A PRISÃO DO DIREITO PENAL. Aurélio Wander Bastos



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Transcrição:

A PRISÃO DO DIREITO PENAL Aurélio Wander Bastos O moderno Direito Penal Brasileiro tem evoluído em três grandes linhas teóricas: a do Direito Penal Comum, que trata principalmente da criminalidade comum; a do Direito Penal Militar, que marca historicamente o Direito Brasileiro, principalmente com a criação do Supremo Tribunal Militar, ainda com D. João VI, e a do Direito penal Econômico, nas suas vertentes especiais: crimes contra a ordem econômica, em que se enquadram os crimes financeiros, ou também conhecidos como crimes de colarinho branco, os crimes de lavagem de dinheiro e os crimes contra a ordem tributária econômica. Superado o regime militar, que transferira para as auditorias militares os crimes políticos definidos em Lei de Segurança Nacional, inclusive reconhecendo no Superior Tribunal Militar STM os crimes militares que têm legislação substantiva e processual próprias. Os crimes de Direito Penal Comum, por tratarem de crimes de direito comum, tramitam, na sua forma histórica, nas varas e câmaras da Justiça Estadual, sendo que não podemos desprezar a ampla gama de crimes contra as relações de trabalho, que são apreciadas na própria Justiça do Trabalho. Todavia, nessas mesmas instâncias, se processam os crimes estaduais e municipais contra a ordem tributária. Os crimes de Direito Penal Econômico, reflexo da evolução das práticas contenciosas das instituições administrativas brasileiras, tramitam, em rito processual ordinário, em circunstâncias especialíssimas na Justiça Federal, tribunais especializados em avaliar crimes contra a União. O que alcança inclusive atos que possam envolver danos à União e às suas autarquias e fundações. Todavia, estas vertentes evoluem para o Superior Tribunal Militar, quando não são retidas nas instâncias inferiores, para serem apreciadas de uma perspectiva jurisprudencial uniformizadora. No entanto, diversamente do que deveria ocorrer, mas seguindo a nossa tradição de produzir leis substantivas (materiais) sem acompanhá-las de nova lei processual, como acontece na própria Justiça do Trabalho, a Justiça do Trabalho como especial órbita da Justiça brasileira, funciona na apreciação de delitos criminais, muito embora com base no mesmo Código de Direito Processual Penal que regula o rito dos crimes comuns, deixando a legislação de considerar que, dos tipos penais próprios do direito econômico, tem uma natureza substantiva profundamente

diferente dos crimes comuns, o que, em princípio, exigiria uma percepção processual diferenciada, mesmo porque não são partes individuais, litígio, mas pelo menos uma delas é a União, que, se presume, exige proteção especial sendo a titular do bem público. Os tipos penais de direito comum têm como característica essencial a prática criminosa contra a vida e a propriedade civil, de natureza material, sendo que os crimes de Direito Penal Econômico têm a natureza de bens fungíveis, ou seja, aqueles que podem ser substituídos por outro da mesma espécie ou semelhantes, que, modernamente, podem inclusive tomar uma dimensão virtual, facilitando não só o fluxo econômico-criminoso, mas o seu alcance repressivo. Neste sentido, aprofundaram-se, modernamente, os crimes de natureza bancária, de blanqueamiento de dinheiro, evasão de divisas, gestão fraudulenta, gestão temerária, e outros, que, por força da legislação brasileira, ou em alguns casos por omissão legislativa, ficaram na área federal. Exceto o blanqueamiento. Neste sentido, quando a Constituição brasileira dispõe (inc. LVII, art. 5º) que ninguém será considerado culpado até o transito em julgado de sentença penal condenatória, em primeiro lugar abre um significativo espaço na tradição judicial penal brasileira que sempre encarcerou o presumível criminoso independentemente do trânsito penal final, o que seria uma verdadeira revolução nas práticas judiciárias (e penitenciárias), mas, em segundo lugar, há que se considerar, por força de todos os dispositivos constitucionais de eficácia penal, que este dispositivo está vinculado à tradição punitiva do Direito Processual Penal Comum, não podendo se classificar como um princípio do Direito Penal Processual Especial, ou seja, semelhantemente ao que ocorre no Direito Processual Penal Militar, aplicável aos crimes de Direito Penal Econômico, por uma razão muito simples, pois, sendo a união uma das partes no contraditório, não prevalece o princípio da liberalidade jurídica no qual o que não está juridicamente proibido, está facultado, mas o princípio da responsabilidade jurídica em que o que não está juridicamente permitido, está proibido. Esta situação demonstra que o alcance repressivo nestas especiais situações exige procedimentos processuais próprios, demonstrando que o Direito Penal Processual Tradicional, se funciona como sistema fechado para os crimes comuns, pode, em determinas circunstâncias, funcionar como sistema aberto para os crimes especiais, onde

prevalece o princípio da responsabilidade de Direito Penal Econômico, suscetível de aplicação nos crimes econômicos, cuja única regra penal constitucional aplicável é o dispositivo (inc. LIII, art. 5º.) que estabelece que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente. Esta situação exige, por conseguinte, especial controle das autoridades judiciárias ao se pronunciarem sobre as políticas de tratamento destes delitos, para se evitar que a leitura aberta e compreensiva do dispositivo penal sobre trânsito em julgado nos casos de litígio de Direito Comum, venha a ser estendida à compreensão de delitos contra à União, em que prevalece a regra da responsabilidade. Neste sentido, a autoridade judiciária federal, mesmo condoída com a imprescindível proteção humana de agentes delituosos especiais, deve evitar que sua hermenêutica espontânea exponha os crimes que estão sujeitos à ação protetiva e repressiva da União, pois somente à autoridade judiciária caberá decidir entre o Direito Processual Penal e a regra da discricionariedade, pouco utilizada no Direito brasileiro (embora princípio geral no Direito anglo-americano), combinada com a lei substantiva aplicável. Nesse sentido, a recente manifestação do Presidente do STF sobre o cumprimento definitivo da prisão somente depois de sentença transitada em julgado está, na forma da sua posição, explicitamente determinada pela hermenêutica compreensiva dos crimes de Direito Penal Comum e não se lhe faltou a imprescindível cautela de apoiar-se, não apenas nos dispositivos constitucionais da ampla defesa e das garantias do contraditório para exprimir-se, mas também de sua decisão subtende-se que o problema que está em questão, independentemente do volumoso contingente populacional de criminosos comuns em nossas penitenciárias, é a ausência de legislação processual própria, especificamente destinada à questão tópica dos crimes de natureza complexa que fogem do cotidiano do Direito Comum e se integram não apenas nas práticas econômicas globalizadas como também viabilizáveis pela rede mundial de computadores. Desta forma, se o raciocínio desenvolvido no relatório do Presidente do STF pode ter um efeito colateral aplicável aos crimes genericamente denominados crimes financeiros, que cresceram vertiginosamente com as emendas constitucionais recentes, esta pode não ser a finalidade da orientação, pois fica implícito, muito especialmente, que o Código de Processo Penal, ficando comum à Justiça Estadual e à Justiça Federal, faz com que os fins processuais da legislação comum que inspiraram a Constituição sobreponham-se aos fins da legislação dos crimes econômicos, multiplicados na sua

criatividade com o processo de globalização e privatização. Estes crimes, por estas razões, muitas vezes são reconhecidos discricionariamente não sê-lo, o que torna a matéria de grande efeito político e jornalístico. Na verdade, os fins processuais de uma legislação não podem se confundir com o outro, sendo que as regras constitucionais para o tratamento penal do cidadão comum não pode transferir-se para o cidadão que não apenas representa a sociedade e o estado como seu concessionário, mas principalmente à sociedade e ao Estado, que cuida da segurança e funcionalidade da sociedade. O criminoso de colarinho branco está entre aqueles tipos penais que, pela natureza fungível, desagregam mecanismos artificiosos provocados pelas novas tecnologias, enquanto o criminoso comum está entre aqueles praticam atos contra a vida e a propriedade, cujos mecanismos processuais de apreciação têm uma natureza recorrente e repetitiva. Assim, qualquer pronunciamento sobre esta matéria, seja de natureza judiciária ou doutrinária, que não considere a diversidade da tipologia dos crimes penais e as suas instâncias e órbitas de decisão, mesmo em elevado grau onde prepondere a leitura dogmática comum, não alcança seus objetivos, principalmente quando o conhecimento da matéria fica restrito às presumíveis vantagens que poderiam advir para os criminosos que têm receitas financeiras abundantes, para manter em aberto os processos criminais. Na verdade, apesar de calculável veracidade desses efeitos de natureza colateral, ela esconde o verdadeiro sentido do Direito: o pobre fica prejudicado na tramitação de seus recursos, permanecendo preso até o trânsito em julgado, não exclusivamente porque é pobre, mas porque está submetido a um regime prisional congestionado que domina todo o sistema penitenciário estadual, e o Código de Processo Penal não tem aberturas para viabilizar sua movimentação, exceto se evoluir, mas para uma constitucionalização do Direito penal, da mesma forma que vem se constitucionalizando o Direito Civil. Por outro lado, o rico não fica preso apenas devido a seus recursos financeiros, mas porque as figuras processuais penais, da mesma forma que não constrangem o crime de quadrilha, não são suficientes na sua tipologia para alcançar os crimes de Direito Penal Econômico. Finalmente, apesar dos tantos argumentos constitucionais que justificam a compreensão desse lamentável fenômeno da vida jurídica brasileira moderna, a declaração recente do juiz Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil tem

uma força absolutamente protetiva da sociedade e do Estado porque deles subtende-se que os juízes que atuam nestas instâncias, mais compreenderiam o fenômeno, e melhor entenderiam o seu alcance, se se resguardassem no seu silêncio ou se manifestassem nos autos do processo como documentos especialíssimos de seus extensivos poderes. Mesmo reconhecendo o direito de opinião, questionável no exercício funcional, a opinião aberta não pode prevalecer sobre o placet da Magistratura, pois ela pode fazer com que a leitura aberta se transmude em decisão formal, contrariando, mesmo dentro de suas limitações, a tradição dos tribunais sobre a dilação de prazos de detenção ou trânsito em julgado de delitos fungíveis em que a União é parte pela natureza do exercício de sua função judicial, presidido pelo princípio da responsabilidade jurídica.