OS ALIMENTOS INFANTIS SÃO SEGUROS?

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Transcrição:

OS ALIMENTOS INFANTIS SÃO SEGUROS? A alimentação infantil é uma preocupação não apenas das mães, mas dos profissionais da área de saúde. E para discutir as dúvidas do dia a dia dos consultórios e as informações e pesquisas mais recentes sobre o tema, diversos especialistas estiveram reunidos no final de agosto, em São Paulo, no Workshop Segurança do Alimento da Criança, uma parceria do ILSI Brasil com a Sociedade de Pediatria de São Paulo. A preocupação permanente quanto à melhor dieta da criança, nas diferentes fases do seu desenvolvimento, ainda envolve muitas dúvidas. Qual alimento é o mais adequado? Quando se deve optar por um cardápio rico em certos nutrientes? Como entender as substâncias dos produtos industrializados? Muitas vezes estas informações são passadas de forma equivocada, sem trazer benefícios e até confundir. Daí a importância de um consenso médico e científico e do entendimento das necessidades dos pais no seu cotidiano, quando o assunto for uma alimentação saudável para seus filhos, concordaram os participantes do evento. Na abertura, Aldo Baccarrin, presidente do ILSI Brasil, e Rubens Ferferbaum, Diretor de Departamentos Científicos da Sociedade de Pediatria de São Paulo, ressaltaram a importância desta discussão, viabilizada pela parceria entre as duas entidades, e que deve ser o primeiro passo de futuros eventos a favor da saúde e bem-estar infantil. Chamaram a atenção para o fato da maior longevidade das pessoas e a preocupação hoje com o futuro das crianças que poderão atingir os 100 anos e precisam ter perspectivas de chegar lá com qualidade de vida. Esta conquista passa por uma nutrição equilibrada, que já começa com a amamentação.

Dr. Flávio Zambrone, do Instituto Brasileiro de Toxicologia (IBT), abriu o ciclo de palestras falando sobre a avaliação e percepção do risco e a sua importância em todas as etapas do crescimento humano. Salientou que o risco envolve o modo de ver e encarar a nutrição, e que a perspectiva de se viver mais, não significa poder ter uma total isenção do contato com as substâncias químicas na alimentação, mas sim conviver com elas. Toda atividade humana implica em algum tipo de risco. Sempre que ocorre a exposição a uma substância química há um risco. No cotidiano, alguns destes riscos são inevitáveis e outros involuntários. Assim, o risco é a combinação de dois fatores: a probabilidade de um evento adverso ocorrer e as suas conseqüências. Para os alimentos em produtos para crianças e adultos - a avaliação do risco tem sido uma ferramenta importante de regulamentação, utilizada em todo o mundo, para o estabelecimento níveis de risco aceitáveis, considerando que o organismo humano é capaz de sobreviver a diferentes níveis de exposição, dependendo da dose ingerida. Por isso, o avaliador do risco deve levar em conta o coletivo. Advertiu ainda, que hoje os rótulos dos alimentos são feitos para o regulador e não contém as informações que a população deveria saber. Neste contexto, a maior dificuldade da comunicação do risco é ter uma linguagem precisa, clara e objetiva, pois a informação correta é que faz a segurança. A ausência total do risco é um objetivo inatingível. É preciso sempre avaliar o risco versus o benefício, e a tomada de decisão deve ser sempre um ato de equilíbrio e bom senso. Dr. Claudio Leone, do Departamento de Saúde Materno Infantil, da Faculdade de Saúde Pública da USP, focou no acesso ao alimento e as diretrizes da OMS para alimentação saudável. Dentro desta abordagem, destacou que o ponto de partida é a segurança alimentar e nutricional e que é necessário garantir a todos condições de acesso a alimentos básicos de qualidade e em quantidade suficiente, como patamar de práticas alimentares saudáveis. Porém, não basta apenas ter acesso. É preciso ter o alimento disponível de maneira contínua, para que se possa adquirir hábitos saudáveis e mantê-los. Traçou um paralelo, ao longo da história, e a preocupação com a segurança alimentar. Destacou que durante a primeira e segunda Guerra Mundial, a preocupação era com a carência de alimentos e era uma questão estratégica de sobrevivência, inclusive das

próprias nações. Era preciso investir na produção para afastar o fantasma da falta de alimentos. No pós-guerra, se iniciou uma preocupação com o perfil nutricional e o problema a ser enfrentado passou a ser a desnutrição. O acesso ao alimento deixou de ser uma questão apenas de produção e disponibilidade, mas de poder aquisitivo da população, o que criou um novo cenário: se saiu de um quadro de desnutrição alarmante para o de sobrepeso e obesidade, inclusive afetando as crianças. Assim, o que determina o estado nutricional e segurança alimentar sofre a influência de hábitos e comportamentos da população e tem como ponto fraco a conjugação da produção, comercialização e consumo. O ato de comer não envolve apenas uma necessidade fisiológica do organismo de reposição de energia, mas está associado à satisfação, à cultura. Estas mudanças, com o tempo, têm seus reflexos diretos no que se leva à mesa e faz parte da dieta da família, inclusive das crianças. Neste cenário, a OMS tem como estratégia global controlar o balanço energético e peso saudável, com menos gordura, açúcar e sal e com aumento da ingestão de frutas, verduras e legumes. Para se atingir esta meta, necessita do envolvimento de todos os atores atuantes no sistema alimentar, onde só o poder de compra não garante o acesso a uma alimentação saudável. O Marketing tem um papel fundamental e os comitês de ética, a ele atrelados, devem ter esta preocupação com a informação que chega ao público infantil e assim pode influenciar na mudança para hábitos alimentares mais saudáveis. Observou, ainda, que hoje se gastam milhões de dólares para a promoção da venda de alimentos e que, por isso, é preciso trazer estes marqueteiros para uma discussão conjunta com todos os protagonistas envolvidos nas políticas, na produção e na prática de divulgação de alimentos e hábitos alimentares, de maneira a mobilizar a sociedade para o acesso a uma alimentação saudável. Afinal, acesso a uma alimentação saudável não é só poder comprar. Dr. Mauro Fisberg, pediatra e nutrólogo da Escola Paulista de Medicina- UNIFESP, apresentou um estudo de caso sobre o ferro, dentro do tema Fortificação de Alimentos É necessária: até quando e até quanto? O exemplo foi escolhido pela grande prevalência da deficiência de ferro e anemia ferropriva, que afeta cerca de 2 bilhões de pessoas em todo mundo, sendo uma das principais carências nutricionais e problema de saúde pública. No Brasil, a situação também é preocupante. A prevalência

de anemia, em 10 capitais brasileiras, em crianças institucionalizadas, menores de três anos, atinge 49%. Mostrou, porém, que os grupos de risco estão em várias faixas etárias, além das crianças, incluindo-se adolescentes, as gestantes e mulheres em idade fértil. Citou as inúmeras repercussões que esta deficiência pode trazer para economia mundial, como acidentes de trabalho, devido à fadiga e redução da capacidade física e atenção nos adultos, e alterações de crescimento, imunidade, desenvolvimento físico, mental e comportamental, nas crianças. Destacou que a prevenção é essencial, pois o tratamento, apesar de relativamente fácil, não consegue reverter alguns dos efeitos potenciais futuros. Apontou como uma das alternativas, a fortificação alimentar, cujo objetivo é reforçar o valor nutritivo do alimento, inclusive o perdido no processamento industrial, e prevenir ou corrigir a deficiência em um ou mais nutrientes, na alimentação da população em geral ou de seus grupos de risco. Mostrou a experiência brasileira da fortificação com ferro, mandatória ou voluntária, num panorama de 1995 até agora, ressaltando as vantagens e aspectos a serem considerados nestes programas em relação aos riscos e benefícios, monitoramento e abrangência. Relatou algumas experiências com seu grupo de trabalho, com alimentos fortificados em pesquisas com crianças pré-escolares e escolares e deixou como reflexão, questões como: o que aconteceria se todos os alimentos fossem fortificados? Seria um valor agregado, um risco de toxicidade ou resolução dos problemas? O Prof. Dr. João R. O. do Nascimento, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental, da FCF/USP, apresentou uma questão que ainda desperta muitas polêmicas: Transgênicos: sim ou não? Iniciou mostrando a importância de se pesar os eventuais efeitos adversos atrelados aos OGMs e seus benefícios, como a diminuição no custo da produção e perdas no campo, a tendência de poder obter alimentos mais nutritivos, saborosos e seguros. Graças à evolução tecnológica, estas características estão cada vez mais sendo viáveis. Quanto aos potenciais efeitos adversos dos OGMs, alertou para o bombardeio de informações desencontradas e, na maioria das vezes, sem embasamento científico, o que, segundo o especialista, gera um temor injustificado, mas que toma grandes proporções. Chamou a atenção para o fato de que o desenvolvimento de qualquer cultura transgênica considera as dúvidas que têm sido

levantadas por leigos e especialistas e são analisadas em cada etapa do processo, sempre avaliando o risco de potenciais efeitos para a saúde humana. A meta é que sejam tão seguros quanto seus análogos convencionais, que apesar de aceitos também não são isentos de riscos, pois não existe risco zero. Outra dúvida, quanto se os OGMs são naturais ou não, observou que os próprios convencionais passam por melhoramentos genéticos com cruzamentos e uso de agentes mutagênicos. E defendeu que a transgenia permite um controle ainda mais preciso do melhoramento, e que o consumo destes alimentos não tem riscos comprovados pela ciência. Pontuou as mudanças peculiares do campo, como clima, solo, geografia e pragas, evidenciando que estas condições podem explicar uma variabilidade natural na composição da planta que, muitas vezes, é maior do que a que ocorre em uma matériaprima geneticamente modificada, em relação à sua contraparte convencional, pois as condições de cultivo e variedades de uma mesma planta têm mais impacto na composição química do que a modificação genética. Quanto à alergenicidade, comentou que os riscos são os mesmos dos produtos convencionais e as pessoas alérgicas devem continuar evitando os alimentos que lhes causem efeitos adversos, independente de serem transgênicos. Enfatizou que todos os produtos OGMs autorizados são seguros para consumo, a partir do momento que são liberados pelos órgãos regulatórios e mesmo que tragam a identificação de transgênico nos rótulos, uma obrigatoriedade legal, não devem ter seu consumo restrito por esse motivo. Finalmente, destacou que mesmo após muitos anos de consumo de OGMs em vários países, não surgiu nenhuma evidência comprovando os efeitos adversos destes alimentos, apesar do grande interesse que essa questão desperta. E reforçou que, quando autorizados, são tão seguros quanto aos análogos convencionais e talvez até mais seguros, pelos vários processos de avaliação a que são submetidos. Dr. Mauro Batista de Morais, Gastroenterologista Pediátrico da UNIFESP, abriu as discussões sobre as ações adversas dos alimentos sob o ponto de da Gastroenterologia. Observou que estas reações podem ser tóxicas ou não tóxicas. Neste caso, dependem da sensibilidade individual e estão incluídas a intolerância alimentar e a hipersensibilidade alimentar (alergia alimentar) Destacou a intolerância à lactose, que se manifesta tanto em

crianças, após o desmame, como em adultos, e comentou, ainda, que parcela expressiva dos indivíduos com hipolactasia do tipo adulto (geneticamente determinada) não apresenta sintomatologia atribuível à intolerância à lactose. Ressaltou que, em geral, os indivíduos com intolerância podem consumir alimentos que contenham as proteínas do leite de vaca, mas com pequena quantidade de lactose. Este consumo dependerá da habilidade de cada organismo no seu processo digestivo. Iogurtes, queijos e sobremesas são mais tolerados e podem ser ingeridos, compensando parte da menor ingestão de cálcio conseqüente da intolerância ao leite in natura. Mas advertiu que é difícil elaborar um cardápio com 100% de exclusão dos lácteos e que mantenha as doses de cálcio recomendadas. Por outro lado, ressaltou que a prevalência da alergia alimentar está aumentando no mundo inteiro. Pode causar nos lactentes importante dano nutricional, faixa etária na qual o problema apresenta maior prevalência. Nesta fase da vida, a dieta substitutiva pode significar uma alternativa com maior custo, mas diante da suspeita diagnóstica, as fórmulas especiais devem ser viabilizadas para reverter e prevenir déficits dietéticos e do crescimento. A Profa. Dra. Maria Marluce dos S. Vilela, Imunologista Pediátrica da UNICAMP, trouxe para debate a visão do imunologista mostrando que, durante a evolução humana, o sistema imune aprendeu a conviver com os trilhões de bactérias da nossa microbiota e passou a se adaptar e tolerar a diversidade de alimentos que ingerimos. Porém, a prevalência de alergia alimentar registrou um crescimento de 18%, entre 1997 e 2007, sendo 6% entre crianças e adolescentes e 3% a 4% em adultos. Observou que há diversos fatores que interferem para o desenvolvimento da alergia ou intolerância a certos alimentos, sendo o leite de vaca, ovo, amendoim e frutos do mar os alimentos mais comuns. Entre estes fatores há o genético; a maturidade no trato gastrointestinal, onde a prevalência é mais alta nas crianças do que em adultos; e introdução precoce de certos alimentos. Segundo estudos, cerca de 80% das crianças alérgicas ao leite de vaca e ovo podem tolerar esses alimentos quando cozidos, pois eles perdem os epitopos nativos conformacionais, devido à desnaturação pelo calor. Estima-se que existam 170 alimentos que causem alergia por IgE e que, no caso das crianças, elas iniciam com o leite de vaca e ovo e

progridem para outros alimentos como amendoim, castanha, trigo e soja. Entre os adultos, os mais comuns são peixes, frutos do mar e nozes. Mas lembrou que qualquer alimento pode desencadear alergia, porém são poucas as proteínas que tem este efeito. Os alérgenos alimentares formam três grupos de proteínas de origem animal e quatro famílias de origem vegetal. Comentou, ainda, sobre a memória de certas células, o que pode ser ruim para autoimunidade. Alertou que não há nenhum teste que de fato garanta 100% que o indivíduo é portador de alergias, não mediadas por IgE. A exclusão é ainda o padrão ouro e a sensibilização dos indivíduos pode ocorrer a diferentes proteínas, citando como exemplo algumas pessoas que tem reações alérgicas apenas a algumas partes da fruta, como só polpa ou casca. Outro ponto a considerar são as reações cruzadas, pois há manifestações que começam com uma simples dermatite e não se caracterizam como uma doença alérgica. Daí a importância de se considerar o histórico do paciente para um diagnóstico mais preciso, principalmente pelo problema da alergia ter crescido no impacto da saúde da criança nas últimas décadas. Neste contexto, é necessário diferenciar entre a intolerância, que se manifesta em relação a certas proteínas do alimento, e à própria alergia, que pode se desencadear uma reação por outras substâncias como aditivos alimentares, corantes. Os rótulos dos alimentos têm contribuído, mas a educação do consumidor não é uma tarefa fácil, diante de alergias que podem ser complexas. Há ainda o fator econômico, quando há a necessidade de alimentos diferenciados, como o leite especial para certas crianças alérgicas, por exemplo, prescrição que envolve um alto custo, nem sempre possível de ser assumido pelos pais. Dr. Willian Allaben, do Center for Toxicology and Enviromental Health, USA, em sua primeira visita ao Brasil, focou sua palestra nos riscos do Bisfenol A (BPA) para saúde humana, dentro do tema dos Disruptores Endócrinos. Disse que o tema causa controvérsias no mundo todo e o uso do BPA é amplo na fabricação de vários produtos, pois a partir dele são produzidos vários polímeros de plástico empregados em centenas de produtos como mamadeiras, garrafas, dispositivos médicos, CDs, DVS e, no setor alimentício, como revestimento de diversas embalagens. Porém, tem sido considerado seguro há décadas, pois é capaz de criar uma barreira entre o produto e o metal das latas, por exemplo, com alto

desempenho funcional. As polêmicas têm motivado a busca de alternativas, mas os cerca de 2 mil estudos, até agora, não apontaram nenhum substituto. Citou o estudo do Programa Nacional de Toxicologia, dos EUA, 2007/2008, focado no risco potencial para exposição do Bisfenol A e o achado foi desprezível, em relação aos endpoints avaliados. Porém, é difícil o consenso sobre o tema e se faz necessário mais pesquisas sobre os efeitos efetivos para o ser humano. Segundo os órgãos regulatórios, os atuais níveis de exposição, tanto de bebês, como crianças, são seguros, apesar de tentativas de banir a substância, principalmente em brinquedos ou mamadeiras. Uma das questões é que o Bisfenol possa penetrar nos alimentos, o que, segundo o especialista, não significa uma dose crítica de risco, pois o próprio organismo no fígado e intestino é capaz de realizar esta desintoxicação caso ela ocorra. Em relação aos disruptores endócrinos, observou que são substâncias exógenas, introduzidas no organismo, que tem a capacidade de interferir no metabolismo e causar efeitos negativos, bloqueando uma resposta, um receptor. Neste contexto, o Bisfenol A é um estrógeno fraco, que precisa de grande quantidade para que seu receptor faça algo que possa migrar para o núcleo da célula e suscitar uma resposta. No organismo humano ele não bioacumula. Mencionou estudo recente que demonstra que se uma mãe é exposta ao Bisfenol A - via oral - ele é eliminado pela urina e se penetrar na placenta e atingir o feto, este também terá a capacidade - mesmo que limitada de metabolizar a substância e excretá-la, num mecanismo de proteção. As conclusões das pesquisas mostram que diante dos atuais níveis de exposição, não há necessidade ou riscos que justifiquem mudar os níveis já estabelecidos como seguros. Uma nova regulamentação dependerá dos resultados de pesquisas e de um consenso científico, quando os órgãos fizerem uma revisão do status atual. Os processos de avaliação de riscos, para atingir de modo objetivo as diretrizes e padrão ouro, são aplicados mesmo em pequenas pesquisas que são revisadas. Ressaltou, ainda, que não há um entendimento, por alguns investigadores, qual o processo de avaliação do risco. Por isso, se criam grupos de interesse polêmicos o que faz com que muitos trabalhos não sejam considerados, pois não têm peso para um risco potencial. Hoje, graças à mídia social, há um forte impacto na interpretação do público sobre o que os órgãos estão fazendo. É uma nova era, onde é cada vez maior a pressão

para que os órgãos regulatórios mostrem seus estudos. Salientou que não há outra substância tão testada quanto o Bisfenol A. E questionou até que ponto novos produtos não representam risco? Foram testados? Porém, com risco ou não, não há um consenso global dos níveis de exposição e esta discussão está longe de ter um fim. Provavelmente nunca se chegará lá. Observou que se mantém a preocupação de elementos químicos como disruptores endócrinos, e que estudos estão sendo realizados nesta direção. A FDA também já estabeleceu o mecanismo de DEs para novos medicamentos e a área de segurança alimentar está ciente de produtos contaminantes e aditivos e se mobiliza para realizar testes nesta identificação. O Prof. Dr. Felix G.R. Reyes, da UNICAMP, abordou sobre os resíduos de agrotóxicos e fármacos veterinários em alimentos. Iniciou lembrando a necessidade de se produzir alimentos para uma população de cerca de 7 bilhões no planeta e que tem mantido seu crescimento constante. Neste cenário, a agricultura desempenha um papel essencial, e o uso de agrotóxicos e de medicamentos veterinários é uma realidade. Mesmo diante da tendência de se buscar cada vez mais alimentos orgânicos, a produção desse tipo de alimentos não consegue atender a demanda mundial. Segundo dados da ANDEF, o Brasil é o maior consumidor mundial de agrotóxicos, negócio que movimenta cerca de US$ 7,5 bilhões e também está entre um dos principais países exportadores de alimentos. Em relação aos medicamentos veterinários, citou que é uma indústria em plena expansão e, em 2010, atingiu R$ 3 bilhões. Em relação aos aspectos toxicológicos, observou que todas estas substâncias, antes de chegarem ao mercado, passam por uma avaliação do risco à saúde, de acordo com parâmetros de órgãos internacionais. Assim, são estabelecidos valores de ingestão diária aceitável (IDA) e limites máximos de resíduos (LMR) para cada uma das substâncias avaliadas, sendo que os dados científicos disponíveis permitem garantir que o consumo dos alimentos em conformidade com os LMR não deverá causar dano à saúde do consumidor. No Brasil, parte do controle de resíduos é realizada pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA) através do PNCRC Programa Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes - que avalia carnes (bovina, suína, equina e de aves), leite, ovos, mel e pescado. Nos últimos cinco anos, os alimentos analisados nesse programa

estiveram em conformidade com os níveis estabelecidos pela lei. O Ministério da Saúde, através do Programa de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA/ANVISA), tem divulgado que muitos dos alimentos analisados estão em não conformidade em relação aos LMR. Cabe mencionar que em relação ao consumo de vegetais, com a simples lavagem do alimento, consegue-se eliminar cerca de 90% dos resíduos. Descartar a casca, folhas externas em algumas hortaliças, e o cozimento ou aquecimento também contribuem para reduzir os níveis de resíduos dos agrotóxicos nos alimentos. Em relação aos medicamentos veterinários, a tendência global é minimizar o uso, devido a custos e fatores de saúde humana e ambiental. Com referência à inocuidade alimentar, dados indicam a disponibilidade de alimentos mais seguros para consumo do que no passado. Os pontos mais críticos estão atrelados às ações de vigilância sanitária, relativa aos dados de exposição, sendo necessárias ações mais eficientes para realizar o controle da presença de resíduos de agrotóxicos e fármacos veterinários nos alimentos. Amanda Poldi, nutricionista e consultora de assuntos regulatórios de alimentos, encerrou o evento abordando sobre o que é importante saber na rotulagem de alimentos para crianças. Salientou que cerca de 85% das informações dos rótulos são exigência da legislação em vigor e que a lista de ingredientes deve estar em ordem decrescente, sendo que o primeiro ingrediente é aquele que está em maior quantidade no produto e o último em menor quantidade e os aditivos alimentares são declarados depois dos ingredientes. Apesar dos processos regulatórios terem consultas públicas que viabilizam a intervenção da sociedade nas decisões, há espaço para avanços nessas participações e temas que ainda são polêmicos como a expressão não contém glúten, por exemplo. Atualmente o Brasil participa das discussões do MERCOSUL, sobre a revisão da legislação relativa à rotulagem dos alimentos embalados, que inclui outros pontos críticos, como a declaração nos rótulos dos alimentos e ingredientes conhecidos por causar hipersensibilidade ou intolerância em pessoas sensíveis e como devem constar na lista de ingredientes. Uma das propostas é destacar em negrito e em cor contrastante ao fundo do rótulo, para servir de alerta para o consumidor. A lista de substâncias alergênicas deve estar de associada aos ingredientes? E a maneira de conservação? E o tamanho mínimo de letra das informações obrigatórias,

quanto pode aumentar, considerando-se as exigências legais existentes? São perguntas que sempre entram nas discussões. Analisando a rotulagem pelo aspecto nutricional, a legislação sobre o tema estabelece, exceto quando se tratar de um alimento para fim especial, em conformidade com referências internacionalmente reconhecidas como o Codex Alimentarius, porções para maiores de 36 meses, com referência numa dieta de duas mil calorias. Segundo a consultora, parâmetros que nem sempre são os ideais para orientar a dieta de uma criança. Em relação aos transgênicos, a controvérsia está no uso do símbolo. A informação no rótulo sobre a presença de matéria-prima geneticamente modificada no produto é fundamental, mas a indagação é: se os produtos são comprovadamente seguros é necessária esta advertência? Todos estes pontos se convergem para o desafio de transmitir ao consumidor informações que o orientem na hora da compra e do próprio armazenamento e consumo. Porém, a rotulagem não será uma solução se não se tiver como base uma educação do consumidor, inclusive em relação a uma dieta saudável. O desafio é o uso e entendimento da rotulagem dos alimentos de uma maneira informativa, a favor da saúde. E nesta direção pode ser uma ferramenta deste processo educativo. No encerramento, Dr. Rubens Lipinski, pediátra e diretor de cursos e eventos da SPSP, e Dr. Mario Hirschheimer, endocrinologista pediátrico e vice-presidente da SPSP, lideraram como debatedores ressaltando a importância de implementar mudanças de atitudes, que passam pela educação, considerando ser o Brasil um país gigantesco e cheio de diversidades. Por parte das mães, há dificuldades diante da desnutrição e risco de sobrepeso e obesidade e, por isso, é importante buscar sempre o aprimoramento da informação que será repassada para o consumidor. O alto consumo de sódio é outro problema, pois no Brasil é duas vezes maior que o recomendado pela OMS. Outra dúvida que ainda existe é sobre os alimentos light e diet e suas recomendações. Em relação às substâncias químicas, a preocupação está na dose e resíduos que permanecem no organismo. Daí a necessidade em checar, continuamente, a segurança do seu uso. Neste cenário, comentou-se, ainda, que a ciência é dinâmica e o que pode ser inócuo hoje poderá não ser amanhã, numa trajetória que se desencadeia, ao longo da história, numa avaliação das substâncias à luz do conhecimento científico disponível em cada época.

Mesmo assim, às vezes, há uma tendência de demonizar a tecnologia. Hoje se pode ter como exemplos o largo uso do Bisfenol A, e os alimentos transgênicos. Diante de impasses é controvérsias o desafio é não se curvar a evidências óbvias. Informações para Imprensa edna vairoletti - (11) 8164-9863 vairoletti@ndata.com.br Vairoletti & Vairoletti Comunicação