A oficina contou com 26 participantes, representando 11 diferentes entidades da sociedade civil local.

Transcrição

1 Relatoria da Oficina de Praia Grande 12 de junho de 2012 A Oficina Desafios para o Desenvolvimento Sustentável de Praia Grande, realizada no dia 12 de julho de 2012, na Associação Comercial de Praia Grande, faz parte de um processo de escuta comunitária do Projeto Litoral Sustentável Desenvolvimento com Inclusão Social, realizado pelo Instituto Pólis, em convênio com a Petrobras. A oficina contou com 26 participantes, representando 11 diferentes entidades da sociedade civil local. As questões propostas para a discussão foram: 1) fragilidades e potencialidades do município; 2) perspectivas de desenvolvimento sustentável, tendo em vista os empreendimentos em curso no litoral paulista, entre eles, a ampliação do Porto de Santos e as operações da Petrobras em torno do pré-sal. A discussão abrangeu os pontos descritos abaixo de forma sintética. Percepção do município e visão de sustentabilidade: O sistema de transporte foi apontado como um dos problemas principais do município, prejudicando a mobilidade urbana e regional de seus habitantes: Se você hoje você for para Santos, pegando o ônibus, chegaria mais rápido em São Paulo do que à Ponta da Praia (demora-se 1h50 aproximadamente). Críticas foram endereçadas à insuficiência de oportunidades de qualificação profissional e de equipamentos culturais na cidade, sobretudo os voltados para os jovens: Oportunidades? Quem é da Praia Grande tem que sair para outras cidades. Não tem um curso gratuito de capacitação, curso técnico. Se não tiver uma estrutura boa, muitos tendem a ir pra outros campos, para as drogas.... O jovem está sem nada na Praia Grande. Não tem um teatro, um cinema, nada. A vida dos jovens? Uma porcaria, porque falta qualificação e oportunidades. Violência e uso de drogas foram citados pelos participantes da oficina pública como questões preocupantes, que têm assumido maior destaque em Praia Grande, nos últimos anos: Violência está complicada na Praia Grande. A questão do crack tá demais. É assustador, existe criança com dez, onze anos de idade na boca de fumo, vendendo a droga. Poder público Um grande número de críticas relacionadas ao poder político local foi tecido durante a oficina. Foram mencionadas as relações próximas do terceiro setor com políticos locais, o coronelismo como característica importante da vida política municipal e a predominância de interesses privados no trato da gestão pública: Rua Araújo, 124, Centro 1 CEP São Paulo SP Brasil Tel.: Fax:

2 Terceiro setor da cidade também é muito ligado a um politico, a um vereador, a uma personalidade da cidade. Praia Grande é uma cidade localizada nas proximidades de uma das maiores cidade do mundo e ainda tem coronel. Quem pensa a cidade? O poder local daquela época é o mesmo poder de agora. Quem mandava em 1970 são os mesmos que mandam hoje. De que forma ele pensou? Em uma forma de ganhar dividendos mais à frente. A cidade era encarada como uma cidade turística de farofeiros. Quem manda nessa cidade pensa muito na cidade para essa parcela privilegiada. Com certeza eles sabem o que vai ser da cidade no futuro. (...) o que percebemos é que a classe dominante, que controla o poder político, trata o potencial de desenvolvimento baseado na exclusão social. Esses empreendimentos, como o Parque da Mônica ou o aeroporto, são feitos para que uma minoria possa obter lucro, não são pensados para a manutenção da cidade. Faltam ações culturais para que haja uma mudança no paradigma, na cabeça das pessoas. Todos os empreendimentos não levam em consideração o ecossistema, levam em consideração apenas o lucro imediato. Educação e capacitação Junto a essas avaliações, defendem maior investimento em educação e em formação política da população como meio de induzir a participação crítica, a organização e o controle social sobre a gestão pública: Tem que reeducar politicamente a população. Aqui, infelizmente, ainda existe isso, a pessoa não põe a cara a tapa. Mudar a cultura da população. Fazer a população ser opinante, ser pensante. Ao mesmo tempo que é uma fragilidade, que hoje não funciona, é uma potencialidade, ou seja, com um trabalho de reeducação política, há muita possibilidade de consolidar uma cultura de organização popular que busque mudanças pra região. Emprego e oportunidades Menciona-se que o comércio e a Prefeitura são os principais empregadores do município. O pré-sal é visto como um potencial de geração de empregos futuros, mas, ao mesmo tempo, se reconhece a necessidade de investir na qualificação profissional da população local: Nós aqui só temos o comércio. É só isso que sobrou, ou a Prefeitura são os dois suportes de emprego no município. Hoje, com esse pré-sal, o desenvolvimento vai ser muito maior. Então, a gente tem que saber aproveitar isso aí, e os prefeitos de cada região devem dar um incentivo para formação e qualificação profissional da população. Sem qualificação, o progresso pode vir, mas vai acabar sendo aproveitado por outras pessoas que vêm de fora. Muitas pessoas de várias cidades têm vindo pra cá, por causa do emprego, por causa do pré-sal. Estamos condicionados a esse desenvolvimento de lucro imediato sem nos preocupar com as próximas gerações. Crescimento urbano Com a nova dinâmica regional, Praia Grande absorveria parte da demanda por moradia das populações dos municípios vizinhos (como Santos), onde o preço dos imóveis seria mais caro, experimentando assim um crescimento desordenado: Sobre as relações com outros municípios, vemos que está acontecendo o mesmo crescimento desordenado. Eles vêm morar na Praia Grande e vêm morar na zona 3. Moram aqui, mas trabalham em outras cidades. Na verdade, observa-se um esvaziamento de Santos por causa da renda, e Praia Grande se torna uma cidade que absorve essa demanda. Percebemos que o desenvolvimento da Baixada Santista não é com inclusão, mas com exclusão social. Tendo em vista que não há investimento para o inverso, para quem reside na região. Turismo 2

3 O turismo é visto como fonte de contradição na cidade. Os moradores se ressentem do fato de as ações e os investimentos do Poder Público sestarem focados mais nas demandas da população flutuante do que naquelas da população residente. Ao mesmo tempo, maiores investimentos são desejados no turismo para que o município possa atrair turistas que se hospedem por mais tempo: As ações são focadas no bem-estar dos turistas, não para a população local. Não há obras de infraestrutura como há ações para a população flutuante. O turista foi atraído pelo mar e pela cidade, que foi maquiada. Para a população de baixa renda, resta a luta por coisas básicas. Nosso destino é nos organizarmos, é ter informação que a gente não tem (...). Aqui, deveria haver investimentos que atraiam o turismo para cá, não apenas o morador de São Paulo, que vem no final de semana, consome e volta. Ocupação do território e urbanização Por fim, mas não menos importante, são as diversas menções feitas ao processo de urbanização de Praia Grande, que seria fundado nos interesses do mercado imobiliário. Dividida em três zonas, a cidade teria uma clara divisão socioespacial. Parte do território seria tida como reserva de mercado : Deveria ser feito um mapeamento da Zona C, do que está e do que não está regularizado. A Prefeitura só está preocupada com a malha rodoviária, enquanto a Zona 3, Zona C, é deixada de lado. A Zona 1 é cuidada para os turistas, a Zona 2 serve de divisão entre os ricos e pobres. Embora a maior parte da população more na Zona 3, os equipamentos públicos ficam todos na Zona 1. A terceira zona está jogada. Agora que estão fazendo uma coisinha... época de eleição, né?. A maior demanda da cidade é a construção civil. Nas reuniões, as construtoras tão tomando conta. *Relato dos Grupos de Debate: Grupo 1: Fragilidades e potencialidades do município 1) Fragilidades Habitação Quem consegue morar na Ponta da Praia são só os engenheiros. [referem-se à diferença de preços entre as zonas da cidade: Ponta da Praia seria área nobre]. O Governo Municipal fechou a Secretaria de Habitação. Eles não têm um espaço que receba a comunidade para falar de moradia. A interlocução hoje é com a Secretaria de Obras. Ficou mais difícil, pois não tem um secretário que trate exclusivamente de habitação. Tem menos tempo para atender às famílias, para falar de moradia, porque eles também têm que dividir o tempo com outras coisas para fazer. Falta de planejamento da urbanização Estimula/facilita a ocupação confusa e desordenada do território. Quando fizeram a terceira zona, construíram bairros sem saída. Fizeram um viaduto, tinha que passar ônibus. Já é a terceira vez que tem de reformar tudo. Questão relacionada às pessoas com deficiência Pautou-se a necessidade de um planejamento que ultrapasse a questão da acessibilidade pura e simplesmente; que Rua Araújo, 124, Centro 3 CEP São Paulo SP Brasil Tel.: Fax:

4 abrangesse uma inclusão total. Exemplo: qualificação profissional, formação/educação especial. Vim de um lugar onde o portador era mais respeitado [em Varginha]. Aqui você não vê portadores. Parece até que são escondidos pelas famílias. A gente queria que o Poder Público desse mais atenção à questão da inclusão aqui. Por que, na verdade, não funciona. Com 40, 50 alunos em sala de aula, como as professoras vão olhar só pra mim. Não tem como fazer isso. Saúde Sempre está faltando algo. Educação Há uma carência, em Praia Grande, de equipamentos de educação que tragam possibilidades de enriquecimento da experiência profissional e de vida do jovem. Perspectiva pro jovem tem que ser buscada lá fora, Santos, São Paulo. Essa coisa da progressão contínua é muito complicada, porque você realmente se depara com meninos, no ensino médio, que mal escrevem. Trabalhar qualificação profissional dentro das próprias escolas estaduais. O jovem de Praia Grande não conhece a cidade, ele conhece seu bairro, ele não sai dali. É preciso criar coisas que façam com que ele crie raízes em sua cidade. É cada um por si, Deus por todos". Segurança pública drogas Violência está complicada na Praia Grande. Drogas A questão do crack tá demais. É assustador, existe criança com dez, onze anos de idade na boca de fumo, vendendo a droga. Seria também uma questão de prevenção. Poderia ser feito muito mais coisas pelo Poder Público. O tráfico de drogas aqui, hoje, é o quarto setor. Ele é organizado, tem dinheiro e tem poder. Chega o traficante, dá uma cesta básica, um barraquinho para mãe do garoto. Cumpre o papel do Estado! Assim, o Poder Público tem que ter muitas outras ações para dar conta dessa questão. É preciso uma política social sobre isso. Falta de participação popular Hoje, eu cheguei abismada [com o número de presentes na oficina]. Mas isso é algo que é parte da dinâmica da cidade, as pessoas não participam. Não sei se é porque as pessoas não têm amor pela cidade ou é a questão de ser uma cidade-dormitório. E quando chega o fim de semana, ele também não fica aqui. Então, ele não vai à praia, ele não participa, porque ele não vive a cidade [Segundo os relatos, até existem alguns espaços sendo articulados pela sociedade civil, mas a população não tem uma cultura de ocupar esses espaços de maneira participativa.]. A dificuldade é movimentar essa massa para participar. Mas eu creio, também, que se tivesse criação e renda... [indicando que essa questão seria diferente]. Nas associações de bairro, os caras vão lá e colocam alguém do prefeito. Mudar a cultura da população. Fazer a população ser opinante, ser pensante. Cidade nova Eu vejo que o grande potencial da cidade é que ela é nova. Por isso, tem muito ainda a crescer, a oferecer, a expandir. Por isso também, por outro lado, ela cresceu e se desenvolveu já tão rápido. A gente tem jeito de crescer, porque Santos não tem mais espaço, e nós temos uma área ainda. E Praia Grande é a cidade que mais cresce do país. 4

5 Turismo Não adianta, é pequeno. É só de veraneio. Enquanto for Estância Balneária não pode trazer grandes empresas pra cá. [Os moradores querem grandes empresas, indústrias não poluentes, mas principalmente cooperativas populares, para geração de renda.] Artesanato Aqui, em Praia Grande, tem muitos artesãos de mão cheia, mas aqui não tem espaço para esses artesãos. Eles vão pra Santos [Seria preciso, segundo os participantes do grupo, criar um espaço adequado para o desenvolvimento dessa atividade.] Tem toda essa coisa da cultura caiçara também. Isso não é explorado. Grupo 2: Perspectivas de desenvolvimento sustentável Questões que devem ser consideradas para alavancar o processo de desenvolvimento. Problemas urbanísticos Problema fundiário, como em Santos. As pessoas não conseguem mais viver em seus bairros de origem e têm que se realocar para bairros com menos equipamentos públicos. São ignoradas leis como o Estatuto da Cidade e a lei de ocupação e uso do solo que, quando é utilizada, serve apenas para a especulação fundiária. Áreas da segunda zona não têm regularização fundiária; a Prefeitura tem em vista outros fins que não a moradia para a região. Isso acaba pressionando os moradores a irem para a terceira zona e para os mangues. Mobilidade urbana Uma grande potencialidade da região metropolitana, para mobilidade e outros fins, seria o transporte ferroviário, pois já há uma malha na região que não é utilizada. O transporte ferroviário também tem como vantagem o fato de ser mais limpo que o rodoviário. Imaginam se pode ser possível a implementação de um rodízio regional; não se vai da Praia Grande a Santos em menos de uma hora e meia. Planejamento A cidade não se preparou para a realidade que enfrenta hoje. Para se preparar, seria necessário mais 20 anos. Já deveríamos ter pensado nisso [todos os problemas do município] lá atrás, para hoje estarmos usufruindo. Então, devemos pensar hoje, para que possamos usufruir em 20 anos. Educação e qualificação profissional Não há equipamentos de educação; as pessoas têm que ir para outras cidades em busca disso. É uma potencialidade também. Sem qualificação, o progresso pode vir, mas vai acabar sendo aproveitado por outras pessoas que vêm de fora. Política local e desenvolvimento excludente Foi resolvido o desenvolvimento na primeira zona, o que trouxe retorno econômico pra cidade. A segunda zona é preferencial para quem não pode morar na primeira. Quem não Rua Araújo, 124, Centro 5 CEP São Paulo SP Brasil Tel.: Fax:

6 tinha condições nenhuma, ia para a terceira zona. Hoje, se pensa que não pode mexer na segunda, pois é a carta na manga. Em 2006, foram feitas as ZEIS, mas não foram regulamentadas. Conseguimos o Plano Municipal de Habitação. Se ele é ruim, não sei, não conseguimos discutir da forma que gostaríamos. O Plano Diretor também. Não temos perna para fazer isso. As pessoas, as entidades estão muito atreladas ao Poder Público. Se não viesse o Minha Casa, Minha Vida, o movimento de moradia teria construído mais casas que a Prefeitura. Quem manda, nessa cidade, pensa muito a cidade para essa parcela privilegiada. Com certeza eles sabem o que vai ser da cidade no futuro. Outra potencialidade são as ciclovias. Mesmo existindo muitos usuários do serviço, não há investimentos para a expansão da ciclovia. Corremos atrás de um terreno, fizemos tudo e não conseguimos. Temos problema de esgoto. Para resolver, 600 mil reais. Estamos correndo para negociar, para fazer uma parceria. Nós precisamos de parceria. Quem é parceira na Praia Grande? Não tem. Soubemos que tem muito terreno na Praia Grande (...). A Prefeitura está colocando conjuntos habitacionais na entrada, para esconder o que tem atrás, de forma parecida com o que o Maluf fez em São Paulo. Os principais espaços públicos ficaram formados na Zona 1, que não é constituído pela população da Praia Grande. Se a Prefeitura se voltasse para a Zona 3, o setor privado iria também para a Zona 3. Os relatórios de impacto do meio ambiente são comprados. Sobre as relações com outros municípios, vemos que está acontecendo o mesmo crescimento desordenado. Eles vêm morar na Praia Grande e vêm morar na Zona 3. Moram aqui, mas trabalham em outras cidades. 6