Avaliação dinâmica de um evento de precipitação intensa sobre o Nordeste do Brasil

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1 Avaliação dinâmica de um evento de precipitação intensa sobre o Nordeste do Brasil Rafaela Lisboa Costa 1, Enio Pereira de Souza 2 1 Programa de Pós-Graduação em Meteorologia, Departamento de Ciências Atmosféricas, Universidade Federal de Campina Grande (DCA UFCG), Campina Grande, PB Brasil, rafaelalisboac@gmail.com, 2 Prof., Departamento de Ciências Atmosféricas UFCG, Campina Grande, PB Brasil, esouza@dca.ufcg.edu.br. RESUMO: Este trabalho teve como objetivo realizar uma analise da dinâmica de um sistema meteorológico ocorrido em Maceió em Março de Utilizando como ferramenta de estudo o modelo atmosférico BRAMS e a equação da vorticidade, observou se que os termos da equação mostram bem o evento em questão, sendo que o termo da advecção de vorticidade foi o que melhor representou o sistema. Palavras chave: VCAN, BRAMS, sistema convectivo. ABSTRACT: This study aimed to conduct an analysis of a dynamic weather system occurred in the city of Maceió in Alagoas State, in March Using as a tool to study the atmospheric model BRAMS (Brazilian Developments on the Regional Atmospheric Modelling System), and vorticity equation, it was observed that the terms of the equation explains well the event in question, and the term of the vorticity advection was the best represented the system. Key words: ULCV, BRAMS, convective system. 1. INTRODUÇÃO Durante o verão no Hemisfério Sul (DJF) a região Nordeste do Brasil (NEB) apresenta uma circulação atmosférica bastante característica. Em altos níveis atmosféricos, a presença de uma circulação anticiclônica quase estacionária sobre a Bolívia (Alta da Bolívia) e um profundo cavado sobre o NEB e Oceano Atlântico adjacente configuram a formação do Vórtice Ciclônico Altos Níveis (VCAN), sistema meteorológico responsável por intensas precipitações sobre a região NEB. Segundo Kousky e Gan (1981), os VCANs são sistemas de baixa pressão que se originam na alta troposfera, se estendendo até níveis médios, são quase estacionários, podendo se deslocar lentamente tanto para leste quanto para oeste. Também conhecidos como baixas frias, esses sistemas possuem uma área de nebulosidade em forma de arco, onde essa estrutura indica a existência de uma área de subsidência no centro do vórtice e uma grande área de convecção na sua periferia. Durante o mês de Março de 2008, a região Nordeste sofreu com a intensidade de um evento de VCAN. O estado de Alagoas foi castigado com as chuvas intensas causadas por Sistemas Convectivos (SCs) presentes na borda do VCAN. 2. OBJETIVOS

2 O objetivo deste trabalho é, através da utilização do modelo atmosférico BRAMS (Brazilian developments on the Regional Atmospheric Modeling System) atualmente em uso no Laboratório de Modelagem e Desenvolvimento (LMD), da Unidade Acadêmica de Ciências Atmosféricas da Universidade Federal de Campina Grande UFCG, e a equação da tendência de vorticidade, realizar uma analise dinâmica do sistema atmosférico que atingiu a cidade de Maceió em Março de MATERIAIS E METODOLOGIA Neste trabalho foi utilizado o modelo BRAMS na versão 4.2 ( um modelo de mesoescala que possui várias opções de parametrizações físicas incluídas no seu código. A parametrização utilizada neste trabalho foi a de convecção profunda na opção do tipo Grell (Grell e Dévéndyi, 2002). Para a realização deste estudo, foi realizada uma simulação usando o esquema de Grell (Grell e Dévényi, 2002), possuindo as seguintes características básicas: o modelo BRAMS iniciado a 00:00 UTC do dia 17 de Março de 2008 e integrado durante um período de 48 horas, isto é, até a 00:00 UTC do dia 19 de Março de Foram utilizados dados diários de reanálises do NCAR/NCEP tanto na alimentação do modelo quanto na análise sinótica do período, para o mês de Março de O BRAMS foi inicializado, utilizando a grade com resolução de 20 km, com 80 pontos de grade distribuídos na direção x e y. Na vertical o modelo conta com 42 níveis atmosféricos, sendo a resolução inicial de 20 km, com a grade vertical aumentando por um fator 1,2, à medida que atinge níveis mais altos na vertical. Neste estudo, utilizou-se a equação da vorticidade para verificar os fatores dinâmicos que são importantes para a intensificação, tempo de atuação e deslocamento dos VCANs sobre o Nordeste. Para tanto, a equação da vorticidade é apresentada na seguinte forma (Kousky e Gan, 1981): ζ u v = V ζ βv ( ζ + f ) + (1) t x y Na equação (1), o termo ( ζ/ t) representa a variação local da vorticidade relativa, isto é, a tendência de vorticidade relativa. Em outras palavras, este termo representa a soma do deslocamento e da intensificação do sistema. Os outros termos da equação interagem de tal maneira que o sistema evolui, intensificando-se ou não. O primeiro termo do segundo membro da equação (1) representa a advecção de vorticidade relativa; o segundo é da advecção de vorticidade planetária e o terceiro é o da divergência. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO A figura 1a mostra as linhas de corrente em 200 hpa para o dia do evento. É possível observar o padrão anticiclônico que aparece com uma configuração mais amena, formando apenas uma crista em altos níveis. Sobre os estados da Bahia e Minas Gerais, observa-se um forte padrão ciclônico, configurando um Vórtice Ciclônico de Altos Níveis. Nota-se, também,

3 que a Alta da Bolívia aparece bem configurada, podendo ter relação com a formação deste VCAN, já que há uma correlação positiva entre estes dois sistemas. O vento em 500 hpa apresenta uma forte circulação anticiclônica (Figuras 1b). Na costa do NEB, o vento apresentase praticamente perpendicular com uma componente zonal intensa, transportando umidade do oceano Atlântico para o continente. Em estudo realizado anteriormente, Valverde (1996) concluiu que em eventos de VCAN, as configurações de circulação ciclônica só podem ser observadas em 200 hpa, onde apresentam o máximo de vorticidade ciclônica, entretanto, apresentam um centro frio em 300 hpa, ou seja, uma circulação anticiclônica que pode se estender até o nível de 500 hpa. Figura 1 Linha de corrente em 200 hpa e Função de corrente em 500 hpa sobre o Nordeste A Figura 2a mostra a evolução da velocidade vertical (w) em perfil vertical correspondente às coordenadas do estado de Alagoas. É observado movimento predominantemente ascendente (w positivo) e os núcleos de velocidade vertical ascendente mostram-se intensos até altos níveis atmosféricos, evidenciando a intensidade do evento. Esses valores intensos de velocidade vertical são observados nos dias 17, 18 e 19 de março. Analisando o gráfico da vorticidade (Figura 2b), observa-se que a mesma apresenta valores negativos (convergência) em baixos níveis, ou seja, em 800 hpa, com núcleos mais intensos coincidindo com a máxima convecção ascendente. Esta configuração evidencia uma área de convergência em baixos níveis, com vorticidade ciclônica. Em consequência, observa-se uma forte área de divergência em altos níveis, enfocando a área de atuação de um anticiclone. Figura 2 Evolução da velocidade vertical (cm/s) e evolução da vorticidade relativa em perfil vertical sobre (10 S, 36 W). Os valores da vorticidade relativa estão multiplicados por 10 6

4 Para a realização do estudo dinâmico do evento, foi utilizada a equação da vorticidade. Nesta equação, são observados os seguintes termos: advecção de vorticidade relativa, advecção de vorticidade planetária, termo de divergência e tendência de vorticidade, todos analisados no nível de 300 hpa e em perfil vertical no ponto de (10 S, 36 W). A Figura 2a mostra a advecção de vorticidade relativa. Pode se observar valores positivos da advecção de vorticidade relativa próximo à superfície. Nota-se que, onde são observados altos valores da advecção de vorticidade relativa, os valores da velocidade vertical e da vorticidade relativa também são elevados. Como elevados valores de velocidade vertical estão relacionados com forte vorticidade ciclônica, como mostrado na Figura 2a, elevados valores de advecção positiva de vorticidade relativa indicam que esse termo atua como um freio inibindo o desenvolvimento do sistema. Observa se que em altos níveis este termo trabalha para gerar vorticidade ciclônica, atuando também para desintensificar o sistema. Figura 3 - Evolução da advecção vorticidade relativa e advecção de vorticidade planetária sobre (10 S, 36 W). Os valores estão multiplicados por O termo de divergência (Figura 4a) é o termo mais importante da equação da vorticidade em baixos e altos níveis. É ele que vai influenciar diretamente o resultado final, pois depende de fatores locais. Na Figura 4a, veem-se valores negativos em baixos níveis, aumentando à medida que se eleva na atmosfera. Os valores negativos abaixo do nível de 900 hpa indicam que o termo de divergência atua fortemente para gerar vorticidade ciclônica em baixos níveis. Contudo, grande parte dessa geração de vorticidade é compensada logo acima, entre 800 e 900 hpa, ficando muito pequena a contribuição desse termo nos níveis superiores da atmosfera. A tendência de vorticidade, que é o resultado dos três termos da Equação 1, é mostrada na Figura 4b. Como poderia ser esperado, o campo tende a se assemelhar ao da Figura 3a, que apresenta o termo de advecção de vorticidade relativa, que é uma ordem de magnitude maior que os outros. O que fica evidente é a alternância entre valores negativos e positivos, dados pelo domínio ora dos termos de divergência e de advecção de vorticidade planetária em gerar vorticidade ciclônica e pelo termo de advecção de vorticidade relativa em gerar vorticidade anticiclônica.

5 Figura 4 Evolução do termo de divergência e a tendência de vorticidade sobre (10 S, 36 W). Os valores estão multiplicados por CONCLUSÕES O modelo BRAMS reproduziu bem o sistema precipitante observado no noroeste de Alagoas em 18 de Março de Este sistema estava associado à presença de um VCAN localizado sobre Minas Gerais e Bahia. N análise da equação da vorticidade observou se que o termo de advecção de vorticidade relativa é uma ordem de magnitude maior que os outros, e tende a atuar como um limitador ao desenvolvimento do sistema, o termo de advecção de vorticidade planetária teve um papel de favorecimento do desenvolvimento do sistema, contribuindo para a geração de vorticidade ciclônica em baixos níveis e anticiclônica em altos níveis e o termo de divergência mostrou que o papel da geração de vorticidade devida à convergência é mais importante em baixos níveis, abaixo de 900 hpa, e que esse termo gera divergência logo acima, entre 800 e 900 hpa. Embora tenha sido possível estabelecer a dinâmica deste sistema, em particular, seria interessante estudar outros casos e verificar se a contribuição dos termos da equação da vorticidade permanece com as mesmas características. 6. AGRADECIMENTOS A Capes pelo auxilio financeiro. 7. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS GRELL, G. A.; DÉVÉNYI, D. A new approach to parameterizing convection using ensemble and data assimilation techniques. Geophysical Research Letters. v.29. Art. Nº p.1693, KOUSKY, V. E. & GAN, M. A. Upper troposhperic cyclonic vortices in the tropical South Altantic. Tellus, v.33, p , VALVERDE, M. C. Padrões Climáticos dos Vórtices Ciclônicos em Altos Níveis no Nordeste do Brasil. São José dos Campos, Dissertação (Mestrado em Meteorologia). Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, São Paulo, MISHRA, S. K. et al. Structure and Evolution of the Large-Scale Flow and an Embedded Upper-Tropospheric Cyclonic Vortex over Northeast Brazil. American Meteorological Society, v. 129, p , 2001.