AS REPRESENTAÇÕES E USOS DE PLANTAS MEDICINAIS EM HOMENS IDOSOS NO COTIDIANO.

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1 AS REPRESENTAÇÕES E USOS DE PLANTAS MEDICINAIS EM HOMENS IDOSOS NO COTIDIANO. Silvia Cristina da Silva Lima 1 ; Rogério Dias Renovato 2. 1 Estudante do Curso de Enfermagem da UEMS, Unidade Universitária de Dourados cristinajimu@hotmail.com 2 Professor do curso de Enfermagem da UEMS, Unidade Universitária de Dourados rrenovato@uol.com.br Área temática: Saúde Coletiva. Resumo A utilização das plantas medicinais como recurso terapêutico é bastante difundida em todo o mundo. As representações sobre as plantas medicinais parecem ancoradas na concepção de inocuidade, desconsiderando a potencialidade de reações adversas e até toxicidade. O uso de plantas medicinais em idosos tem elevada prevalência, como prática da automedicação. O objetivo dessa pesquisa foi conhecer e compreender as representações sobre o uso de plantas medicinais por homens idosos. Tratou-se de pesquisa qualitativa, cujos aportes teóricos foram as concepções de práticas de medicação de Peter Conrad, de representação, a partir de Stuart Hall, e de identidade proveniente do campo dos Estudos Culturais. Participaram desse estudo 12 homens idosos com idade média de 66 anos. A maioria eram aposentados e moravam com a esposa. Os resultados apontaram que para eles as plantas demoram mais para fazer efeito e só servem como auxílio à medicação prescrita. Em geral, possuem o hábito de cultivar as plantas medicinais em seus quintais, sendo o seu preparo, através de chá por decocção. Verificamos o consumo de plantas medicinais entre os idosos e que o seu uso é feito concomitantemente com os medicamentos industrializados, sendo utilizadas para tratar desordens menores, como gripes e resfriados. Palavras-chave: Fitoterápicos. Saúde do Homem. Saúde do Idoso. Introdução A utilização das plantas medicinais como recurso terapêutico é bastante difundida em todo o mundo. Em pesquisa realizada por Veiga Junior (2008), a prevalência de utilização de plantas medicinais alcançou 97,7%. Mesmo com a disponibilidade de medicamentos alopáticos, a terapêutica com plantas medicinais foi a principal forma de tratamento em 63%

2 dos entrevistados, e o conhecimento das indicações terapêuticas se centralizava nas pessoas idosas. Ao contrário dos medicamentos alopáticos, cujos significados sobre seu uso apresentam caráter ambivalente, ora relacionados à sua eficácia, às suas qualidades curativas intrínsecas, ora relacionados às experiências negativas decorrentes das reações adversas, as representações sobre as plantas medicinais parecem ancoradas na concepção de inocuidade. Todavia, as plantas medicinais comumente consumidas pela população podem apresentar efeitos colaterais, e muitas delas ter seu uso desaconselhado para gestantes. O uso de plantas medicinais em idosos foi verificado por Silva et al (2008), sendo as plantas mais utilizadas Capim Santo (Cymbopogan citratus (DC.) Stapf.), hortelã-da-folhamiúda (Mentha x villosa Huds) e erva- cidreira (Lippia alba (Mill.) N.E Br.). Em outro estudo, o emprego de plantas medicinais em situação de automedicação foi verificado em 47,4% dos idosos (CASCAES et al, 2008). Assim, é possível constatar o uso de plantas medicinais em idosos, como prática terapêutica contemporânea, associada ou não ao uso de medicamentos alopáticos ocidentais, cujo fenômeno pode estar associado ás estratégias de resistência à biomedicina, ou simplesmente tem a finalidade de complementar a terapêutica medicamentosa prescrita. Este estudo teve como objetivo principal conhecer e compreender as representações e o uso de plantas medicinais por homens idosos no cotidiano, bem como verificar como se articulam os usos de medicamentos alopáticos ocidentais com os usos das plantas medicinais por homens idosos. Além disso, procuramos conhecer os modos de preparo das plantas medicinais e onde adquirem esses objetos terapêuticos. Material e Métodos Trata-se de pesquisa com abordagem qualitativa, cujos aportes teóricos têm como arcabouço as concepções de práticas de medicação de Peter Conrad (1985), de representação, a partir de Stuart Hall (1997), e de identidade proveniente do campo dos Estudos Culturais (GUARESCHI, BRUSCHI, 2003). Os sujeitos desse estudo foram homens com idade igual ou superior a 60 anos assistidos em equipes Estratégias de Saúde da Família (ESF) de Dourados, MS, fazendo uso de 4 ou mais medicamentos. A amostra foi de cunho qualitativo, sendo entrevistados 12 homens. As ESFs selecionadas foram as dos bairros: Parque do Lago II, Cuiabazinho, Vila Hilda, Ouro Verde e Parque das Nações I.

3 Foi utilizada a entrevista-narrativa, que contém as seguintes etapas: a fase de preparação, a iniciação, a narração central, a fase de perguntas, e a fala conclusiva (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2008). As entrevistas foram gravadas e transcritas. Para a análise das narrativas, aproximanos da Teoria do Discurso de Michel Foucault (2005). O presente projeto foi enviado ao Comitê de Ética em Pesquisa da UFMS e teve a sua aprovação, de acordo com o protocolo nº1625. Cada idoso recebeu um código como E.1. E.2, a fim de preservar seu anonimato. Resultados e Discussão A idade média dos participantes foi de 66 anos. A menor idade encontrada foi de 60 anos e a maior de 91 anos. A maioria eram aposentados, e moravam com a esposa. Todos possuíam o ensino fundamental incompleto. Quanto à profissão, seis eram motoristas, quatro lavradores e um foi mecânico de automóveis. Dentre os medicamentos utilizados pelos homens idosos, estão: captopril, propranolol, hidroclorotiazida, losartam, enalapril, nifedipina, ácido acetilsalicílico, metformina, atenolol, anlodipina, digoxina, furosemida, atropina, espironolactona, sinvastatina, budesonida, formoterol, salbutanol, aminofilina, prednisona, glibenclamida, betaistina, amantadina. Já as plantas utilizadas entre os entrevistados foram: guaco, flor de laranja de lima, jateicaá, carqueja, cancro branco, gervão, cancro rosa, guampa de boi, cabreúva, erva cidreira, baquinho, folha de pitanga, boldo e folha de coco, jurubeba, folha de goiaba, cavalinha, fedegoso, rubim, poejo, pau azul, guavira, serigoela, graviola, sabugueiro, feijão-andu, babosa, cancorosa, douradinha, barbatimão, camomila, erva-de-são-joão, condro, romã, flor do amazonas, manjericão, manjerona, marcela, folha de laranja, caraguatá, eucalipto, hortelã, folha de manga, flor de mamão, cipó da amazônia, chá de burrico, limão. Dos entrevistados, todos afirmaram ter aprendido sobre as plantas medicinais com seus ascendentes, pais e avós principalmente. E quando questionados desde quando utilizavam os chás, um deles respondeu: [...] desde que me entendo por gente utilizo os chás de plantas (E.1). Esta fala nos retrata como a utilização das plantas medicinais está incorporada em seu cotidiano, trazendo significados de permanência e singularidade. Entre os achados da pesquisa, verificamos que os homens idosos possuem o hábito de cultivar as plantas medicinais em seus quintais e jardins, como também adquirem esses objetos terapêuticos dos quintais de vizinhos, amigos, e até em lugares, como o brejo perto de onde moram. Em relação ao preparo, todos se referiram ao chá por decocção.

4 Foi possível verificar que os entrevistados criam suas próprias táticas, como foi verificado em dos entrevistados que para aliviar sua falta de ar fazia uso tanto da inalação no posto de saúde, quanto do preparado de um complexo feito em sua casa composto por: eucalipto, feijão andu, hortelã e gengibre. Certeau (2008) diria se tratar de uma criatividade dispersa, tática e bricoladora. Essas práticas de medicação são técnicas de produção sóciocultural. Talvez para um profissional de saúde a inalação do preparado caseiro de gengibre não seja adequada, visto que o broncodilatador inalado é o mais correto cientificamente, no entanto, essa associação em pé de igualdade tenha significado para aquele que a realiza. Essas práticas de medicação, esses arremates com as plantas medicinais ocorrem na maioria de modo silencioso, em trilhas ilegíveis. São táticas ou engenhosidades do fraco para tirar do forte. Até o início do século XX, as plantas medicinais eram o principal recurso terapêutico e com legitimação das sociedades científicas desse período histórico, o que não se configura na contemporaneidade. Porém, os homens idosos fazem uso desses artefatos para tratar gripes, resfriados, como também congestão, machucados, dor de cabeça, dor no estômago, e são adjuvantes no combate ao diabetes e hipertensão. Para eles as plantas são diferentes dos remédios do posto, pois demoram mais para fazer efeito e só servem como auxílio no tratamento prescrito pelo médico. Um dos entrevistados relatou: [..] a planta vai tentando, às vezes ajuda alguma coisa... e se me falarem que faz bem, eu tomo; se falar que é bom, eu tomo (E.9). As plantas medicinais podem ser consideradas pelos homens idosos como recursos terapêuticos complementares, visto que o tratamento com os medicamentos industrializados parecem não sofrer muitas interferências. Em alguns casos, o uso de plantas medicinais assume o protagonismo da terapêutica, como o tratamento de males menores, dentre eles, chás para gripes e resfriados. Assim, as concepções de eficácia sobre as plantas medicinais podem assim ser resumidas: fazem algum bem, ou simplesmente atuam como placebo. Todavia, essa concepção de aparente inocuidade, parece desconsiderar as reações adversas e os efeitos tóxicos decorrentes do uso de plantas medicinais. E além do mais, o uso concomitante desses artefatos com os demais medicamentos, podem acarretar interações medicamentosas, muitas vezes desconhecidas, e interferindo na eficácia do tratamento. Desse modo, corroborando com esta concepção de inocuidade um dos idosos quando perguntado se achava que os chás lhe faziam algum mal respondeu: [...] não não, fazem não. A planta se tomar conforme indicado não faz mal (E.2).

5 Conclusão O uso de plantas medicinais como recurso terapêutico é bastante empregado entre os idosos. Segundo eles, as plantas demoram mais para fazer efeito e só servem como auxílio no tratamento medicamentoso. Em geral, o emprego das plantas medicinais são práticas de automedicação e utilizadas para tratar desordens menores. Agradecimentos Agradecemos aos idosos das Unidades básicas de Saúde pela participação nesta pesquisa e à UEMS pela disponibilização da bolsa de iniciação científica viabilizando a realização deste estudo. Referências Cascaes, E. A.; Falchetti, M. L. & Galato, D Perfil da automedicação em idosos participantes de grupos da terceira idade de uma cidade do sul do Brasil Arquivos Catarinenses de Medicina, v.37, n.1, p Certeau, M A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. 14ª. ed. Petrópolis, RJ: Vozes. Conrad, P The meaning of medications: another look at compliance. Social Science & Medicine, v.20, n.1, p Foucault, M A Arqueologia do saber. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. Guareschi, N.M.F.; Bruschi, M.E. (Orgs.) Psicologia social nos Estudos Culturais. Petrópolis,RJ: Vozes, Hall, S The Work of Representation. In: HALL, Stuart (Org) Representation: cultural representations and signifying practices. London: Sage. Jovchelovitch, S. & Bauer, M.W Entrevista narrativa. In: Bauer, M.W. & Gaskell, G (Ed). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, p Silva, F. L. A.; Oliveira, R. A. G. & Araújo, E. C Uso de plantas medicinais pelos idosos em uma Estratégia Saúde da Família. Revista de Enfermagem da UFPE On Line, v. 2, n.1, p Veiga Junior, V. F Estudo do consumo de plantas medicinais na Região Centro-Norte do Estado do Rio de Janeiro: aceitação pelos profissionais de saúde e modo de uso pela população. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 18, n.2, p