O PROTAGONISTA ÓRFÃO: A REPRESENTAÇÃO DA INFÂNCIA EM OLIVER TWIST, DE CHARLES DICKENS.
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- Yasmin Quintão Lima
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1 O PROTAGONISTA ÓRFÃO: A REPRESENTAÇÃO DA INFÂNCIA EM OLIVER TWIST, DE CHARLES DICKENS. Edith Estelle Blanche Owono Elono UFCG 1 Sarah Da Cunha Santos UFCG 2 RESUMO Considerando a figura do órfão personagem recorrente na literatura inglesa Vitoriana, neste trabalho temos como objetivo, apresentar uma leitura da representação de crianças órfãs em Oliver Twist de Charles Dickens, com foco no protagonista que dá título ao romance. Para tal discussão, baseamo-nos em Philippe Ariés (1981) no que diz respeito ao conceito de infância, sobretudo no século XIX, para dialogar com a obra de Dickens que tece uma crítica social sobre como eram tratadas as crianças no período da Revolução Industrial. Uma vez que, trabalhos perigosos como limpar chaminés e ruas da cidade eram extremamente comuns à realidade infantil daquela época. Palavras-chave: Criança órfã. Representação. Literatura vitoriana. Crítica social. INTRODUÇÃO Durante o reinado da rainha Victoria ( ) a população da Inglaterra quase duplicou devido ao fato de muitas pessoas terem decidido se casar e também pela melhoria de estilo de vida dos habitantes desse país. A revolução industrial trouxe também, um crescimento considerável no nível de natalidade, de pobreza e consequentemente um aumento nos índices de mortalidade na sociedade vitoriana. As mudanças sociais e econômicas foram motivadas pelo contexto da economia mundial, que gerou uma situação interna difícil na Inglaterra. As fábricas precisavam de mão de obra, portanto, todos os membros das famílias de baixa renda tinham que trabalhar para sustentar a família. As crianças oriundas dessas famílias, sem exceção, eram órfãs nascidas nas fábricas. Essas crianças eram obrigadas a trabalhar nessas fábricas em condições desumanas, resultando num elevado índice de mortalidade infantil nesses ambientes de trabalho que na maioria das vezes sofriam complicações de problemas respiratórios e doenças como a anemia aguda. 1 Graduanda do Curso Letras Língua Inglesa, na UFCG. 2 Graduanda do Curso Letras Língua Inglesa, na UFCG.
2 Charles Dickens viveu nessa sociedade conservadora na qual as crianças eram consideradas como adultos em miniatura. Ele foi o primeiro autor a abordar na literatura a questão da criança, dando uma importância a esse ser que era quase insignificante nessa época, além de centralizar a sua obra na vivência do menino Oliver Twist. Dickens nessa obra literária denuncia que a modernidade industrial condenava tantos a uma vida de misérias, enquanto alguns fidalgos lucravam. É necessário mencionar que Oliver Twist é uma obra na qual o protagonista é um menino que desperta a empatia do leitor. Esse livro é sobre a criança e não para a criança, pois, apresenta uma crítica social no que se refere ao trato com crianças no período da Revolução Industrial. O pequeno Oliver tem uma infância de precariedades, o presente romance mostra as cidades grandes enquanto lugares pouco convidativos, enquanto espaços desiguais, onde a miséria é a contraparte do luxo. Diante do exposto, baseamo-nos em Philippe Ariés (1981) no que diz respeito ao conceito de infância, sobretudo no século XIX, para dialogar com o romance de Dickens que narra uma crítica social sobre como eram tratadas as crianças no período da Revolução Industrial. Assim, esse artigo tem como objetivo apresentar uma leitura da representação de crianças órfãs na obra supracitada, com foco no protagonista que intitula o romance. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Concepções acerca da infância sempre existiram, embora a criança como ser social e cultural fosse algo distante da realidade. A criança era vista como um adulto em miniatura. O século XIX é o século que marca a expansão industrial e também, segundo Ariès (1981), marca a chegada do sentimento de infância, ainda confuso, aos adultos. A criança do século XIX só era vista como criança quando era ainda bebê, crescia no meio dos adultos, na maior parte do tempo agindo como adulto. A criança em sua totalidade, segundo ARIÉS apud SOARES (2001) era vista como sendo qualquer coisa sem muita importância. Pois naquela época a taxa de mortalidade infantil era alta, sendo assim, não se construía um sentimento de afeto pelas mesmas como exemplifica Ariès (ibid) essa indiferença era uma consequência direta e inevitável da demografia da época. Sentimento esse caracterizado na maior parte das
3 vezes, pela incerteza de que a criança sobreviverá, o que dá origem ao desapego afetuoso dos pais para com os bebês. Contudo, com o passar do tempo, a criança foi adquirindo, aos poucos, um lugar em meio à sociedade. A criança ainda que silenciosa e vagarosamente, ascendia e consequentemente demarcava o seu lugar no meio social. Foi no século XIX que Charles Dickens escreveu o romance Oliver Twist; o nome do livro a primeira vista, nos chama atenção pelo seu título, o nome de uma criança, nome esse que retrata o descaso que a sociedade nutria pelas mesmas. Dentro da narrativa, Oliver Twist é uma criança que na maioria das vezes age como um adulto, enfrentando seus medos e trabalhando enquanto recebia maus tratos e trabalhava em condições miseráveis. Ao retratar as condições da exploração e da miséria no país pioneiro da revolução industrial a Inglaterra, e ao apresentar o estado de tantos cidadãos privados da real cidadania, enquanto alguns privilegiados reservavam para si os ganhos da nova expansão econômica. O autor inglês Charles Dickens dá voz a uma denúncia na obra literária em que o protagonista é uma criança órfã. Oliver é um órfão que tenta sobreviver em um contexto tão hostil e com poucas possibilidades de ser bem sucedido. Oliver representa o modo como a criança era vista no século industrial, por ser órfão e não ter nenhum responsável por ele. A infância daquela época denunciava que: A sociedade via mal a criança, e pior ainda o adolescente. A duração da infância era reduzida a seu período mais frágil, enquanto o filhote do homem ainda não conseguia bastar-se; a criança então, mal adquiria algum desembaraço físico, era logo misturada aos adultos, e partilhava de seus trabalhos e jogos (ARIÈS, 1981, p.10). A revolução Industrial apesar de ter tido um caráter evolutivo, ou seja, substituir o trabalho manual pelo trabalho com máquinas; fez com que muitas crianças exercessem o trabalho manual que antes eram feitos por adultos. Vários cidadãos se aproveitavam da miséria alheia. Os limpa-chaminés empregava crianças num trabalho insalubre e perigoso, onde as crianças faziam o trabalho sujo, e morriam entaladas nas chaminés ou com câncer nos pulmões segundo Heywood ( 2004). As crianças órfãs se tornavam reféns desse tipo de negócio, pois segundo a New Poor Law dava o privilégio aos
4 pobres e órfãos serem ensinados, porém havia um propósito incutido, seria fazer com que os órfãos trabalhassem em condições precárias. Nestes trabalhos as crianças eram expostas a longas horas de trabalho, muitas vezes limpando chaminés, o que lhes causava problemas respiratórios que podiam levar à morte. Ao falar das obras de Oliver Twist e Jane Eyre, concordamos com Ribas (2010) mostram de maneira dilacerante o tipo terrível de tratamento dado às crianças pela sociedade, pelas instituições educacionais e pelos adultos que deveriam ser responsáveis por cuidar delas. Embora as crianças desenvolvam afetos pelas pessoas que as criam, seus responsáveis não desenvolvem afetos por elas, como veremos adiante. De acordo com Ariès (1981) o primeiro sentimento da infância que era caracterizado pela paparicação surgiu no meio familiar. A partir dessa paparicação passou-se a pensar e preocupar-se no futuro da criança. Uma realidade diferente da de que víamos nos séculos precedentes ao século XIX e ainda no século XIX. O romance Oliver Twist evidencia a desigualdade social num período em que a Inglaterra estava em ascensão mundial, por ser pioneira da Revolução Industrial. A criança retratada na obra de Dickens mostra a criança que era negligenciada no século XIX, falada na obra de Ariès (1981) em que a criança não era diferenciada do adulto. Mais adiante analisaremos os aspectos encontrados no romance de Dickens que estão diretamente ligados à indiferença com qual ela era tratada. A INFÂNCIA EM OLIVER TWIST O romance Oliver Twist mostra do início ao fim a opressão social para com o protagonista, o qual é sujeito a condições de exploração e de miséria extrema, trabalhando várias horas por dia e comendo muito pouco. A opressão social é evidenciada a partir do título da obra, o próprio nome Oliver Twist. A palavra Twist pode ser traduzida para o português como complicada, deformada ou mesmo distorcida, apresentando ao leitor uma imagem de como será a vida de Oliver. A vida de Oliver passa por muitas dificuldades desde o período em que ele esteve na workhouse, (termo intraduzível ara o português) até o período em que foi para Londres. Logo no início da obra o leitor é apresentado ao descaso que se tinha por Oliver como criança, pelas condições de nascença. Já que ele nasce numa fábrica e devido à falta de atendimento apropriado durante o parto Oliver tem dificuldade em respirar. Oliver e a natureza disputam o ponto entre eles. (DICKENS, p. 3).
5 Na escolha do nome da criança, no livro, não se mostra nenhum sentimento na hora de atribuir um nome a criança órfã. O seu nome foi escolhido aleatoriamente, pois o dono do orfanato atribuía nomes às crianças em ordem alfabética, como é mostrado nesse trecho do romance nós nomeamos nossas crianças em ordem alfabética. A última foi S- Swubble, (...). Esse foi T- Twist, (...) (DICKENS, 2000, p. 8) 3. A aparência do protagonista demonstra uma criança que trabalhava em condições precárias e não se alimentava bem, pois o que é mostrado através da obra é que ele era uma criança de baixa estatura em relação às outras crianças de mesma idade e que era uma criança pálida. Um fragmento que nos evidencia essa condição de Oliver é quando é falado no livro em seus nove anos Oliver Twist se encontrava uma criança magra e pálida, um tanto quanto minúsculo em estatura e pequeno em circunferência. (DICKENS, 2000, p. 7) 4. Segundo Heywood (2004) por serem submetidas a inúmeras horas de trabalho exaustivas e pelo fato de que a comida era um pouco escassa, por este motivo muitas das crianças daquela época eram vítimas de anemia ou de complicações respiratórias. Na fábrica, que era como uma casa para Oliver, as crianças eram submetidas a diversas formas de trabalho como também a várias formas de tortura, Oliver e seus companheiros são torturados por três (3) meses sem comida e quando ele ped e mais comida, o Mr. Limbkins decide vendê-lo por cinco libras. Oliver foi condenado em confinamento instantâneo; e Bill foi, na manhã seguinte colar do lado de fora da porta, uma oferta de 5 para quem levaria Oliver Twist (DICKENS, 2000, P. 14) 5. Na sociedade vitoriana a educação não era obrigatória, algumas famílias ricas pagavam a um tutor para ensinar aos seus filhos, porém às crianças pobres e órfãs pertenciam às escolas que eram conduzidas por igrejas e a disciplina nessas escolas era severa. O romance evidencia este fato, Oliver é privado da educação garoto, disse o cavalheiro da cadeira, me escute, você sabe o que é um órfão, suponho? O que é isso, senhor? Indagou o pobre Oliver. O garoto É um néscio. (DICKENS, 2000, p. 10) 6. A lei dos pobres dava o privilégio aos pobres e órfãos de serem ensinados, porém havia um propósito incutido, seria fazer com que os órfãos trabalhassem. Sendo 3 Tradução nossa. 4 Tradução nossa. 5 Tradução nossa. 6 Tradução nossa.
6 assim, Oliver é apresentado ao trabalho logo em sua tenra infância bem, você tem que vir para cá, pra ser educado e ensinado uma profissão útil (DICKENS, 2000, p. 10) 7. Por ser criança e órfão ele era naturalmente dependente das pessoas que o cercavam para cuidar dele, dependência essa que era banalizada pelos adultos ao seu redor. O modo como Oliver era tratado é mostrado explicitamente em todo romance, o autor expressa um enorme desprezo para com o garoto pra ser socado e esbofeteado pelo mundo desprezado por todos e ninguém para se compadecer (DICKENS, 2000, p. 5) 8. Por ser dependente e não ter família, Oliver Twist se apega aos que lhe fazem companhia Mrs. Mann, e até mesmo o Mr. Bumble pedindo para não deixar ele sozinho; sou um garoto pequeno, senhor; e tão, tão (...) tão sozinho, senhor! Tão sozinho! (DICKENS, 2000, p. 16) 9. Este excerto nos apresenta o afeto que Oliver desenvolve por essas pessoas, embora que elas o maltratem ele não quer ser abandonado. A situação das outras crianças na obra é semelhante à de Oliver, com exceção que elas obedecem aos seus tutores (exploradores) fazendo atos delinquentes. Oliver não somente é explorado por pessoas da fábrica como por Mr. Bumble e Mrs. Mann, mas também por outros adultos que são de baixa renda como Fagin, que ensina atos de delinquência às crianças para que elas possam trabalhar para ele. Pois, naquela época as crianças faziam os trabalhos mais perigosos por serem pequenas, como é o caso de Oliver que é usado, por ser pequeno, para entrar e roubar a casa de Mr. Brownlow. Além disso, Oliver sofre as consequências do inicio ao fim do romance por ser uma minoria, por ser criança, pobre e órfão. Ele é tão ingênuo que vê o treinamento para batedor de carteira, Oliver vê aquilo como um jogo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Conforme visto, a sociedade vitoriana era de um conservadorismo extremo caracterizado especificamente pelo descaso para com as crianças. A obra Oliver Twist de Charles Dickens apresenta um retrato da negligência infantil no século XIX, já que o seu protagonista vivia na periferia de Londres, era desnutrido, pálido e vítima de opressão social. Embora sendo uma obra sobre a criança órfã da era vitoriana, vai de 7 Tradução nossa. 8 Tradução nossa. 9 Tradução nossa.
7 encontro à ideia de Rousseau de que o homem nasce bom, mas é a sociedade que o corrompe. Oliver padece muitas coisas, mas não obedece aos conselhos que são dados por seus tutores maus. Assim, Oliver é o retrato do desamparo de uma criança órfã dentro de um sistema injusto. Se o mundo já é cruel para os adultos, então imagine para as crianças. Além disso, Oliver representa a figura real de uma criança da época vitoriana, pela negligência social e todos os outros males a que foi submetido sociedade.
8 REFERÊNCIAS ARIÉS Philippe. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman. 2ª edição. Rio de Janeiro, Zahar Editores, BURGESS, Antony, A literatura Inglesa trad. Duda Machado, São Paulo, Ática, DICKENS Charles, Oliver Twist. Londres, Wordsworth Classics, SOARES, Natália Fernandes. Infâncias. Contornos e dimensões. In:. Outras infâncias. A situação social das crianças atendidas numa comissão de proteção de menores. [s.l.], Centro de estudos da criança, Universidade do Minho, HEYWOOD, Colin. Uma história da infância. Da idade média à época contemporânea no ocidente. Colin Heywood, trad. Roberto Cataldo Costa, Porto Alegre, Artmed, RIBAS, Marcos Maciel. Entendendo o sistema educacional vitoriano: realidade e ficção em Jane Eyre e Oliver Twist. Porto Alegre, 2010.
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