Porto Alegre, 15 de outubro de Orientação Técnica IGAM nº /2018
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1 Porto Alegre, 15 de outubro de Orientação Técnica IGAM nº /2018 I. O Poder Executivo do Município de Capão do Leão, por meio do servidor Crístoni Costa, solicita análise e orientações acerca do projeto de lei nº 38, de 2018, de autoria do próprio Executivo, que tem como ementa: Revoga a Lei 1622 de 2013 e dispõe sobre a regulamentação da concessão de benefícios eventuais no âmbito da Política Municipal de Assistência Social e dá outras providências. II. Preliminarmente, constata-se que a matéria foi objeto de análise por meio das Orientações Técnicas nº , de 29 de maio de 2018, e nº , de 15 de maio de Esta matéria encontra-se inserida nas competências legislativas conferidas aos Municípios, conforme dispõem a Constituição Federal 1 e a Lei Orgânica Municipal 2 quanto à autonomia deste ente federativo para legislar sobre determinados assuntos de interesse local. Da mesma forma, considerando que a proposição versa sobre o funcionamento e a prestação de serviços públicos prestados por órgãos da Administração Pública local, depreende-se legítima a iniciativa do Executivo, também nos termos da Lei Orgânica do Município 3. 1 Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; 2 Art. 7 o Compete ao Município, no exercício de sua autonomia, dispor sobre assuntos de interesse local, cabendo-lhe entre outras, as seguintes atribuições: I organizar-se administrativamente, observadas a legislação federal e estadual; II decretar suas leis, expedir decretos e atos relativos aos assuntos de seu peculiar interesse; (NR) 3 Art São de iniciativa do Prefeito, leis que disponham sobre: (NR) V - criação, atribuições e competências dos Conselhos Municipais.(NR) Art Compete, privativamente, ao Prefeito: VI - dispor sobre a organização e o funcionamento da administração municipal, na forma da lei; X - planejar e promover a execução dos serviços públicos municipais; (grifos nossos) 1
2 III. Feitos esses esclarecimentos preliminares, reitera-se que, sob o ponto de vista material, o objeto do projeto de lei em análise apresenta conformidade com a regulação da matéria, tanto em nível constitucional como infraconstitucional de regulamentação da matéria. Primeiro ponto a ser considerado, de acordo com o art. 1º da Resolução nº 39, de 9 de dezembro de 2010 (D.O.U. 16/12/2010), do Ministério do Desenvolvimento Social MDS/Conselho Nacional de Assistência Social CNAS, determinadas provisões deixaram de ser atendidas pela assistência social e passaram a ser da área da saúde: Art. 1º Afirmar que não são provisões da política de assistência social os itens referentes a órteses e próteses, tais como aparelhos ortopédicos, dentaduras, dentre outros; cadeiras de roda, muletas, óculos e outros itens inerentes à área de saúde, integrantes do conjunto de recursos de tecnologia assistiva ou ajudas técnicas, bem como medicamentos, pagamento de exames médicos, apoio financeiro para tratamento de saúde fora do município, transporte de doentes, leites e dietas de prescrição especial e fraldas descartáveis para pessoas que têm necessidades de uso. (grifou-se) Outrossim, referida Resolução nº 39/2010 (art. 2º), recomenda aos órgãos gestores e Conselhos de Assistência Social da União, Estados e Municípios que reordenem os itens que possam ser providos como benefícios eventuais: Art. 2º Recomendar aos órgãos gestores e Conselhos de Assistência Social das três esferas de governo que promovam e aprimorem o reordenamento da prestação dos benefícios eventuais afiançados na assistência social, referentes às provisões da política de saúde citadas no art. 1º. exame. Esta providência se encontra atendida pelo art. 23 do projeto de lei em Prosseguindo na análise, segundo o art. 203 da Constituição Federal, a assistência social é política pública de natureza não contributiva, isto é, deve ser fornecida a qualquer pessoa que dela necessitar, independentemente de contribuição à previdência social 4. 4 Art A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (grifou-se) I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; 2
3 Benefícios eventuais são aqueles definidos no art. 22 da Lei Federal nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS): Art. 22. Entendem-se por benefícios eventuais as provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Suas e são prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. (Redação dada pela Lei nº , de 2011) 1 o A concessão e o valor dos benefícios de que trata este artigo serão definidos pelos Estados, Distrito Federal e Municípios e previstos nas respectivas leis orçamentárias anuais, com base em critérios e prazos definidos pelos respectivos Conselhos de Assistência Social. (Redação dada pela Lei nº , de 2011) (grifou-se) Referidos benefícios eventuais também constam do Decreto nº 6.307, de 14 de dezembro de 2007, que regulamenta os benefícios descritos no art. 22 da LOAS. Justamente por tal norma não ser autoaplicável, o Município carece de regulamentação própria, razão porque precisa instituí-los por meio de lei: Art. 1 o Benefícios eventuais são provisões suplementares e provisórias, prestadas aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. 2 o A concessão e o valor dos auxílios por natalidade e por morte serão regulados pelos Conselhos de Assistência Social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante critérios e prazos definidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social -CNAS. (grifou-se) Nesse contexto também podem se inserir: auxílio natalidade; concessão de passagens; provisões de alimentação, vestuário, higiene, cama, mesa e banho; documentação civil; fotografias para documentos, entre outros, materializando-se, preferencialmente, na entrega de bens de consumo, destinados a suprir a vulnerabilidade temporária dos beneficiados. IV. Feita a análise material ampla, passa-se aos detalhes que merecem ponderações pontuais. O benefício eventual do auxílio natalidade está corretamente previsto nos arts. 10 e 11 do projeto de lei em exame, com a entrega de bens de consumo ou a prestação de serviços, conforme determinar a situação de vulnerabilidade da mãe e do nascituro. V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. 3
4 Por um lado, a melhor orientação é a de que não se conceda benefícios em espécie (pecúnia) a particulares, tendo em vista a dificuldade ou inviabilidade na prestação de contas, o que afronta as normas de controle dispostas no parágrafo único do art. 70 da Constituição Federal 5, por ser pertinente às normas de controle da Administração Pública. Porém, por outro lado, o art. 4º da Resolução nº 212/2006 do CNAS 6 permite a concessão por essa forma. Neste mesmo sentido, embora se ressalte que o objetivo dos benefícios eventuais seja justamente suprir a falta no momento em que ocorre a situação de vulnerabilidade, não se justifica a possibilidade de concessão em pecúnia ou de ressarcimento de despesas, notadamente porque essas disposições afrontam as regras de execução da despesa pública, relativas ao prévio empenho. Constata-se, entretanto, que permanece o critério do inciso II do art. 6º do projeto de lei em análise, quanto à obrigatoriedade da inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal CadÚnico 7, para ter acesso aos benefícios eventuais no Município apresenta-se como exigência contraditória ao próprio conceito de vulnerabilidade que caracteriza a natureza deste benefício. Quer dizer então que, quem não estiver inscrito(a) no CadÚnico não poderá obter nenhum benefício eventual no Município de Capão do Leão, mesmo se estiver em situação de vulnerabilidade? E tais situações de vulnerabilidade têm hora certa para acontecer ou se caracterizam justamente por sua imprevisibilidade? Sobre o auxílio funeral, é vedado prever formas alternativas de concessão, pois tal deixa ao alvedrio do gestor público decidir a forma de concessão do benefício eventual, ofendendo o princípio da impessoalidade e o da igualdade, que determina sejam todos os iguais tratados igualmente. Assim, está correto prever no art. 13 do projeto de lei em análise que o auxílio funeral será prestado mediante bens de consumo ou prestação de serviço, com custeio do velório e sepultamento, com fornecimento de urna funerária. A aquisição de urnas funerárias e a contratação de serviços funerários pelo Município deverá 5 Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. 6 Art. 4º O benefício eventual, na forma de auxílio-natalidade, constitui-se em uma prestação temporária, não contributiva da assistência social, em pecúnia ou em bens de consumo, para reduzir vulnerabilidade provocada por nascimento de membro da família. (grifou-se) 7 Decreto nº 6.135, de 26 de junho de 2007: Dispõe sobre o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal e dá outras providências. 4
5 ser atendida pelo Município mediante processo licitatório. Quanto ao benefício eventual do auxílio alimentação, determinado pela situação de vulnerabilidade de insegurança alimentar, também se encontra corretamente previsto nos arts. 15 a 17 do projeto de lei em análise, com o fornecimento de gêneros alimentícios inclusive sob a forma de cesta básica. Da mesma forma, em tese, a aquisição dos alimentos pelo Município deverá ser atendida pelo Município mediante processo licitatório, quando não decorrer por exemplo de doações legais. Sobre o auxílio moradia, está corretamente previsto nos arts. 18 a 20 do projeto de lei em análise. Destarte, conclui-se que, a rigor, considerando a análise tão somente pelo prisma socioassistencial, há viabilidade para o Município, por meio do órgão competente, atender os pedidos, inclusive com fornecimento de material. Sobre o auxílio transporte, também corretamente no art. 21 do projeto de lei em análise, atendido mediante fornecimento de passagens, desde que adquiridas no âmbito de compras e contratações realizadas pelo Município com observância da legislação de licitações. O mesmo entendimento até aqui explicado se aplica ao art. 22, que se refere aos benefícios eventuais decorrentes de outras situações de vulnerabilidade, pois não se trata de deixar nenhum requerente desassistido porque seu pleito não encontra correspondência numa lista de benefícios disponibilizados pelo Município, mas de atender situação que atenta contra os princípios e direitos acima citados, assegurados em nível constitucional. V. Diante do exposto, conclui-se que a viabilidade jurídica do projeto de lei nº 38, de 2018, fica condicionada apenas à correção no inciso II do art. 6º. Especialmente quanto à correção recomendada neste dispositivo do projeto de lei analisado, sugere-se consultar o órgão de assistência social do Município, uma vez que não consta nenhuma demonstração de consulta, tampouco nenhuma justificativa ou exposição de motivos anexa ao PL. O IGAM permanece à disposição. Roger Araújo Machado OAB/RS B Consultor do IGAM 5
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