DESEMPENHO DO SISTEMA DE LAGOAS DE ESTABILIZAÇÃO DE MARACANAÚ

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1 DESEMPENHO DO SISTEMA DE LAGOAS DE ESTABILIZAÇÃO DE MARACANAÚ Salomão Anselmo Silva (1) Engenheiro Civil e Mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Paraíba. Ph.D em Engenharia Civil pela Universidade de Dundee, Escócia. Professor Titular da Universidade Federal da Paraíba, Campus II. Chefe de Pesquisas da EXTRABES. Fernando J. A. da Silva Engenheiro Civil pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Mestre em Engenharia Civil, área de Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Federal da Paraíba. Professor Assistente do Centro de Ciências Tecnológicas da UNIFOR. Doutorando em Engenharia Civil pela Universidade de Leeds, Inglaterra. Bolsista do CNPq. Endereço (1) : Rua Monsenhor João Luís Santiago, Fortaleza - CE - CEP: Brasil - Tel: (085) Fax: (085) camila@feq.unifor.br RESUMO O Município de Maracanaú, Região Metropolitana de Fortaleza - RMF, possui um dos maiores sistemas de lagoas de estabilização da América do Sul, com cerca de 74 ha de espelho d água. O sistema trata esgotos de pelo menos 40 indústrias e sete conjuntos habitacionais. Durante um período de 13 meses foi verificada a performance da série de lagoas, na remoção de matéria orgânica, nutrientes e coliformes fecais. A remoção total de DBO e DQO foram, respectivamente de 94 e 85%. A concentração final de amônia foi de 1,55 mg N/L (95% de remoção) e a de fósforo total de 3,85 mg P/L. A remoção total de CF foi de 6 log s, sendo que as lagoas de maturação secundária e terciária apresentaram a mesma concentração. A biomassa de algas representou de 43 a 61% da DBO nas lagoas, tendo também influenciado significativamente na remoção de amônia. PALAVRAS-CHAVE: Lagoas de Estabilização, Biomassa de Algas, Maracanaú. O MUNICÍPIO DE MARACANAÚ Maracanaú é um dos nove municípios que compõem a Região Metropolitana de Fortaleza, abrigando o mais importante parque industrial do Ceará (IPLANCE, 1995). O município tem uma população de cerca de habitantes, tipicamente operária, apesar da renda per capita ser de US$ (Brandão, 1995). Até 1995, Maracanaú contava com boa estrutura de esgotamento sanitário, e que praticamente todas as unidades residenciais, que faziam parte de conjuntos habitacionais e indústrias dispunham de rede de coleta e estação tratamento de esgotos (CAGECE, 1996; Carvalho, 1997). ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 621

2 O SISTEMA INTEGRADO DE TRATAMENTO DE ESGOTOS DOMÉSTICOS E INDUSTRIAIS DE MARACANAÚ - SIDI Em operação desde setembro de 1992, o SIDI ( S, O, 48 m acima do nível do mar) trata os esgotos de sete conjuntos habitacionais e de pelo menos 40 indústrias, das quais se destacam as do setor têxtil. Durante o estudo o SIDI operava com uma vazão média de 116,4 l/s ( m 3 /dia). A série é composta por cinco lagoas, sendo a primeira anaeróbia (LA), seguida de uma facultativa secundária (LFS) e três de maturação (primária - LMP, secundária - LMS e terciária LMT). A Figura 1 mostra o diagrama de fluxo do SIDI, e as características físicas estão na Tabela 1. Figura 1 - Esquema de representação da série de lagoas de Maracanaú. Afluente LA LFS LMP LMS LMT Efluente Rio Maranguapinho Tabela 1 - Características físicas das lagoas do Distrito Industrial de Maracanaú. Lagoa Dimensões (m) Área (ha) Volume (m 3 ) Profundidade (m) LA 30 x , LFS 190 x , LMP 158 x , LMS 158 x , LMT 158 x , Total ,277,605 - METODOLOGIA O trabalho teve duração de 13 meses (junho/ junho/1998), com coleta semanal de amostras de esgoto bruto composto (efluentes doméstico e industrial - EBC) e efluentes das lagoas (LA - LMT). As amostras foram coletadas às 9 horas da manhã, preservadas em gelo e analisadas nos mesmo dia no laboratório da Divisão de Análises e Pesquisas - DIAPE da Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE. De acordo com os procedimentos analíticos descritos em APHA (1992) foram determinados os seguintes parâmetros: temperatura, ph, oxigênio dissolvido (O.D.), demanda bioquímica de ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 622

3 oxigênio (bruta e filtrada - DBO e DBOf), demanda química de oxigênio (bruta e filtrada - DQO e DQOf), sólidos suspensos (SS), fósforo total, nitrogênio amoniacal e coliformes fecais (CF). As determinações de clorofila a foram feitas de acordo com Jones (1979), com extração de pigmento em metanol a 90%. As vazões foram determinadas com base nas leituras dos horímetros dos conjuntos motorbomba das estações elevatórias, que recalcavam esgoto bruto afluente ao sistema. As leituras foram mensais, antes da coleta das amostras. RESULTADOS E DISCUSSÃO O sistema operou com um tempo de detenção hidráulica de cerca de 127 dias.. Não houve variações relevantes ao longo do período de estudo, independentemente do ciclo climatólógico da região. Os resultados ajustaram-se a uma distribuição normal (limite de 95%), estando as médias dos parâmetros investigados contidos na Tabela 2. Tabela 2 - Resultados da monitorização da série de lagoas de Maracanaú - SIDI. Parâmetro EBC LA LFS LMP LMS LMT Remoção (%) Temperatura ( C) 31,7 29,3 28,8 28,1 28,4 28,0 - ph (unidades) 8,76 7,98 8,32 8,37 8,54 8,96 - Oxigênio dissolvido - 0,0 4,1 5,5 6,0 7,2 - (mg/l) DBO (mg/l) DBOf (mg/l) DQO (mg/l) DQOf (mg/l) SS (mg/l) Fósforo total (mg P/L) 6,44 6,13 6,26 6,09 5,10 3,85 40 Amônia (mg N/L) 32,49 51,82 16,31 7,24 1,92 1,55 95 Clorofila a (m g/l) Coliformes fecais (células/100 ml) 1,9E7 8,3E6 1,2E5 2,8E2 3,3E1 3,6E1 99,99998 (6 log s) O EBC apresentou características semelhantes às de esgoto doméstico, porém com ph alcalino (8,76 unidades), resultante da contribuição das indústrias. Provavelmente, isto explica porque a remoção de DBO na LA (60%) foi um pouco inferior àquelas relatadas por Silva et al. (1996) (em torno de 70%) estudando lagoas anaeróbias na região. No entanto, deve ser salientado que cerca de 2/3 de todo o conteúdo orgânico (DBO, DQO e SS) foi removido neste reator. As demais lagoas tiveram taxas de remoção de DBO e DQO decrescentes, característica de séries de lagoas. A presença de biomassa de algas proporcionou crescimento na concentração de SS. Os resultados dos parâmetros relativos a matéria orgânica ao longo da série estão representados no gráfico da Figura 2. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 623

4 Figura 2 - Decaimento de matéria orgânica (DBO, DQO e SS) ao longo do SIDI. Concentração (mg/l) DBO (mg/l) 800 SS (mg/l) 600 DQO (mg/l) EBC LA LFS LMP LMS LMT Lagoas A biomassa de algas exerceu uma DBO de 4 mg/l para cada 100 µg/l de clorofila a. Este resultados pode ser verificado na Figura 3, que mostra a correlação entre as concentrações de clorofila a e a DBO particulada (DBOp = DBO - DBOf). Por sua vez, as concentrações de SS representaram cerca de 23 mg/l de DBOp para cada 100 mg/l de SS. Isto, aplicado ao sistema como um todo. Figura 3 - Relação entre biomassa de algas e DBOp nas lagoas do SIDI. 45 DBOp (mg/l) DBOp= 0,0411Cla "a" - 0, R 2 = 0, Cla "a" (microgramas/l) A remoção de nitrogênio amoniacal foi bastante elevada. A combinação de parâmetros como ph e tempo de detenção hidráulica, conforme relatado por Soares et al. (1996), governaram o processo de remoção. No entanto, isto foi verificado mais evidentemente na relação com a biomassa de algas (Figura 4). Figura 4 - Relação entre a biomassa de algas e a taxa de remoção de amônia. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 624

5 Remoção de amônia (Kg/ha/d Rem. amônia = 0,0264 Cla "a" - 8,0097 R 2 = 0, Cla "a" (microgramas/l) As concentrações de fósforo total no EBC e nos efluentes das três primeiras lagoas foram praticamente as mesmas (em torno de 6,23 mg P/L), havendo remoção nas duas últimas lagoas (LMS e LMT). Isto esteve de acordo com o que relatam Silva et al. (1996), pois o ph elevado (em geral 9,0) possibilita a remoção de fósforo em lagoas de maturação por precipitação na forma insolúvel. A lagoa anaeróbia apresentou crescimento de cerca de 59% na concentração de amônia devido ao processo de amonificação que ocorre com a parcela de nitrogênio orgânico, sendo removido nas lagoas seguintes. Os resultados estão representados no gráfico da Figura 5. Figura 5 - Variações de fósforo total e amônia ao longo da série de lagoas Concentração Fósforo total (mg P/L) N. amoniacal (mg N/L) EBC LA LFS LMP LMS LMT Lagoas A remoção de coliformes fecais foi de um e dois log s na LA e LFS, respectivamente. Na LMP a contagem média de CF foi inferior a 5.000/ 100 ml - NMP e menor que 100 nas duas últimas. Estes resultados são semelhantes aos de Carvalho (1987), que utilizou coliformes totais como parâmetro. Isto sugere que praticamente todos os coliformes presentes nas lagoas são do grupo fecal, indicando também a remoção de outras bactérias do grupo que não sejam fecais. Os resultados de O.D. e ph mostraram o bom funcionamento das lagoas (LFS a LMT), com ambiente propício à remoção de patógenos. Os coeficientes de remoção de coliformes fecais (Kb) variaram de 0,10 d -1 na LA a 17,19 d -1 na LMP. Os resultados sugerem que os fatores intervenientes para a remoção de CF não podem ser explicados pelo modelo de Marais (1974), que propõe que a remoção de coliformes segue um modelo de cinética de primeira ordem em reator com mistura completa. O gráfico da Figura 6 mostra o comportamento destes parâmetros na série. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 625

6 Figura 6 - Variações de ph, O.D. e coliformes fecais ao longo da série de lagoas. log 1,00E+08 1,00E+06 1,00E+04 1,00E+02 1,00E+00 CONCLUSÕES EBC LA LFS LMP LMS LMT Lagoas 10,00 A série de lagoas do SIDI apresentou excelentes resultados, com desempenho favorecido por grandes tempos de detenção hidráulica. O EBC está prejudicando o desempenho da lagoa anaeróbia por seu ph elevado. O sistema se encontra em estado transiente, com vazão de operação de cerca de 22% da vazão final prevista no projeto (520 l/s). Os efluentes das lagoas de maturação (LMP - LMT) podem ser aproveitados para irrigação irrestrita, uma vez que CF< 1.000/100 ml. A biomassa de algas exerceu uma DBO de 4 mg/l para cada 100 µg/l de clorofila a. Também esta (Cla a 300 µg/l) esteve fortemente correlacionada com as taxas de remoção de nitrogênio amoniacal. 8,00 6,00 4,00 2,00 0,00 ph e O.D. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. APHA (1992). Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. 18 th edition. American Public Health Association. Washington, DC. 2. BRANDÃO, R. L. (1995). Diagnóstico Geoambiental e os Principais Problemas de Ocupação do Meio Físico da Região Metropolitana de Fortaleza. Projeto SINFOR. Fortaleza: CPRM. 3. CAGECE (1996). Relatório de Avaliação Preliminar do Desempenho do Sistema de Lagoas de Estabilização do Distrito Industrial - SIDI e Perspectivas de Reuso do Efluente. Companhia de Água e Esgoto do Ceará. Fortaleza, Ceará. 4. CARVALHO, M. E. (1997). Avaliação do Desempenho das Lagoas de Estabilização do Sistema Integrado do Distrito Industrial (SIDI) de Maracanaú-CE, Tratando Água Residuária Composta (Doméstica e Industrial). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Ceará. 86p. 5. IPLANCE (1995). Atlas do Estado do Ceará. Fundação Instituto de Planejamento do Ceará. Fortaleza. 6. JONES, J. G. (1979). A guide to methods for estimating microbial numbers and biomass in freshwater. Ambleside: Freshwater Biological Association-Scientific Publication (39). 7. MARAIS, G. V. R. (1974). Faecal bacterial kinetics in stabilizaton ponds. Journal of the Environmental Division, ASCE, 100 (EE1), SILVA, S. A., DE OLIVEIRA, R. AND MARA, D. D. (1996). Performance of Waste Stabilization Ponds in Northeast Brazil. Research Monograph number 9. University of Leeds. UK. 9. SOARES, J., SILVA, S. A., DE OLIVEIRA, R., ARAÚJO, A. L. C., MARA, D. D. AND PEARSON, H. W. (1996). Ammonia removal in a pilot-scale WSP complex in Northeast Brazil. Wat. Sci. Tech. 33 (7), ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 626