ATIVIDADE INSETICIDA DE LECTINA DE Myracrodruon urundeuva CONTRA Sitophilus zeamais

Transcrição

1 ATIVIDADE INSETICIDA DE LECTINA DE Myracrodruon urundeuva CONTRA Sitophilus zeamais Belmonte, B.R (1) ; Napoleão, T.H (1) ; Pontual, E. V(1) ; Albuquerque, L. P(1) ; Sá, R.A (1) ; Paiva, L.M (1) ; Coelho, L.C.B. B(1) ; Paiva, P.M.G (1) bernardo_belmonte@yahoo.com.br (1) Universidade Federal de Pernambuco UFPE, Recife PE, Brasil, FACEPE, CNPq e CAPES. RESUMO O presente trabalho avaliou o efeito da lectina de folhas de Myracrodruon urundeuva (MuLL) sobre adultos de Sitophilus zeamais, praga de grãos armazenados. MuLL foi isolada a partir do tratamento do extrato salino de folhas com sulfato de amônio e cromatografia em coluna de quitina. Ensaio de toxicidade por ingestão consistiu na incubação de grupos de 20 insetos com dieta alimentar constituída por discos de farinha de trigo contendo MuLL em uma determinada concentração (3 150 mg de lectina/g de trigo). Após 7 dias, foi determinada a taxa de mortalidade e calculados o índice de deterrência alimentar (IDA) e os parâmetros nutricionais dos insetos. Ingestão de MuLL não resultou em indução da mortalidade dos insetos. Por outro lado, a lectina apresentou forte ação deterrente, com IDAs variando de 61% (3 mg/g) a 91% (150 mg/g). Insetos que ingeriram MuLL também apresentaram diminuição da taxa de consumo relativo. Nos tratamentos com as maiores concentrações de lectina, os valores de taxa de crescimento relativo e eficiência de conversão do alimento ingerido foram negativos, evidenciando forte desbalanço nutricional. Em conclusão, MuLL apresentou forte ação deterrente sobre adultos de S. zeamais, levando-os à situação de inanição e promovendo efeitos deletérios na fisiologia dos insetos. Palavras chave: Sitophilus zeamais; Myracrodruon urundeuva; Atividade Inseticida.

2 INTRODUÇÃO As lectinas constituem um grupo heterogêneo de proteínas que se ligam a carboidratos e se diferenciam entre si quanto à especificidade ao carboidrato ligante, estrutura molecular e atividades biológicas. As lectinas possivelmente estão envolvidas em mecanismos de defesa de plantas e animais. As lectinas têm sido descritas como agentes antibacteriano, antifúngico, antitumoral e inseticida (PAIVA et al., 2010, 2011). Tem sido demonstrado que lectinas de plantas interferem na alimentação, desenvolvimento, reprodução e sobrevivência de insetos em diferentes estágios de vida (SÁ et al., 2009). O potencial biotecnológico de lectinas inseticidas tem sido explorado para controle de insetos através da engenharia genética (SADEGHI et al., 2008). Uma lectina ligadora de quitina isolada da folha de Myracrodruon urundeuva (denominada MuLL, do inglês M. urundeuva leaf lectin) apresentou atividade larvicida contra larvas de Aedes aegypti e termiticida contra cupins Nasutitermes corniger (NAPOLEÃO et al., 2011, 2012). Sitophilus zeamais Motsch, conhecido como gorgulho do milho, pertence à Ordem Coleoptera e à Família Curculionidae. Destaca-se como uma das principais pragas de grãos armazenados no Brasil por possuir elevada capacidade de infestação cruzada e de penetração nos grãos e grande número de hospedeiros, tanto das larvas como dos 2

3 adultos. Causam danos aos grãos de milho, trigo, arroz e alimentos processados (GALLO et al., 1988, 2002). O presente trabalho avaliou o efeito de MuLL sobre a sobrevivência, comportamento alimentar e parâmetros nutricionais de adultos de S. zeamais. MATERIAL E MÉTODOS Extração de proteínas O extrato de folhas de M. urundeuva (EF) foi preparado a partir da homogeneização da farinha (10 g) de folhas saudáveis em NaCl 0,15 M (100 ml) durante 16 h a 4 C, sob agitação constante. Precipitação com sulfato de amônio EF foi tratado com sulfato de amônio (0-60% e 60-80%) sob agitação suave durante 4 h a 28 C. A fração de proteínas precipitadas a 60-80% (F60-80) foi coletada após centrifugação (3.000 g a 4 ºC) e dialisado contra água destilada (4 h) e NaCl 0,15 M (2 h). Dosagem de proteínas A dosagem protéica foi realizada de acordo com Lowry et al. (1951) utilizando curva-padrão de albumina sérica bovina (31, µg/ml). 3

4 Purificação de MuLL O isolamento de MuLL foi realizado segundo o protocolo descrito por Napoleão et al. (2011). A F60-80 foi cromatografada em coluna (7,5 x 1,5 cm) de quitina equilibrada com NaCl 0,15 M (fluxo 20 ml/h). Após lavagem com a solução de equilíbrio, MuLL foi eluída com ácido acético 1,0 M e dialisada contra água destilada (4 h) para eliminação do eluente. Ensaio de toxicidade por ingestão O ensaio foi realizado de acordo com Xie et al. (1996). Cada bioensaio consistiu em uma placa de Petri de vidro contendo cinco discos de uma mistura de farinha de trigo com uma determinada concentração de MuLL. Para preparação dos discos, 5 ml de uma solução da amostra ou de água destilada (controle negativo) foram adicionados a 2 g de farinha de trigo autoclavada. Após homogeneização por 5 min, cada disco foi preparado retirando-se uma alíquota de 200 µl da mistura. As placas foram postas em estufa a 56 ºC por 24 h e, em seguida, a massa dos discos foi registrada. Foram avaliadas concentrações de 3, 15, 30, 45, 75 e 150 mg/g de MuLL por g de farinha de trigo. Ao final, grupos de 20 insetos com peso conhecido foram transferidos para cada placa. Os bioensaios foram realizados em quadruplicata e mantidos a 28 ± 2 ºC. Após 7 dias de experimento, a taxa de mortalidade o peso dos discos e dos insetos foram determinados. O índice de deterrência 4

5 alimentar (IDA) foi calculado segundo a fórmula: IDA = [100 x (C T)]/C, onde C corresponde à massa ingerida no controle e T à massa ingerida no teste. Os seguintes índices nutricionais foram também calculados: Taxa de crescimento relativo: (biomassa adquirida) / (biomassa inicial dos insetos x dias). Taxa de consumo relativo: (massa ingerida) / (biomassa inicial dos insetos x dias). Eficiência de conversão do alimento ingerido: (biomassa adquirida / massa ingerida) x 100. Análise estatística Diferenças significativas (p<0,05) entre os tratamentos foram calculadas através do Teste de Tukey. Os dados foram expressos como média ± desvio padrão. RESULTADOS E DISCUSSÃO MuLL não induziu significativamente (p>0,05) a mortalidade de S. zeamais em nenhuma das concentrações avaliadas. Por outro lado, MuLL apresentou efeito deterrente moderado nas concentrações de 3 e 15 mg/g e forte nas demais (30 a 150 mg/g) (Figura 1). A Figura 2 mostra os parâmetros nutricionais de insetos do grupo controle e dos vários tratamentos com MuLL. Os valores da taxa de consumo relativo para insetos que ingeriram a lectina foram, em média, 4,75 vezes menores que aqueles determinados no controle. As taxas de 5

6 crescimento relativo e a eficiência de conversão do alimento ingerido foram negativas nos tratamentos com MuLL. Figura 1. Índices de deterrência alimentar (IDA) de Sitophilus zeamais mantidos em dieta contendo MuLL em diferentes concentrações (3 150 mg/g). Figura 2. Índices nutricionais de Sitophilus zeamais mantidos em dieta contendo MuLL em diferentes concentrações (3 150 mg/g) ou NaCl 0,15 M (controle negativo). 6

7 Uma vez que nenhuma mortalidade foi detectada após 7 dias, os elevados valores de deterrência provavelmente estão ligados à rejeição da dieta contendo MuLL e não a uma diminuição no número de insetos vivos. Os valores da taxa de consumo relativo foram menores que o controle, de acordo com o forte efeito deterrente. Os valores negativos de taxa de crescimento relativo provavelmente estão ligados à ausência de uma alimentação adequada pelos insetos e prejuízos causados nos processos de digestão e absorção, induzindo o inseto a metabolizar suas reservas para sobreviverem. A eficiência de conversão do alimento ingerido também foi negativa nos tratamentos com maior concentração de MuLL demonstrando que a incorporação da lectina à dieta levou a um desbalanço na fisiologia do inseto. CONCLUSÃO MuLL apresenta potencial para uso no controle do gorgulho do milho por apresentar forte efeito deterrente, impedindo que os adultos aproveitem uma determinada fonte de alimento e induzindo situação de inanição e efeitos deletérios na fisiologia dos insetos. REFERÊNCIAS GALLO, D. et al. Manual de entomologia agrícola, 2ª ed., São Paulo: Ed. Agronômica Ceres; p ,

8 GALLO, D. et al. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, LOWRY, O.H. et al. Protein measurement with the Folin phenol reagent. Journal of Biological Chemistry, v. 193, p , NAPOLEÃO, T.H. et al. Effect of Myracrodruon urundeuva leaf lectin on survival and digestive enzymes of Aedes aegypti larvae. Parasitology Research, v. 110, p , NAPOLEÃO, T.H. et al. Termiticidal activity of lectins from Myracrodruon urundeuva against Nasutitermes corniger and its mechanisms. International Biodeterioration & Biodegradation, v. 65, p , PAIVA, P.M.G. et al. Plant compounds with Aedes aegypti larvicidal activity and other biological properties. In: LIONG, M-T. (Org.) Bioprocess Sciences and Technology. New York: Nova Science Publishes, 2011, pp PAIVA, P.M.G. et al.. Antimicrobial activity of secondary metabolites and lectins from plants. In: VILAS, A.M. (Org.) Current Research, Technology and Education Topics in Applied Microbiology and Microbial Biotechnology: Current Research, Technology and Education Topics in Applied Microbiology and Microbial Biotechnology. Badajoz, Formatex Research Center, 2010, pp SÁ, R.A. et al. Larvicidal activity of lectins from Myracrodruon urundeuva on Aedes aegypti. Comparative Biochemistry and Physiology, Part C, v. 149, p , SADEGHI, A.; SMAGGHE, G.; BROEDERS, S.; HERNALSTEENS, J.; GREVE, H.; PEUMANS, W.J.; VAN DAMME, E.J.M. Ectopically expressed leaf and bulb lectins from garlic (Allium sativum L.) protect transgenic tobacco plants against cotton leafworm (Spodoptera littoralis). Transgenic Research, v. 17, p. 9-18, XIE, Y.S.; BODNARYK, R.P.; FIELDS, P.G. A rapid and simple flour-disk bioassay for testing substances active against stored-product insects. Canadian Entomology, v. 128, p ,