Poder Judiciário JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Paraná 2.ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais

Transcrição

1 1 Recurso Cível JEF: Recorrente(s): FLÁVIA DE CÁSSIA SILVA MELHADO RAPOZO E INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Recorrido(s): INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS E FLÁVIA DE CÁSSIA SILVA MELHADO RAPOZO Relator: Juiz Federal Leonardo Castanho Mendes RELATÓRIO Trata-se de recurso de ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para converter de especial para comum os períodos de 01/05/1985 a 09/08/1993 e de 01/10/1997 a 26/06/2007. Com contrarrazões da autora, vieram os autos a esta Turma. É o relatório. VOTO Recurso do INSS Destaco, inicialmente, que é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum mesmo após 28/05/1998, conforme orientação jurisprudencial. EMENTA CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO A 28 DE MAIO DE INEXISTÊNCIA DE ARRIMO LEGAL. 1. Conquanto tenha a Medida Provisória nº , de , em seu artigo 28, determinado, de maneira expressa, a revogação do 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213, de 1991, não se manteve tal determinação na lei de conversão respectiva (a Lei nº 9.711, de ). 2. O fato de o Decreto nº 3.048, de 1999, na redação original de seu artigo 70, haver regulamentado a conversão do tempo de serviço exercido até , não desautoriza tal conclusão, eis que não poderia dispor diferentemente da lei em sentido formal. Ademais, a própria redação de tal artigo 70 do Decreto veio a ser alterada (através do Decreto nº 4.827, de 2003), de modo que, atualmente, estatui serem as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dele constantes aplicáveis ao trabalho prestado em qualquer período. 3. Não prospera o argumento de que, a despeito de haver suprimido a revogação expressa do artigo 57, 5º, da Lei nº 8.213/1991, teria a Lei nº 9.711/1998, através de seu artigo 28 (o qual, como visto, estatui que O Poder Executivo

2 2 estabelecerá critérios para a conversão do tempo de trabalho exercido até 28 de maio de 1998 ), mantido a vedação à conversão de tempo de serviço especial em comum. Não se poderia supor que o legislador, deliberadamente, tenha suprimido um dispositivo de dicção clara e direta Revogam-se (...) o 5º do art. 57 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, tal como estatuía a redação original da MP, antes da conversão em lei, para proibir a conversão do tempo de serviço de maneira subliminar e indireta, através do citado artigo Pedido de uniformização conhecido e improvido. (TNU, Incidente de Uniformização , Relatora Juíza Federal Joana Carolina Lins Pereira, Data da decisão: 27/03/2009, DJ 22/05/2009). Anote-se que a Súmula nº 16, da Turma Nacional de Uniformização [ A conversão em tempo de serviço comum, do período trabalhado em condições especiais, somente é possível relativamente à atividade exercida até 28 de maio de 1998 (art. 28 da Lei nº 9.711/98) ], foi cancelada em 27/03/2009 (DJ 24/04/2009). - Período de 01/05/1985 a 09/08/1993 Alega o INSS que o período acima não deve ser convertido de especial para comum, uma vez que a autora exerceu a atividade de auxiliar de ambulatório. A sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos quanto à conversão de especial para comum do período acima. Registro, em atenção às razões recursais, que embora os decretos vigentes no período em questão mencionem apenas enfermeiros, os auxiliares, técnicos e atendentes de enfermagem ou, como no caso dos autos, os auxiliares de ambulatório, exercem atividade igualmente próxima dos pacientes, não havendo razão para tratá-los de forma diferenciada. Acrescente-se apenas que o E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região também tem se manifestado nesse sentido: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. IDADE MÍNIMA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO. LEI N.º 9.711/98. DECRETO N /99. AUXILIAR/TÉCNICO/ATENDENTE EM ENFERMAGEM. AGENTES BIOLÓGICOS. (...) 4. É devido o enquadramento até , por categoria profissional, nos códigos do Quadro Anexo do Decreto n /64, do Quadro II do Anexo do Decreto n /73 e do Anexo II do Decreto n /79 (enfermagem), para o auxiliar/atendente/técnico de enfermagem, uma vez que, por exercerem atividades ligadas à enfermagem, a ela equiparam-se, gozando igualmente deste tratamento privilegiado. 5. É admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a agentes biológicos, com enquadramento nos códigos (agentes

3 3 biológicos) e (germes infecciosos ou parasitários humanos) do Quadro Anexo do Decreto nº /64, e (agentes biológicos) e (doentes ou materiais infectocontagiantes) do Anexo I do Decreto nº /79. (TRF4, APELREEX , Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 14/01/2010) - Período de 01/10/1997 a 26/06/2007 Aduz o INSS que o período acima não pode ser convertido de especial para comum, uma vez que a autora desempenhava o cargo de secretária. Assiste razão à autarquia. A carteira de trabalho da autora apresentada com a petição inicial (docs. CTPS30/CTPS31) demonstra que ela exerceu, no período acima, a atividade de secretária. Embora o formulário emitido pelo empregador (docs. OUT18/OUT19 evento 1) tenha indicado o exercício da função de auxiliar de enfermagem, as atividades descritas no Laudo Técnico e no Programa de Prevenção dos Riscos ambientais deixam claro que não havia habitualidade e permanência na exposição a agentes infecto-contagiosos, conforme exigido pela legislação. Destacou o laudo técnico que tanto a secretária como a auxiliar de enfermagem realizavam as seguintes atividades: agendar consultas; atender telefone; fazer curativos; preparar paciente para consultas e exame de eletrocardiograma; lavar materiais usados nos curativos como pinças; verificar pressão arterial (doc. LAU7 evento 26). Em que pese o laudo técnico tenha mencionado que havia exposição contínua a microorganismos (vírus e bactérias), quando da realização de curativos e contato com pacientes, a variabilidade de tarefas exercidas pela autora não permite concluir pela habitualidade permanência, conforme exigido pela legislação. Com efeito, a autora também era responsável pelo agendamento de consultas, atendimento de telefone e preparação de pacientes para consultas e exames. Dessa forma, a autora não estava permanentemente em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados, conforme exigência do código do Decreto n.º 2.172/97 e código do Decreto n.º 3.048/99. Portanto, o período de 01/10/1997 a 26/06/2007 não deve ser convertido de especial para comum. Recurso da autora

4 4 - Período de 02/01/1980 a 30/03/1985 Alega a autora que o período acima deve ser reconhecido, uma vez que o documento particular apresentado pelo empregador Aparecido José da Silva é prova idônea. A sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos. Transcrevo a seguir trecho da sentença que adoto como razão de decidir: A autora pretende o reconhecimento do labor prestado para o referido empregador sem registro, com a posterior conversão de especial para comum. Para tanto foi apresentada no processo administrativo apenas uma declaração particular firmada em 29/03/2007 por Aparício José da Silva, proprietário da empresa Martis & Silva (sic), a qual dá conta de que a autora teria trabalhado no período 02/01/80 a 30/03/85 (à fl. 16-PA). Com a inicial foi apresentada uma tela do cadastro nacional de pessoa jurídica extraída do site da Receita Federal do Brasil (doc. 32, inicial), na qual consta o nome empresarial como sendo Aparício José da Silva Consertos, nome fantasia como sendo Oficina do Aparício e o código da descrição da natureza jurídica como empresa individual imobiliária. Preliminarmente, deve ser ressaltado que somente é possível o reconhecimento de tempo de serviço mediante a apresentação de início de prova material idôneo, nos termos do estatuído pelo art. 55, 3º, da Lei nº 8.213/91: A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento. Nesse sentido a jurisprudência: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. VÍNCULO DE EMPREGO. JUSTIFICAÇÃO JUDICIAL. RECONHECIMENTO. UTILIZAÇÃO. OBEDIÊNCIA AO ARTIGO 55, PARÁGRAFO 3º, DA LEI Nº 8.213/91. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. NECESSIDADE. COMPROVAÇÃO. RECEPÇÃO PERANTE O RGPS. POSSIBILIDADE. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO E EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. (...). 2. Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de um início razoável de prova material da atividade urbana, contemporânea à época dos fatos, corroborada por prova testemunhal idônea e consistente. Inteligência do artigo 55, parágrafos 1º e 3º, da Lei nº 8.213, de (TRF 4ª região, AC nº , rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu, DJU de ) Não obstante a fragilidade da prova documental apresentada, foram apuradas discrepâncias que inviabilizam totalmente o reconhecimento do tempo de serviço pretendido.

5 5 Primeiramente, analisando o processo administrativo, verifica-se que a autora solicitou a realização de JA para o período de 10/11/66 a 30/04/85, alegando ser trabalhadora rural em regime de economia familiar. O INSS, por sua vez, indeferiu a realização da JA (fl. 54-PA), por ter constatado que o pai da autora exercia atividade urbana remunerada até 30/11/79, bem como pelo fato de a requerente ter apresentado a declaração emitida por Aparício José da Silva (fl. 16-PA). Por fim, importa salientar que mera declaração particular não basta como início de prova material, tendo valor probatório equivalente à prova testemunhal, razão pela qual não procede o pedido da autora neste particular. Registro, em atenção às razões recursais, que a realização de audiência não seria suficiente para o reconhecimento do período acima, uma vez que ausente início de prova material. - Período de 10/08/1993 a 25/10/1999 Quanto à conversão de especial para comum do período acima, a sentença também merece ser mantida por seus próprios fundamentos. Alega a autora que, no período acima, apesar de ter trabalhado como estatutária, verteu contribuições para o Regime Geral de Previdência Social. Sem razão, contudo. O documento DECL1 (evento 43) comprova que no período acima a autora desenvolveu atividade sob o regime estatutário e com recolhimento para o Regime Próprio de Previdência Social e não para o RGPS. Reafirmação da DER Por fim, pleiteia a autora que seja computado o tempo de contribuição posterior à DER para a concessão do benefício (reafirmação da DER). Ocorre que, mesmo se computado período posterior à DER, a autora não faria jus ao benefício de aposentadoria especial e nem ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com a conversão de período laborado em atividade especial. Dessa forma, resta prejudicado o pedido de fixação da DIB após a data de entrada do requerimento administrativo. Conclusão Esse o contexto, voto por NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS, nos termos da fundamentação. Condeno a autora ao pagamento de honorários de 10% do valor atualizado (IPCA-E) atribuído à causa, condenação suspensa, na forma do

6 6 art. 12 da Lei 1.060/50, enquanto persistir a assistência judiciária gratuita deferida. Considero prequestionados especificamente todos os dispositivos legais e constitucionais invocados na inicial, contestação e razões de recurso, porquanto a fundamentação ora exarada não viola qualquer dos dispositivos da legislação federal ou a Constituição da República levantados em tais peças processuais. Desde já fica sinalizado que o manejo de embargos para prequestionamento ficarão sujeitos à multa, nos termos da legislação de regência da matéria. É como voto. Leonardo Castanho Mendes Juiz Federal Relator