Processos e modelagem da erosão: da parcela à bacia hidrográfica
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1 Processos e modelagem da erosão: da parcela à bacia hidrográfica 04 Jean Paolo Gomes Minella Gustavo Henrique Merten José Miguel Reichert Elemar Antonino Cassol Introdução Os atuais níveis de crescimento populacional e a consequente necessidade de ampliar a produção de alimentos, fibras e energia, tem promovido uma intensa utilização dos recursos naturais que geram muitas vezes impactos indesejáveis ao meio ambiente. Dentro deste contexto é importante considerar que os recursos naturais devem servir não apenas para suprir as necessidades da sociedade atual, mas também das futuras gerações. Essa condição baseada, em princípios éticos, quando transposta ao nosso cotidiano quer dizer que devemos realizar um esforço para aperfeiçoar nossa capacidade de gerenciar a utilização dos recursos naturais com maior habilidade, de forma a conciliar as nossas necessidades atuais sem comprometer as necessidades futuras. Diferente do que alguns podem imaginar, os interesses de produção e da preservação dos recursos naturais não são conflitivos, já que a preservação do solo e da água são fatores importantes para garantir as necessidades econômicas e sociais de uma nação. Neste contexto, é importante considerar que o estabelecimento de políticas públicas voltadas para a preservação dos recursos naturais são fundamentais para estabilidade de uma sociedade. Dentre inúmeros fatores relacionados com a degradação dos recursos naturais, a erosão hídrica assume papel de destaque, contribuindo significativamente para a situação atual de degradação dos solos e da água por todo o planeta. A erosão hídrica provoca impactos indesejáveis ao ambiente tanto no local, onde essa ocorre, como também fora do local, onde os solos foram erodidos. Os 105
2 principais problemas referentes aos efeitos fora do local da erosão estão relacionados ao depauperamento da qualidade da água, o assoreamento dos corpos de água e à degradação dos ecossistemas aquáticos. Esses impactos, têm sido considerados nos últimos anos, um assunto de grande importância para a sociedade e têm merecido a atenção da comunidade científica internacional. Nesse sentido, quando se estuda o processo erosivo, devem ser focalizados não apenas os processos envolvidos nos locais onde esse processo ocorre, mas também os locais onde o material erodido foi transferido. Os estudos do processo erosivo, baseados na escala de bacia, têm possibilitado a compreensão mais adequada desses processos. Nas últimas décadas, a comunidade científica tem exercido um grande esforço no desenvolvimento de técnicas de monitoramento e modelagem da erosão na escala de bacia hidrográfica (DICKINSON; COLLINS, 1998; RICKSON, 2006). Esse esforço tem contribuído, de forma substancial, para a integração das informações entre as diferentes escalas, permitindo com isso representar adequadamente as diferentes fases do processo erosivo (destacamento, transporte e deposição), bem como os elos entre os diferentes componentes do sistema (fontes, redes de transporte, depósitos, rede fluvial). A análise dos impactos no local e fora do local da erosão depende fundamentalmente de informações de estudos desde a escala de parcelas, passando pelas encostas até as bacias hidrográficas, envolvendo profissionais de diversas áreas como ciência do solo, geomorfologia, hidrologia, dentre outros. Mecanismos da erosão hídrica A erosão do solo é um processo geomórfico natural, que pode ser intensificado quando a ocupação das terras e as práticas de uso e manejo do solo são inadequadas. Segundo Morgan (2005) o processo erosivo consiste de três fases: desagregação, transporte, e quando não existe energia suficiente para o transporte das partículas desagregadas ocorre a deposição. O processo inicia com o impacto das gotas de chuva sobre o solo, sendo que a energia cinética da gota de chuva é transferida para o solo, causando a desagregação das partículas de solo 106
3 (desagregação física) e também o transporte das partículas em alguns poucos centímetros pelo salpicamento das gotas levando consigo partículas de solo. A taxa de destacamento é proporcional à energia cinética da chuva, à declividade do terreno e à altura da lâmina de água. Na etapa seguinte, a erosão é controlada pelo escoamento superficial. A formação e magnitude do escoamento superficial dependem fundamentalmente da infiltração, sendo que esta depende das características da precipitação, relevo, vegetação e características do perfil do solo. A variabilidade espacial dos fatores condicionantes determina que a geração do escoamento superficial em bacias hidrográficas seja governada por uma complexa dinâmica hidrológica (ROSE, 2004). Duas teorias são utilizadas para descrever a variabilidade espacial e temporal da infiltração e, consequentemente, do escoamento superficial: mecanismo hortoniano e as áreas de afluência variável. O primeiro ocorre quando a intensidade de precipitação excede a taxa de infiltração (HORTON, 1947), e o segundo quando o solo torna-se saturado, sendo que qualquer precipitação adicional causará escoamento (BEVEN; KIRKBY, 1979). Para os estudo de erosão é preciso diferenciar o escoamento difuso do escoamento concentrado. O escoamento difuso ocorre através de uma rede de canais anastomosados, que se movimenta por canalículos de forma difusa, em função das características do microrelevo e rugosidade da superfície. Este se forma pelo volume além daquele que ficou armazenado nas microdepressões e não infiltrou. O escoamento concentrado ocorre com o acúmulo do volume de água, proveniente do escoamento difuso, formando sulcos bem definidos e com maior velocidade que o escoamento difuso. A taxa de desagregação, devido ao escoamento, é em função da velocidade do fluxo de água descontada a parcela de energia do escoamento que se encontra comprometida com o transporte de sedimentos (TOY et al., 2002). A capacidade de transporte de sedimentos pelo escoamento é decorrente de algumas variáveis hidráulicas e das características dos sedimentos. A intensidade do processo erosivo é decorrente da quantidade do material que é desagregado e pela capacidade do escoamento em transportar os sedimentos. Desta maneira a intensidade da erosão pode ser limitada tanto pela quantidade de material desagregado (limitado 107
4 pela desagregação) ou pela capacidade de transporte (limitado pelo transporte). É importante considerar que na sua grande maioria os modelos de erosão desenvolvidos, para serem aplicados em áreas agrícolas, são capazes de simular apenas os processos de erosão do tipo entressulco e em sulco. Entretanto cabe lembrar, que outros processos erosivos são importantes também e podem representar uma parcela significativa na quantidade de sedimentos que são produzidos em uma bacia. Entre esses processos, destacam-se a erosão que ocorre nas estradas, as voçorocas, a erosão subsuperficial também denominada erosão em pipes, a erosão fluvial, a erosão eólica e os processos de fluxo de massa ou erosão por remoção em massa como deslizamentos e colapso de barrancos em rios (HADLEY et al., 1985). Estes tipos de erosão não ocorrem necessariamente isolados um do outro. Eles são influenciados pelos fatores que compõem a paisagem e também pelas características da chuva. Sendo assim, a modelagem da erosão depende, fundamentalmente, da identificação dos mecanismos erosivos dominantes na escala de interesse. Assim, quando se simula a erosão em uma lavoura, certamente os processos erosivos do tipo sulco e entressulcos são importantes, mas na escala de bacia predominam outros processos importantes que estão relacionados principalmente com a erosão que ocorre no canal fluvial (YAN et al., 2010). Modelagem matemática dos processos erosivos Em função do problema crescente de degradação dos recursos naturais, existe uma grande demanda por informações relativas à quantificação da erosão, da produção de sedimentos e dos seus impactos sobre as atividades econômicas e de meio ambiente. O conhecimento das taxas de erosão e o conhecimento do fluxo de sedimentos e dos poluentes em uma bacia são considerados informações importantes para possibilitar uma gestão adequada dos recursos naturais (WALLING, 2005). Atualmente, a discretização espaço-temporal da erosão e da produção de sedimentos tem contribuído, significativamente para auxiliar no planejamento econômico e ambiental dos recursos naturais (LIM et al., 2005). Além da obtenção da taxa de erosão média de longo período para áreas homogêneas, tem sido possível obter a variação 108
5 espaço-temporal dessas taxas (SUMMER; WALLING, 2002; DE ROO; JETTEN, 1999, DE ROO et al., 1996). A tendência é que os modelos matemáticos se tornem ferramentas cada vez mais refinadas para descrever os processos de erosão e sedimentação que ocorrem em uma bacia hidrográfica. Nos estudos da erosão e sedimentação na escala de bacia é necessário considerar a influência de todos os ambientes (subsistemas) que compõem a paisagem como, por exemplo, os diferentes usos agrícolas, as áreas urbanas, as estradas, as florestas, as áreas úmidas e os rios (Figura 1). Os subsistemas não podem ser avaliados isoladamente porque afetam e são afetados pelos outros subsistemas, formando uma rede complexa de interações (OWENS, 2005). Os resultados deste conjunto de interações, envolvendo diversos ambientes e diferentes processos erosivos, refletirão nas características das descargas líquidas e sólidas na rede de drenagem. Cada ambiente exercerá influência na geração e no movimento do escoamento superficial, bem como na erosão e transporte de sedimentos. Sendo assim, a produção de sedimentos e as características físicas e químicas dos sedimentos nos rios é um reflexo da integração de todos os subsistemas que compõem a paisagem, dentro dos limites de uma bacia hidrográfica. Figura 1. Desenho ilustrando os ambientes (subsistemas) de uma bacia hidrográfica e processos erosivos dominantes. 109
6 Na simulação da erosão hídrica na escala de bacia, através de modelos matemáticos, é necessário considerar os três processos fundamentais que são: desagregação, transporte e deposição. Na desagregação as partículas de solo são removidas pelo impacto da gota de chuva e/ou pelo escoamento, sendo dependente das características físicas e químicas do solo, que definem sua susceptibilidade à desagregação. Na desagregação, parte da energia é proveniente da chuva e parte do escoamento. O processo de transporte de sedimentos ocorre através do escoamento concentrado em sulcos e da energia disponível para realização desse trabalho. A deposição dos sedimentos obedece a uma condição que ocorre quando a quantidade de sedimentos, que está sendo transportada, supera a capacidade de transporte. A deposição, no entanto, é um processo complexo de modelar, porém considera-se que essa etapa é de fundamental importância para possibilitar o processo de transferência de sedimentos das suas fontes para os locais de depósito que pode ser a bacia vertente ou a calha fluvial (Figura 2). Figura 2. Desenho esquemático do processo de transferência de sedimentos das suas fontes para os locais de depósito. As fontes de sedimentos mais comuns encontradas em uma bacia hidrográfica são as áreas agrícolas, os locais de construção, as áreas com vegetação alterada, as estradas e a rede de drenagem. O 110
7 processo de transporte dos sedimentos erodidos ocorre em caminhos preferenciais do escoamento superficial que são sulcos de erosão, canais, voçorocas e a rede de drenagem. As áreas de depósito ocorrem nas faixas de vegetação, reservatórios, lagos, banhados, locais de relevo côncavo, áreas de escoamento divergente e junto a planície aluvial. Sendo assim, a modelagem da erosão e dos processos hidrossedimentológicos, na escala de bacia deve incluir os processos de desagregação, transporte e deposição nos diferentes ambientes levando-se em consideração os processos que possibilitam a conectividade entre esse ambientes. Além da erosão entressulco e em sulco, que são de ocorrência comum nas áreas agrícolas, existem outros processos erosivos como a erosão fluvial e a erosão em voçoroca, que são processos erosivos importantes que apresentam uma dinâmica complexa e que, de uma maneira geral, não são contempladas na maioria dos modelos de erosão que são aplicados na escala de bacia. Dependendo das características da bacia (geologia, relevo, área de drenagem) a importância de um ou mais destes tipos de erosão é predominante, e precisa ser identificado pelo modelador. Sendo assim, é importante que o usuário escolha o modelo que represente o processo que, de fato, contribui com a produção de sedimentos na bacia. Entretanto, em geral, os problemas erosivos em bacias envolvem mais um tipo de erosão sendo necessário o acoplamento de diferentes modelos a fim de englobar os fenômenos ocorrentes. Aplicação dos modelos matemáticos de predição de erosão O desenvolvimento de modelos de predição de erosão hídrica ou eólica tem como motivação principal o desenvolvimento de uma ferramenta de auxílio voltada para o planejamento das ações de conservação do solo e da água. Mediante o uso de modelos diferentes, práticas de controle da erosão podem ser testadas a partir da simulação de diferentes cenários de uso e manejo do solo e variações climáticas. Os modelos matemáticos de predição de erosão podem ser utilizados, tanto para o propósito com fins acadêmicos como aplicados. Os propósitos acadêmicos tem haver com a possibilidade de compreender e descrever os mecanismos da erosão. Já com o propósito 111
8 aplicado, os modelos são aplicados para quantificar a erosão e identificar áreas mais afetadas por esse processo. A seguir seguem alguns exemplos de utilização acadêmica e aplicada dos modelos de predição de erosão: Utilização acadêmica: Ÿ Representar os diferentes tipos de erosão e suas interações; Ÿ Analisar os processos de destacamento das partículas da massa de solo, transporte das partículas e deposição dos sedimentos erodidos, em função das características da chuva, do solo, do relevo e cobertura vegetal; Ÿ Analisar os mecanismos de conexão entre os processos erosivos nas vertentes e na rede fluvial; Ÿ Avaliar em que nível de discretização do meio físico é possível representar os processos erosivos e hidrológicos em diferentes escalas e condições. Utilização aplicada: Ÿ Calcular as taxas de erosão para avaliar as perdas do potencial produtivo dos solos, a degradação dos solos e os impactos econômicos; Ÿ O planejamento integrado de bacias hidrográficas com vistas à preservação dos recursos hídricos e à manutenção do potencial produtivo dos solos; Ÿ Demonstrar previamente os efeitos da alteração do uso e do manejo dos solos sobre o volume de escoamento superficial e a taxa de erosão. Um dos principais campos de aplicação da modelagem de erosão encontra-se na engenharia de sedimentos. Nesta área os modelos de predição de erosão, aplicados na escala de bacia, são utilizados com o propósito de estimar o aporte de sedimentos, para fins de avaliação da vida útil de reservatórios (CARVALHO et al., 2000). A estimativa da erosão através de modelos matemáticos, no entanto, se torna difícil a medida que ocorre um aumento de escala onde esses modelos são aplicados. Esta condição ocorre não somente 112
9 pela natureza variada das fontes de sedimentos, mas principalmente, pela complexa relação de transferência dos sedimentos da bacia vertente para a calha fluvial. Nestas condições a combinação de um levantamento do meio físico, para indificar os principais processos erosivos que ocorrem na bacia, pode contribuir para a seleção do modelo mais adequado a ser utilizado. Classificação geral dos modelos de erosão (perda de solo e produção de sedimentos) Os modelos matemáticos de estimativa de perda de solo e produção de sedimentos diferem em termos de complexidade, dos processos considerados e dados requeridos. A escolha do modelo mais apropriado deve ser baseada no objetivo de uso, nas características do local de estudo e da disponibilidade de dados. Não existe o melhor modelo para todas as aplicações, mas sim aquele mais adequado ao objeto de estudo. As diferenças entre os modelos permitem agrupá-los segundo diferentes critérios: os objetivos, a base conceitual e a escala espacial e temporal. Os modelos apresentam características distintas, segundo os objetivos para os quais foram desenvolvidos. Os modelos de processos erosivos e hidrossedimentológico estão presentes em diferentes áreas do conhecimento, como por exemplo, na geografia, na engenharia e na agronomia. Sendo que o enfoque e a descrição matemática priorizarão os processos de interesse de cada campo de trabalho como por exemplo: Ÿ Determinação da fragilidade ambiental à erosão hídrica; Ÿ Determinação das taxas médias de perda de solo de longo período em áreas agrícolas; Ÿ Determinação do balanço de sedimentos, diferença entre erosão e deposição na bacia, controlando a produção de sedimentos; Ÿ Análise dos processos de transferência de sedimentos, nutrientes e pesticidas das encostas para os depósitos e rede de drenagem; Ÿ Interpretação das relações entre os processos erosivos, observados nas encostas, com os processos de transporte na calha fluvial; Ÿ Determinação da taxa de emissão de sedimentos (relação entre a perda de solo e a produção de sedimentos); 113
10 Ÿ Erosão fluvial, transporte e deposição de sedimentos em rios e reservatórios; Ÿ Impacto na qualidade da água, pela presença de sedimentos e contaminantes associados (nutrientes, pesticidas, metais pesados e patógenos). Considerando a base conceitual dos modelos, outra maneira usual de classificação é segundo os processos erosivos considerados e pelos algoritmos utilizados. Considerando como exemplo os modelos para as áreas agrícolas, os processos de desagregação, transporte e deposição são controlados pela capacidade (energia) da chuva e do escoamento em desagregar e transportar o solo através das vertentes. O processo pode ser modelado pela relação entre desagregação e capacidade de transporte do escoamento. Para estes casos existem três tipos de modelos que utilizam essa relação para a estimativa da perda de solo: ŸLimitados pela desagregação - a quantidade de solo erodido é limitada pela capacidade da chuva e do escoamento desagregar o solo, assumindo que o escoamento pode transportar uma infinita quantidade de sedimentos, ou seja, tudo que for desagregado poderá ser transportado para uma determinada posição considerada. Nesses modelos o processo de deposição não é simulado e sim assumido que irá ocorrer onde a declividade do terreno for muito baixa ou onde o escoamento poderá ser canalizado. Este é o caso dos modelos relacionados com a Equação Universal de Perda de Solo - USLE (WISHMEYER; SMITH, 1978). Os resultados destes modelos são, frequentemente, utilizados como uma estimativa da desagregação nos dados de entrada de modelos que simulam a mobilização e deposição na bacia. ŸSimulam as condições limitadas pela disposição de sedimentos e pela capacidade de transporte - o modelo assume que o escoamento pode transportar uma quantidade de sedimento controlada pela sua capacidade máxima de transporte de sedimentos. Desta forma, a deposição ocorre quando a carga de sedimentos a ser transportada é maior que a capacidade de transporte. Nestes modelos a capacidade de 114
11 transporte não somente condiciona a transferência dos sedimentos que foram mobilizados através da energia da chuva, mas também condiciona o potencial de desagregação pelo escoamento concentrado. A energia para realização deste trabalho resulta da diferença entre a capacidade de transporte e a carga que esta sendo transportada. Ainda na classificação da base conceitual, os modelos podem ser classificados como empíricos, conceituais e de base física (Tabela 1): ŸModelos empíricos - são baseados em relações estatísticas entre variáveis consideradas importantes. Os parâmetros das equações são obtidos por calibração em parcelas experimentais. Nestas condições de grande controle experimental se estabelece as relações entre os fatores controladores e as variáveis de interesse (escoamento e perda de solo). Estes modelos necessitam pequeno número de variáveis em comparação com os modelos determinísticos, realizando boas estimativas de longo período. Estes modelos são utilizados em situações com limitação de dados, sendo importantes úteis na identificação das áreas críticas de erosão. ŸOs modelos conceituais - são baseados num conjunto de fórmulas que representam o sistema de forma simplificada, tendo um conjunto de componentes interligados e incorporando na sua estrutura mecanismos de geração e transferência de sedimentos, cada um requerendo alguma caracterização do seu comportamento dinâmico. Incluem uma descrição geral dos processos na bacia, sem incluir detalhes específicos das interações entre os processos. Permitem inserir dados da variabilidade espacial e temporal mesmo que com pouco detalhamento. Os parâmetros de ajuste do modelo são obtidos com dados medidos. ŸModelos de base física - os resultados são obtidos pela solução de equações físicas que descrevem os processos hidrológicos (infiltração, evapotranspiração e escoamento superficial) e erosivos (desagregação, transporte e deposição de sedimentos). O uso destas equações depende da obtenção ou estimativa dos parâmetros necessários, esta é uma limitação, principalmente, para áreas extensas e heterogêneas onde não existem dados ou com baixo nível de detalhamento. 115
12 Tabela 1. Resumo dos principais tipos de modelo segundo sua base de cálculo. Fonte: Merritt (2003), Vente e Poesen (2005). Outro critério de classificação dos modelos refere-se à escala espacial e temporal sendo esses classificados como concentrados ou distribuídos. Modelos concentrados referem-se àqueles cuja variabilidade espacial dos processos não é levada em conta ou seja o resultado representa um valor médio para uma área homogênea. Nos modelos distribuídos, os parâmetros, variáveis e resultados são obtidos para toda a área de interesse com discretização espacial. Este tipo de modelo é apropriado para áreas heterogêneas e extensas, permitindo identificar onde os processos erosivos (desagregação, transporte e deposição) estão ocorrendo. Em relação à escala temporal, os modelos de erosão podem gerar resultados médios de longo período ou resultados relativos à ocorrência de eventos de chuva. A escolha do modelo gera alguma incerteza em função da grande número de opções e diferença entre eles. É importante lembrar que o modelo adequado será aquele que representa explicitamente os processos requeridos. Além disso, é importante verificar a disponibilidade de dados, a representatividade dos processos para o local de interesse e a adequação à resolução espacial e temporal que se deseja modelar. A análise detalhada do fenômeno de interesse e dos 116
13 modelos é fundamental para o planejamento da obtenção dos parâmetros, monitoramento e, finalmente, da modelagem. Na Tabela 2 são apresentados alguns modelos de erosão e suas principais características. Tabela 2. Exemplos de modelos de erosão e suas principais características. Contribuição das diferentes escalas para a modelagem da erosão A evolução da modelagem de erosão, na escala de bacia, depende fundamentalmente do entendimento de como se conectam as informações geradas nas diferentes escalas, ou seja, da microparcela à grande bacia (Figura 3). O entendimento desta questão sem dúvida irá auxiliar também na elaboração de medidas mais efetivas de controle da produção de sedimentos, considerando que os sedimentos não são produzidos somente na bacia vertente, conforme já comentado. Com isso e importante considerar que as medidas de conservação de solos utilizadas em uma bacia são importantes, porém, não suficientes para reduzir a produção de sedimentos na mesma bacia. Fatores relacionados com os processos erosivos que ocorrem na calha fluvial também cumprem um papel importante neste processo. Os resultados na escala de microparcela têm grande aplicação e importância no suporte de parâmetros para os modelos de base física e distribuídos, já que definem com grande precisão os parâmetros necessários para a caracterização específica de processos interferentes como, por exemplo: a) estudos para a determinação da energia cinética 117
14 da gota de chuva erosividade, b) salpico, c) formação de selo superficial, d) avaliação da cobertura do solo, e) influência da estabilidade de agregados, coesão do solo, granulometria. Figura 3. Desenho esquemático da representação da conexão das escalas de monitoramento e modelagem para a representação dos processos erosivos e hidrossedimentológicos. Na escala de parcela e vertente é possível definir das taxas de erosão para diferentes solos e níveis de cobertura, numa condição mais representativa da realidade e com grande controle experimental. Nessas escalas é possível fazer uma grande discretização das variáveis de solo e vegetação, permitindo quantificar seus efeitos. Existe também a possibilidade de realizar experimentos com chuva simulada e estabelecer variáveis como erodibilidade e importância da erosão em sulco. Outro aspecto muito importante nesta escala é a possibilidade de compreender a dinâmica da infiltração e escoamento superficial em função de manejos diferentes. Na escala de pequenas bacias é possível avaliar os mecanismos de interação entre os processos erosivos da bacia vertente com a calha fluvial. Condições geomorfológicas associadas à hidrologia afetam fortemente a dinâmica da erosão, e o processo de mobilização, deposição e transporte, bem como transferência de sedimentos para a calha fluvial. Na escala de grandes bacias são avaliados os impactos regionais 118
15 da erosão sobre a degradação dos recursos hídricos, a economia regional e a saúde da população. Os processos relacionados à erosão e à produção de sedimentos tornam-se ainda mais complexos devido à participação de fontes de sedimentos de diferentes naturezas (sulco, entressulco, voçorocas, remoção em massa e erosão fluvial) e também da dinâmica deposicional devido à ocorrência de várzeas, lago e reservatórios, além da redução natural da declividade do canal fluvial. Considerações finais A modelagem da erosão do solo e da produção de sedimentos, sem dúvida nenhuma tem se tornado uma ferramenta importante para auxiliar na gestão sustentável dos recursos naturais, principalmente quando aplicada a escala de bacia hidrográfica. Porém, é justamente nesta escala que são encontrados os vazios do conhecimento que limitam o desenvolvimento de modelos mais robustos. Os vazios de conhecimentos devem ser traduzidos como desafios a serem realizados por parte da comunidade científica envolvida neste tema. Dessa forma, sugere-se que os principais desafios da modelagem de erosão e da produção de sedimentos consiste na: a) representação da complexidade natural do ambiente minimizando a quantidade de parâmetros necessários; b) transferência de informação entre diferentes escalas; c) compreensão dos mecanismos de ligação entre os processos nas pendentes e na calha fluvial e a redistribuição de sedimentos na bacia; e d) compreensão dos padrões de infiltração e formação do escoamento superficial na escala de bacia. Referências bibliográficas BEVEN, K. J.; KIRBY, M. J. A physically based, variable contributing area model of basin hydrology. Bulletin Hydrologiques, v. 24, n. 1, p , CARVALHO, N. O.; FILIZOLA, N. P. F. J.; SANTOS, P. M.C.; WERNECK, J. E. F. L. Guia de Avaliação de Assoreamento de Reservatórios. Brasília: ANEEL, p. 119
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