COMISSÃO PERMANENTE DE DIREITO DO TRABALHO

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1 lnst1tuto DOS ADVOGADOS BRAS\lE\ROS COMISSÃO PERMANENTE DE DIREITO DO TRABALHO REF: INDICAÇÃO N. 201/2011 EMENTA: PROJETO DE LEI DO SENADO N. 524/2011. ALTERA A LEI Nº 8.036, DE 8 DE MAIO DE 1990, PARA DISPOR SOBRE A MULTA INCIDENTE SOBRE O MONTANTE DE TODOS OS DEPÓSITOS REALIZADOS NA CONTA VINCULADA DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERViÇO (FGTS) DURANTE A VIGÊNCIA DO CONTRATO DE TRABALHO, NA HIPÓTESE DE TRATAR-SE DE MULHER "CHEFE DE FAMíLIA". INCONSTITUCIONALlDADE. PRINCIPIO DA ISONOMIA. PARECER PELA REJEiÇÃO DO PROJETO DE LEI. RELATÓRIO A indicação 201/2011 se refere ao Projeto de Lei apresentado pela senadora Ana Rita Esgário (PT/ES), que acresce o 4º ao art. 18 da Lei nº 8.036/90 (dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS) para dispor que será elevado em 10% (dez por cento) o percentual disposto no 1º do mencionado art. 18, somente na hipótese de tratar-se de trabalhadora "chefe de família" que percebia até 3 (três) salários mínimos por ocasião da demissão sem justa causa. Dispõe o art. 18 da Lei 8.036/90: "Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais. (Redação dada pela Lei nº 9.491, de 1997) 1º Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros. (Redação dada pela Lei nº 9.491, de 1997). 1

2 3 As importâncias de que trata este artigo deverão constar da documentação comprobatória do recolhimento dos valores devidos a título de rescisão do contrato de trabalho, observado o disposto no art. 477 da CLr, eximindo o empregador, exclusivamente, quanto aos valores discriminados. (Redação dada pela Lei nº 9.491, de 1997)". Alteração proposta pelo Projeto de Lei: "Art. 1º O Art. 18, da lei nº de 8 de maio de 1990, passará vigorar acrescido do seguinte parágrafo 4º: a "Art.18º. 4º eleve-se em dez por cento o percentual disposto no 1º, na hipótese de tratar-se de trabalhadora chefe de família, que percebia até 3 salários mínimos por ocasião da demissão sem justa causa." (NR) Art. 2º Esta lei entrará em vigor depois de transcorridos 60 dias da data de sua publicação." A nobre senadora Ana Rita, em sua justificação, argumenta, em síntese, que a proposição "... vem oferecer uma proteção ainda maior para as mulheres chefes de família. Garantir que tenham reduzidas as chances de serem demitidas sem justa causa, pois hoje elas são as mais vulneráveis." Para elaborar o projeto, a senadora se baseou em dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que apontam a desigualdade de gêneros no mercado de trabalho. O estudo demonstrou que o desemprego entre mulheres é superior, quando comparado ao índice dos homens. Cerca de 20% das mulheres estão fora do mercado de trabalho contra 10,2% dos homens. Mesmo tendo mais anos de estudo, as mulheres enfrentam maiores dificuldades para conseguir trabalho. Ademais, de acordo com o estudo, aproximadamente 23,5% das mulheres em atividade ganham menos de dois terços do rendimento mediano real. Entre os homens, esse percentual cai para 15,5%. Outro problema observado foi a quantidade de mulheres no mercado informal de trabalho: apenas 46,7% delas estão em alguma atividade formal. Por outro lado, o número de mulheres à frente das responsabilidades familiares aumentou quase 10% na última década: entre 2000 e 2010 o número de famílias chefiadas por mulheres passou de 25,9% para 35%. Assim, de acordo com a senadora " Somadas às atribuições de chefe da casa, a mulher também acumulou, ao longo dos anos, uma 2

3 Por fim, consigna pesquisa realizada pela Regus que constatou a preferência das empresas em contratar mulheres sem filhos. Segundo a ilustre senadora, tal fato tem como fundamento (i) a preocupação dos empregadores com a possibilidade de elas tirarem licença-maternidade para dar à luz a outro filho, e (ii) de estarem desatualizadas profissionalmente em decorrência da dedicação à família. PARECER o mencionado projeto dispõe sobre uma maior proteção da trabalhadora dita "chefe de família" contra a dispensa arbitrária e, portanto, tem motivo nobre e relevância econômico/social. É questão que provavelmente terá, se aprovada a alteração da lei, repercussão junto à sociedade civil, interessando aos trabalhadores, empregadores e Governos. 1. Da Constitucionalidade Todavia, de plano a proposição afronta o princípio constitucional da isonomia e estimula discriminação entre homens e mulheres, colidindo com os arts. 3º, IV e Sº, I da Constituição Federal de 1988, verbis: "Art. 3 Q Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação." "Art. SQ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;... /1 3

4 .,f~v /~~~~ ~'l~~~~o 4~9:J~-~~ ~., t ;;' \..;':;,' \ ;,;,) Nãohá estudos científicosque alberguema ideia trali!~;:f/!!l:?0i1' ft:; :,:::: 9 no projeto, que a trabalhadora que recebe até 3 salários mínimos tenha uma situação' ''';'~ i;':,<... diferente do homem trabalhador, arrimo de família, com o mesmo nível salarial. Ao contrário, dados recentes do IBGE mostram que mais de 60% dos chefes de família no Brasil (ainda) são homens. Assim não há comprovação sociológica que embase uma afirmação de desigualdade. Apenas os desiguais podem ser tratados desigualmente, sem ofensa ao princípio da Isonomia. 2. Do mérito Se por um lado as informações levantadas nas pesquisas apresentadas pela ilustre senadora concluem que a contratação de mulheres é preterida pela de homens, por outro lado não há dados estatísticos de que a aplicação de maiores penalidades para a demissão arbitrária de mulheres irá aumentar a contratação das mesmas. Na verdade, poderá ocorrer justamente o oposto. Quanto mais empecilhos o legislador imputar à contratação de trabalhadoras, maior poderá ser a procura por trabalhadores homens. Outras soluções podem ser encontradas pelo legislador para reduzir a desproporcional idade entre a contratação de homens e mulheres no mercado de trabalho, criando-se, por exemplo, incentivos tais como redução da alíquota do imposto de renda ou outro benefício de ordem previdenciária. Creio que medidas que aumentem o custo do empregador para a dispensa de trabalhadores, só fazem aumentar o custo da contratação, que econômico-financeiramente é repassado para os preços de produtos e serviços. penalização, demonstram Medidas de incentivo são mais efetivas que as de a experiência e o bom senso. CONCLUSÃO Pelas razões expostas, entendo que o Projeto de Lei do Senado n. 524/2011 é inconstitucional por afrontar o principio da isonomia, um dos pilares do nosso ordenamento jurídico. No mérito, no meu pensar, tal como apresentado, o projeto estimula a discriminação entre os gêneros no mercado de 4

5 trabalho. Ainda mais, se aprovado, poderá reduzir o número de mulheres, gerando efeito oposto ao espírito que presidiu a elaboração do texto legislativo em comento. Et pour cause, opino pela sua rejeição integral. É o parecer, SMJ. de novembro de 2011 Membro Efetivo do IAB Comissão Permanente de Direito do Trabalho 5