto BRA/05/009 Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro, e juntamente com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), apoiou três projetos-piloto de Justiça Restaurativa. Esta parceria deu-se em virtude das demais na área de Justiça que vinham sendo desenvolvidas desde 2003 entre SRJ e o PNUD tendo como preocupação central os meios alternativos de resolução de conflitos, principalmente, no campo dos conflitos de natureza penal e infracional, em que se notava uma ausência destas alternativas. (PRUDENTE, 2011, p. 47). Portanto, a pesquisa apresentada busca evidenciar um dos projetos-piloto que já existem promovendo a Justiça Restaurativa e que teve como propulsor o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Neste sentido, ante a necessidade de

57 57 promoção de novas práticas e alternativas de solução de conflitos, bem como, de acesso ao Poder Judiciário, surgiu a o projeto implantado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios para aplicação das ações restaurativas ao juizado criminal. Embora, seja uma abordagem voltada para a mediação de ocorrências de crimes de menor potencial ofensivo, não deixa de ser um importante avanço no âmbito do Judiciário pátrio Metodologia da pesquisa Dito isso, importante considerar que a pesquisa se deu com a seguinte metodologia: Observação, coleta de dados, vídeos, fotos e entrevista. Assim, os aspectos quantitativos basearam-se nas informações secundárias dadas pela equipe técnica e pelo facilitador supervisor do Núcleo de Justiça Restaurativa, por meio, de cartilhas e informativos fornecidos pelo programa, ademais, a pesquisa quanto ao ambiente e local das práticas restaurativas se deu por meio de observação e registro fotográfico, ao passo que as questões qualitativas foram registradas através de entrevistas. Ressalte-se, que por aviso do próprio supervisor no Núcleo de Justiça Restaurativa não havia mais a permissão para assistir a um encontro vítima/ofensor como já houvera sido permitido em outra ocasião, tendo em vista, que fora determinado pelo Tribunal a reserva das partes no plano do encontro restaurativo que possui um caráter procedimental diferente do processo comum, pois os programas restaurativos possuem o valor e o caráter da confidencialidade o que é diverso do viés público do processo tradicional. Por outro lado, a investigação com relação às concepções sobre a Justiça Restaurativa, crime, a dinâmica do programa e como são realizados os encontros restaurativos, se deu por meio de entrevistas fornecidas pela própria equipe técnica que disponibilizou vídeos institucionais com a entrevista de magistrados, promotores, mediadores que participam do programa e assim contribuiu para complementar o trabalho de pesquisa de campo e para verificar como estas concepções estavam embasadas na prática, bem como, analisar se a visão dos operadores do direito e dos profissionais envolvidos com a Justiça Restaurativa se coadunava com os princípios e valores restaurativos. Por fim, a pesquisa bibliográfica serviu de base para análise dos resultados. Enfim, há que se destacar o contexto em que a pesquisa fora realizada, precisamente no Fórum Desembargador Hugo Auler, localizado na cidade do Núcleo Bandeirante, Avenida Contorno, Lote 14, Distrito Federal, na data de 05/04/2013 às 15hs30mins.

58 Dos resultados da pesquisa Nesse tópico, serão apresentados os resultados com base nas observações e análises realizadas e fundamentadas com os dados colhidos durante a visita ao Tribunal, desta forma, pode-se verificar o quanto o Poder Judiciário se encontra disposto a investir e implantar ações restaurativas Da observação e do ambiente restaurativo Em observação do Núcleo de Justiça Restaurativa localizado no andar térreo do Fórum Desembargador Hugo Auler, pode-se identificar que há uma boa estrutura para o programa que dispõe dos seguintes recursos, ao qual, pode-se apresentar de modo tabular: Tabela 2: Observação pesquisa de campo Estrutura Física Recursos Humanos Basicamente o projeto-piloto conta com as seguintes salas: - 3 (três) salas de atendimento particular e encontro restaurativo que pode ser acompanhada pelas famílias de vítimas/ofensor. - 1 (uma) sala mais ampla que contam com várias cadeiras para os chamados encontros dos círculos restaurativos, também chamados de sentencing circle e para as conferência que envolvem não só vítima/ofensor como também às famílias e a comunidade, chamado de family group conferences - 1 (uma) sala de trabalhos, onde são recebidos No plano dos recursos humanos temos a seguinte configuração: - Profissionais: - 2 (dois) Coordenadores 11 do Projeto são Juízes de Direito: Dr. Asiel Henrique de Sousa e Dra. Léa Martins Sales; - 1 (um) advogado/facilitador e supervisor - 2 (duas) psicólogas 12-2 (dois) servidores analistas - 2 (dois) estagiários - Não foi verificada a presença de assistente social que também é um profissional importante nas práticas estudantes, servidores, advogados, pessoas da restaurativas. comunidade, com interesse na abordagem restaurativa, esta sala funciona como um escritório, lá são catalogados os casos de atendimento, referências e livros sobre Justiça Restaurativa e onde se encontra a equipe técnica do programa. Estas observações são importantes para se verificar o quanto o poder público se encontra realmente interessado em tornar a política pública de promoção da Justiça Restaurativa efetiva e capaz de contribuir com o melhor acesso ao Poder Judiciário, bem 11 Os coordenadores não se encontravam quando da visita ao Núcleo. Destaque-se que a visita deve ser agendada com antecedência e quem recebe o estudante e lhe dá as informações necessárias é o supervisor que é advogado. 12 Esta informação fora dada pelo próprio supervisor do núcleo, pois as duas psicólogas não se encontravam no dia da visita, especificamente, 05/04/13 às 15h30min.

59 59 como, a redução da morosidade processual e a consequente ampliação da participação das partes no plano processual. No seguinte momento, após a observação inicial quanto à estrutura do programa passamos para a análise do ambiente restaurativo. Neste ponto, é relevante considerar que um dos aspectos que a chama a atenção fora à forma como as partes devem ser tratadas, o facilitador-supervisor do programa frisou a importância do respeito, bem como, do tratamento pessoal e reservado quanto às partes: As chamamos pelo nome, reservadamente, convidamos a entrar e perguntamos como está se sentindo, se quer realmente realizar o encontro, oferecemos água, café, sempre procurando deixar as partes mais relaxadas e desarmadas possível, muito diferente das audiências comuns que o secretário grita o número do processo no corredor e o nome da pessoa [...]. (Comentário realizado pelo supervisor/facilitador quando da apresentação das salas onde ocorrem os encontros restaurativos, observação pesquisa de campo). Nesse ínterim, pode-se observar como são planejadas e diferenciadas as salas de atendimento restaurativo, ao contrário, de uma sala de audiência comum, não há púlpito, nem tablado, as figuras centrais envolvidas no processo não se encontram hierarquizadas pela altura ou qualquer posição nas salas, mas, permanecem horizontalmente todas no mesmo patamar e na formação circular, há uma mesa com computador para registro do acordo e de tudo que é expresso pelas partes, quadro para auxiliar o facilitador/moderador (ROBALO, 2012, p. 75) e lugares para que a comunidade diretamente afetada e as famílias possam se acomodar. Figura 1 Fotografias retiradas com a autorização do supervisor do Núcleo de Justiça Restaurativa das salas onde ocorrem os encontros restaurativos. A frase ao lado está afixada no quadro branco e foi dita pelo Presidente do TJRS no 3º Simpósio Internacional de Justiça Restaurativa em Porto Alegre em outubro de 2012.

60 60 O presente recinto é dedicado aos encontros diretos entre vítima e ofensor, podendo ocorrer também o encontro entre as famílias, os principais atores se sentam a mesa redonda e os demais participantes se acomodam a volta da mesa ao centro, tudo acompanhado pelo facilitador e um servidor que fica responsável pelo registro da reunião. Todavia, nestes encontros restaurativos não há a figura do Juiz nem de policiais da escolta, conforme próprio relato do supervisor: Não há policiais, se entendermos que há necessidade de acompanhamento policial não chegamos nem a realizar o encontro vítima/ofensor, pois demonstra que as coisas ainda não estão no plano da conversa e do diálogo. O Juiz também não pode participar porque ele deve ser imparcial e precisará sentenciar caso o processo restaurativo não dê certo ou homologar o acordo, nos dois casos ele deve estar afastado das partes. (Comentário realizado pelo supervisor/facilitador quando da apresentação das salas onde ocorrem os encontros restaurativos, observação pesquisa de campo). Posteriormente, fora observado a sala mais ampla onde ocorrem os chamados sentencing circles e as reuniões com as famílias, também denominadas de family group conference. Estas são duas modalidades das práticas restaurativas, no primeiro encontro temos a participação mais ativa da comunidade ao passo que no segundo encontro a atuação cabe, mormente, às famílias de vítima e ofensor. Ambos, no entanto, consideram as questões emocionais e a vivência da vítima e do ofensor e assim procuram resolver o conflito com aqueles diretamente afetados pelo ilícito. Entretanto, há uma particularidade quanto aos círculos de sentença em que a comunidade participa mais ativamente, que visa a provocar no ofensor uma vergonha positiva que o leve a refletir sobre seus atos e modificar sua realidade. Quanto aos sentencing circles (ou circle sentencing), os mesmos operam de modo a que a comunidade se pronuncie sobre uma determinada conduta, procurando-se a reconciliação entre vítima e o agente, podendo a sua opinião ser levada em consideração pelo juiz. [...] De acordo com Keneth Menzel, os circle sentencing consistem numa aproximação holística à justiça penal, permitindo que as vítimas e aos agentes interajam e se curem num local neutro e dá à comunidade a última palavra na condenação do agente. [...] Um outro aspecto referido pela doutrina consiste no facto de os circle sentencing potenciarem não apenas a vergonha do agente, de tal sorte que o mesmo sinta sincero remorso pela sua conduta, sendo exposto perante a sua comunidade mas não sendo, contudo, estigmatizado, visto que serão também levadas a cabo medidas que potenciem a sua efetiva reintegração na sociedade [...]. No que em concreto diz respeito aos family group conferences, se é certo que tiveram a sua origem na Nova Zelândia, não menos verdade é o facto de esse mesmo modelo se ter [...] rapidamente espalhado para outros países [...], como refere Nathan Harris. No que diz respeito ao funcionamento destas conferências, é de salientar a presença do agente e da vítima e, bem assim, daqueles que lhes venham prestar apoio, onde se incluem os seus familiares. (ROBALO, 2012, p , grifo do autor). Logo, temos que as práticas restaurativas no Núcleo Bandeirante também possuem o caráter de círculos restaurativos e de conferência entre as famílias. Deve-se destacar que nestes dois tipos de abordagem restaurativa a figura do facilitador é fundamental para dar

61 61 harmonia do diálogo entre as partes, porém, esta espécie de moderador procurará máximo possível, ser isento e imparcial. Há ainda um espaço reservado para este tipo de encontro, ao qual, pode-se analisar e observar: Figura 2 Fotografia retirada da sala onde ocorrem os sentences circles e os encontros family group conference. Sendo assim, estas foram às observações preliminares quanto ao ambiente restaurativo, contexto e estrutura física do núcleo de atendimento, adiante, será abordada a dinâmica de trabalho, bem como, os dados estatísticos fornecidos pela equipe técnica Da dinâmica dos trabalhos A realidade dos Tribunais revela um grave problema que é a cultura da litigiosidade, ou da comumente chamada briga na justiça. Neste viés, não só esta atitude causa a morosidade no judiciário como também não gera a satisfação adequada e equilibrada das partes que acabam recorrendo ou mesmo dando entrada em nova ação, restando sempre um vazio para àqueles diretamente afetados pela lide e que gera frustração e insatisfação ante as instituições estatais. Os casos são escolhidos principalmente, tendo em vista, a continuidade dos relacionamentos dos envolvidos no problema. O vizinho que vai se encontra com o outro vizinho, então está surgindo um problema entre eles, aí você precisa solucionar aquele problema porque eles vão se encontrar novamente. Há uma perspectiva de quê aquele problema vai repetir, de quê aquele conflito vai repetir, aquela violência vai repetir [...]. (Entrevista com Juiz Ben-Hur Viza do 2º Juizado Especial de Competência Geral do Núcleo Bandeirante/ DF, presente no vídeo institucional do TJDFT sobre Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica.) Os programas de mediação e que abarcam as práticas restaurativas são importantes instrumentos para promoção de um prestação jurisdicional efetiva, bem como, a redução dos números de processos que adentram o Poder Judiciário pautado por um mesmo conflito a

62 62 envolver as mesmas partes e assim restaurar os relacionamentos e não somente retribuir a ação criminosa com uma punição. A ideia de Justiça Restaurativa ela se contrapõe a ideia de Justiça Retributiva que é o modelo de justiça criminal tradicional. O modelo de justiça criminal tradicional pressupõe uma certa quantidade de punição para uma certa quantidade de maldade ou de erro, de crime praticado pela pessoa a dor paga pela dor. A ideia de Justiça Restaurativa é a ideia de quê dos crimes decorrem consequências que vão para além da violação da lei e que estas consequências podem ser tratadas no ambiente não necessariamente formal do processo. [...] No Brasil, a Justiça Restaurativa foi iniciada no ano de 2005, simultaneamente, em São Caetano do Sul São Paulo, em Porto Alegre e aqui no Distrito Federal em nosso projeto-piloto lá do Núcleo Bandeirante. (Entrevista com Juiz Dr. Asiel Henrique de Souza, do Juizado Especial de Competência Geral do Núcleo Bandeirante DF e Coordenador do Projeto de Justiça Restaurativa, vídeo institucional da Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica). No Núcleo de Justiça Restaurativa do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios os processos são encaminhados pelo juiz, após a análise preliminar do Ministério Público, bem como, da equipe técnica da Justiça Restaurativa. Posteriormente, são submetidos à concordância ou não das partes envolvidas, assim, é uma opção voluntária das pessoas diretamente intricadas na lide, caso não seja aceita pelas partes o processo segue de modo convencional. A utilização de práticas restaurativas no âmbito da Justiça Criminal embora possa ser contraditório o Ministério Público ter o interesse na aplicação da Justiça Restaurativa é muito interessante verificar que o Ministério Público não tem a função como antes da Constituição de 1988 como um mero órgão acusador, ele também é um órgão promotor de igualdade social, de promoção dos direitos humanos, é um órgão que atua mais na defesa da sociedade como um todo. E por conta disso, havendo interesse da sociedade na resolução pacífica dos conflitos seja por intermédio da justiça, ou seja, por intermédio deles mesmos tendo o empoderamento que lhe é dado com a Justiça Restaurativa, o Ministério Público entende muito satisfatória essa prática, essa adoção, até porque, a Justiça Restaurativa traz enormes ganhos não só aos envolvidos, mas, também para toda sociedade. (Entrevista com o Dr. Diógenes Antero Lourenço, promotor de justiça, vídeo institucional da Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica.) Nesse contexto, o núcleo realiza encontros particulares de preparação em que são explicados e explicitados os princípios restaurativos e como a Justiça Restaurativa funciona, assim, as próprias partes decidem se desejam ou não continuar no programa. Logo, há uma audiência prévia ou preliminar em que trabalha com as partes em separado para somente depois realizar o encontro vítima/ofensor e suas famílias. Desde o início, para que ocorra o encontro vítima/ofensor, necessário que as parte concordem, bem como, o ofensor assuma responsabilidade sobre os seus atos. Às vezes a gente vê um processo e a gente acha que a situação é um pouco complicada e bota as partes para se encontrarem talvez pudesse não ser tão interessante, mas quando a gente faz os encontros privados depois à gente faz os encontros restaurativos, a gente vê que as partes tem muita disponibilidade mesmo para estar coversando e mudando o seus pontos de vista, revendo seus pontos de

63 63 vista, para mim é uma oportunidade muito gratificante de poder apostar nessa qualidade do ser humano de se esperar, de sair dessa condição mais adversarial e essa comunicação mais eficiente atinge também os grupos que vem aqui, as próprias famílias envolvidas vão vendo como é mais produtivo você ter uma comunicação mais aberta à posição do outro, às circunstâncias que o outro está envolvido. [...] (Entrevista com Simone de Assis Republicano, psicóloga e mediadora do Projeto de Justiça Restaurativa, vídeo institucional da Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica). Nessas reuniões tanto a preliminar individual como o encontro em si são mediados pelo facilitador, neutro e imparcial, que organizará o diálogo entre as partes. Esta dinâmica do encontro entre vítima/ofensor é um método fundamental de Justiça Restaurativa e quando realizado adequadamente as partes saem satisfeitas, pois outros aspectos que não podem ser tratados em uma sentença tradicional podem ser abordados no âmbito restaurativo. Quando se leva o conflito para a mediação, a gente acaba resolvendo todos os pontos controvertidos e quando levamos o conflito para outro sistema heterocompositivo como, por exemplo, um julgamento, a gente tem uma série de questões que acabam não sendo resolvidas dentro daquele ambiente de resolução de disputas, que é o que a gente chama de uma litigiosidade remanescente. As partes vão ao juízo, pleiteiam uma solução, muitas vezes o juiz prolata uma sentença e as partes ainda saem daquele processo de resolução de conflito com a sensação de que gostariam ter resolvidas algumas coisas que não foram resolvidas e que são as questões que não são juridicamente tuteladas e que naturalmente não podem ser resolvidas em uma sentença. Então, na verdade, a grande vantagem da mediação é resolver o conflito como um todo. (Entrevista com o Juiz André Gomma do Tribunal de Justiça da Bahia, vídeo institucional da Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica). No projeto da Justiça Restaurativa nós participamos de um caso que foi especialmente gratificante, porque envolvia uma denúncia grave de ameaça e a gente ao final chegou a um resultado extremamente positivo, foi realmente a restauração entre as partes. É uma satisfação muito grande ver partes que não conseguiam se falar, ao final se cumprimentando e desejando boa sorte e se dispondo à estabelecer novos padrões de conduta uns com os outros. (Entrevista com Leonardo Amorim, mediador voluntário do Projeto de Justiça Restaurativa, vídeo institucional da Justiça Restaurativa fornecido pela equipe técnica). Após a realização dos encontros restaurativos, será analisado pelo juiz quanto aos ditames da lei e verificado se não ocorreu qualquer irregularidade ou suprimido qualquer direito fundamental. Estando às partes de acordo, o juiz homologa o acordo ou prolata uma sentença que conterá os exatos termos do acordo com alguma questão adicional, como por exemplo, eventuais valores a ser restituído ou pago para as vítimas, o que também será colocado e evidenciado aos envolvidos. Logo, pela Justiça Restaurativa: [...] a resolução de problemas seria de forma colaborativa, pela oportunidade que oferece aos prejudicados por uma infração de se reunirem [...] (KONZEN, 2007, p. 79, grifo nosso). Assim, percebe-se que o programa restaurativo implantado no Tribunal de Justiça da Capital Federal preenche realmente os requisitos restaurativos e visa à aplicação dos princípios da Justiça Restaurativa, bem como, a utilização de seus valores como fundamentos

64 64 para a prática: No tocante aos valores, embora haja inúmeros, acreditamos que quatro elementos centrais da Justiça Restaurativa são o I) encontro, II) participação, III) reparação e IV) reintegração. (PRUDENTE, 2011, p. 43, grifo nosso) Dados estatísticos coletados Posteriormente, foram coletados alguns dados estatísticos fornecidos pela equipe técnica que demonstram os dados dos anos de 2005 a no que toca a atuação do Programa de Justiça Restaurativa quanto a quantidade de acordos celebrados, número de processos, mediações. Assim temos: Gráfico 1 Fonte: TJDFT, 2011, p. 44. Observam-se no gráfico colacionado que há uma crescente dos processos restaurativos, nos anos de 2005 e 2010, outro ponto que merece destaque é que há uma tendência aos acordos. Percebe-se que no primeiro ano, no caso, 2005, as saídas com acordo foram apenas de 6 (seis) contra 15 (quinze) saídas sem acordo, ou seja, do total de processos apenas um percentual de 28,5% (vinte e oito e meio por cento) saíram com acordo. Por outro lado, já no ano de 2010, dos 59 (cinquenta e nove) processos abertos, 22 (vinte e dois) saíram com acordo em face de apenas 13 (treze) que saíram sem acordo. Neste caso, tivemos um percentual de aproximadamente 37,2% (trinta e sete e dois por cento) de acordos. O ano anterior de 2009, também evidencia uma crescente dos acordos restaurativos 13 Importante considerar que estes são os dados catalogados e os mais organizados até o momento, recentemente, eles estão realizando uma nova organização de dados com dos anos de 2011 a 2013, mas, que ainda não se encontra pronta.

65 65 já que do total de 43 processos abertos, 33 concluíram com acordo, o que representa um percentual aproximado de 77% (setenta e sete por cento) dos processos em que a mediação restou frutífera. Assim, podemos verificar na análise gráfica comparativa dos anos de 2009/2010: Gráfico 2 Fonte: TJDFT, 2011, p. 45. No total da soma de todos os processos temos o número de 211 (duzentos e onze) processos abertos, em que 118 (cento e dezoito) saíram com acordo o que representa em termos percentuais, aproximadamente, 56% (cinquenta e seis por cento) das ações abertas. Sendo assim, deve-se notar que mesmo ante a crescente na utilização da Justiça Restaurativa e o aumento dos processos que restaram em acordos, ainda assim, o percentual fica quase parelho aos processos que saíram sem acordo que possuem um percentual expressivo de aproximadamente 39% (trinta e nove por cento) de litígios sem acordo. Nessa medida, há que destacar que não são fáceis os acordos e mediações restaurativas, tendo em vista, que há um tratamento mais direto com as partes e com todos os sentimentos que aquele crime gerou, por isso, o encontro e o diálogo, por si só, já indica um grande passo para a possível composição, todavia, mesmo nos casos dos delitos de menor potencial ofensivo, aos quais, são tratados pelo programa de Justiça Restaurativa, os acordos não são de fácil resolução. De outro modo, é de grande valia observar que as demandas no âmbito restaurativo vêm, gradativamente, aumentando e se consolidando e mesmo que ainda não seja tão alto, o percentual de processos com acordo, ainda é maior do que àqueles que saem sem o acordo. Destaque-se também quanto aos dados estatísticos, o número total de mediações ocorridas entre os anos de 2005 e 2010, e que refletem uma preferência das partes pelos

66 66 encontros privados junto dos facilitadores, na realidade, ocorrem na maioria dos casos encontros preparatórios e preliminares o que evidencia a necessidade que as partes têm de participar do processo judicial: Gráfico 3 Fonte: TJDFT, 2011, p. 46. Observa-se que também no plano das mediações no número de acordos foi maior do que o número de processos sem acordo, entretanto, a análise gráfica também demonstra que o trabalho do programa restaurativo não está somente associado aos encontros conjuntos, mas, também aos encontros privados o que evidencia um grande número. Nestas mediações privadas há o atendimento de parte a parte, ou seja, somente a vítima e seus familiares ou somente o ofensor e seus familiares. Estas mediações privadas são fundamentais para a preparação e verificação da possibilidade de um possível encontro para realização de um acordo ou não. Conclui-se que a busca pela Justiça Restaurativa é crescente, quanto mais o programa se estrutura e é divulgado, a tendência é a procura pelas práticas restaurativas. Entretanto, a possibilidade ou não de acordos no plano do programa do Núcleo Bandeirante, ainda é algo que necessita de estudos mais aprofundados e novos dados para verificação, pois, conforme restou demonstrado há uma tendência aos acordos, mas, o número de processos sem acordos ainda é relevante. Por isso, somente a prática e a experiência dirão qual o futuro do Programa Restaurativo implantado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, porém, sem dúvida, a configuração de um programa que dá resultados é um grande avanço para a construção de práticas restaurativas no âmbito do Poder Judiciário e evidencia algo muito positivo no judiciário.

67 Da discussão dos resultados Pode-se concluir da pesquisa realizada no Programa de Justiça Restaurativa do Fórum do Núcleo Bandeirante que as práticas restaurativas já existem e há cada vez mais setores e profissionais da área jurídica, bem como, autoridades interessadas na aplicação da Justiça Restaurativa como instrumento de mediação penal. Há uma tendência universal no sentido de adoção sistemática das mediações penais, focadas na relação, enquanto práticas restaurativas para prevenir litígios ou na fase inicial dos processos perante os Juizados Criminais. E, nessas aplicações formais, como atividade complementar e voluntária com o apoio do Ministério Público, do Tribunal de Justiça e da Defensoria Pública. (VASCONCELOS, 2008, p.37). Além disso, verificou-se que no plano restaurativo há um tratamento das questões que não podem ser tratadas dentro de uma sentença, nem mesmo no âmbito da Justiça convencional, o que de certo, demonstra uma grande vantagem da Justiça Restaurativa ante o sistema de justiça criminal tradicional, ao qual, não trata de questões como as consequências do crime para determinada comunidade, os sentimentos, traumas e dores. Ademais, evidenciou-se o caráter democrático e dialógico presente na prática restaurativa que busca suplantar discórdias com o tratamento igualitário entre as partes envolvidas e a promoção do empoderamento pelas partes. Neste sentido, percebeu-se que até mesmo o ambiente restaurativo e a dinâmica dos trabalhos possui um caráter diverso do ambiente e do tratamento tradicional do processo e do conflito. [...] O poder passa a ser a comunicação em vez da imposição e, nesse contexto, a vítima é reintroduzida no processo de resolução dos conflitos (empoderamento e reapropriação do conflito). Também o infrator encontra a oportunidade de compreender e reconhecer seus erros, desenvolvendo o sentido de responsabilidade e de transformação, em um espaço de fala e escuta, portanto, de diálogo, longe do contexto de vingança. A comunidade também participa da solução do conflito. (Entrevista com a Dra. Léa Martins Sales, Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal de Samambaia/DF e Coordenadora do Núcleo de Justiça Restaurativa do TJDFT, anexo 2, p ). Finalmente, os dados estatísticos trouxeram uma visão panorâmica de como caminham os resultados quantitativos do programa e destacaram que há uma crescente busca da Justiça Restaurativa para a resolução de conflitos, bem como, se verificou que há mais processos com acordo do que processos sem acordo. Portanto, mesmo sendo um número considerável de processos que não chegam a uma resolução, a maioria é de processos frutíferos em que se alcança uma efetiva prestação jurisdicional com a pacificação social. O Programa de Justiça Restaurativa do TJDFT apresenta um importante avanço para a implementação de políticas públicas que possam

68 68 inserir a Justiça Restaurativa como uma possibilidade expressa e regulamentada pelo ordenamento jurídico pátrio. Feita estas considerações quanto à sucinta pesquisa de campo apresentada, o presente trabalho adentrará a proposta, com vistas à busca da conciliação da Justiça Restaurativa no plano do Tribunal do Júri. Nesta linha, serão feitas considerações e uma reflexão ante a realidade encontrada nos julgamentos realizados na seara do juízo popular.

69 69 6. DA PROPOSTA: POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA AO TRIBUNAL DO JÚRI No presente capítulo será abordada a possibilidade de conciliação entre a Justiça Restaurativa e a realidade do Tribunal do Júri, para tanto, serão propostas ideias que podem se compatibilizar com o sistema tradicional e qual o papel das partes no âmbito da proposta. Além disso, serão abordados programas já existentes tanto no Brasil como no exterior no que diz respeito à inserção das práticas restaurativas para o tratamento de crimes mais graves ou de maior potencial ofensivo. 6.1 BREVES APONTAMENTOS SOBRE O TRIBUNAL DO JÚRI Historicamente o Júri surgiu no Brasil no ano de 1822, especificamente, em 18 de junho do citado ano, quando por Decreto do Príncipe Regente, instalou-se o Tribunal do Júri no país, atendendo-se a corrente europeia. Inicialmente, era composto por 24 cidadãos com as seguintes qualificações bons, honrados, inteligentes e patriotas (NUCCI, 2011, p. 733), aptos a julgar os crimes de abuso da liberdade de imprensa, todavia, suas decisões poderiam ser revistas pelo próprio Regente. Posteriormente, o formato muito vinculado ao império fora modificado para os moldes Republicanos quando se criou o júri federal a partir do Decreto nº 848 de 1890, sob forte influência da Constituição Americana. Foi neste contexto que o Tribunal do Júri transferiu-se para o rol dos direitos e garantias individuais. Segundo as lições da doutrina: Esse resultado foi obtido em face da intransigente defesa do Tribunal Popular feito por Rui Barbosa, seu admirador inconteste. (NUCCI, 2011, p. 734, grifo nosso). Enfim, com a Constituição de 1988 e o retorno da democracia ao cenário pátrio, o Júri se consolidou como no capítulo dos direitos e garantias individuais, fundamentado nos princípios, já previstos na Carta de 1946 e que permaneceram na atual Lei Maior, como sendo, os seguintes: Soberania dos veredictos, sigilo das votações e plenitude de defesa. Estes são os princípios basilares do Tribunal Popular, também se encontram em sua alçada o princípio in dúbio pro societá que se aplica quando da dúvida da ocorrência de um crime doloso contra a vida, ou seja, este último princípio nos diz que na dúvida não devemos beneficiar o acusado, mas sim, a sociedade. Logo, quando da dúvida surgida ante a ocorrência de um delito que atente contra o direito fundamental à vida. Ademais, importante destacar que a competência do Tribunal do Júri diz respeito ao julgamento dos crimes dolosos contra a vida, a qual se encontra versada na Constituição Federal, especificamente no art. 5º, inciso XXXVIII, alíneas a a d. Trata-se de uma

70 70 garantia fundamental de caráter formal, ou seja, simplesmente por ter sido previsto na Constituição como tal, mas não o é no seu sentido material. (NUCCI, 2011, p. 736, grifo nosso). Destaque-se que o Tribunal Popular é formado pelo Juiz Presidente, este togado, e de vinte e cinco jurados, dos quais sete tomam assento no Conselho de Sentença, além disso, a competência do Júri prevalece sobre os demais tribunais quando da ocorrência de concurso de competências, conforme determina o art. 78, inciso I, do Código de Processo Penal - CPP. Há também a previsão de recurso de apelação ao Tribunal das decisões proferidas pelo Júri de acordo com o estabelecido no art. 593, III, d do CPP. O procedimento do Tribunal Popular possui a seguinte dinâmica: Primeiro há a formação da culpa do acusado, por meio do inquérito policial, denúncia, resposta à acusação, seguimento do feito com oitiva de testemunhas em juízo, instrução do feito, superada esta fase, que trata sobre a produção de provas ou pedido de diligências, as partes, no caso o Ministério Público a representar os interesses da vítima e dos ofendidos apresenta alegações finais assim como a defesa, posteriormente, o juiz avaliará se pronunciará, absolverá, desclassificará a conduta ou impronunciará o acusado. Após realizados estes trâmites, caso seja o réu pronunciado, tem-se a chamada decisão de pronúncia que tem o caráter interlocutório misto, julgando admissível a acusação, a remeter o caso à apreciação do Tribunal do Júri. Assim, trata-se de uma decisão de natureza mista, pois encerra a fase de formação da culpa, inaugurando a fase de preparação do plenário, que levará ao julgamento de mérito. (NUCCI, 2011, p. 742, grifo nosso). Por fim, ocorre a preparação do plenário em que o juiz determina a intimação do Parquet ou do querelante, bem como, do defensor para que em cinco dias, apresentem o rol de testemunhas que irão depor em plenário, até o máximo de cinco para cada parte. Além disso, ainda poderão juntar documentos e requerer diligências que considerem pertinentes, conforme disposição do art. 422 do CPP. Por seu lado, o magistrado elabora um relatório que não adentra no mérito para ser entregue aos jurados que compõe o Conselho de Sentença, para que tomem parte dos fatos antes do início dos debates orais. Então, o juiz adverte os jurados quanto aos impedimentos e realiza o sorteio dos sente jurados entre os vinte e cinco, a formação do Conselho é dado tempo hábil para que os jurados leiam o relatório do magistrado, e enfim é aberta à sessão, ouvindo-se e interrogando as testemunhas e depois com o interrogatório do acusado, por fim, a abertura dos debates orais, iniciados pelo Ministério Público e depois a defesa, podendo haver réplica e tréplica.

71 71 Assim, se dá a dinâmica dos trabalhos no âmbito do Tribunal Popular que por suas características desperta na sociedade grande interesse e curiosidade, aliás, o senso comum das pessoas compreende o direito como algo restrito ao Tribunal do Júri o que resulta certo sensacionalismo por parte dos meios de comunicação que trazem o Júri como o auge dos julgamentos. 6.2 COMO INSERIR A JUSTIÇA RESTAURATIVA NO ÂMBITO DO TRIBUNAL POPULAR A FIM DE PROMOVER UMA CULTURA DE PAZ? A Justiça Restaurativa já demonstrou que por suas características e valores se coaduna perfeitamente com o ordenamento jurídico brasileiro, e evidencia resultados importantes no âmbito dos crimes de menor potencial ofensivo, bem como, no tratamento dos jovens infratores no plano dos juizados especiais. A mediação penal tem-se utilizado da Justiça Restaurativa como meio de promoção de paz social e reparação às vítimas, além da conscientização do ofensor ante os atos praticados quando este resolve assumir a responsabilidade pelo crime praticado. Por seu lado, a construção de uma cultura de paz necessita da valorização do humano e dos direitos humanos como um todo, é na realidade, a promoção da própria dignidade humana que desenvolve a pacificação e o equilíbrio das relações, entretanto, para que isto ocorra é de suma importância à atuação conjunta da comunidade no sentido de respeito ao outro, bem como, entendimento mútuo e transformação das concepções culturais de intolerância que na atualidade se encontram tão arraigadas no meio social. Em suma, [...] a paz não se constitui numa atitude passiva, mas se insere em um novo paradigma do viver social. (MALHEIRO et al., 2012, p. 93, grifo nosso). A paz é parte integrante da construção de uma cultura de direitos humanos, bem como esta é o outro lado da engrenagem da cultura de paz. Assim, concluise que ambas andam juntas. A paz significa a possibilidade do respeito à dignidade humana, da construção de um processo da alteridade e de mudanças culturais da intolerância. (MONTEIRO, 2012, p. 109 grifo nosso). A grande questão e polêmica surgem, quando se propõe práticas restaurativas no contexto dos crimes mais graves ou de maior repercussão no meio social, em especial, os crimes contra a vida que geram um maior envolvimento emocional da sociedade e ênfase da mídia. [...] o julgamento de um homicídio que atraíra a mórbida curiosidade da população, quando, durante uma sessão incrivelmente lotada do Tribunal do Júri, levantou-se para ser interrogada a estupenda figura de Maria Nicolaevna Tarnovskij. Nesse momento, uma centena de senhoras, que lotavam os lugares reservados, puseram-se de pé e voltaram toda sorte de lentes e binóculos para a interroganda. Observando tal reação, Ângelo Fusinato, insigne presidente do Tribunal, exclamou com indignação: Amanhã este espetáculo não se repetirá! (CARNELUTTI, 2001, p. 14).

72 72 Dito isso, em face de uma cultura sensível quanto à prática de crimes contra a vida e ainda arraigada ao sensacionalismo dos julgamentos e o interesse mórbido pela vida privada leva a dificuldades no tratamento do Tribunal Júri, o que torna um tanto delicado tratar da possibilidade de inserção da Justiça Restaurativa no meio de competência do Tribunal Popular, aliás, competência esta, conforme já fora explicitado, definida pela Constituição Federal. Ademais, há um debate doutrinário no sentido de verificar a possibilidade de inserção da mediação penal no plano de competência do Tribunal do Júri, o que não vem sendo acatado pela doutrina majoritária, dizem alguns doutrinadores de renome que a possibilidade de acordo entre as partes envolvidas em crimes dolosos contra a vida, feriria a competência estabelecida pela Carta Magna, o que poderia inviabilizar qualquer pensamento no sentido de propor um trabalho do Tribunal do Júri vinculado, por exemplo, à Justiça Restaurativa. Cabe, pois, ao juiz presidente zelar pela aplicação fiel do princípio constitucional, não permitindo que acordos feitos pelas partes subtraiam dos jurados o pleno conhecimento do feito. Somente a noção ampla e completa do conteúdo do processo pode levar o Conselho de Sentença a proferir, com soberania, o veredicto considerado justo. (NUCCI, 2011, p. 788). No entanto, conforme se observa na citação supracitada, o ilustre doutrinador utiliza ao findar de suas considerações o termo justo, o que será justo no contexto de um Tribunal em que os principais juízes têm apenas dez minutos para se interar dos fatos graves que afetaram famílias e depois escutar durante horas debates orais acalorados e com matizes tão próximos do processo e das provas, mas, tão distante das pessoas envolvidas na ocorrência trágica e nefasta. A Justiça Restaurativa proporciona, ainda, uma forma concreta de pensar sobre a justiça no âmbito da teoria e prática da transformação de conflitos e construção de paz. De fato, a maioria dos conflitos orbita em torno de uma percepção de injustiça, ou ao menos implica tal percepção. [...] Os princípios da Justiça Restaurativa oferecem uma estrutura concreta para tratar as questões de injustiças presentes no conflito. (ZEHR, 2012, p. 54, grifo nosso). É bem verdade, não há como ser retirada a competência do Júri, esta resta protegida com o caráter de cláusula pétrea por ser estabelecida pelo art. 5º da Lei Maior. Todavia, o Tribunal Popular não pode continuar sendo um palco somente de embates adversariais em que se rivaliza defesa e acusação e após horas de debates um lado sai, supostamente, vitorioso enquanto o outro é perdedor, quando na essência a ocorrência de um fato que desemboca no Tribunal do Júri, é no mínimo terrível, tanto que nem ao Juiz togado cabe decidir, mas, ao senso de Justiça que move cada cidadão.

73 73 No fim, a prática do Tribunal do Popular demonstra um ato desesperado de fazer justiça e reparar o dano causado a alguém ferido profundamente com a ação criminosa que atingiu o bem jurídico mor chamado vida. Em verdade, o Tribunal do Júri nada mais reflete do que às misérias do processo penal, pois trata de um único ato da vida do acusado: o delito. Esta é a sua miséria. (CARNELUTTI, 2001, p. 3, grifo nosso). É assim, que mesmo após um julgamento e, muitas vezes, com uma condenação veemente, vítimas ou familiares das vítimas, saem do Tribunal, vazias de sonhos, esperanças ou qualquer sensação de Justiça, ou seja, sem qualquer empoderamento e traumatizadas. Muitas se dizem impotentes diante da própria vida e assustados ante o crime. Neste ínterim, a mídia se retira silenciosa e esquecida da família ferida, porque o julgamento não é mais notícia. Por seu lado, o ofensor, é levado ao cárcere que o tornará pior ou, no mínimo, estigmatizado e revoltado, inconsciente quanto à dor que causou aos outros, retorna a seara social e em muitos casos voltar a delinquir, porque em seu ser foi morta à dignidade. No que tange à condenação, ocorre às pessoas, inclusive aos juristas, algo semelhante ao que sucede quando um homem morre. A sentença condenatória, com as suas bem conhecidas formalidades, é uma espécie de funeral. Finda a cerimônia, quando o acusado sai da cela e os guardas assumem a sua custódia, retomamos a nossa vida cotidiana e, pouco a pouco, não se pensa mais no morto. Sob um determinado ângulo, a penitenciária assemelha-se ao cemitério. Só não se pode esquecer que o condenado é sepultado em vida. (CARNELUTTI, 2001, p.78). Desse modo, ao deparar-se com a realidade prática do Tribunal do Júri, verifica-se que quando do tratamento das chagas causadas pelos crimes contra a vida, há um afastamento e uma frieza assustadora dos operadores do direito no palco de competência do citado Tribunal, ou seja, o que se dá de regra, são atores sociais que amam o Direito [...] mas odeiam gente, contato, proximidade [...] (ROSA, 2011, p. 114, grifo nosso). Logo, a proposta de atuação paralela com a Justiça Restaurativa poderia ser uma porta de atendimento das necessidades dos envolvidos na ocorrência de um crime contra vida, seja ele culposo ou doloso, consumado ou tentado. Diante disso, é sumamente relevante que se discuta a realidade do Tribunal do Júri, porém, também que se proponham medidas para dar início a mudanças que não só melhorem a prestação jurisdicional, mas, que tornem o direito e o processo penal mais humano e próximo das figuras centrais no palco do crime, ou seja, as pessoas, vítima/ofensor e a comunidade. Por isso, a Justiça Restaurativa aparece como um meio de reequilibrar relações, conscientizar o ofensor e ao mesmo tempo alavancar suas qualidades, atender as vítimas em suas dores, traumas e sentimentos e assim promover um empoderamento em face de suas

74 74 vidas. Por todas estas características e qualidades as práticas restaurativas deságuam na melhor pacificação social, que não se dá pela força, mas, pelo próprio diálogo. Assim, a escuta das necessidades para soluções e tratamento das emoções é o que a Justiça Restaurativa busca de modo diverso do viés retributivo que trabalha com papéis, provas e a própria coerção estatal. No que tange a promoção de ações restaurativas nos casos de crimes mais graves, há uma discussão na seara da Justiça Restaurativa entre àqueles que apoiam a aplicação das práticas aos crimes mais graves e de maior repercussão e àqueles que se posicionam contra esta visão: Como informam Hughes e Mossman, muito embora a MVO 14 possa ser empregada para quaisquer crimes, ela é mais freqüentemente utilizada em casos de delitos referentes à propriedade ou de agressões leves. Nestes casos, o potencial de reparação do prejuízo pelo ofensor seria mais efetivo. Além disso, a demonstração do efeito humano do crime contribuiria para a conscientização do ofensor, diminuindo a probabilidade de cometimento de ofensas mais graves. A possibilidade de revitimização do ofendido no decorrer do processo também seria menos expressiva em comparação com crimes de natureza diversa (e.g. estupro) ou de maior gravidade (e.g. lesão corporal grave). Outra parte da doutrina, contudo, esposa o entendimento de que casos de maior impacto são precisamente os mais indicados para a MVO. As lesões psicológicas e comunitárias decorrentes destes delitos são muito mais expressivas do que as percebidas nos crimes de menor grau ofensivo. O potencial de restauração oferecido pela MVO é muito mais bem empregado no trato de tais ofensas. Obviamente, a mediação destes casos teria de ser realizada de forma muito mais cautelosa. Porém, caso bem utilizada, sua eficácia seria também muito mais significativa. (CARNEIRO, 2007, grifo nosso). No entanto, repita-se, a construção de uma cultura de paz caminha no sentido de promoção da participação efetiva da comunidade e da sociedade como um todo para melhora das relações sociais. Neste sentido, pensar a Justiça Restaurativa no âmbito do Tribunal do Júri mesmo ante todas as dificuldades que se apresentam, é algo extremamente valioso para a reflexão do que é necessário melhorar em sociedade para que necessitemos cada vez menos demandar a coerção estatal e a condenação, mesmo em um Tribunal Popular. Além disso, é importante para se pensar o caráter mais efetivo de atendimento das necessidades das vítimas de crimes dolosos contra a vida, bem como, das necessidades e da conscientização dos ofensores. Sendo assim, ao caminhar para verificar quais as possibilidades e portas que a Justiça Restaurativa nos abre, percebe-se que há algo para além do mero encontro entre vítima e ofensor, assim como no Tribunal do Júri há questões que ultrapassam a mera sentença ou julgamento popular. É neste instante, que se pode trabalhar com uma possível interface entre 14 MVO: Se refere à Mediação Vítima/Ofensor, abreviação utilizada pelo autor.

75 75 o Tribunal versado como garantia fundamental pela Lei Maior e a Justiça que visa mais do que punir, humanizar e tratar as feridas do crime. 6.3 ATUAÇÃO PARALELA: UM BOM COMEÇO Em primeiro plano, deve-se observar que a Justiça Restaurativa não se resume ao mero encontro vítima-ofensor e neste viés é importante considerar que nem sempre será aconselhável o encontro vítima e ofensor. É, inclusive, o que indica a realidade do Tribunal do Júri, em que esta interface resta ainda mais dificultada porque nem sempre a vítima estará presente para encarar o seu ofensor e quando estiver será um encontro delicado, por envolver casos graves. Pensando nisto, alguns programas começaram a promover práticas de encontros restaurativos com vítimas do mesmo crime, mas, que não eram vítimas diretas daquele ofensor, assim, vale colacionar: Mas a mediação nem sempre é apropriada. Mesmo com o apoio e garantia de segurança, a vítima pode sentir muito medo. A diferença de poder entre as partes pode ser muito pronunciada e impossível superar. A vítima ou o ofensor podem não estar dispostos a participar. O crime talvez seja por demais hediondo e o sofrimento lancinante. Uma das partes pode estar emocionalmente instável. O contato direto entre vítima e ofensor pode ser de muita ajuda, mas a justiça não pode depender apenas de interações diretas. Nesses casos há maneiras de manter o foco na interação e troca de informações. O uso de vítimas substitutas, adotado em programas pioneiros no Canadá e na Inglaterra, é exemplo disso. Ali alguns ofensores se encontram com vítimas que não são as suas como um passo em direção a assumir a responsabilidade e partilhar informação. (ZEHR, 2008, p. 194, grifo nosso). Dito isso, é relevante que para o trabalho de conscientização do ofensor de modo voluntário, assumi-se parcela de responsabilidade ante o crime cometido, o que restaria em segredo de justiça para não afetar o julgamento no plano do Tribunal do Júri, nem ofender os princípios da ampla defesa e contraditório e devido processo legal. O ofensor poderia ainda participar de encontros com outras vítimas, bem como, contar com o apoio de sua família para a busca do arrependimento e da reparação que se daria por meio do incentivo às competências pessoais, ou seja, a reinserção social já se iniciaria por meio da integração com a família, a escuta da dor das vítimas, tratamento de possíveis vícios e o incentivo ao trabalho Convém observar que o sofrimento advindo da situação de desemprego, conforme levantado nos grupos, tem mobilizado várias reuniões dos grupos de Terapia Comunitária. Constatou-se que este tema tem sido mais recorrente na CEPEMA. Ademais, os sentenciados têm relatado que a situação de desemprego é percebida por eles como fator desencadeante da dinâmica que leva à delinqüência. Conforme pesquisa já citada anteriormente, ao ser analisado o perfil dos sentenciados atendidos pela CEPEMA, constatou-se que 75% encontra-se com ganhos de até 3 (três) salários mínimos. 31,4% dos entrevistados atribuíram à falta de emprego fator de dificuldade para uma integração social e uma vida sem delitos e 13,4% fez referência à falta de recursos e a pobreza. (RIBEIRO et al., 2006, p. 276, grifo nosso).

76 76 Ademais, o ofensor também teria oportunidade de comunicar suas necessidades, carências e o quê exatamente, o levou ao cometimento do ilícito, tendo assim, chance de dialogar e expor sua experiência, com participação mais ativa no processo de conscientização e responsabilização. Nessa perspectiva, seria formado o estímulo à experiência de transformação pessoal, por meio de seis elementos de grande importância no atendimento das necessidades do ofensor, aos quais, seriam: o diálogo, a responsabilização, a conscientização, o suporte de familiares e amigos ou quando não de assistentes sociais, o trabalho voltado para o incentivo de competências pessoais e o tratamento terapêutico de possíveis vícios que o ofensor tenha desenvolvido, como no caso de usuários de drogas e álcool. O produto do trabalho poderia ser dividido e a parcela poderia ser revertida ao próprio ofensor e a outra destinada a instituições de caridade e assistência aos necessitados, conforme se verificou em alguns casos concretos que optaram pela solução restaurativa em projetos realizados nos juizados e fóruns brasileiros. Tudo isso, independente do julgamento em sede de Tribunal Popular. Um exemplo importante de viés restaurativo para os ofensores é método APAC Associação de Proteção e Assistência aos Condenados 16, um modelo que trabalha com a reinserção do preso no plano social, com baixo custo para o Estado. O que esta metodologia de trabalho propõe é a administração pelos presos do próprio estabelecimento prisional com o apoio da comunidade, os transgressores reconhecem a necessidade de reparar os danos e de cumprir com a pena, no entanto, de uma forma mais humana e responsável, podendo às celas dos estabelecimentos ficarem inclusive abertas. O APAC 17 está pautado na responsabilidade, trabalho conjunto, incentivo a profissionalização, disciplina e humanidade das penas. Por possuir todas estas características relevantes, este programa, apesar de não se intitular como restaurativo possui um caráter extremamente restaurador e se baseia e em alguns dos princípios da Justiça Restaurativa. Senão, vejamos: O trabalho da APAC dispõe de um método de valorização humana, vinculada à evangelização, para oferecer ao condenado condições de recuperar-se. Busca também, em uma perspectiva mais ampla, a proteção da sociedade, a promoção 16 [...] é uma entidade civil de direito privado, com personalidade jurídica própria, dedicada à recuperação e reintegração social dos condenados a penas privativas de liberdade. Amparada pela Constituição Federal para atuar nos presídios, possui seu Estatuto resguardado pelo Código Civil e pela Lei de Execução Penal. A APAC opera como entidade auxiliar dos poderes Judiciário e Executivo, respectivamente, na execução penal e na administração do cumprimento das penas privativas de liberdade nos regimes fechado, semi-aberto e aberto. (Disponível em:< Acesso em: 20 maio ) 17 Este programa de assistência ao condenado tem recebido apoio do governo de Minas Gerais e de pessoas da comunidade.

77 77 da justiça e o socorro às vítimas. A principal diferença entre a APAC e o sistema carcerário comum é que, na APAC, os presos (chamados de recuperandos pelo método) são co-responsáveis pela recuperação deles, além de receberem assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica prestadas pela comunidade. A segurança e a disciplina são feitas com a colaboração dos recuperandos, tendo como suporte funcionários, voluntários e diretores das entidades, sem a presença de policiais e agentes penitenciários. Além de freqüentarem cursos supletivos e profissionais, eles possuem atividades variadas, evitando a ociosidade. A metodologia APAC fundamenta-se no estabelecimento de uma disciplina rígida, caracterizada por respeito, ordem, trabalho e o envolvimento da família do sentenciado. A valorização do ser humano e da sua capacidade de recuperação é também uma importante diferença no método APAC. Um outro destaque, refere-se à municipalização da execução penal, ou seja, o condenado cumpre a sua pena em presídio de pequeno porte, com capacidade para, em média, 100 (cem) recuperandos, dando preferência para que o preso permaneça na sua terra natal e/ou onde reside sua família. (Disponível em:< Acesso em: 20 maio. 2013). Dando continuidade a proposta de atuação da Justiça Restaurativa junto ao Tribunal do Júri, pode-se dizer que a condenação ou absolvição do ofensor somente emanaria do Tribunal do Júri que tem competência para tanto. No entanto, no caso de uma condenação o ofensor estaria mais consciente de seus atos e disposto a mudança pessoal e no caso de uma absolvição, poderia manter seu trabalho e já consciente de seus erros estaria mais apto a evitálos no futuro. No entanto, em ambos os casos o programa de Justiça Restaurativa poderia continuar a atuação na recuperação do ofensor. Por outro lado, pode-se trabalhar com as vítimas ou familiares das vítimas de modo reservado e individualizado, como já é feito com os juizados especiais em que a atuação de psicólogos, assistentes sociais, advogados e defensores públicos, vêm, auxiliando a promover encontros privados somente com as vítimas, em reuniões prévias, para analisar o quanto as vítimas se encontram preparadas para continuar no processo restaurativo. Conforme se verificou em pesquisa de campo, já há uma impulsão do Poder Judiciário para se criar ambientes dentro do próprio fórum, com o fim de promover estes tipos de encontros restaurativos, mediados por facilitadores. Frise-se que também este tipo de atuação do programa restaurativo deve ser de caráter voluntário, não podendo o Estado impor que vítimas de crimes contra a vida sejam obrigadas a participar do processo restaurativo, que será, mormente, de tratamento das dores, sentimentos, traumas e a busca do empoderamento, além do atendimento de suas necessidades, não sendo necessário o encontro direto com o ofensor. Logo, o apoio dado às vítimas seria em termos de atendimento psicológico, psiquiátrico, social, jurídico. Ressalte-se, que o programa restaurativo deixaria às vítimas a vontade para desabafar, recontar suas experiências, vivências e histórias, bem como, de expressar seus sentimentos,

78 78 dores e traumas, seria a oportunidade das vítimas e familiares serem acolhidos e tratados, sempre na busca da superação da experiência traumática, bem como, no retorno a suas vidas. Além disso, seria a oportunidade que as vítimas teriam de participar mais do contexto jurídico processual, interagindo e sendo escutadas, assim: A inserção do sujeito concretizante como cognoscente nos processos de decisão jurídica justamente contempla o resgate da dialética e, portanto, a dimensão da intersubjetividade, no processo jurídico. (VASCONCELOS, 2012, p. 140, grifo nosso). Nessa medida, as vítimas poderiam ter participação mais ativa nos processos judiciais e um melhor suporte do Estado na superação das dores e traumas deixados pela violência. Como a Justiça Restaurativa concebe o crime como o rompimento das relações sociais, um programa efetivo de atendimento às vítimas de crimes dolosos contra vida, promoveria, ao menos, um apoio à minimização da dor e, por conseguinte a humanização do Direito e a vivência da experiência de justiça. A justiça precisa ser vivida, e não simplesmente realizada por outros e notificada por nós. Quando alguém simplesmente nos informa que foi feita justiça e que agora a vítima irá para casa e o ofensor para a cadeia, isto não dá a sensação de justiça. Nem sempre é agradável vivenciar, passar pela experiência da justiça. Mas ao menos saberemos que ela existiu porque participamos dela ao invés de ter alguém a fazer isto por nós. Não é suficiente que haja justiça, é preciso vivenciar a justiça. (ZEHR, 2008, p , grifo nosso). Nesse diapasão, com o tratamento adequado das vítimas e o acolhimento de suas necessidades, o programa restaurativo poderia até mesmo ensejar o perdão, todavia, esta consequência jamais poderá ser imposta ou estabelecida pelo facilitador e mesmo em face de um possível perdão das vítimas, o ofensor, ainda assim, seria levado a julgamento pelo Tribunal Popular, de conformidade com o ordenamento jurídico pátrio. Destaque-se que as vítimas não se resumem apenas às pessoas diretamente afetadas pelo crime, mas, também aos familiares, amigos, parentes e vizinhos, ou seja, a micro comunidade afetada pelo crime também deve ser abarcada e compreendida na presente proposta restaurativa. Nessa perspectiva, é importante considerar que a presente proposta de atuação paralela da Justiça Restaurativa ao Tribunal do Júri, além de não ferir a competência precípua deste tribunal estabelecida pela Constituição Federal, enleva o princípio da dignidade da pessoa humana, basilar para a Carta Magna. Além disso, contribuí para a implantação de políticas públicas que atendam a determinação da Resolução nº 2002/12 das Nações Unidas. Diante disso, a proposta de atuação paralela da Justiça Restaurativa ao Tribunal do Júri encontra respaldo tanto no ordenamento jurídico pátrio, como não invade a competência, mas,

79 79 ao contrário, promove a complementação e a atuação nas lacunas às quais o processo tradicional não pode suprir, quais sejam das relações sociais e do tratamento das necessidades das partes. Por ser assim, a presente proposta está plenamente embasada nos princípios restaurativos, bem como, no valor primordial da Justiça Restaurativa que é o respeito a todas as partes e pessoas envolvidas no âmbito de um conflito, assim, onde o senso comum enxerga guerra, briga, agressividade, coerção, violência, disputa, agressão, ou seja, rompimento da teia de relacionamentos em que estamos vinculados, a Justiça Restaurativa busca com outras lentes observar diálogo, paz, entendimento, solução, crescimento, aproximação. Esta, aliás, é nova concepção quanto à moderna teoria do conflito: A possibilidade de se perceber o conflito de forma positiva consiste em uma das principais alterações da chamada moderna teoria do conflito. Isso porque a partir do momento em que se percebe o conflito como um fenômeno natural na relação de quaisquer seres vivos é que é possível se perceber o conflito de forma positiva. (AZEVEDO, 2009, p. 25, grifo nosso). Portanto, como o sociólogo americano Howard Zehr ensina, os programas restaurativos caminham em um continum, para se tornarem totalmente restaurativos. Logo esta é uma proposta que por ser inovadora, se inicia parcialmente restaurativa e caminha para a plenitude deste caráter, na medida, que procura atender e escutar todos os lados envolvidos com a ocorrência do delito e a partir daí promover a pacificação social. 6.4 ATUAÇÃO INTEGRADA: PARA O FUTURO Para o futuro ainda distante, pode-se dizer que o Tribunal do Júri poderia ser integrado com a Justiça Restaurativa, desde que mantivesse os princípios básicos restaurativos e os constitucionais. Isto, porque, existe uma importante modalidade de prática restaurativa que chama a atenção pelo seu viés democrático e participativo e pela reunião da comunidade, que são os círculos de sentença e as conferências familiares. Precisamente, no plano dos Tribunais do Júri nos Estados Unidos, há reunião em que juiz, promotor e advogado, promovem um diálogo entre eles e as partes para prolatar a sentença mais adequada ao caso 18, o que já evidencia um avanço no âmbito restaurativo. Muito embora a experiência americana se encontre um tanto distante da realidade brasileira, há experiências interessantes em outros países, em especial, na Nova Zelândia em que o modelo de Justiça Convencional dialoga com o modelo de Justiça Restaurativa. 18 No sistema norte-americano o advogado de defesa negocia com o promotor um acordo quanto à declaração que fará diante da acusação em juízo. Caso se declare culpado de um crime de pena menor, o réu poderá ficar livre do julgamento pelo Tribunal do Júri. (ZEHR, 2012, p. 51).

80 80 No programa desenvolvido na Nova Zelândia o agente deve reconhecer a sua responsabilidade perante e o ato e demonstrar interesse em participar conjuntamente com a vítima do processo restaurativo, neste ínterim, o tribunal adia o momento de condenação de modo a permitir que a conferência familiar ocorra. Após o decurso da conferência prepara-se um relatório que será entregue ao tribunal para que este tome conhecimento do que aconteceu ao longo do encontro restaurativo, por seu lado, o juiz revisa o acordo de reparação à vítima, por último, é ainda possível, que o tribunal condene o agente, mas [...] que incorpore na sentença elementos decorrentes do plano oferecido na conferência [...] (ROBALO, 2012, p. 159, grifo nosso). Destaque-se que o programa da Nova Zelândia é referência de modelo restaurativo para outros países e o nível de satisfação das vítimas no processo chega ao percentual de 92% (noventa e dois por cento), segundo informam alguns doutrinadores: Neste sentido, 92% das vítimas demonstraram uma efetiva satisfação pelo facto de poderem participar nestas conferências [...] e 75% revelam sentir-se melhor após participar nestas conferências. (ROBALO, 2012, p. 159). Por outro lado, o modelo dos círculos de sentença possuem algumas peculiaridades que ressoam como uma possibilidade diversificada de conceber o julgamento no Tribunal do Júri. Isto porque os círculos de sentença poderiam ser uma alternativa à sessão plenária da Corte Popular. Em apertada síntese, os chamados círculos de sentença são a reunião das famílias de vítima e ofensor, bem como, de pessoas da comunidade que queiram se inteirar do fato e gostariam de debater a ocorrência criminosa, assim, como podem ser vizinhos e parentes. Ocorre que estes círculos contam com a participação direta dos afetados pelo crime e assim, todos tomam uma resolução e chegam ao fim a uma sentença mais adequada ao caso que está sendo debatido. Logo, esta modalidade de prática restaurativa se conforma com o formato do Tribunal do Júri, ou seja, os jurados são a própria comunidade, então, o ordenamento poderia prever a possibilidade dos jurados, ofensores e vítimas optarem pelo modelo de Júri baseado no sentences circles. No entanto, esta decisão teria natureza voluntária não podendo ser imposta. Esse modelo de prática restaurativa não retira a competência do Júri, pois os jurados seriam a própria comunidade, então seria também a cargo da comunidade, a sentença. Sobre esta modalidade restaurativa importante destacar: Círculos, além de incluir vítima e o ofensor, seus respectivos familiares e apoios, estão abertos a qualquer pessoa representativa

81 81 da comunidade que tenha um interesse em envolver-se no assunto. Os membros do sistema judicial também podem participar. (PRUDENTE, 2011, p. 43, grifo nosso). Os círculos de sentença se coadunam com o elemento primordial do Júri que é a participação da comunidade juntamente com os membros do sistema judicial, sendo assim, não haveria qualquer conflito, caso o legislador regula-se a prática restaurativa como uma opção de formato do Tribunal do Júri. Deste modo, as partes poderiam optar se desejam realizar o plenário, por exemplo, como círculo de sentença ou como o método tradicional, convencional de debates orais sem participação de vítimas, familiares e do ofensor. Outrossim, já foi observado em sede de pesquisa de campo que os Tribunais vêm implantando ambientes e estrutura para este tipo de prática restaurativa, a indicar um movimento do Poder Judiciário para inserção da Justiça Restaurativa no âmbito da resolução de conflitos que envolvam parte da comunidade. Nessa esteira, é relevante frisar que a presente proposta de atuação integrada é algo que precisa ser aprofundado e reflexionado, tendo em vista, ser uma possibilidade de atuação para o futuro, não deve ferir os preceitos constitucionais e deve se desenvolver no âmbito do Judiciário. Há que se ter uma maior consolidação e experimentação da Justiça Restaurativa para se realizar uma mudança tão drástica nos moldes do Tribunal Popular, todavia, não há nada demais em lançar a semente, haja vista, que a realidade atual no tratamento dos crimes contra a vida não é das mais animadoras e refletem a própria crise do sistema retributivo. A verdade é que o germe do bem, em cada um de nós, e não apenas nos delinquentes, está aprisionado. Há quem possua mais e quem menos, ninguém entretanto possui todo o espaço que deveria possuir. Todos, em uma palavra, encontramo-nos presos numa prisão invisível, cuja força não podemos deixar de sentir. Essa angústia humana, que inspira uma corrente da filosofia moderna, de grande notoriedade e indiscutível importância, não é outra coisa que a sensação de aprisionamento. Cada um de nós é prisioneiro, na medida em que está encerrado em si mesmo, na solidão do seu eu e no amor a si próprio. O delito não é senão uma explosão do egoísmo. O outro não conta; o que conta é apenas o eu. Somente quando se abre para os outros, o homem sai da prisão. Nesse momento, a graça de Deus penetra pela porta que se abriu. (CARNELUTTI, 2001, p. 19). Enfim, a Justiça Restaurativa sem encontra vinculada a supracitada reflexão de Francesco Carnelutti, na medida, em que busca o trabalho conjunto e promove a saída de si mesmo para a solução do conflito, a estimular a centelha de bem que existe em cada indivíduo. Por isso, sua importância na seara do Tribunal do Júri. 6.5 DA REFLEXÃO SOBRE A PROPOSTA Inicialmente, quando do estudo da proposta, pode-se notar que a temática do tratamento dos crimes mais graves por medidas alternativas, tal qual se apresenta a Justiça

82 82 Restaurativa em face do Tribunal do Júri, gera certo receio, isto porque, o conhecimento sobre Justiça Restaurativa é pouco difundido e há distorções quanto a sua compreensão, além disso, no que toca os crimes de maior potencial ofensivo parece haver um receio velado em que ninguém deseja abordar o assunto, ao mesmo tempo, por parte das autoridades há quase que uma indiferença quanto a ocorrências destes tipos de crime. No modelo atual de justiça criminal foca-se apenas na descrição do fato típico, aliado a uma resposta penal de caráter predominantemente retributiva. Nessa dinâmica, como o crime passou a ser definido como uma ofensa ao Estado, este e não o ofendido é quem sustenta o título de vítima, representada pelo órgão do ministério público. Assim, essa indiferença do Estado em relação ao ofendido deixao com a sensação de desamparo, e, resignado com o papel irrelevante que assume no contexto processual, raramente reflete sobre o ocorrido de maneira aprofundada e dialógica, o que resulta, muitas vezes, na assimilação dos movimentos punitivistas que se encontram propagados no meio social, passando a clamar puramente por vingança. Em relação ao infrator, pode-se afirmar que a percepção que os acusados têm da resposta penal nos moldes tradicionais é a de que com o cumprimento da pena pagaram o seu delito, não restando dívida com o Estado livres, portanto, para novas práticas delitivas. Nesse contexto, o infrator sequer toma consciência da existência da vítima, na medida em que esta se torna uma abstração, uma vez substituída pelo órgão do ministério público, que assume esse posto e passa a confrontar-se diretamente com o acusado. (Entrevista com a Dra. Léa Martins Sales, Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal de Samambaia/DF e Coordenadora do Núcleo de Justiça Restaurativa do TJDFT, anexo 2, p. 97). Nesse diapasão, tanto vítima como ofensor são relegados aos últimos lugares do palco do julgamento e o Estado toma a frente de tudo. Esta realidade é tão flagrante no plano de competência do Tribunal Popular, que nem mesmo às vítimas ou seus familiares são escutados. Na maioria das vezes eles se restringem a atuarem no âmbito da instrução criminal, mas, suas dores, traumas, necessidades e mesmo a vontade de atuar mais ativamente no processo são deixados de lado pelos entes estatais. Diante disso, a Justiça Restaurativa aparece como uma alternativa que pode ser trabalhada juntamente com a competência do Tribunal do Júri sem que isto venha a afetar a prerrogativa constitucional ou qualquer princípio de direito, ao contrário, a Justiça Restaurativa aparece como uma forma de complementar a atuação judiciária e atender às necessidades das pessoas afetadas pelo cometimento de um crime contra a vida e que não podem ser atendidas em sede de um julgamento plenário. Frise-se, que a Justiça Restaurativa tem os seus efeitos ampliados quando do tratamento de crimes mais graves, por isso, torne-se interessante pensar na aplicação das concepções restaurativas nos casos dos delitos contra a vida, tendo em vista, que o efeito restaurador seria maior e consequentemente os resultados para a sociedade. [...] acredito que a expansão dessas práticas para crimes mais graves trará resultados ainda mais exitosos. No entanto, em relação às infrações mais graves temos a barreira da própria legislação, o que não impede que as reflexões nesse aspecto sejam desenvolvidas, especialmente no meio acadêmico. (Entrevista com a Dra. Léa

83 83 Martins Sales, Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal de Samambaia/DF e Coordenadora do Núcleo de Justiça Restaurativa do TJDFT, anexo 2, p. 97) Nessa medida, há uma tendência de que seja ainda mais restaurador o efeito quanto mais grave for o crime praticado, entretanto, a Justiça Restaurativa acaba por esbarrar em barreiras políticas e legislativas, conforme se verifica que não há uma legislação específica a regular as questões restaurativas. Mesmo assim, suas práticas podem ser fomentadas e implementadas para uma melhor prestação jurisdicional e o atendimento efetivo dos principais interessados quando da ocorrência de um crime. Assim, por meio, da escuta de todos os lados da dor e a formação de equipe multidisciplinar capacitada para o atendimento tanto de vítimas como de ofensores e suas respectivas famílias, podem gerar uma melhor prestação jurisdicional, bem como, restabelecer o empoderamento das vítimas perante suas vidas e o arrependimento do ofensor que poderá ser estimulado à transformação pessoal. Logo, estes aspectos gerariam um melhor tratamento para o reequilíbrio das relações sociais.

84 84 CONCLUSÃO O espírito do presente trabalho diz respeito à reflexão, questionar e ao mesmo tempo propor soluções e caminhos para o melhoramento do processo penal e da realidade prática vivenciada nos Fóruns, em especial, do Tribunal do Júri. Foi a partir da escuta do lamento de mães e pais, do choro incontido em audiências e da frieza com que muitas vezes eram tratadas as pessoas afetadas pelo crime que surgiu a ideia de descrever a explicitar a abordagem restaurativa que promove a aplicação dos direitos humanos a todos os envolvidos no conflito. Por outro lado, também foi pela escuta dos ofensores, em sua maioria, semianalfabetos ou subescolarizados, viciados e desempregados que em audiência são tratados com indiferença e rispidez, foi, igualmente, pisando nas baratas do cárcere para conversar com o preso que o trabalho foi inspirado, buscando propor soluções mais humanas para a grave realidade e consequência gerada pelos crimes contra a vida. Nessa perspectiva, a primeira reflexão que se chega é: O quanto a chaga do egoísmo continuará a ceifar vidas e causar mais crimes? Não se pode responder ao certo, mas, urge uma mudança social para o pensamento voltado para o bem da coletividade, o respeito mútuo e o trabalho em conjunto. Estas concepções são abarcadas pela Justiça Restaurativa, aliás, está intrínseca ao estudo da Justiça Restaurativa a antiga discussão sobre o que é Justiça. Ao longo do trabalho, pode-se perceber que a Justiça Restaurativa caminha no sentido de um movimento, a atualidade, discute às questões das penas e como o Poder Judiciário pode melhor atender os indivíduos, então a Justiça Restaurativa surge como uma espécie de política criminal com o fim de promover um melhoramento do sistema criminal tradicional e torná-lo mais efetivo no atendimento das carências das pessoas que dele necessitam. Desse modo, a Justiça Restaurativa demonstrou, com as pesquisas realizadas no presente trabalho, que está disposta a oferecer uma resposta justa em face da ocorrência de um crime, e para tanto, busca, propor o encontro, o diálogo, a verdadeira promoção da não violência. Porém, não o faz de modo leviano, ao contrário, considera a realidade fática, não nega a importância do modelo retributivo, mas, sugere mudanças e complementações. Em primeira linha, a concepção restaurativa trabalha com uma definição abstrata do que seja a Justiça Restaurativa e a fundamenta em princípios que a nortearam no âmbito de diferentes culturas, posteriormente, a filosofia Restaurativa estabelece seus valores, modelos e programas, todavia, uma das coisas que mais chama a atenção é a nova abordagem quanto ao crime que não é visto como mero fato típico, antijurídico, ilícito e culpável, mas sim, como

85 85 um rompimento de relações sociais, o que gera uma obrigação, ou seja, de restaurar o dano causado. Nesse viés, surge a noção de Shalom que nada mais é que a concepção judaico-cristã de que estamos todos interligados em uma única teia social, por isso, quando da ocorrência de um crime, há um rompimento desta teia o que gera desarmonia e conflito. Assim, a Justiça Restaurativa propõe a transformação desta realidade, por meio, de práticas que possam restaurar, reparar, reconstruir o que restou destruído pelo delito. Diante disso, a Justiça Restaurativa demonstra afeição pelos processos colaborativos, inclusivos e consensuais, para a promoção de uma cultura de paz. Por ser assim, esta filosofia não se restringe ao âmbito do Poder Judiciário e suas práticas têm ultrapassado as portas dos fóruns e até mesmo alcançado às escolas. Nessa medida, as contribuições da Justiça Restaurativa para o tratamento dos delitos e dos desequilíbrios causados por este, tem evidenciado um grande avanço e uma melhora e harmonização das relações sociais, os chamados subprodutos da Justiça Restaurativa como a não reincidência e a melhora na qualidade de vida das comunidades, são consequências importantes e positivas a demonstrar que este modelo é tendente à expansão. Ademais, os focos primordiais da Justiça Restaurativa são a escuta das necessidades de todos os legitimamente interessados e afetados pelo crime e como atendê-los de modo equânime e pautado pelo respeito e dignidade humana. Após escuta das necessidades, incentivo ao trabalho para a composição e pacificação do conflito, chega-se, reequilíbrio das relações sociais. Logo, as práticas restaurativas caracterizam-se por uma abordagem muito diversa do sistema tradicional retributivo e por ser assim, abre-se portas para a discussão do atual modelo de justiça criminal e a implementação de projetos que visem à humanização do Direito e, repita-se, o atendimento das pessoas diretamente afetadas pelo crime. Dito isso, pode-se concluir que a Justiça Restaurativa é uma importante filosofia com instrumentos hábeis para resolução de conflitos de modo alternativo, bem como, o tratamento das partes de modo mais humano e com o incentivo para a colaboração mútua, pela promoção da interface vítima/ofensor e comunidade. Por estas características, restou evidenciado que a Justiça Restaurativa estimula o processo mais democrático de decisão, o empoderamento das vítimas ante o delito e a conscientização do ofensor ante seus atos, além de lhe alavancar qualidades potenciais que se encontram, muitas vezes, intrínsecas. Observou-se que a Justiça Restaurativa por seus valores, princípios e características se conforma perfeitamente com o ordenamento jurídico pátrio e que suas práticas já vêm sendo

86 86 aplicadas nos tribunais brasileiros e com incentivo do Poder Judiciário e do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas PNUD. Verificou-se que a Justiça Restaurativa é uma realidade nos fóruns brasileiros com estrutura física, recursos humanos, atendimentos e resultados na maioria positivos, e que promovem não só uma melhor pacificação social, como as partes sentem-se mais satisfeitas com Poder Judiciário, pois foi lhes dado oportunidade de terem voz no âmbito do processo. Diante disso, analisou-se que a Justiça Restaurativa pode ser aplicada ao âmbito do Tribunal do Júri, sem necessariamente, utilizar-se da mediação vítima/ofensor e sem afetar a competência precípua deste tribunal. A atuação de modo paralelo para o tratamento das chagas deixadas pelo cometimento de um crime contra a vida é um importante passo que pode ser implantado pelos fóruns, dando-se a opção voluntária para as partes de decidirem se querem participar paralelamente de um processo restaurativo, sem que isto afete a competência e o julgamento em sede de Tribunal Popular. Nesse ínterim, verificaram-se também programas já existente no Brasil, que trabalham com abordagens restaurativas e uma resposta de tratamento diferenciado no cárcere, a exemplo, do que método APAC. Ademais, confirmou-se a aplicação prática da Justiça Restaurativa em projetos e programas essencialmente restaurativos como o Justiça para o Século XXI, implantado no Rio Grande do Sul e o Projeto Piloto do Núcleo Bandeirante realizado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. No plano do Tribunal do Júri a Justiça Restaurativa iniciaria seu programa como parcialmente restaurativo até evoluir para um viés pleno. Neste sentido, o modelo restaurativo atuaria de modo complementar a atender as necessidades que não podem ser atendidas em um processo judicial comum, sendo assim, estaria diretamente voltada aos principais atores afetados com a ação criminosa, especificamente, no tratamento das dores deixadas pelo crime contra a vida. Pode-se concluir em que pese à discussão se é cabível ou não a Justiça Restaurativa no âmbito dos crimes mais graves, deve-se ter em mente que os princípios restaurativos atendem perfeitamente as necessidades surgidas ante a prática destes tipos de delito de natureza grave, haja vista, ser foco primordial da Justiça Restaurativa o atendimento de vítimas/ofensores que se encontram no palco de um cometimento mais danoso de ilícito. Além disso, o impacto restaurativo é maior quando se trabalha com os traumas, dores e necessidades deixados por um crime de caráter gravoso do que um de menor potencial ofensivo. Todavia, não se deve desprezar, de modo algum, as práticas restaurativas

87 87 fomentadas para a abordagem dos crimes de menor potencial ofensivo, principalmente, ante os avanços verificados em pesquisa de campo. Frise-se que apesar das críticas, o campo para a exploração e experimentação da Justiça Restaurativa é vasto e a reflexão desta abordagem em sede de justiça criminal tem um caráter, extremamente, enriquecedor, na medida, em que demonstra uma solução a alguns dos graves problemas enfrentados pelos os órgãos de controle do Estado, bem como, estimula a aproximação do Poder Judiciário, dos operadores do direito à comunidade e às necessidades que esta apresenta. Assim, a Justiça Restaurativa, ao contrário da retributiva, atrai, agrega e torna mais próxima a relação entre direito e comunidade. Nessa medida, pode-se dizer que os objetivos principais do presente trabalho foram alcançados com as metodologias utilizadas e a pesquisa realizada, observou-se que o atual sistema de Justiça Criminal necessita de reformas e complementação, verificou-se também a importância de se discutir questões inovadoras no âmbito do processo penal como a Justiça Restaurativa, e percebeu-se o quanto esta última tem a contribuir para a humanização do Direito e a promoção de uma cultura de paz em meio social através da escuta e do diálogo, bem como, a aplicação prática dos direitos humanos. Ressalte-se, que a abordagem restaurativa contribuiu para uma melhor reflexão da realidade do Tribunal do Júri e como as partes são tratadas no plano de competência deste tribunal, notou-se às carências que não são sanadas em sede de julgamento plenário e a urgente necessidade de tratamento adequado das vítimas, famílias, ofensores e comunidade no âmbito do Tribunal Popular. Por conseguinte, a Justiça Restaurativa aparece como um modelo com instrumentos adequados para suprir as carências pouco sanadas no julgamento convencional, a atuar de modo complementar. Precisamente, no que toca os crimes contra a vida, a proposta acostada no presente trabalho visou sugerir medidas que pudessem ser fomentadas de modo prático sem que viessem a gerar conflito com atual sistema de justiça criminal, simultaneamente, não gerassem conflitos de competência, por isso a proposta se deu no plano do Tribunal do Júri, já que as carências da vítima não são escutadas, na medida, em que o Parquet toma o lugar de ofendido, ao passo, que o ofensor não encontra, igualmente, respaldo para suas necessidades. Deste modo, a Justiça Restaurativa em atuação conjunta com a Corte Popular ampliaria o campo restaurador, com a consequente ampliação dos resultados e uma possível melhora no atendimento jurisdicional e social as partes, bem como, a comunidade afetada pelo crime. Dessa forma, a Justiça Restaurativa mostrou que com a aplicação de seus princípios e valores aos crimes mais graves ou de maior potencial ofensivo, maior seriam os efeitos para a

88 88 sociedade. No entanto, como as práticas restaurativas ainda são tímidas no Brasil quanto ao tratamento de crimes de maior repercussão, a proposta do presente trabalho se apresenta como uma semente. Tal qual a figura do semeador de tâmaras, há que se aguardar os frutos de uma sugestão um pouco avançada. Nesse diapasão, o presente trabalho não teve a pretensão de esgotar a temática abordada, mas sim, incitar a discussão, o debate e a reflexão, com vistas à busca de um melhoramento no tratamento das pessoas em dor em face dos crimes contra a vida, quando recorrem ao Poder Judiciário. Em que pese às práticas restaurativas implantadas no cenário nacional serem voltadas, mormente, para as infrações penais e os crimes de menor potencial ofensivo, o que se verificou é que há um grande campo de possibilidades para se promover a Justiça Restaurativa no plano dos crimes mais graves. Todavia, o principal entrave se encontra na vontade política, nas compreensões distorcidas do que seja a Justiça Restaurativa, bem como, na polêmica e comoção social gerada quando se trata dos crimes contra a vida. Por fim, apesar de a Justiça Restaurativa ter um início tímido na década de 80, atualmente, caminha para a expansão de seus programas e projetos, ou seja, o modelo restaurativo encontra-se em franca ascensão. Conforme verificado no âmbito do ordenamento pátrio já há resoluções e projetos implantados nos tribunais, ao passo, que no plano internacional crescem os adeptos a esta filosofia e o suporte das Nações Unidas para as práticas e propostas cuja base é os princípios restaurativos. Finalmente, a Justiça Restaurativa não deve ser confundida como uma solução para todos os problemas, mas, reflete a busca por modelos alternativos de solução de conflitos e o tratamento das pessoas, na tentativa de saciar o sentimento que se encontra no íntimo de cada ser humano que é a sede de Justiça.

89 89 REFERÊNCIAS AZEVEDO, André Gomma (Org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento - PNUD, BIANCHINI, Edgar Hrycylo. Justiça Restaurativa: Um desafio à práxis jurídica. Campinas: Servanda, BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 11 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007.v.1. BRASIL, Emenda nº 1, de 31 de Janeiro de 2013, Ementa: Altera os arts. 1º, 2º, 6º,7º,8º, 9º, 10, 12, 13, 15, 16,18 e os Anexos I, II, III e IV da Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010 do Conselho Nacional de Justiça CNJ. CARNEIRO, Breno Zaban. A indicação à Mediação Vítima-Ofensor: Algumas considerações em relação à sua eficácia em diferentes casos. In: Estudos de Arbitragem Mediação e Negociação. AZEVEDO André Gomma de, BARBOSA Ivan Machado (orgs.). Brasília: Grupos de Pesquisa, 2007, vol. 4. Disponível em: < dearbitragem-mediacao-e-negociacao-vol4/parte-iv-doutrina-artigos-dos-pesquisadores/a indicacao-a-mediacao-vitima-ofensor-algumas-consideracoes-em-referencia-a-sua-eficaciaem diferentes casos > Acesso em: 20 maio CARNELUTTI, Francesco. As Misérias do Processo Penal. São Paulo: Edicamp, DIREITORIA DE POLÍTICAS DE APAC E CO-GESTÃO. Governo de Minas Gerais. Disponível em:< > Acesso em: 20 maio EASTERN MENNONITE UNIVERCITY. Howard Zehr. Disponível em: < Acesso em: 25 março FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. 28. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, JUSTIÇA 21, Disponível em: < Acesso em: 17 abr KONZEN, Afonso Armando. Justiça restaurativa e ato infracional: desvelando sentidos no itinerário da alteridade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, MALHEIRO, Edna; CARAZZONE,Verônica; KAWAHALA,Marlene; Mediação: um instrumento para a construção da cultura de paz. In: Diálogo Mediação e Justiça Restaurativa Cultura de paz, (orgs.): PELIZZOLI Marcelo, SAYÃO, Sandro. Recife: Universitária da UFPE, p , MARSHALL, T. Restorative Justice handbook. In: McCOLD, P. The tenth United Congress on the Prevention of Crime and the Treatment of Offenders. Nienna, p , April

90 90 Mc COLD, P. e WACHTEL, T. Em Busca de um paradigma: Uma Teoria de Justiça Restaurativa. Disponível em: < Acesso em: 17 mar MONTEIRO, Valdênia Brito. Mediação Coletiva: Uma construção à luz dos direitos humanos. In: Diálogo Mediação e Justiça Restaurativa Cultura de paz, (orgs.): PELIZZOLI Marcelo, SAYÃO Sandro. Recife: Universitária da UFPE, p , MORRIS, Alisson. Criticando os críticos. Uma breve resposta aos críticos da Justiça Restaurativa. In: Justiça Restaurativa Coletânea de artigos. SLAKMON, C., VITTO R. de e PINTO R. Gomes, (orgs.). Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, p , NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. 8 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, ONU, RESOLUÇÃO 2002/12. Ementa: Reportando-se à sua Resolução 1999/26, de 28 de julho de 1999, intitulada Desenvolvimento e Implementação de Medidas de Mediação e Justiça Restaurativa na Justiça Criminal, na qual o Conselho requisitou à Comissão de Prevenção do Crime e de Justiça Criminal que considere a desejável formulação de padrões das Nações Unidas no campo da mediação e da justiça restaurativa. Tradução livre por Renato Sócrates Gomes Pinto. Disponível em: < Acesso em: 09 Abr PINTO. Renato Sócrates Gomes. Justiça Restaurativa é possível no Brasil? In: Justiça Restaurativa Coletânea de artigos. SLAKMON, C., VITTO R. De, e PINTO R. Gomes, (orgs.).brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, p PRUDENTE, Neemias Moretti. Justiça Restaurativa e Experiências Brasileiras. In: Justiça restaurativa e mediação: políticas públicas no tratamento dos conflitos sociais. SPENGLER Fabiana Marion, LUCAS, Doglas Cesar (orgs.). Ijuí: Unijuí, p RIBEIRO, Alda, RODRIGUES; Daniela de Mendonça, HAMU; Eneida Maria França e S.; TUSI, Michelle Moreira de Abreu. A Terapia Comunitária na Central de Coordenação de Penas e Medidas Alternativas e no Núcleo Psicossocial Forense do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. In: Novos Paradigmas na Justiça Criminal: Relatos de experiências do Núcleo Psicossocial Forense do TJDFT. (Orgs): ROQUE Elizângela Caldas Barroca, MOURA Marília Lobão Ribeiro de, GHESTI Ivânia. Brasília: TJDFT, p ROBALO, Teresa Lancry de Gouveia de Albuquerque e Sousa. Justiça restaurativa: Um caminho para a humanização do direito. Curitiba: Juruá, ROSA, Alexandre Morais. Mediação e ECA: Práticas e possibilidades. In: Justiça restaurativa e mediação: políticas públicas no tratamento dos conflitos sociais. SPENGLER Fabiana Marion, LUCAS Doglas Cesar (orgs.). Ijuí: Ed. Unijuí, p , TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica para operadores do Direito. 5 ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.

91 91 SALIBA, Marcelo Gonçalves. Justiça restaurativa e paradigma punitivo. Curitiba: Juruá, TORRES, Raquel. USP. Isolamento social tem sérias consequências. Disponível em < Acesso em: 29 março TJDFT, Portaria Conjunta nº 52 de 09 de Outubro de TJDFT, Sistema de Múltiplas Portas de Acesso à Justiça. Brasília: Poder Judiciário da União, VASCONCELOS, Carlos Eduardo. A Cultura de Paz na Metódica do Direito e na Prática da Mediação de Conflitos. In: Diálogo Mediação e Justiça Restaurativa Cultura de paz, (orgs): PELIZZOLI Marcelo, SAYÃO Sandro. Recife: Universitária da UFPE, p , VASCONCELOS, Carlos Eduardo. Mediação de Conflitos e práticas restaurativas. São Paulo: Método, VITTO, Renato Campos Pinto de. Justiça Criminal, Justiça Restaurativa e Direitos Humanos. In: Justiça Restaurativa Coletânea de artigos. SLAKMON, C., VITTO R. De, e PINTO R. Gomes, (orgs.). Brasília: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, p ZEHR, Howard. Justiça Restaurativa. Tradução por Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athenas, ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça. Tradução por Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008.

92 92 ANEXOS ANEXO 1. Roteiro de pesquisa de campo ANEXO 2. Roteiro e Entrevista com Dra. Léa Martins Sales ANEXO 3. PRODOC BRA /06/

93 93 Universidade Católica de Brasília - UCB Pró-Reitoria de Graduação Disciplina: Monografia Professora/Orientadora: Heloisa Vivo Marques Período: 1 o semestre de 2013 Aluna: Tassiane Nunes Garcia ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO PESQUISA DE CAMPO Estrutura do relatório final referente à atividade prática para o Trabalho de Conclusão de Curso de Bacharel em Direito: Tema Justiça Restaurativa e uma proposta ao Tribunal do Júri. Introdução Na introdução são apresentadas as justificativas que levaram à realização da pesquisa. Os fundamentos teóricos que orientaram o estudo do fenômeno em questão são apresentados e analisados. Citações são necessárias, particularmente na Introdução e na discussão do trabalho. No final desta seção, irei apresentar, de forma clara e sucinta, os objetivos do estudo de campo realizado. Metodologia Algumas considerações gerais sobre a metodologia adotada devem ser apresentadas no início desta seção. Relatar os contatos iniciais com a instituição do Poder Público, bem como as etapas necessárias para a realização da pesquisa. Após a apresentação das considerações gerais sobre a metodologia utilizada, esta seção deve ser dividida nos seguintes tópicos: Participantes: apresentar características relevantes dos/as participantes e das instituições; Contexto: caracterizar onde foi realizada a pesquisa? Se foi em Fóruns ou projetos desenvolvidos fora do Poder Judiciário? Localização: Asa Sul? Asa Norte? Cruzeiro?...), descrever o espaço físico das práticas restaurativas, bem como, os profissionais envolvidos, realizar também coleta de dados estatísticos quanto a quantidade de atendimentos e ações restaurativas, se há reincidência ou não? Procedimentos de coleta de dados: especificar os critérios e as etapas envolvidas na coleta de dados, tanto em relação às observações como em relação às entrevistas. Apresentar quadros que permitam a visualização das sessões de observação realizadas, registrando todas as informações necessárias à plena compreensão do que foi feito (Quem fez o que? Onde? Quando?), ou seja, qual é a dinâmica e como são realizadas as ações restaurativas na prática?

94 94 Procedimentos de análise dos dados: descrever os critérios utilizados para analisar as informações coletadas no estudo de campo. Apresentar as categorias de análise utilizadas em relação às observações e entrevistas realizadas. Resultados Nesta seção, irei descrever os resultados obtidos, tanto nas observações como nas entrevistas realizadas. É importante apresentar os resultados de forma sistematizada a partir das categorias de análise utilizadas. Nesse sentido, é importante que se organize a apresentação dos resultados da seguinte forma: Entrevistado: - Observação: (1) instituição, núcleo de trabalho ou projeto; (2) organização e dinâmica das atividades; (3) comunicação e diálogo; (4) interação entre as partes; (5) conflito e dificuldades encontradas; (6) profissionais envolvidos; (7) clima do núcleo de atendimento restaurativo e de um encontro restaurativo se possível; (8) dados estatísticos dos atendimentos. - Entrevista: (1) história profissional; (2) formação profissional; (3) concepção sobre Justiça Restaurativa; (4) concepção sobre a prática da justiça Restaurativa e seus desafios, crítica; (5) relação vítima/ofensor; (6) papel da comunidade (família, parentes, vizinhos) e da sociedade representada pelo Estado nas práticas restaurativas e na promoção de uma cultura de paz; (7) percepção sobre o próprio trabalho; (8) outras questões (como direitos humanos regime carcerário humanização do direito); IMPORTANTE: Ilustrarei os resultados obtidos com trechos das informações registradas nos protocolos de observação, bem como com trechos das entrevistas realizadas. Discussão Nesta seção, deve-se realizar uma análise comparativa entre os resultados obtidos nas observações e nas entrevistas (confronto entre discurso e prática). É importante também discutir os resultados a partir da fundamentação teórica apresentada na Introdução. Apresentar as dificuldades e limitações encontradas na realização da pesquisa. Destacar os principais resultados, apresentando hipóteses explicativas e sugerindo caminhos para futuras pesquisas. Reflexão e criatividade são fundamentais nesta seção. Referências Apresentar todas as referências bibliográficas utilizadas na pesquisa, de acordo com as normas técnicas da ABNT.

95 95 Observações importantes - O relatório final deverá ser digitado com espaçamento 1,5 entre as linhas, fonte Times New Roman 12 e deverá apresentar de 06 a 12 páginas de elementos textuais (da primeira página da Introdução à última página da Discussão). - Os trechos extraídos de textos consultados devem ser apresentados em forma de citação, de acordo com as normas técnicas da ABNT.

96 96 ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DA ENTREVISTA Trabalho de Conclusão de Curso de Bacharel em Direito: Tema Justiça Restaurativa e uma proposta ao Tribunal do Júri. Perguntas a serem realizados com o entrevistado/a: DOUTORA LÉA MARTINS SALES, JUIZA DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DE SAMAMBAIA/DF 1. O/A senhor/a ou V. Excelência poderia nos falar um pouco sobre o seu histórico e formação profissional? R: 1. Bacharel em direito pela PUC-GO. 2. Pós graduação em Criminologia IBCCRIM/SP 3. Aluna especial do mestrado em Políticas Públicas do UniCEUB 4. Juíza de Direito do TJDFT Desde agosto de 2004, titular da 2.ª Vara Criminal de Samambaia/DF. 5. Professora de Direito Processual Penal no UniCEUB-DF. 6. Coordenadora do programa de Justiça Restaurativa do TJDFT Núcleo Bandeirante/DF (junto com o juiz Asiel) 2. Qual a sua visão e seu conceito de crime no plano social? R: A compreensão do fenômeno criminal é o resultado das reflexões a respeito do discurso da imputação de culpa (Direito Penal e Processual Penal) e do discurso explicativo (Teorias Criminológicas). 3. Qual a sua concepção sobre Justiça Restaurativa? Já conhece este conceito? Em que consiste, na sua visão? R: De forma resumida, pode-se apresentar a justiça restaurativa como um movimento que propõe a redefinição do crime, passando a tratar a infração não mais como uma violação contra o Estado, mas como um dano para aqueles que se encontram envolvidos nesse conflito. O poder passa a ser a comunicação em vez da imposição e, nesse contexto, a vítima é reintroduzida no processo de resolução dos conflitos (empoderamento e reapropriação do conflito). Também o infrator encontra a oportunidade de compreender e reconhecer seus erros, desenvolvendo o sentido de responsabilidade e de transformação, em um espaço de fala e escuta, portanto, de

97 97 diálogo, longe do contexto de vingança. A comunidade também participa da solução do conflito. 4. Qual a sua concepção quanto à prática da Justiça Restaurativa e seus desafios? Qual a sua crítica às ações restaurativas? R: No programa do Núcleo Bandeirante temos colhido resultados muito animadores da aplicação dessas práticas em crimes de menor potencial ofensivo, mas acredito que a expansão dessas práticas para crimes mais graves trará resultados ainda mais exitosos. No entanto, em relação às infrações mais graves temos a barreira da própria legislação, o que não impede que as reflexões nesse aspecto sejam desenvolvidas, especialmente no meio acadêmico. 5. Qual a sua visão quanto à relação vítima/ofensor no âmbito do Processo Penal Brasileiro? R: No modelo atual de justiça criminal foca-se apenas na descrição do fato típico, aliado a uma resposta penal de caráter predominantemente retributiva. Nessa dinâmica, como o crime passou a ser definido como uma ofensa ao Estado, este e não o ofendido é quem sustenta o título de vítima, representada pelo órgão do ministério público. Assim, essa indiferença do Estado em relação ao ofendido deixa-o com a sensação de desamparo, e, resignado com o papel irrelevante que assume no contexto processual, raramente reflete sobre o ocorrido de maneira aprofundada e dialógica, o que resulta, muitas vezes, na assimilação dos movimentos punitivistas que se encontram propagados no meio social, passando a clamar puramente por vingança. Em relação ao infrator, pode-se afirmar que a percepção que os acusados têm da resposta penal nos moldes tradicionais é a de que com o cumprimento da pena pagaram o seu delito, não restando dívida com o Estado livres, portanto, para novas práticas delitivas. Nesse contexto, o infrator sequer toma consciência da existência da vítima, na medida em que esta se torna uma abstração, uma vez substituída pelo órgão do ministério público, que assume esse posto e passa a confrontar-se diretamente com o acusado.

98 98 6. Qual a sua visão quanto ao papel da sociedade (representada pelo Estado) e do Poder Judiciário na promoção de uma cultura de paz? R: É um dos escopos da Justiça. Nesse aspecto, é importante a assimilação de políticas criminais que possam introduzir no sistema de justiça, meios alternativos de solução dos conflitos criminais, e a justiça restaurativa se apresenta como um bom exemplo. 7. Fale-nos um pouco quanto a sua percepção sobre o seu próprio trabalho? R: Como afirmado na resposta da pergunta de n.º 2, o trabalho no sistema de justiça criminal exige a compreensão do fenômeno criminal de forma ampliada, não somente a partir do discurso dogmático da imputação de culpa (Direito Penal e Processual Penal). É importante trazer para o sistema de justiça o resultado do discurso explicativo (Teorias Criminológicas), o que ocorre por meio dos movimentos de política criminal. 8. Como consideração final, poderia nos dizer o que, na atualidade, o direito e o processo penal brasileiro necessitam regastar para a diminuição da violência? Qual a sua visão? R: Nota-se a urgência em se adotar mudanças no processo penal e no direito penal, com a promoção de abertura dialógica entre aqueles atingidos pelo crime, buscando novas formas e mecanismos que possam atenuar esse distanciamento existente entre as instituições formais de justiça e os indivíduos diretamente envolvidos nos conflitos de natureza criminal. Nesse aspecto, pode-se apresentar como exemplo a ampliação das práticas restaurativas para conflitos de médio e alto potencial ofensivo.

99 99 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS PRODOC BRA/06/022 PROJETO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA: Modernização do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios

100 100 PRIMEIRA PARTE A ANÁLISE DA SITUAÇÃO 1. ANTECEDENTES E JUSTIFICATIVA Justificativa O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios investe, constantemente, na melhoria dos serviços prestados à sociedade. Pode-se observar tal preocupação nas diversas ações realizadas ao longo de sua história. Investimentos na modernização dos seus sistemas de informação, infra-estrutura tecnológica e equipamentos de informática se traduzem em serviços mais ágeis, descentralizados e disponíveis para os usuários. Práticas de gestão como custas com código de barras, drive-thru para recebimentos de processos, instalação de uma ouvidoria, juizados especiais de trânsito e itinerante, terminais de auto-atendimento para consultas processuais, disponibilização de postos de atendimento em convênio com programas do governo local, Juizados Especiais Criminais 24h e outras ações demonstram um contínuo cuidado com a melhoria da prestação jurisdicional. Somado a isso, o TJDFT implantou projetos inovadores como o Justiça Comunitária (vencedor do primeiro lugar na categoria Tribunal de Justiça, na edição de 2005 do Prêmio Innovare do Ministério da Justiça), o Serviço de Mediação Forense (parte do Programa de Estímulo à Mediação), o Projeto Justiça Restaurativa, o Projeto Justiça e Cidadania nas Escolas (em convênio com a Secretaria de Educação do DF), a Central de Penas e Medidas Alternativas, a Central do Idoso, dentre outros. Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais são apontados por parlamentares e outros tribunais como um dos melhores exemplos do país, com níveis expressivos de acordos e baixos índices de morosidade. Sistemas de automação cartorária são progressivamente aperfeiçoados e soluções como assinatura digital de documentos por magistrados e servidores já são uma realidade crescente na Instituição.

101 101 No âmbito administrativo, as principais mudanças são notadas na distribuição de tarefas entre as diversas unidades, procurando, com isso, a especialização dos serviços e a maior agilidade da instituição. Observe-se que as mencionadas reformulações sempre objetivaram conferir aos serviços prestados por esta Corte uma perfeita adequação aos princípios fundamentais pregados pela ordem processual vigente, traduzidos, primordialmente, na celeridade e na economia processual, e nos preceitos orientadores da Administração Pública, concentrados, a seu turno, no binômio razoabilidade e eficiência. Apesar de todos esses avanços, alguns deles pioneiros na justiça brasileira, o TJDFT enfrenta desafios preocupantes, dos quais se pode destacar: aumento progressivo do número de ações ajuizadas (só no ano de 2005 foram ajuizadas novas ações, além dos processos pendentes de julgamento no Tribunal) limitações/dificuldades inerentes a um Órgão do Poder Público (escassez de recursos, empirismo administrativo, burocracia etc); incipiência de mecanismos e práticas que viabilizem a pesquisa e a mensuração de resultados; inexistência de Órgão direcionado para a formação específica que prepare agentes de direito para o atendimento efetivo das demandas da sociedade, vinculando o aprendizado e o desenvolvimento às principais metas organizacionais. No aspecto do aumento do numero de ações ajuizadas, segundo o Diagnostico do Poder Judiciário publicado pelo Ministério da Justiça em 2004, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios se encontra no ranking dos cinco tribunais brasileiros que apresentam alta taxa de litigiosidade no Brasil. Na parte da pesquisa sobre desempenho entre processos julgados e entrados na 2ª Instancia, o TJDFT se encontra no ranking dos 27 tribunais o TJDF figurou na posição 21, com media de 55% dos processos julgados. A morosidade para resolução de conflitos no país ainda é preocupante. A literatura indica que um dos problemas fundamentais do Poder Judiciário está relacionado à lentidão no atendimento da demanda. Dados do STF sugerem que existe cerca de seis milhões de casos pendentes nos tribunais brasileiros, somando uma média de 700 casos por juiz. Para enfrentar este problema, várias alterações legislativas vêm sendo propostas, muitas delas com reflexo direto em elementos processuais. Entretanto, o TJDFT entende que alinhado com essas mudanças, outras medidas podem também trazer ganhos de eficiência. Um exemplo são ações relacionadas à modernização dos sistemas de gestão administrativa, responsáveis por parcela

102 102 considerável da lentidão do fluxo processual; e o uso da tecnologia para a celeridade da prestação jurisdicional. O crescimento populacional, a criação de novas regiões administrativas e o agravamento dos índices de desemprego e criminalidade implica no conseqüente aumento da demanda judicial no Distrito Federal. A análise comparativa da estrutura desta Corte no decorrer dos últimos anos e as respectivas projeções de crescimento revela-nos um panorama que ratifica tal percepção. O quadro demonstrativo abaixo, elaborado pela Presidência do TJDFT, apresenta projeção do número de processos a serem distribuídos até o ano de Durante o período de 1996 a 2002, verificou-se o crescimento médio de 115,68% do número de processos distribuídos às Varas da Justiça do Distrito Federal. Considerando essa constatação, foi elaborada e está em tramitação no Congresso Nacional proposta de ampliação da Organização Judiciária, que responde a latente necessidade de modernização e reestruturação deste Tribunal, visando garantir à população, uma prestação jurisdicional célere e de qualidade. Processos distribuídos por Circunscrição Judiciária no DF de 1996/2002 e projeção para 2012 Circunscrição % % Brasília e DF (*) ,41% ,14% Brazlândia ,75% ,50% Ceilândia ,10% ,98% Gama ,45% ,67% Paranoá ,26% ,39% Planaltina ,54% ,64% Samambaia ,88% ,45% Sobradinho ,48% ,86% Taguatinga ,69% ,04% Total ,68% ,27% Fonte: 1996/2002 Sistema de Acompanhamento e Controle de Processos 1ª Instância SISTJ Valores consolidados entre 1996 e 2002 e a probabilidade de valores para * Varas de competência em todo Distrito Federal

103 103 De outra parte, o diagnostico também aponta que uma melhora de produtividade na celeridade da prestação jurisdicional da nas demandas da 1ª instancia poderá sobrecarregar ou piorar o índice de desempenho da 2ª instancia dos tribunais comuns e federais, razão pela a necessidade de encontrar novas formas de imprimir celeridade e eficiência na prestação jurisdicional torna-se premente. Diante do exposto, o TJDFT necessita avançar em diversas outras áreas para se solidificar como instituição ágil, eficiente e transparente. Resta patente que por mais que bons projetos e ações sejam implantados e aperfeiçoados progressivamente ou que adequações na estrutura e organização judiciária no DF sejam viabilizadas, a falta de um planejamento estratégico sólido e bem elaborado dispersa o foco dos esforços realizados anualmente, além de diminuir a efetividade dos resultados advindos dos investimentos. Delinear com clareza metas e objetivos, estabelecendo uma estratégica eficaz de alcance dos mesmos, aliada a um controle da execução do que foi planejado é, ainda, uma carência observada nesta Corte de Justiça. Apesar de todos os esforços já realizados, que colocam o TJDFT na vanguarda do Poder Judiciário brasileiro, a Instituição padece dos mesmos males do serviço público como um todo: falta de planejamento efetivo, descontinuidade de ações, inexistência de sistemas efetivos de aferição de desempenho e resultados, carência de política sólida de investimento contínuo no capital humano, apenas para citar os principais. O desafio de modernizar, ainda mais, o TJDFT, assim como a totalidade dos tribunais estaduais no Brasil, passa pela implantação de modelos de gestão mais efetivos que levem em conta: Formação e desenvolvimento contínuo da força de trabalho alinhados à missão organizacional e aos objetivos estratégicos traduzir e direcionar os investimentos em ações continuadas de desenvolvimento do capital humano com base nas necessidades do tribunal, utilizando modelos de educação corporativa onde trilhas de conhecimento são estabelecidas para que, tanto nas atividades administrativas quanto nas jurisdicionais, os recursos humanos estejam cada vez mais preparados para atuar profissionalmente e de forma específica. Implantação de Política de Qualidade diagnosticar e medir os serviços oferecidos pelo tribunal para elaboração de um programa de melhoria contínua do atendimento ao usuário externo e

104 104 interno, bem como para a definição de ações que priorizem a utilização racional dos recursos disponíveis. Padronização do funcionamento administrativo e judicial das Varas, Turmas e Câmaras estabelecimento de modelos ideais de funcionamento que levem em conta questões como padronização de mobiliário, aproveitamento do espaço físico, técnicas de gestão e liderança, procedimentos de trabalho etc. Padronização de processos de trabalho mapeamento e racionalização dos processos de trabalho utilizados pelas diversas unidades do tribunal, com enfoque na redefinição de rotinas para economia de tempo e recursos materiais. Utilização de modalidades alternativas e complementares de resolução de conflitos investimento em ações que estabeleçam sistemas efetivos (mediação prévia e forense, conciliação nos Juizados Especiais) de resolução de conflitos como alternativa e/ou complemento ao procedimento tradicional. Adoção de sistemas de informação efetivos de apoio à tomada de decisão tratamento da informação com enfoque estatístico e histórico para controle, acompanhamento e análise de ações e intervenções. Sistema efetivo de aquisição de serviços e produtos com enfoque na transparência dos atos e na desburocratização dos procedimentos para que as aquisições do tribunal sejam realizadas no menor espaço de tempo possível com a maior qualidade disponível. Fortalecimento das ações de acesso à justiça investimento em projetos e programas que promovam um maior acesso da sociedade à justiça, levando em consideração aspectos formativos e informativos de curto, médio e longo prazos. Sistemas efetivos de monitoramento e avaliação continuada de todas as ações desenvolvidas pelo Tribunal para a melhoria e ampliação do acesso à justiça da população do DF. Aliadas a um grande conjunto, as ações listadas contextualizam a necessidade de investimentos precisos para melhoria do resultado apresentado pelo TJDFT até o momento. A crescente demanda pelos serviços jurisdicionais exige que a Instituição esteja preparada para oferecer agilidade e

105 105 transparência de forma efetiva. Modernizar, constantemente, o TJDFT não é mais uma opção e sim uma necessidade que deve ser atendida de forma sistematizada, organizada e com controle. 1.2 Marco Institucional Como referência histórica, o primeiro Tribunal de Justiça do Brasil foi instalado na cidade de Salvador (BA), centro administrativo da colônia brasileira à época. Tal fato levou alguns historiadores a colocarem o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em Brasília, como o mais antigo da história, razão de ter sido este o primeiro Tribunal do Distrito Federal. Porém, vale lembrar que naquela época, não se concebia a existência de um município ou estado neutro para recepcionar a capital ou centro administrativo de um país. É inegável que a história do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios remonta àquela instituição judiciária, na Cidade de Salvador. Entretanto, com a transferência da capital para a Brasília, houve um rompimento com o antigo Tribunal do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, pois aquele foi extinto, propiciando a criação de uma nova corte de justiça em Brasília, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, que não era continuação do Tribunal do Rio de Janeiro e de Salvador. Esse enfoque é o que prevaleceu, inclusive considerando aspectos legais que garantissem a destinação orçamentária que adviria da transferência da Capital e direito do princípio constitucional aos magistrados de inamovibilidade. Atualmente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios TJDFT é composto por 35 desembargadores, 230 juízes de direito e servidores efetivos do quadro (dados do 1º semestre de 2006). Toda essa estrutura está à disposição para atender aos litígios da sociedade e garantir o direito do cidadão. À medida que a população cresce, as demandas coletivas e individuais também aumentam e a justiça precisa acompanhar esse processo. A organização Judiciária do Distrito Federal é regida por leis de iniciativa do TJDFT, encaminhadas por meio de Projeto de Lei ao Congresso Nacional que, após a tramitação normal, são sancionadas pelo Presidente da República. Leis que regem a Organização Judiciária do Distrito Federal:

106 106 Lei N , de 14 de maio de 1991 responsável pela organização da Estrutura da Justiça do Distrito Federal e dos Territórios e regulamentação do funcionamento dos seus serviços auxiliares. Lei N , de 10 de janeiro de 1992 altera a Lei 8.185, de 14 de maio de 1991, que dispõe sobre a Organização Judiciária do Distrito Federal e cria a Auditoria Militar do Distrito Federal. Lei N , de 26 de dezembro de 1995 acrescenta inciso ao art. 32 da Lei de Organização Judiciária do DF e Territórios. Lei N , de 8 de setembro de 1998 altera a Lei N , alterada pela Lei N e dispõe sobre a Organização Judiciária do Distrito Federal e Territórios, criando os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Lei N , de 10 de dezembro de 2003 altera a Organização Judiciária do Distrito Federal e Territórios, estabelecida pela Lei N , de 14 de maio de 1991, com as modificações introduzidas pelas Leis N , de 10 de janeiro de 1992 e N , de 8 de setembro de A atual Lei de Organização Judiciária do DF está em vigor desde 1991 e se encontra defasada diante da criação de novas regiões administrativas e do crescimento da população. Estudo realizado pela comissão técnica responsável pela elaboração da proposta de lei apontou que, em 1996, o DF tinha cerca de um milhão oitocentos e vinte mil habitantes. Naquele ano, foram distribuídos pouco mais de 102 mil processos. Do ano de 1996 a 2002, houve um crescimento médio maior do que 115% na distribuição de processos em todas as Varas do DF. Diante desses dados, chegou-se à estimativa de um aumento da ordem de 83,27% de processos entre 2002 e Com base na analise acima, uma nova lei foi proposta ao Congresso nacional em 2003 por meio de projeto de lei encaminhado pelo então Presidente do TJDFT, Desembargador Natanael Caetano Fernandes. O PL N. 3248/04 foi aprovado no início de 2006 pela Câmara dos Deputados e aguarda aprovação no Senado Federal. Após ser sancionada, a nova Lei de Organização Judiciária do DF terá um prazo de dez anos para ser totalmente implementada. Nesse período de uma década está prevista a criação de três novas circunscrições: Núcleo Bandeirante (já criada e em fase de adequação), Riacho Fundo e São Sebastião. Atualmente, os processos de interesse da população dessas duas últimas regiões

107 107 administrativas são resolvidos nos fóruns de Brasília, Samambaia e Paranoá. O projeto também cria novas varas para o TJDFT: 1. Execução das Penas e Medidas Alternativas: Sua criação objetiva oferecer uma especialidade mais acurada, dando melhor trato às execuções penais e à reintegração dos apenados. Competência: Responder pela execução de penas restritivas de direito provenientes de sentença penal condenatória, da suspensão condicional da pena e o regime aberto em prisão domiciliar e o livramento condicional; fixar as condições do regime aberto e prisão domiciliar; acompanhar e avaliar os resultados das penas e medidas alternativas, articulando, para esse fim, as ações das instituições, órgãos e setores, externos e internos, envolvidos no programa; desenvolver contatos e articulações com vistas na busca de parcerias e celebração de convênios e acordos capazes de ampliar e aprimorar as oportunidades de aplicação e execução das penas e medidas alternativas; colaborar com a Vara de Execuções Penais na descentralização de suas atividades; designar a entidade credenciada para cumprimento da pena ou medida alternativa, em cada caso, supervisionando e acompanhando seu cumprimento; inspecionar os estabelecimentos onde se efetive o cumprimento de penas ou medidas alternativas; decidir os pedidos de unificação das penas referidas no inciso I do caput deste artigo, bem como julgar os respectivos incidentes; coordenar os núcleos descentralizados de execução das penas e medidas alternativas. 2. Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário: A criação de uma vara especializada para tratar questões de meio ambiente, desenvolvimento urbano e fundiário acompanha o movimento de aumento da importância de tais questões e o grande enfoque que vêm recebendo nos últimos tempos. Competência: processar e julgar todos os feitos que versem sobre o meio ambiente natural, urbano e cultural, inclusive as questões relacionadas à ocupação do solo urbano ou rural e ao parcelamento do solo para fins urbanos, excetuadas as ações de natureza penal. OBS: Passarão à competência do Juiz da Vara do Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário os feitos em curso nas Varas Cível e de Fazenda Pública do Distrito Federal, relacionados com as matérias indicadas no caput deste artigo. 3. Juizado Especial da Fazenda Pública: Sua criação tem como finalidade prestar jurisdição célere e eficaz em causas em que seja parte do Distrito Federal ou entidades de sua administração descentralizada.

108 108 Competência: processar, conciliar, julgar e executar causas em que o Distrito Federal ou entidades de sua administração descentralizada, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista de que participe, forem autores, réus, assistentes, litisconsortes ou intervenientes, excetuadas as de falência, acidentes de trabalho e de meio ambiente, desenvolvimento urbano e fundiário, conforme o disposto na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de Execução Fiscal: Determina a especialização do Juízo em função da matéria, trazendo significativo alívio às Varas de Fazenda Pública. Competência: processar e julgar as execuções em que o Distrito Federal ou entidades de sua administração descentralizada, inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista de que participe, forem autores, réus, assistentes, litisconsortes, intervenientes ou opoentes, excetuadas as de falência, acidentes de trabalho e de meio ambiente, desenvolvimento urbano e fundiário. 5. Reestruturação da Vara da Infância e Juventude: Contando com apenas uma única vara voltada para os processos ligados à infância e juventude, a Justiça do Distrito Federal carece de rever as condições de oferecer atendimento satisfatório. Atualmente, essa unidade atende toda a demanda judicial do DF ( habitantes) relacionada a essa competência, o que implica na necessidade de dividir o trabalho dali decorrente, como forma de melhorar a prestação jurisdicional. Até o final da implementação da lei, a previsão é de que sejam criadas e preenchidas 101 vagas de Juízes de Direito, 82 de Juízes de Direito Substitutos, de Analistas Judiciários e de Técnicos Judiciários, passando de servidores para Acompanhando o movimento de adequação de sua estrutura à realidade de crescimento da demanda, faz-se necessário promover ajustes relacionados à sua capacidade administrativa, tecnológica e de infra-estrutura em geral. A ampliação de pontos de atendimento e serviços oferecidos pelo TJDFT indica a premência de se promover investimentos ligados ao fortalecimento e modernização de sua atuação, como um passo importante no sentido de oferecer atendimento com qualidade à sociedade do DF que busca, no Judiciário, o apoio para resolver seus conflitos. Assim, reafirma-se o papel do TJDFT como instrumento para o pleno exercício da cidadania. O TJDFT está estruturado, administrativamente, da seguinte forma:

109 Tribunal de Justiça do DF e Territórios: 109

110 Presidência: 110

111 Secretaria Geral: 111

112 Vice-Presidência: 112

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