POR QUE TU E NÃO VOCÊ?

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Transcrição:

UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO ESPECIALIZAÇÃO EM LÍNGUA E LITERATURA COM ÊNFASE NOS GÊNEROS DO DISCURSO GABRIELA NAZÁRIO ZILLI POR QUE TU E NÃO VOCÊ? CRICIÚMA, SETEMBRO 2009

GABRIELA NAZÁRIO ZILLI POR QUE TU E NÃO VOCÊ? Monografia apresentada à Diretoria de Pósgraduação da Universidade do Extremo Sul Catarinense- UNESC, para a obtenção do título de especialista em Língua e Literatura com Ênfase nos Gêneros do Discurso. Orientadora: Profa. Dra. ÂNGELA CRISTINA DI PALMA BACK

CRICIÚMA, SETEMBRO 2009 Dedico este trabalho a Edvaldo Zilli, meu pai, Ruthe Nazário Zilli, minha mãe, Fernando Paz Silva, meu companheiro de todos os momentos e Tarek Zilli Hamad, meu filho, que durante esta trajetória, estiveram presentes e souberam compreender meus momentos de ausência, ao mesmo tempo que me estimulavam a seguir em busca dos objetivos traçados.

AGRADECIMENTO Agradeço às Drª. Márluce Coan e Drª. Ângela Cristina Di Palma Back, minhas professoras, e aqueles que estiveram comigo nesta caminhada e contribuíram de forma importante na construção de novos conhecimentos.

Bons professores são eloqüentes, professores fascinantes conhecem o funcionamento da mente. Bons professores possuem metodologia, professores fascinantes possuem sensibilidade. Bons professores usam a memória como depósito de informações, professores fascinantes usam-na como suporte da arte de pensar. Bons professores são mestres temporários, professores fascinantes são mestres inesquecíveis. Bons professores educam para uma profissão, professores fascinantes educam para a vida! (AUGUSTO CURY)

RESUMO Este trabalho tem por objetivo analisar a variação lingüística entre os pronomes TU e VOCÊ, descrevendo o perfil lingüístico dos falantes de Criciúma. O trabalho fundamenta-se na Teoria da Variação. Assim, parte-se da premissa de que cada forma desempenha funções distintas e está correlacionada a fatores de ordem lingüístico e social. Os dados analisados foram retirados de seis entrevistas do Banco de Dados Entrevistas Sociolingüísticas UNESC cujos informantes foram devidamente estratificados de acordo com sexo (masculino e feminino), idade (mais de 50 anos) e escolaridade (primário, ginásio e segundo grau). A partir da primeira vertente teórica, Teoria da Variação, proposta por William Labov, insiste-se na relação entre língua e sociedade e na possibilidade, virtual e real, de se sistematizar a variação existente e própria da língua falada (Tarallo, 2006, p.06). O caráter dessa investigação é de natureza quantitativa em que se interpreta os dados qualitativamente a partir de resultados estatísticos do pacote VARBRUL (1988). Dessa guisa, os fatores lingüísticos a serem controlados foram paralelismo formal (você/você, você/tu, tu/você, tu/tu), referência (particular, interlocutor, grupo e genérico), interação entrevistador/informante, formas nominais, tempo verbal e concordância verbal. Os resultados apresentados não só atestaram a variação entre as formas em jogo, como também revelaram a existência de usos não só restrito ao prescrito pela tradição gramatical TU e VOCÊ referendo-se ao interlocutor como também esboçam outros modos pelos quais tais pronomes interagem quando fazem uso dessas mesmas formas ao se dirigir a grupos, a si próprio e, também, genericamente a quaisquer pessoas. Palavras-chave: Tu; Você; Sociolinguística; Funcionalismo; Gêneros do Discurso.

LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01: Atuação das referências nos pronomes TU e VOCÊ...36 Gráfico 02: Atuação das referências grupo e particular sobre o sexo...39 Gráfico 03: Atuação do pronome TU sobre o sexo...39

LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Atuação do grupo referência sobre os pronomes TU e VOCÊ...36 Tabela 2: Atuação do grupo referência sobre a variável sexo...38 Tabela 03: Atuação do grupo referência sobre a variável escolaridade...41 Tabela 04: Atuação da referência sobre a variável interação entre entrevistador e informante...43

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO: TU OU VOCÊ MOSTRANDO O OBJETO... 10 2 GÊNEROS: DEFINIÇÕES E CONCEPÇÕES... 12 2.1 A entrevista como um gênero... 14 3 A SOCIOLINGUÍSTICA... 15 3.1 O que se tem dito de TU e VOCÊ... 22 4 METODOLOGIA... 25 4.1 Variáveis Dependentes... 26 4.2 Variáveis Independentes... 28 4.2.1 Fatores Linguísticos... 28 4.2.2 Fatores Extralinguísticos...31 5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS... 33 5. 1 - Referência e atuação do TU e VOCÊ na fala de informantes criciumenses...35 5.2 - Cruzamento dos fatores dos grupos referência e sexo...38 5.3 - Cruzamento dos fatores dos grupos referência e escolaridade...40 5.4 - Cruzamento dos fatores dos grupos referência e interação entre entrevistador x informante...43 7 CONCLUSÃO... 47 8 REFERÊNCIAS... 49

10 1 INTRODUÇÃO: TU ou VOCÊ mostrando o objeto O presente trabalho trata dos pronomes TU e VOCÊ na fala dos criciumenses. Por meio de uma análise sociolingüística e funcional, os pronomes serão abordados sob quatro contextos semânticos e pragmáticos: TU e VOCÊ particular, TU e VOCÊ interlocutor, TU e VOCÊ grupo definido e TU e VOCÊ genérico. O objetivo geral deste trabalho é verificar se há variação dos pronomes TU e VOCÊ na fala dos informantes criciumenses. Se houver variação, verificar como ela ocorre e se os contextos semânticos podem estar correlacionados à variação entre essas formas. Os questionamentos que norteiam essa investigação procuram perscrutar se o entrevistador pode influenciar ou não o uso das formas acima citadas; se há uma idade que propicie a utilização de uma das formas pronominais e se a escolaridade, como fator social, tem influência sobre o uso de uma das variantes em jogo e, por fim, identificar quem (homens ou mulheres) utiliza com maior freqüência o TU e VOCÊ. Essas indagações e suas respectivas hipóteses estão devidamente discutidas junto à metodologia, e suas respostas são alcançados por meio da pesquisa sociolingüística, que estuda as relações entre as variações lingüísticas e as variações sociológicas, levando em consideração toda a situação em que se encontra no momento em que uma mensagem é transmitida, conforme a seção que trata do referencial teórico. Em uma língua falada, por exemplo, a sociolingüística pode desenvolver um trabalho de pesquisa que permitirá o estudo da variação lingüística que pode ocorrer em um determinado grupo de pessoas. No caso do presente estudo, a variação está na utilização dos pronomes TU e VOCÊ, a exemplo do que estudam os autores como Mollica (2007), Tarallo (2006), Loregian (2004), Menon (2000), Lucca (2005) entre outros contribuíram para a elaboração da fundamentação teórica. Acerca do assunto, o trabalho apresenta em sua primeira seção os gêneros, que apresenta os textos como materialidade enunciativa presente com estilos próprios a cada esfera social de pertencimento, portanto, todo exemplar de

11 texto pode ser considerado como um determinado gênero segundo sua condições de produção. Dentre os diversos gêneros que podem ser encontrados no convívio social, tomamos como um deles a entrevista, por ser o gênero entrevista o local adequado para a coleta de dados. Na segunda seção abordaremos como a sociolingüística, ramo da lingüística que estuda a relação entre a língua e a sociedade, é a teoria que embasa esta investigação, fundamenta o estudo que aqui se investiga e o porquê de o gênero entrevista ser o local adequado para a coleta de dados. A terceira seção trata da metodologia que, com base no referencial teórico que será apresentado, mostrará o modo como fizemos a coleta de dados e seus desdobramentos junto aos encaminhamentos para a análise dos dados. Os resultados aqui apresentados revelam a variação entre TU e VOCÊ cujos resultados podem ser apreciados em detalhes junto à seção de análise, na qual evidenciamos a freqüência e as explanações no seu entorno, a exemplo do que se atestaram outros estudos que são chamados a fortalecer as discussões aí travadas. O presente trabalho apresenta ainda, análise dos dados retirados das entrevistas realizadas a partir dos seus objetivos didáticos e dos dados teóricos que a sustentam e por fim, as considerações finais.

12 2 - GÊNEROS: DEFINIÇÃO E CONCEPÇÕES O século em que se vive, e especialmente a partir de Bakhtin, viu a noção de gêneros textuais ser progressivamente aplicada ao conjunto das produções verbais organizadas, ou seja, às formas escritas usuais (artigo científico, resumo, notícia, publicidade, etc.) e ao conjunto das formas textuais orais, ou normatizadas, ou pertencentes à linguagem ordinária (exposição, relato de acontecimentos vividos, conversação, etc.). Assim, toda e qualquer espécie de texto pode atualmente ser designada em termos de gênero; portanto, todo exemplar de texto pode ser considerado como um determinado gênero. Marcuschi (2009) destaca que eles (os gêneros) surgem emparelhados a necessidades e atividades socioculturais, bem como na relação com inovações tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes em relação a sociedades anteriores à comunicação escrita. Segundo interpretação bakhtiniana, os gêneros são elementos bastante maleáveis e dinâmicos, haja vista a diversidade com que podem ser encontrados na sociedade, não se caracterizando, portanto, como formas de estruturas estáticas, prontas e acabadas de uma vez por todas. Nesse sentido, então, podemos citar Meurer (2000, p.150) segundo o qual: São tipos específicos de texto de qualquer natureza, literários ou não. Tanto na forma oral como na escrita, os gêneros textuais são caracterizados por funções específicas e organização retórica mais ou menos típica. São reconhecíveis pelas características funcionais e organizacionais que exibem e pelos contextos onde são utilizados. Gêneros textuais são formas de interação, reprodução e possível alteração social que constituem, ao mesmo tempo, processos e ações sociais e envolvem questões de acesso (quem usa quais textos) Vale ainda destacar outro aspecto do gênero que diz respeito ao fato de ser um tipo relativamente estável de enunciado. Para tanto, Meurer (2000) destaca que este tipo de enunciado reflete as condições específicas e as finalidades das esferas da atividade humana que estão relacionadas com a utilização da língua.

13 Essas esferas de atividades são quase infinitas e cada uma delas remete a um ou mais gêneros. À medida que a esfera fica mais complexa, o gênero relacionado a ela a acompanha. Se há algum tempo a expressão gênero estava ligada aos gêneros literários, atualmente a realidade remete a uma infinidade de espécies de textos que, por si, configuram os gêneros. Assim, independentemente da cultura na qual eles surjam, situam-se e integram-se, facilmente se desenvolvem. E talvez por isso, uma definição formal seja difícil de ser encontrada. Caracterizado por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais, os gêneros, quase inúmeros em diversidade de formas, obtêm denominações nem sempre unívoca, inclusive, do mesmo modo como surgem, podem vir a desaparecer. Contudo, não se deve confundir a propriedade atribuída aos gêneros de serem relativamente estável com aspectos meramente ligados à formação ou algo parecido, pois não se caracterizam nem se definam por aspectos formais, sejam estruturais ou lingüísticos, e sim por aspectos sociocomunicativos e funcionais, o que não quer dizer, que a forma deve ser desprezada ou posta em segundo plano, já que em muitos casos são as formas que ficam em evidência, o que acaba, muitas vezes, por configurarem o próprio gênero e, em outros tantos serão as funções. Nesse sentido, vale a pena trazer as considerações de Marcuschi (2009, p.10), que ressalta: [...] os gêneros textuais não se caracterizam como formas estruturais estáticas e definidas de uma vez por todas. Bakhtin dizia que os gêneros eram tipos "relativamente estáveis" de enunciados, elaborados pelas mais diversas esferas da atividade humana. São muito mais famílias de textos com uma série de semelhanças. Eles são eventos lingüísticos, mas não se definem por características lingüísticas: caracterizam-se, enquanto atividades sóciodiscursivas. Sendo os gêneros fenômenos sócio-históricos e culturalmente sensíveis, não há como fazer uma lista fechada de todos os gêneros. O exposto até aqui, permite-nos, em se tratando do trabalho com gêneros, lidar com a língua em seus mais diversos usos no dia-a-dia, já que, dentro dessa perspectiva, tudo o que se faz lingüisticamente constituir-se-á um gênero. Eles (os gêneros) não precisam (e não o são), necessariamente, entidades naturais como animais plantas, portanto, não se pode defini-los mediante certas propriedades que lhe devam ser necessárias e suficientes. Sob essa visão, por exemplo, uma carta que não contenha Senhor diretor em seu início e que

14 também não contenha a assinatura do remetente, ainda pode ser considerada uma carta. Um poema também pode ser usado em um anúncio de publicidade, e, ainda assim, manter-se-á a qualidade do gênero. De modo que um gênero pode não ter uma determinada propriedade e ainda continuar sendo aquele gênero. Todorov (1980) afirma que os gêneros funcionam como instituição e constata a existência de duas vertentes. Por um lado, de acordo com o autor, os autores escrevem em função do sistema genérico existente. Por outro lado, os leitores leem em função do sistema genérico que conhecem pela crítica. Em quaisquer situações, o gênero estará sempre enquadrado em uma situação social, cada qual com características temáticas, composicionais e estilísticas próprias para formar um gênero, lembrando, portanto, sua natureza heterogênea. Dentre os diversos gêneros textuais que podem ser encontrados no convívio social, tomamos como um deles a entrevista, que discutiremos na seção seguinte. 2.1 - A ENTREVISTA COMO UM GÊNERO As entrevistas constituem-se em um tipo específico de gênero textual, por meio da qual, a partir de um determinado objetivo, o pesquisador elabora perguntas que serão aplicadas ao entrevistado. Esse gênero está presente em atividades ligadas à oralidade e em situações de escrita cujas plataformas tendem a ser revistas, semanais ou mesmo acadêmicas, ou ainda, como um instrumento metodológico a ser utilizado por pesquisadores. Para Gil (1999), trata-se de uma técnica de pesquisa que visa a obter informações de interesse a uma investigação. Eis aqui um uso específico que privilegia a pesquisa. Assim, em sendo uma das técnicas de coleta de dados mais utilizadas no que se refere às ciências sociais, a entrevista, conforme o autor, permite identificar variáveis e suas relações, comprovar hipóteses, orientar outras fases da pesquisa. Seus dados podem ser classificados e quantificados e não exige,

15 em muitas situações a depender do tipo de pesquisa, que o informante saiba ler ou escrever. Uma entrevista pode ser mais ou menos estruturada. No primeiro caso, há um roteiro pré-estabelecido, ao passo que, no segundo caso, não há roteiro préestabelecido. Nosso interesse, portanto, passa pela discussão da natureza da entrevista sociolingüística, que também é usada como unidade de análise em pesquisas e que se enquadra junto ao primeiro caso. A seguir, abordaremos como a sociolingüística, teoria que embasa esta investigação, fundamenta o estudo que aqui se investiga e o porquê de o gênero entrevista ser o local adequado para a coleta de dados. 3 - A SOCIOLINGUÍSTICA O ramo da lingüística que estuda a relação entre a língua e a sociedade é a sociolingüística, sobretudo no que diz respeito ao fato de que a língua não pode ser vista como abstrata e independentemente de fatores sociais; ao contrário, ela existe enquanto interação social, daí se depreende um ponto de contato com as abordagens bakhtianas acerca do gênero. De acordo com Tarallo (2006, p.07): O iniciador desse modelo teórico-metodológico é o americano William Labov. O modelo de análise proposto por Labov apresenta-se como uma reação à ausência do componente social no modelo gerativo. Foi, portanto, William Labov quem, mais veemente, voltou a insistir na relação entre língua e sociedade e na possibilidade, virtual e real, de sistematizar a variação existente e própria da lingua falada. Por meio da fala do autor, observa-se que Labov foi uma das pessoas que procurou mostrar a relação existente entre língua e sociedade e as variações linguísticas presentes, mesmo aquelas que estavam em evidência, cujas variações se mostram em diferentes níveis entre os falantes de uma língua. Isso se faz sob o princípio de que o homem é um ser social, há a necessidade de que ele se comunique, de modo a ocorrer de forma espontânea, por meio da fala individual do usuário da língua.

16 Para Tarallo (2006), a Sociolingüística estuda as relações entre as variações lingüísticas e as variações sociológicas, levando em consideração toda a situação em que se encontra no momento em que uma mensagem é transmitida. Nessa perspectiva, a principal tarefa da Sociolingüística, segundo Magalhães (2008), é mostrar a variação da língua, língua esta que, durante sua trajetória, passa por várias modificações até que chegue não intacta ao receptor e, nesse momento, pode surgir, então, o chamado preconceito lingüístico, que acaba por medir a capacidade intelectual do falante frente ao uso da língua. Em uma língua falada, por exemplo, por meio da sociolingüística variacionista, pode-se desenvolver um trabalho de pesquisa, permitindo o estudo da variação lingüística que ocorre em um determinado grupo de pessoas dentro de uma comunidade de fala. A variação lingüística, segundo alguns teóricos, acontece em todos os níveis de elaboração da linguagem, e ocorre em função do emissor e do receptor, sempre levando em conta a região em que se encontra (emissor ou receptor), faixa-etária, classe social e profissão, sendo eles responsáveis por essa variação. No caso do Brasil, pelo fato de ser um país extenso e com uma população diversificada, utilizando a mesma língua materna, sempre haverá a heterogeneidade lingüística, dentro do mesmo estado ou comunidade lingüística. (BARBOSA, 2009, p.03) Por meio da sociolingüística, pode-se investigar fenômenos estigmatizados ou não e, por conseqüência, fornecer expedientes visando à elaboração didático-metodológica para os estudos da oralidade em diferentes locais. Por meio dessa teoria, é possível que se faça o registro de diversos tipos de falas em diversas localidades na mesma região. Entretanto, há que se ressaltar a necessidade de se delimitar a comunidade de fala na qual a variação será pesquisada para que, assim, os dados sejam os mais fidedignos possíveis, o que, segundo Tarallo (2006), esboça a relação entre língua e sociedade. Dentro desse contexto, a abordagem laboviana busca entender a língua em seu contexto social. Segundo Santos (2009, p.02): para Labov, a sociolingüística adquire a fundamentação teórica na relação de interação fala/sociedade, na qual a descrição intersubjetiva de uma lingüística social expressa a concepção de investigação empírica microssociológica da linguagem. Na pesquisa feita por Labov na ilha de Martha s Vineyard, por exemplo, os habitantes, percebendo a invasão de veranistas e a língua por eles falada, pensando

17 que se sobressairia à sua, passaram a exagerar na pronúncia de sua língua. As atitudes da língua podem ser vistas como uma arma capaz de proteger sua identidade cultural, mostrando, ainda, que a língua é um fator muito importante na identificação dos grupos, bem como uma forma de identificar suas diferenças sociais. Labov, segundo Tarallo (2006), destacava a importância da investigação da realidade na qual o indivíduo está inserido, bem como perceber e analisar o contexto social em que a língua é utilizada, o que leva à conclusão de que a variação linguística pode ocorrer em função de todo um contexto social, de modo que o fato linguístico está diretamente relacionado a um fato social. Tarallo ainda assinala que, por meio de suas pesquisas, Labov observou que os falares carregam grandes variações e que elas servem, de fato, para a comunicação entre falantes de comunidades de fala. Nesse sentido, a análise linguística desempenha papel fundamental no processo de interação fala/sociedade. A título de exemplo, no sentido de explicitar o valor das variantes em jogo, de acordo com Mollica (2007), entre os anos de 1960 e 1970, Labov realizou alguns estudos nos quais se pode observar que falantes com maior cotação no mercado linguístico tendem a lançar mão de estruturas de maior prestígio. Isso mostra que os falantes de uma determinada comunidade linguística possuem consciência do valor das variantes no uso da língua. Evidentemente, que isso não se dá metacognitivamente, talvez possamos dizer que está apenas em nível cognitivo. De acordo com Tarallo (2006), todos os que entendem a língua como um veículo de comunicação, informação e de expressão entre as pessoas, podem também ser chamados de sociolinguistas. Contudo, vale a ressalva de que a teoria laboviana destacou-se por colocar em evidência a possibilidade de sistematizar a variação existente na própria língua falada, o que, consequentemente, coloca a fala em foco. A Sociolingüística variacionista destaca-se por trabalhar com números e tratamento estatístico de dados coletados e opera com duas ou mais formas linguísticas que expressam o mesmo estado de coisas, tratadas como variantes de uma mesma variável. A esse conjunto de variantes linguísticas, que, na verdade, constituem-se como as diversas formas de se dizer a mesma coisa, chamamos de variável linguística que, em última instância, diz respeito ao fenômeno estudado. No

18 caso deste trabalho, a nossa variável é a variação entre os pronomes TU e VOCÊ na fala dos criciumenses. Em uma comunidade de fala, são comuns as formas lingüísticas em variação. Por variável linguística, devemos entender as diversas formas que existem de se dizer uma mesma coisa, em um mesmo contexto, com o mesmo significado. Portanto, em princípio, diremos que o TU e o VOCÊ, dirigindo-se ao interlocutor, revela duas variantes para uma mesma variável: pessoa com quem se fala (interlocutor). Analisar e aprender a sistematizar variantes linguísticas usadas por uma mesma comunidade de fala é um dos objetivos postos pela teoria da variação linguística, segundo Tarallo (2006). E é nesse ponto que podemos afirmar que nossa análise procurará sistematizar as correlações em cada uma das variantes, ou seja, em TU e VOCÊ. Portanto, a análise sociolinguística se justifica pela necessidade de se tentar compreender quantos e quais são os fatores que possam influenciar o uso de uma ou de outra variante, uma vez que a comunidade de fala é influenciada direta e indiretamente pelo meio social de abrangência. De acordo com Tarallo (2006), a cada variante correspondem certos contextos que a favorecem, e esses contextos são chamados de fatores condicionantes. Esses fatores são usados pelas variantes e determinam potencialmente a influência da realização de uma variável, de uma (por exemplo o TU) ou de outra forma (por exemplo VOCÊ). Dentre o rol de fatores que se pode mobilizar visando à investigação, há os eminentemente linguísticos e os extralinguísticos (sociais). Um fator linguístico relevante, por exemplo, pode ser a referência. Os pronomes TU e VOCÊ podem aparecer com referência ou significados diferentes, ou melhor, podem ser usados para se referir ao interlocutor, a um grupo definido, particular ou genérico, dependendo do contexto em jogo. Ainda como contexto de possibilidades, há que se mencionar outro fator que se dá em nível da interação estabelecida entre o entrevistador e o informante. O entrevistador pode ter ou não alguma influência na fala do informante. Se o entrevistador usar o pronome VOCÊ em uma pergunta, por exemplo, o informante poderá usá-lo ou não na sua resposta. Esse viés, necessariamente, deve ser considerado junto aos procedimentos metodológicos, visando a não enviesar os resultados.

19 Fatores extralingüísticos também são muito importantes, sobretudo em trabalho fundamentados por uma abordagem sociolinguística. Fatores como a formalidade, a informalidade, escolaridade, faixa etária e sexo podem estar correlacionados a uma ou a outra variante sob o enfoque da teoria da variação. Os fatores extralinguísticos são relevantes na análise de dados, de forma tal, que quanto mais fatores externos sobre os informantes da pesquisa forem incluídos na análise, maior será a representatividade da amostra. Nesse contexto, cita-se Tarallo (2006, p.47): No caso de você prever um caso de variação que já projete uma mudança dentro do sistema, o fator faixa etária é de extrema importância. O sexo é outro fator extralingüístico importante. As pessoas do sexo feminino apresentam maior tendência a sofrer uma variação. A forma de prestígio tende a predominar na fala feminina, (...) as mulheres demonstram maior preferência pelas variantes lingüísticas mais prestigiadas socialmente, de acordo com Mollica (2007, p. 34). Configura-se fator extralinguístico, também, o nível sócio-econômico. É possível, em conformidade com Tarallo (2006) constatar-se que pessoas de grupo social menos privilegiado utilizam a forma pronominal não-padrão. Lista-se, então, para este estudo, dois fatores sociais que foram analisados, a saber: sexo (masculino e feminino) e escolaridade (primário, ginásio e segundo grau antiga nomenclatura dada ao Ensino Básico). Os fatores linguísticos, por sua vez, foram: referência (particular, interlocutor, grupo, genérico), interação entrevistador / informante, paralelismo formal (você/você, você/tu, tu/você, tu/tu) formas nominais, tempo verbal e concordância verbal. Neste contexto e segundo Mollica (2007), pode-se afirmar que todas as línguas são heterogêneas e o português é repleto de exemplos disso. O pronome TU, por exemplo, é um pronome utilizado com maior freqüência no Sul do país, encontrando-se, portando, com menos escala de utilização em outras regiões. O uso da língua portuguesa em uma casa pode não ser o mesmo em outra, ou seja, a linguagem, que se utiliza em uma residência, pode não se utilizar em outra, ao passo que, em outros momentos, uma grande variação linguística pode não trazer grandes alterações na mensagem que se deseja transmitir. Percebe-se assim que a variação linguística existe em diferentes contextos e situações, entretanto, isso não é um fator determinante para que a mensagem não seja

20 transmitida, mostra que a variação linguística existe e que não altera, necessariamente, as mensagens. Exemplo: 1 - Prato do dia: guisado com mandioca. 2 - Prato do dia: carne moída com aipim. Nos exemplos 1 e 2 acima, observa-se a variação regional. Nesse caso, a mesma comida é apresentada de duas maneiras ao consumidor. Nota-se, então, nos exemplos, que a variação lingüística pode não interferir na mensagem que se deseja entender. Vale salientar que existem condições ou regras que funcionam para favorecer ou desfavorecer, variavelmente e com pesos específicos, o uso de uma forma ou de outra (variantes de uma mesma variável), de acordo com o contexto, como por exemplo, uma das hipóteses no presente estudo é o fato de os entrevistados com escolaridade ginásio utilizarem mais o pronome VOCÊ do que aqueles que possuem somente o primário. Essa hipótese, portanto, leva em consideração fatores ligados à variável escolaridade. Segundo Mollica (2007, p. 51), a escolaridade gera mudanças na fala e na escrita das pessoas, interferindo, assim, na linguagem das mesmas. A autora usa uma frase muito expressiva: A escola sozinha, não faz a mudança, mas mudança alguma se faz sem o concurso da escola. A escolarização tem sido um dos aspectos mais associados à questão da variação lingüística, muito embora os estudos acerca dos aspectos que afetam à variação estejam bastante avançados, ainda há muito o que se pensar a respeito, afirma Mollica (2007). A variação lingüística é um fator presente na sociedade de maneira bastante visível, sobretudo aqueles que estão em nível fonético-fonológico, pois os fenômenos ligados ao sons da fala são bastante salientes. Ainda neste contexto, Mollica (2007) afirma que mudança implica em variação: mudança é variação, mas nem tudo está em variação e por isso deve-se investigar. A autora remete à idéia de que toda mudança irá gerar uma variação. Essa mudança se faz presente inclusive na língua portuguesa, que é uma língua natural. Por ser heterogênea, ela é constituída de inúmeras variedades. A utilização dos pronomes TU e VOCÊ podem exprimir, por exemplo, a constituição de uma

21 dada variedade, embora se constate a existência da variação, haja vista as pessoas ora falarem o TU, ora o VOCÊ. Em relação à variável social sexo, pode-se dizer que há diferença entre a ocorrência de certas variantes, entre elas os pronomes TU e VOCÊ. Geralmente, a forma de prestígio tende a ser mais utilizada pelas mulheres, mostrando que elas apresentam uma preferência pelas variantes de maior prestígio social. Exemplo disso é o estudo feito por Mollica (2007, p.35): No gênero discursivo podem ser depreendidas correlações significativas entre variação lingüística e gênero/sexo como, por exemplo, na alternância entre as formas de tratamento tu e você. Com base em dados de interação face a face entre falantes cariocas, mostra-se que a ocorrência do pronome tu sem concordância com o verbo é mais freqüente na fala de homens do que na fala de mulheres. Evidencia-se, então, a sensibilidade feminina ao prestígio social atribuído pela comunidade às variantes lingüísticas. Ao cruzar elementos como sexo e classe social, por exemplo, chega-se à conclusão de que, em geral, as diferenças entre a fala de homens e mulheres são mais evidentes nos grupos intermediários, do que nos grupos extremos, segundo Mollica (2007). Sintaticamente falando, a variável sexo não tem sido fato muito distintivo, mas em se tratando do uso de pronomes, na maioria das vezes, parece ser o caso da correlação, ou seja, é afetada pela variável sexo. Para Tarallo (2006), a necessidade de a mulher garantir sua aceitação social pode ser atribuída como um dos fatores de elas utilizarem com maior freqüência a norma padrão. Muitos papéis que são atribuídos às mulheres, como o de educar seus filhos, por exemplo, fazem com que tenham uma conduta irrepreensível, conduta esta que faz, inclusive, com que as mulheres utilizem a linguagem de forma mais padrão do que os homens. Diante do exposto, podemos dizer que as línguas variam e que, portanto, também mudam com o tempo. A exemplo disso, temos o latim e a própria língua portuguesa que vem sofrendo alterações ao longo dos séculos. Essas mudanças ocorrem de forma gradual. Para tanto, vale ressaltar que as variantes, tanto lingüísticas quanto não linguísticas, não agem isoladamente; operam de forma que podem ou não favorecer o emprego de formas variantes. Diante dessa constatação, mesmo que empírica em alguns casos, faz com que pessoas com nível de escolarização alta e em contato com a escrita, admitam a existência do padrão popular e culto da língua.

22 No português, observa-se que o uso do pronome VOCÊ é regido, por um lado, pela diferença de idade entre a pessoa que fala e a que ouve e, de outro, pelo grau de intimidade, exceção feita à região de Criciúma, pois esse papel parece estar reservado ao TU. Em relação à faixa etária, parece que, quando se predomina uma variante em faixa etária de jovens, pode ser um sinal de que esteja ocorrendo uma mudança em progresso. No caso do presente estudo, a faixa etária dos entrevistados é de cinqüenta anos de idade. Não é intuito investigar se o fenômeno em variação está em processo de mudança, mesmo que em tempo aparente. Após chegar a esse ponto, é necessário que se tenha clareza de que a língua falada é heterogênea e variável, ou seja, ela é um sistema de regras que pode variar. Trata-se de um princípio universal proposto pela sociolinguística. Por fim, salientamos que esse estudo trata dos pronomes TU e VOCÊ na fala dos criciumenses, cujas análises de dados visam a verificar se há variação entre esses dois pronomes, a exemplo do que já atestam, em outras comunidades de fala, os resultados com base em outras investigações dessa mesma natureza. A seguir apresentaremos alguns estudos que, a exemplo deste, focaliza o fenômeno em questão. 3.1 O QUE SE TEM DITO DE TU E VOCÊ Como o foco deste trabalho visa a encontrar os contextos de ocorrência dos pronomes TU e VOCÊ, necessário se faz visitar alguns autores que registram seus depoimentos no entorno desses usos. Iniciamos nossa discussão por Menon & Loregian-Penkal (2002), a partir da qual seguem-se outros estudos acerca do fenômeno de variação das formas pronominais de TU e VOCÊ como segunda pessoa do discurso. Segundo Menon & Loregian-Penkal (2002), a [...] afirmação [...] de que o TU foi substituído por VOCÊ, [...], também carece de comprovação científica: trabalhos históricos e/ou sincrônicos vêm demonstrando que em muitas regiões provavelmente o VOCÊ teria sido o primeiro pronome implantado, sem etapa anterior de uso de TU. (p. 149).

23 As autoras fazem essa afirmação trazendo para atestá-la Menon (1994), segundo a qual há evidência do não-uso de TU, e Bueno (1958) tecendo uma crítica a afirmações do Dialeto Caipira de Amadeu Amaral quando descreve que o TU era reservado a situações bastante ofensivas, e o VOCÊ pouco usado dá lugar à forma mais corrente mecê (respeitosa) ou então ocê (informal). Loregian (1996) e Menon (1996b) assinalam que a implantação do VOCÊ em Curitiba se deve à penetração dos vicentinos (da Capitania de São Vicente) no planalto paulista e na direção sul do país, passando por Curitiba (fundada em 1693), e por Lages (planalto catarinense), e tendo atingido também boa parte do Rio Grande Sul, conforme se observa na área de uso do VOCÊ, constatada pelos levantamentos do ALERS Atlas Linguístico e Etnográfico da Região Sul. Com base nisso, as autoras explicam a extensão do fenômeno da variação entre as formas TU e VOCÊ constatada na região Sul do país. Ainda acerca da alternância entre o TU e VOCÊ, em alguns trabalhos que mostram resultados 1 a partir de córpus 2 com base em dados reais a ratificam. Vejamos alguns resultados de Loregian (1996). A autora constatou (i) o não-uso de tu em Curitiba; (ii) e, por outro lado, ocorrências de uso não só da forma pronominal TU como também VOCÊ tanto em Florianópolis quanto em Porto Alegre, com distribuição diferenciada nas duas capitais. Portanto, em Curitiba constata-se o uso exclusivo de VOCÊ, já nas outras duas capitais a variação é atestada. Menon & Loregian-Penkal (2002), com o propósito de checar as ocorrências dos pronomes nos indivíduos, revisitam os dados de Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre, além levantarem dados de três cidades no interior de Santa Catarina. Nessa rápida análise, elas acabam por constatar que a variação é extremamente produtiva, ratificando, assim, a alternância entre os pronomes TU e VOCÊ para representar a segunda pessoa do singular. As autoras ainda assinalam, após uma análise mais detida, a evidência de diferenças regionais: [...] de um lado, Curitiba apresenta, categoricamente, o emprego de VOCÊ. De outro, Porto Alegre e Chapecó não têm informantes mulheres que usem categoricamente só VOCÊ. Em Blumenau, tanto 1 Além dos já citados como Menon (1996b), Loregian (1996), Menon & Loregian-Penkal (2002), há Guimarães (1979), Abreu (1987), Ramos (1989), Menon (2000), Hausen (2000), Lucca (2005). 2 Faz-se uso da forma aportuguesada que, segundo Menon & Loregian-Penkal (2002), sofre regularização, a partir do latim corpus, enquadrando-se junto às paroxítonas terminadas em u(s), como em húmus, bônus, cáctus, câmpus, cuja terminação em s no singular, torna a forma invariável no plural.

24 homens como mulheres preenchem as células de só TU, só VOCÊ e T+V. Por fim, destacamos Lucca (2005) que esboça algumas exposições teóricas, para em seguida contrapô-las. Segundo seu trabalho, que trata da variação TU/VOCÊ na fala brasiliense sob o ponto de vista da Teoria da Variação Linguística, leva em conta a influência de fatores como a alternância de estilos e o tipo de relação entre os interlocutores na determinação das formas. Para tanto, a autora visita alguns estudiosos que abordam a temática. O primeiro autor resgatado por ela diz respeito a Luft (1957), o qual afirma que o VOCÊ é a forma de tratamento íntimo mais comum no Brasil e que o TU, e, segundo Nunes (1938) 3, é utilizado em dois casos extremos: ou na linguagem afetiva, íntima e de igual para igual, ou então no falar enfático e, por vezes, escarninho ou irônico. Logo depois, Lucca (2005) apresenta Cintra (1972), o qual tece considerações afirmando que desde o português antigo até o contemporâneo, o uso do TU sempre foi associado ao tratamento íntimo e o uso do VOCÊ, a partir do século XVIII, associa-se ao tratamento cortês. Ainda segundo a autora, para Faraco (1996), o VOCÊ afetou o sistema pronominal do português ou substituindo o TU, ou criando um nível de relativa formalidade em relação ao TU. Para Lucca (2005), esses autores de uma forma ou de outra alimentam a noção de que o pronome TU foi suplantado pelo VOCÊ na variedade brasileira do português. Para ratificar essa linha de raciocínio, Lucca (2005) vai buscar no semanticista Ilari et alli (1996) e em Cunha & Cintra (2001) as afirmações de que o uso do TU encontra-se, atualmente, restrito à fala de Porto Alegre, e que o emprego do TU, no português do Brasil está restrito às falas do extremo Sul do país e a pontos isolados da região Norte, respectivamente. Para Lucca (2005), trata-se de um equívoco por não refletir a realidade da variedade do português, especialmente nas relações solidárias. O uso do TU, segundo a autora, apresenta estatutos diferentes nas várias regiões em que ocorre, e na fala brasiliense não é diferente. Levando-se em conta esta especificidade da variação na referência de segunda pessoa, é imperativo [...] lidar com o componente social da linguagem. (p. 3). 3 NUNES, Sá. Língua Vernácula, 4ª. série. São Paulo: [s.n.], 1938.

25 De acordo com a autora, a variação TU/VOCÊ na fala brasiliense ocorre em contextos bem específicos, manifestando-se na fala dos jovens brasilienses. A fala dos jovens do gênero masculino favorece o uso do pronome TU, sem a concordância verbal explícita, em contraposição ao uso do pronome VOCÊ. Dos grupos de fatores controlados, apenas seis foram relevantes, dois dos quais linguísticos: o tipo de ocorrência no discurso (paralelismo linguístico), se em série ou isolada e o tipo de estrutura em que o pronome ocorre, se afirmativa, interrogativa ou exclamativa; e quatro grupos de fatores extralinguísticos que são: o tipo de relação entre os interlocutores, a familiaridade do falante com o tema do discurso, a região administrativa de onde o falante provém e o gênero do falante. O gênero do falante foi o primeiro fator selecionado, que confirmou a intuição que Lucca tinha antes da coleta dos dados, que o TU é mais usado entre falantes do gênero masculino. Segundo Lucca, o pronome VOCÊ é a variante de prestígio na sociedade brasiliense e é, nessa sociedade, preterido pelos homens em oposição ao TU, que marca solidariedade. As mulheres tendem a usar mais a variante padrão que os homens. Isso posto, passaremos agora, com base no referencial teórico aqui apresentado, ao modo como fizemos a coleta de dados e seus desdobramentos junto aos encaminhamentos para a análise dos dados. 4 - METODOLOGIA Os dados analisados neste trabalho foram retirados de seis entrevistas do Banco de Dados Entrevistas Sociolingüísticas da Unesc, cujos informantes foram devidamente estratificados de acordo com as seguintes células sociais: sexo, idade e escolaridade, totalizando 302 dados. A teoria da Variação e Mudança Linguística tem como objeto de estudo a variação e mudança da língua dentro do contexto social da comunidade de fala. Considera significante a função social e comunicativa da língua como fator importante na identificação de grupos e na demarcação de diferenças sociais na comunidade.

26 A própria teoria da Variação em si apresenta uma base metodológica que nos instrumentaliza à averiguação dos fenômenos variáveis, já que possui como finalidade analisar um determinado fenômeno linguístico variável. A partir das considerações explicitadas no referencial teórico, pode-se dizer que o grau de escolaridade, idade ou sexo do falante podem influenciar junto à variação das formas TU e VOCÊ, e que essa utilização tem relação direta com a posição social desse falante na comunidade a qual pertence. O caráter dessa investigação é de natureza quantitativa em que se interpretam os dados qualitativamente, a partir de resultados estatísticos do pacote VARBRUL (Pintzuk, 1988). A análise dos dados será realizada por meio da observação dos dados estatísticos produzidos pelo VARBRUL (Pintzuk, 1988) e analisados à luz do referencial teórico de autores como Mollica (2007), Tarallo (2006), Loregian (1996 e 2004), dentre outros que fazem referência à Teoria da Variação Linguística. Foram analisados dois fatores sociais: sexo (masculino e feminino) e escolaridade (primário, ginásio e segundo grau), e, por fim, fizemos o recorte considerando-se somente os informantes com mais de 50 anos. As variáveis linguísticas a serem controladas são referência, interação entre entrevistador e informante, paralelismo formal, tempo verbal, formas nominais e concordância verbal. Vejamos como se constitui nesta investigação esse controle. Daremos início à discussão pelos fatores linguísticos e depois os extralinguísticos. 4.1 - VARIÁVEIS DEPENDENTES O primeiro destaque a se fazer aqui diz respeito ao fato de que operaremos com quatro variáveis dependentes juntos as quais se constata a variação entre os pronomes TU e VOCÊ. São elas:

27 Particular - TU e VOCÊ com referência/significado particulares: aparecem em contextos bem definidos, significando a 1ª pessoa do singular, ou seja, o próprio falante. 1: l - *Tu não paras pra conversar, né? *Tu não tens, num, então aqui na... aqui em casa... (...) se não tu não conversas nada, se está vendo televisão, (p.69-70). (SC CRI 08 F B PRl) 2: l -(...) eu entrei naqueles estúdios lá, cantei já, muitas vezes, (est) mas só na dificuldade de você tentar fazer uma coisinha é difícil...(sc CRI 06 M B SEG). Interlocutor - TU e VOCÊ tem o significado previsto pela norma padrão e é usado para designar a 2ª pessoa do singular, a pessoa com que se está falando. 3: l - *Meus filhos, tu conheces, são ótimos... (SC CRI 11 F B SEG). 4: l - *lnclusive gente daqui, você sabe muito bem quem são,... (SC CRI 02 M B PRl). Grupo - TU e VOCÊ são usados para designar algumas pessoas do discurso ou quando o falante consegue determinar um grupo de pessoas. 5: i - *Pode botar um outro peixe também que tu pegas... (SC CRI 02 M B PRl). 6: l - *O tempo vai passando, vai passando e você vai envelhecendo e não vai conseguindo as coisas, vai sonhando... (SC CRI 06 M B SEG). Genérico - TU e VOCÊ servem para designar todas as pessoas do discurso. Esta função aparece quando o falante não consegue determinar a quantidade de envolvidos. 7: í - *Olha, aqui tem uma que é mais pequena, que aí tu dispõe de pregação... (SC CRI 09 F B GIN)

28 8: í - * (...) ditam o que interessa e você fica com o que interessa,... (SC CR! 04 M B GIN). Em face do exposto: Será que o informante usa sempre os pronomes TU e VOCÊ referindo-se ao interlocutor, que é a forma prescrita pela gramática? Temos por hipótese que os informantes não utilizam os pronomes TU e VOCÊ apenas para referirem-se ao interlocutor. Acreditamos que eles usam também, para fazer referência a grupos específicos, genéricos e a ele mesmo. 4.2 - VARIÁVEIS INDEPENDENTES 4.2.1 - Fatores lingüísticos Os grupos de fatores controlados neste estudo foram: interação, paralelismo formal, tempo verbal, formas nominais e concordância verbal. A seguir faremos, então, a caracterização de cada um deles. 1) Interação Um dos fatores linguísticos analisados, portanto, foi a interação entre o entrevistador e o informante, sendo controlado da seguinte forma: - O entrevistador usa VOCÊ e há uma menção de VOCÊ na fala do informante; - O entrevistador usa VOCÊ e há duas ou mais menções de VOCÊ na fala do informante; - O entrevistador não usa TU e VOCÊ, e há duas ou mais menções de TU na fala do informante; - O entrevistador não usa TU e VOCÊ, e há uma menção de TU na fala do informante;

29 - O entrevistador não usa TU e VOCÊ, e há uma menção de VOCÊ na fala do informante; - O entrevistador não usa TU e VOCÊ, e há duas ou mais menções de VOCÊ na fala do informante; - O entrevistador usa TU, e há uma menção de TU na fala do informante; - O entrevistador usa TU, e há duas ou mais menções de TU na fala do informante; - O entrevistador usa VOCÊ, e há duas ou mais menções de TU na fala do informante; - O entrevistador usa VOCÊ, e há uma menção de TU na fala do informante; - O entrevistador usa TU, e há duas ou mais menções de VOCÊ na fala do informante; - O entrevistador usa TU, e há uma menção de VOCÊ na fala do informante. A pergunta que desencadeou esse controle foi: O modo pelo qual se dá a interação entre o entrevistador e o informante pode favorecer o uso de uma ou outra variante, ou seja, favorecer o uso do TU ou VOCÊ? Em termos hipotéticos, buscamos responder que o modo como ocorre a interação pode sim, acreditamos, afetar o uso das formas pronominais de TU e VOCÊ. Achamos que o informante pode ter influência do entrevistador na sua fala. 2) Paralelismo formal O paralelismo formal foi uma das variáveis independentes que compôs este trabalho, entretanto não foi relevante para o mesmo. A concepção de paralelismos aqui pode ser obtido com base em Oliveira (2009, p.07), que afirma: o paralelismo formal indica se o antecedente mais próximo influência de alguma forma a escolha de uma das variantes.

30 3) Tempo verbal Em relação ao tempo verbal, pode-se afirmar que, tomando-se como referência o momento em que se fala, a ação expressa pelo verbo pode ocorrer em diversos tempos, de modo que um desses tempos pode desencadear o uso de uma das formas e de um dos sentidos atrelados a elas. Daí, portanto o tempo verbal também ser um dos fatores controlados. Entretanto, não foi relevante para esse trabalho. Para ilustrar, os tempos verbais controlados foram: Modo indicativo: quando utilizado, expressa em linhas gerais certeza apresentando o fato de uma maneira real, certa e positiva. Presente: João estuda nesse colégio; Tu freqüentas essa livraria? Pretérito imperfeito:joão estudava nesse colégio; Você conhecia o bairro? Pretérito perfeito: João estudou nesse colégio; Você foi viajar? Pretérito mais-que-perfeito:joão tinha estudado nesse colégio; João estudara nesse colégio; Tu farias esse favor? Futuro do presente: João estudará nesse colégio; Tu saberás a verdade! Futuro do pretérito:joão estudaria nesse colégio. Tu verias a paisagem. Modo subjuntivo: tende a revelar um fato incerto e duvidoso. Presente: Talvez eles consigam atingir a meta. Pretérito imperfeito: Se soubesse das conseqüências, não o teria feito. Futuro: Caso ela venha, ficarei feliz. Modo imperativo: Expressa uma atitude de ordem, mando. Afirmativo: Faça sua tarefa! Negativo: Não fale comigo.

31 4) Formas nominais As formas nominais dos verbos são três, infinitivo, gerúndio e particípio e não apresentam flexão de tempo e modo. Em se tratando do infinitivo, que é forma nominal do verbo e pode apresentar-se flexionado e não-flexionado, e, a exemplo do tempo verbal, também não se constituiu como relevante. 5) Concordância Verbal A concordância verbal ocorre quando se flexiona o verbo para concordar com o seu sujeito. A pergunta que se colocou para a investigação considerando esse fator: A ausência da concordância verbal pode acarretar o uso de uma das formas? A hipótese é a de que a ausência de marca formal, aproximando-se da concordância de terceira pessoa do singular (você foi, ele foi, tu foi), poderia indicar uma preferência de uso pelo VOCÊ, embora saibamos que o TU registra o uso lingüístico mais freqüente na região. O fator independente concordância verbal também não foi relevante, e acreditamos que seja justamente em função do caráter que o TU assume como uso preferencial na região de Criciúma. Vamos agora aos fatores extralinguísticos. 4.2.2 - Fatores extralinguísticos Os grupos de fatores analisados foram sexo e escolaridade, que serão caracterizados a seguir. 1) Sexo

32 Foi analisado o fator extralinguístico sexo, controlando os gêneros masculino e feminino, cuja pergunta que desencadeou o controle foi: A ocorrência dos pronomes TU e VOCÊ está mais presente nas falas de homens ou mulheres? - ou dito de outro modo: O sexo do informante pode favorecer o uso de uma ou outra variante, ou seja, favorecer o uso do TU ou VOCÊ? Mollica (2003) destaca que há uma diferença significativa na forma como mulheres e homens manifestam-se verbalmente. Nossa hipótese, portanto, é a de que as pessoas do sexo masculino utilizam mais o pronome VOCÊ do que as pessoas do sexo feminino. Acreditamos que as mulheres utilizam mais o pronome TU, e aqui vale ressaltar as palavras de Paiva (In: Mollica, 2003, p.35) pois há uma maior consciência feminina do status social das formas lingüísticas. As mulheres demonstram maior preferência pelas variantes lingüísticas mais prestigiadas socialmente. 2) Escolaridade A escolaridade foi o outro fator extralingüístico controlado. Foram analisados os dados dos informantes com Primário, Ginásio e Segundo Grau, com base na instalação da seguinte pergunta: Será que o grau de escolaridade do falante influencia na tendência de utilizar o pronome TU ou VOCÊ? Em alguns casos, acreditamos que a escolaridade pode vir a se constituir em um fator que contribui para a variação da língua. Para Mollica (2003, p.51): a escola atua como preservadora de formas de prestígio, face às tendências de mudança em curso. Portanto, faz-se necessário validar ou não se a escolaridade do informante influencia na escolha entre os pronomes TU e VOCÊ. Nossa crença é a de que os informantes com maior escolaridade tende a falar mais o VOCÊ do que informantes com um grau de escolaridade menor, porque este encerra um grau de formalidade maior, essa crença passa justamente pela fala de Mollica (2003) ao afirmar que em casos de entrevista especialmente, o grau de formalismo é um efeito secundário e indireto da escolaridade.