CARACTERIZAÇÃO DE ADSORVENTES PREPARADOS POR PIRÓLISE A VÁCUO DE RETALHOS TÊXTEIS J. Correia 1 ; A. R. V. Mendonça 2 ; S. M. A. G. U. Souza 1 ; R. C. S. C. Valle 3 ; C. R. L. Aguiar 3 ; J. A. B. Valle 3 1 Departamento de Engenharia Química e de Engenharia de Alimentos Universidade Federal de Santa Catarina. Campus Reitor João David Ferreira Lima CEP: 88040-970 Florianópolis SC Brasil. Telefone: (47) 996229676 E-mail: jefersoncor@gmail.com. 2 Instituto de Química Universidade de Brasília. Campus Darcy Ribeiro CEP: 70910-000 Brasília DF Brasil 3 Departamento de Engenharias Universidade Federal de Santa Catarina. Campus Blumenau CEP 89036-256 Blumenau SC Brasil. RESUMO: Amostras de retalho têxtil foram expostas à pirolise a 500 e 700 ºC durante 70 e 120 min, para a produção de adsorventes. As características morfológicas e texturais das amostras foram caracterizadas por microscopia eletrônica de varredura (MEV) e isotermas de adsorção com N 2. Foi avaliada a capacidade de adsorção utilizando o corante Reactive Black 5 (RB5). As análises indicaram adsorventes com poros de dimensões abaixo de 10 nm. A capacidade máxima de adsorção encontrada foi 1,06 mg.g -1 para o adsorvente produzido a 500 ºC e 120 min, que é equivalente a 9 % de corante removido da fase líquida. Os adsorventes obtiveram resultados de remoção limitada de corante, entretanto representam uma ótima alternativa de reutilização de um resíduo industrial no processo de tratamento de efluentes têxteis. PALAVRAS-CHAVE: Adsorção; remoção de corante; pirólise; retalho têxtil. ABSTRACT: Textile scrap samples were exposed to pyrolysis at 500 or 700 ºC during 70 or 120 min for adsorbent production. The morphological and technological characteristics of the samples were characterized by scanning electron microscopy and N 2 adsorption isotherms. The adsorption capacity was evaluated using Reactive Black 5 dye. The analyzes indicated adsorbents with pores of dimensions below 10 nm. The maximum adsorption capacity found was 1.06 mg.g -1 for the adsorbent produced at 500 C and 120 min, which is equivalent to 9% dye of removed from the liquid phase. The adsorbents obtained limited results of dye removal, however, represent an excellent alternative of reuse of an industrial waste in the process of textile effluents treatment. KEYWORDS: Adsorption; dye removal; pyrolysis; textile scraps. 1 INTRODUÇÃO A indústria têxtil de tingimento é uma grande usuária de água. Estima-se que mais de 700 mil toneladas de corantes são descartadas anualmente como efluentes na indústria têxtil (Ncibi et al., 2007). Deste modo, efluentes têxteis geralmente são tratados por processos físico químicos, com coagulação e floculação, e biológicos, com degradação aeróbica e anaeróbica (Kim et al., 2015). O processo de tratamento de efluente têxtil considerado convencional, ou seja, baseado em fenômenos de precipitação e coagulação, acompanhados por tratamento biológico tipo lodo ativado, permite uma remoção próxima de 80 % da concentração de corantes (Kunz et al., 2002). Para remoções maiores, outras formas de tratamento
devem ser utilizadas. Nesse sentido, os processos adsortivos são viáveis economicamente por serem capazes de tratar o efluente têxtil mesmo em baixas concentrações de corante (Eren e Acar, 2006; Gulnaz et al., 2006). Por outro lado, devido ao alto custo agregado, existe uma intensa procura por formas mais econômicas para produção dos adsorventes (Kobiraj et al., 2012). Paralelamente, a competitividade do mercado obriga a indústria desenvolver estratégias competitivas e diferenciadas baseadas na inovação tecnológica. Embora a pesquisa seja abundante, as produções científicas relacionadas à gestão de resíduos no setor têxtil ainda são muito incipientes. A pesquisa conduzida por Freire e Lopes (2013) indica que 30 % de um tecido utilizado no processo de confecção têxtil é descartado na forma de retalhos. O reaproveitamento desse material pode constituir uma potencial fonte de renda e sustentabilidade. Os retalhos de confecção constituem materiais essencialmente carbonosos e podem ser aplicados como matéria-prima para a produção de adsorventes, que por sua vez podem ser reinseridos na cadeia produtiva têxtil como um integrante do processo de tratamento de efluentes. Dentro do contexto apresentado, o objetivo deste trabalho foi preparar e caracterizar adsorvente carbonoso a partir de retalhos oriundos do processo de confecção têxtil. 2 MATERIAIS E MÉTODOS O material precursor do adsorvente é resíduo de tecido plano, predominantemente de fibras de algodão, oriundos de uma indústria do setor do vestuário localizada no município de Blumenau, estado de Santa Catarina. O corante utilizado na etapa de adsorção foi o RB5, nome comercial Preto Remazol Intenso N Gran 150 % da marca DyStar. Para ajuste do ph da solução, foram utilizados ácido nítrico PA (Lafan), solução aquosa de hidróxido de sódio 1 M (Lafan). A metodologia do trabalho foi dividida em três etapas: preparação de adsorvente, caracterização e ensaios de adsorção. 2.1 Preparação de adsorvente A preparação do adsorvente foi realizada a partir da pirólise da amostra precursora. 30 g de amostra de retalhos foram adicionados ao reator de inox inserido no interior de um forno mufla. Ao sistema foi conectado um condensador, coletor de condensado e borbulhador com solução de hidróxido de sódio para lavagem dos gases (Figura 1). Figura 1. Desenho esquemático do sistema de pirólise: (a) mufla, (b) condensador, (c) coletor, (d) borbulhador, (e) manômetro e (f) trompa de vácuo. Adaptado de Sonai et al. (2016). A temperatura de pirólise para preparação do adsorvente, foi avaliada através do comportamento das fibras têxteis submetidas a diferentes temperaturas, mediante a análise termogravimétrica (TGA) de trabalhos similares disponíveis na literatura científica. O tempo de pirólise foi obtido através de trabalhos prévios (Vasques, 2012). Na Tabela 1 são apresentadas as condições de obtenção para cada adsorvente. Tabela 1. Parâmetros utilizados nos experimentos de pirólise. Adsorvente Pirólise T (ºC) t (min) A-500-120 500 120 A-700-120 700 120 A-500-70 500 70 2.2 Caracterização das amostras A caracterização morfológica das amostras foi realizada por MEV, com o uso do microscópio eletrônico marca JEOL, modelo JSM-6390LV. A distribuição de volume de poros foi caracterizada utilizando isoterma de adsorção e dessorção com N 2 (equipamento NovWin, marca Quantachrome Instruments), quantificado a partir da curva ajustada pelo modelo matemático BJH (Benaddi et al., 2000).
2.3 Adsorção com corante têxtil O adsorvente produzido foi aplicado em processos de adsorção com efluente têxtil sintetizado em laboratório. Foi preparado uma solução estoque de corante hidrolisado 1000 mg.l -1 de acordo com metodologia apresentada por Lourenço et al. (2001). As soluções utilizadas nos testes de adsorção foram obtidas a partir de diluições sucessivas. Os ensaios de adsorção foram realizados em batelada, com 50 ml de corante e 40 mg.l -1, em ph 3 e concentração de adsorvente igual a 3 g.l -1, durante 24 horas. As concentrações de corantes na fase líquida foram medidas utilizando o espectrofotômetro (modelo AJX-1900, marca Micronal). A concentração na fase sólida foi conhecida a partir do balanço de massa indicado na Equação 1. O percentual de remoção de corante em fase líquida foi calculado conforme a Equação 2. q = (C 0 C) V m (1) Remoção = C 0 C C 0 100 % (2) Onde q é a quantidade adsorvida de corante por massa de adsorvente (mg.g -1 ); C e C 0 são, respectivamente, a concentração final e inicial de corante (mg.l -1 ); m é a massa de adsorvente (g) e V é o volume de solução (L). da amostra, correspondente à volatilização dos materiais orgânicos. Acima de 400 ºC, a massa sólida de amostra permaneceu praticamente constante, com aproximadamente 20 % da massa inicial. Figura 2. TGA de fibras de rayon. Fonte: Huidobro et al. (2001). Comportamento semelhante foi encontrado na TGA de fibras de cânhamo (Rosas et al., 2009). Conforme Figura 3, a degradação térmica é notável na faixa de temperaturas entre 300 ºC e 400 ºC correspondente à volatilização da celulose. Após esta temperatura a perda de massa sólida com a elevação da temperatura é consideravelmente menor, embora não seja nula. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Nesta seção, os resultados se dividem em análise do comportamento térmico de fibras, caracterização e aplicação em processo de adsorção com corante. 3.1 Análise termogravimétrica de fibras Huidobro et al. (2001) realizaram a TGA de fibras de rayon, ilustrada na Figura 2. Observou-se que a amostra apresenta perda de massa na temperatura de 100 ºC devido à evaporação da água. Na faixa de temperatura compreendida entre 300 e 400 ºC pode ser observada a decomposição Figura 3. TGA das fibras de cânhamo. Fonte: Rosas et al. (2009). A volatilização dos compostos orgânicos é fundamental para o desenvolvimento das características porosas de um adsorvente (Yang, 2003). Deste modo, optou-se por realizar a pirólise em 500 e 700 ºC, ou seja, acima da faixa térmica de decomposição de materiais orgânicos.
dv(r) (cm 3.Å -1.g -1 ) 3.2 Caracterização morfológica A Figura 4 ilustra a amostra de tecido in natura e após realização da etapa de pirólise (adsorvente preparado). Observa-se que o efeito térmico ocasionou degradação das moléculas de corante. Os entrelaçamentos das fibras têxteis, entretanto, permaneceram inalterados. (IUPAC), os poros são classificados em três faixas de valores: microporos, que possuem largura menor que 2 nm; macroporos, que apresentam largura maior que 50 nm, enquanto os valores intermediários são atribuídos aos mesoporos (Sing et al., 1985). 3.3 Distribuição de volume de poros (a) (b) A distribuição do volume de poros (dv(r)), obtida utilizando o modelo BJH, para as amostras de adsorvente é apresentada na Figura 6. Figura 4. Fotografia da amostra retalhos (a) antes e (b) após a pirólise. Com relação ao entrelaçamento das fibras, a situação pode ser melhor analisada pelas micrografias por MEV apresentadas na Figura 5. Comparando as imagens é possível verificar que foi mantido o ligamento tela do tecido mesmo após o processo de pirólise. 3,0E-03 2,5E-03 2,0E-03 1,5E-03 1,0E-03 5,0E-04 0,0E+00 1 10 100 1000 Diâmetro (nm) A-500-70 A-700-120 A-500-120 Figura 6. Distribuição de volume de poros para as amostras de adsorvente. A distribuição do volume dos poros diminuiu acentuadamente com a largura dos poros e se torna praticamente nula para os poros com tamanho maior que 10 nm. Pode ser observado que o volume de poros é maior na faixa de diâmetros até 10 nm, sendo máxima em torno de 3 nm que é o limite de detecção inferior do equipamento. A extrapolação dos dados no limite inferior das curvas indica uma característica predominantemente microporosa dos adsorventes. Figura 5. MEV da amostra (a) Precursora e adsorventes (b) A-500-70, (c) A-500-120, (d) A-700-120. Nenhuma das imagens da Figura 5 revelaram poros na superfície. Entretanto, a análise por MEV permite a visualização somente de ordem de grandeza micrométrica. De acordo com a União Internacional de Química Pura e Aplicada 3.4 Teste de adsorção A Figura 7 ilustra a curva de calibração para o corante RB5, o que possibilitou determinar a concentração em solução após os experimentos de adsorção. A concentração do analito relaciona-se linearmente com absorbância, de acordo com a lei de Beer.
Corante removido (%) Quantidade adsorvida no sólido (mg.g -1 ) Concentração (mg.l -1 ) 60 50 40 30 20 10 0 C (mg.l -1 ) = 61,618.Abs + 0,6294 R² = 0,999 Figura 7. Curva de calibração do corante RB5. Na Figura 8 é apresentada a quantidade de corante adsorvida na fase sólida, bem como o percentual removido da fase líquida. A maior quantidade de corante removido foi de 9 % utilizando o adsorvente A-500-120, equivalente a 1,06 mg.g -1 de corante adsorvido. Para o adsorvente A-500-70 a capacidade de remoção foi menor (0,53 mg.g -1 ou 5 %). Essa diferença indica que o maior tempo de pirólise contribuiu positivamente para a adsorção. 10% 9% 8% 7% 6% 5% 4% 3% 2% 1% 0% 0 0,25 0,5 0,75 1 Absorbância A-500-120 A-500-70 A-700-120 Adsorvente Figura 8. Quantidade adsorvida e percentual de corante removido para cada amostra. Adaptado de Correia et al. (2017). A amostra A-700-120 não apresentou adsorção. A alta temperatura conjuntamente com o tempo de pirólise prolongado pode ter ocasionado a perda dos sítios ativos. Perda da capacidade adsortiva relacionada ao aumento de temperatura e tempo de pirolise também foram relatadas em outros trabalhos (Naik et al., 2011; Zheng et al., 2014). 1,2 1 0,8 0,6 0,4 0,2 0 4 CONCLUSÃO O retalho têxtil se apresentou como matéria prima de baixo custo para preparação de adsorvente. A contribuição deste trabalho consiste em agregar valor a um resíduo que muitas vezes é descartado diretamente em aterros industriais. A distribuição do volume revelou a existência de poros entre 3 e 10 nm, muito menor que a capacidade de visualização por MEV. Por limitações do equipamento, a distribuição de volume de poros foi possível apenas para a região meso e macroporosa. Entretanto, faz-se necessária conhecer a distribuição para poros menores que 3 nm em virtude do adsorvente apresentar característica microporosa. Os adsorventes preparados apresentaram capacidade de adsorção limitada. Uma alternativa para aumentar a capacidade de adsorção consiste na adição de uma etapa de ativação química do adsorvente, que será avaliada em trabalhos futuros. 5 REFERÊNCIAS BENADDI, H.; BANDOSZ, T..; JAGIELLO, J.; SCHWARZ, J..; ROUZAUD, J..; LEGRAS, D.; BÉGUIN, F. Surface functionality and porosity of activated carbons obtained from chemical activation of wood. Carbon, v. 38, n. 5, p. 669 674, jan. 2000. CORREIA, J.; MENDONÇA, A. R. V.; SOUZA, S. M. de A. G. U.; VALLE, R. de C. S. C.; VALLE, J. A. B. Reaproveitamento de retalhos de tecido na fabricação de adsorventes. Anais do 2 o Seminário Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação da Indústria Têxtil, p. 123 135, 2017. EREN, Z.; ACAR, F. N. Adsorption of Reactive Black 5 from an aqueous solution: equilibrium and kinetic studies. Desalination, v. 194, n. 1 3, p. 1 10, jun. 2006. FREIRE, E.; LOPES, G. B. Implicações da Política Nacional de Resíduos Sólidos para as práticas de gestão de resíduos no setor de confecções. Revista de Design, Inovação e Gestão Estratégica, v. 4, p. 22, 2013. GULNAZ, O.; KAYA, A.; DINCER, S. The reuse of dried activated sludge for adsorption of reactive dye. Journal of hazardous materials, v. 134, n. 1 3, p. 190 6, 30 jun. 2006. HUIDOBRO, A.; PASTOR, a. C.; RODRÍGUEZ-
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